Caos, a vida de Anya Hoffmann era puro caos desde que cometeu o erro de cair no charme de Nikolas Oliveira, um aproveitador do pior tipo. As consequências de sua burrice não demoraram a explodir como fogos de fim de ano em sua cara, por isso estava quase sem ar, as pernas doloridas empreendendo uma corrida desenfreada em direção ao imponente prédio do escritório de advocacia O’Connor Direito Cível, onde seu divórcio e a custódia do filho seriam discutidos.
Conseguiu sair mais cedo do trabalho ao aceitar descontos em seu já apertado salário, um pesado sacrifício para estar na reunião de conciliação no horário marcado. No entanto, o trânsito caótico entre a periferia e o centro da cidade conspirou contra ela. Estava atrasada, muito atrasada, constatou ao olhar as horas pela milionésima vez desde que abandonou o Uber, resignada, no meio do engarrafamento.
Esbaforida, atravessou a porta giratória e se apresentou na recepção, trocando o peso de um salto para o outro e mordendo o lábio inferior enquanto esperava impacientemente ser autorizada a subir. Voou da catraca da entrada até o elevador ao ter a passagem permitida.
Dentro do elevador, a caminho do andar que selaria seu destino, alisou nervosamente o cabelo e o blazer, tentando recompor-se após a corrida frenética. Endireitou a coluna, inspirou fundo e decidiu que não daria a seus pais e ao seu graças-a-Deus-futuro-ex-marido, o prazer de notar o impacto da campanha empreendida contra ela.
Abriu um largo e plástico sorriso ao sair do elevador e ser recebida pelo advogado público que a representava e seguiu rapidamente até a recepção do andar ao ser informada de que seu ex-marido já estava na sala com o advogado dele.
— Por favor, me acompanhem! — disse a recepcionista, guiando-os até uma sala próxima. — O advogado Nikolas Oliveira os aguarda.
Atingida pelo fantasma do amor passado, Anya engoliu em seco, a tensão duplicando em cada fibra de seu ser ao atravessar a porta, os olhos arregalando confirmarem a presença do homem que foi a melhor e a pior parte de seu passado: Nikolas, seu grande amor, o homem que partiu seu coração e, indiretamente, a levou aquele momento.
A surpresa foi um soco no estômago, fazendo seu coração disparar e sua mente reviver lembranças dolorosas. Mesmo relutante em sucumbir à beleza dele, Anya não pode negar que ele continua lindo. Atlético e alto, Nikolas exalava confiança.
O cabelo castanho escuro, que na faculdade tinham irresistíveis e macios cachos, estava penteado com esmero, mas um cacho se soltou do controle do gel que usava e aumentava o seu charme natural e irresistível. E aqueles olhos cor de ônix, profundos e misteriosos, capazes de fazer qualquer mulher perder o fôlego e cair no erro de se apaixonar loucamente.
Forçou-se a manter a compostura e não se deixar levar tão facilmente, de novo. Também não queria revelar que o conhecia. Ninguém de sua família nem seu ex-marido sabia de seu passado com Nikolas, e pretendia mantê-los na ignorância.
Nikolas pareceu compartilhar o mesmo desejo ao cumprimenta-la friamente:
— Boa tarde, senhora Anya Hoffmann Petrov! — disse ele, a voz fria contrastando com a intensidade das íris ônix fixas nela. — É um prazer conhecê-la.
Disfarçando a onda de emoções que a inundava, mesmo com o coração acelerado, pulsando sentimentos inacabados, forçou um sorriso educado.
— Boa tarde, senhor Nikolas Oliveira! Peço que me trate apenas como Anya Hoffmann — devolveu, imitando a frieza no tratamento.
Ele esboçou um rápido meio sorriso. Um gesto sutil que a transportou de volta aos tempos da faculdade, fazendo-a se xingar por vibrar da cabeça aos pés como antes.
~*~
Anya sabia que seu ex-marido, apoiado pelos pais dela, não mediria esforços para contratar os melhores advogados e manipular a justiça para que desistisse. Mas nada a preparou para o tsunami de mentiras que inundou a sala. Acusações absurdas voavam em sua direção, impiedosamente lançadas por Nikolas, que exigia que ela desistisse do processo ou ele convenceria o juiz de que ela era inepta, irresponsável e incapaz de cuidar do filho.
Tentou falar, expor sua verdade, relatar os abusos e manipulações que havia sofrido. No entanto, seu próprio advogado a mandou calar diante dos ataques à sua moral. Enquanto a reunião prosseguia, Anya lutava para manter a calma – como seu advogado inútil pedia – e resistir ao impulso de gritar ou bater as cabeças dos três homens umas contra as outras. Estava claro que nenhum deles estava interessado em ouvir sua versão dos fatos; a verdade tinha um preço, e no momento, ela não podia pagá-lo.
Em meio ao forçado silêncio, sentia o olhar de Nikolas perfurar sua armadura, como se pudesse ler seus pensamentos e segredos mais profundos. Evitava seu olhar, temendo que ele pudesse mesmo fazê-lo.
Ao final da reunião, seu ex-marido e Nikolas trocaram palavras sobre os próximos passos do processo, enquanto Anya seguia seu advogado para fora da sala. Perdida em reflexões, pediu para usar o lavabo e deixou o advogado partir.
Sozinha, curvou-se sobre a bancada de mármore com duas pias, jogou água no rosto, molhou a nuca e se obrigou a respirar fundo. Não bastasse tudo o que vinha sofrendo, agora vinha o passado açoitá-la, trazendo de volta à sua vida Nikolas, seu amor de faculdade e com quem teve um término amargo. Olhou o reflexo no espelho, vendo a palidez e as olheiras com apatia.
— Nikolas... Maldito... — sussurrou com raiva, sentindo o nó na garganta aumentar.
Mordeu o lábio inferior, um hábito quando estava nervosa. Sentia-se vulnerável e exposta, sem saber como lidar com essa nova complicação em sua vida. Precisava agir, mas estava dividida. Podia se humilhar, esquecer o mal que Nikolas lhe causou e pedir que ele mudasse de lado. Mas isso exigiria revirar o passado.
— Tenho que falar com ele... pelo meu filho... — murmurou, fitando seu rosto abatido, ensaiando mentalmente as palavras guardadas nos últimos cinco anos.
Respirou fundo, buscando forças para enfrentar o que estava por vir, e ao sair, pediu para falar com Nikolas novamente. Notando o tremor em sua voz e o desespero, a recepcionista rapidamente, sem muito questionar, interfonou e logo a conduziu de volta à sala de Nikolas. O reencontrou cercado por papéis carregados de mentiras sobre ela, o olhar frio e cortante se erguendo ao ouvir a porta se fechar.
Ignorando a postura rígida e o olhar hostil, com passos firmes, aproximou-se dele, pronta para uma conversa decisiva e fazer o que fosse necessário para proteger os interesses de seu filho.
— Por favor, não continue no caso, não tire meu filho de mim — implorou, as lágrimas pinicando no canto de seus olhos. — Se um dia sentiu algum carinho por mim, me ajude.
O pedido entrou nos ouvidos de Nikolas da pior maneira. Como ela se atrevia? Os olhos cor de carvão observavam Anya como adagas afiadas.
— Senhora Hoffmann, por favor, tome assento e me diga: por que devo te ajudar?
Anya podia apontar um bom motivo para Nikolas sair do caso e não ficar contra ela na disputa de guarda do filho. No entanto, ressentida pelos traumas e manipulações dele no passado, não confiava nele. Além disso, temia aumentar os esforços para tirar o filho dela. Tensa, com as mãos suadas, sentou-se, respirou fundo e reuniu coragem antes de começar angustiada:— As acusações de Liam, meu ex-marido, são falsas. Não sou uma má influência para meu filho. Só quero o melhor para ele, e isso significa protegê-lo de Liam. Por favor, não continue no caso — explicou, optando por um caminho seguro até sentir confiança para revelar mais.Uma tensão palpável pairava no ar enquanto os dois se encaravam intensamente, o silêncio cortante aumentando o nervosismo de Anya. Sentia-se dividida entre o desejo de fugir e a necessidade de lutar por seu filho. A segunda opção venceu.Lembrava-se dos casos que assistiu Nikolas auxiliar quando eram estudantes. Ele era habilidoso, metódico e feroz, mesmo como e
Carregando o fracasso de fazer Nikolas ficar do seu lado, Anya retornou para casa, para a pensão humilde onde ocupava um pequeno cômodo. Dentro do ônibus, a poucos minutos de rever o filho, inspirou fundo, ergueu o queixo e determinou-se a ser forte, ter fé na justiça, que conseguiria vencer.Ao chegar à pensão bateu na casa de sua vizinha, uma senhora gentil que cuidava do pequeno Maximilian enquanto Anya trabalhava.— Chegou cedo — a idosa comentou ao abrir a porta, dando passagem para o animado menino.— Mamãe!Anya se abaixou para receber o abraço apertado do filho, os dedos sentindo a maciez dos cachos pretos.— Tive um compromisso e precisei sair antes — explicou erguendo-se com o menino nos braços. — Obrigada por cuidar do Max!— Ah, ele é um menino tão bonzinho, não me custa nada — disse acariciando as costas da criança. — Ele já tomou banho e comeu. — A idosa entregou para Anya a bolsa com os pertences do menino. — Coloquei uma vasilha com sopa de abobora dentro. Vai te fazer
Anya acordou cedo, como de costume, e começou a se preparar para mais um dia de trabalho árduo. Acordou Max beijando sua bochecha macia, os dedos fazendo cócegas em sua barriga, despertando-o entre risadinhas e queixas sonolentas.— Hora de levantar, Max!— Num quero... — ele reclamou puxando a coberta, o corpinho se encolhendo e evitando os olhos dela.— Mamãe tem que trabalhar! A tia Dolores está a sua espera. Não quer encontrá-la? — disse mencionando a bondosa vizinha que cuidava de Max com carinho.Mesmo resmungando, o menino sentou na cama, esfregando os olhos azuis iguais aos dela. Não se moveu, mas também não ofereceu resistência enquanto Anya o arrumava antes de saírem.Após vesti-lo, o levou para a casa da vizinha, em que foram recebidos com calorosos sorrisos e abraços. Dolores exalava o conforto e afeto que Anya nunca sentiu com os pais e o marido.— Por favor, entre, vamos tomar café juntas.O convidativo cheiro reconfortante de café fresco e pão recém assado pairava no ar.
Após dois turnos exaustivos de trabalho, e uma longa viagem de ônibus e metrô, Anya chegou ao condomínio de luxo em que morou até dois meses antes. Seus pés doíam, sua mente está turva de cansaço, mas a esperança de ter a guarda de seu filho, Max, a fazia prosseguir. O severo mordomo a escoltou pela mansão de sua família, mesmo ela sabendo exatamente que caminho tomar até o escritório de seu pai. Ao entrar no local foi recebida pelos olhares severos de seus pais, o sorriso falso de Liam, seu ex-marido, e o olhar velado do advogado Nikolas Oliveira. — Anya, querida, que prazer recebê-la em nossa casa — disse Elisa, sua mãe, como se fosse uma visita qualquer. Seguindo o exemplo, Anya a saudou com a mesma frieza, sabendo que qualquer palavra calorosa seria rejeitada ou serviria de combustível para as constantes críticas que recebeu ao longo dos anos. — Como está, docinho? — Liam soltou com um de seus sorrisos calculados. — Liguei para definirmos o melhor futuro para o Maximilian. An
Durante o trajeto até o endereço de Anya o silêncio pesou dentro do carro. A rua tranquila do subúrbio estava iluminada pelas luzes fracas dos postes, lançando sombras dançantes sobre o asfalto molhado pela chuva recente, e do bar ao lado da pensão. Nikolas estacionou e observou o local com uma ruga se formando entre os olhos. — Pode abrir a porta? — Anya pediu ao notar que estava travada. Voltou-se irritada, só então notando o desgosto nos olhos negros fixos no prédio decadente. — Precisa considerar com seriedade suas opções — ele declarou sem retirar a atenção do imóvel repleto de pichações e rachaduras. — Com o trabalho, a casa e o advogado que arranjou, as chances de ganhar a guarda são nulas — proferiu, movendo o olhar sombrio para o rosto dela. — Entre em um acordo e entregue o menino para o pai e os avós. Com isso, aceitarão que retorne a sua casa, sairá desse lugar deprimente e oferecerá uma melhor condição de vida a criança. Mordendo o lábio inferior, Anya suspirou e anali
As lembranças de seu romance com Anya se entrelaçavam aos tempos de faculdade, em que o termo “bebê fortuna” era comum entre os alunos ao se referir aos nascidos na riqueza e poder. Foi em seu primeiro ano que descobriu do que se tratava, ao defender um colega do ataque durante um intervalo.A situação acabou aproximando Nikolas do rapaz, Ricardo, um bebê fortuna de uma longa linhagem de advogados renomados. A amizade lhe rendeu o cargo de assistente do advogado e professor mais linha dura da faculdade, pai de Ricardo.A primeira amizade com um bebê fortuna não foi intencional, mas as que vieram ao longo do curso foram estrategicamente planejadas. Percebendo a vantagem das conexões e influências dos ricos ao seu redor, se aproximou da maioria ao longo do curso, utilizando sua inteligência e charme para se inserir no círculo das famílias influentes. Logo se tornou uma figura conhecida e respeitada, transitando entre os círculos sociais mais privilegiados.No último ano soube de Anya Ho
Finalizando o segundo turno de seu trabalho como garçonete, Anya removeu o uniforme e vestiu a calças de moletom e camiseta, empurrando as peças provocantes para o fundo de sua bolsa, junto com os saltos agulha. Era mágico colocar os tênis, como pisar em nuvens felpudas todo fim de expediente.Ao sair pela porta dos fundos, a fim de evitar os bêbados e os descarados, deparou-se com uma das dançarinas, fumando escorada na parede.— Você é tão patética, Anya! Com seu corpo e rosto, no lugar de sair na encolha, podia rebolar no colo de um daqueles velhos babões e lucrar muito — ela soltou junto de uma baforada cinza. — As gorjetas seriam muito maiores e sairia dessa vida de merda que está levando — comentou observando Anya com um sorriso sarcástico.Balançou a cabeça, recusando mais uma vez a proposta. Desde que começou a trabalhar, as garotas do lugar, o segurança que arranjou a vaga para ela e o dono do bar insistiam que ampliasse suas funções. Sempre recusava. Era ruim o bastante estar
Segurando firme Max em seu colo, entrou na sala do advogado Nikolas, sendo o foco da atenção dele e das pessoas que representava: os pais e o ex-marido dela. Seu olhar inseguro vasculhou o ambiente a procura do próprio, não o encontrando.— Meu advogado ainda não chegou... — informou com dificuldade, a garganta seca pelo temor de estar ali com Max. Só o levou por medo da ameaça de perdê-lo se não fosse.— Lamento, ele avisou a poucas horas que não participará da reunião. Disse não ser necessário — Nikolas explicou apontando uma cadeira. — Sente-se!Ignorando o pedido, manteve-se em pé, enquanto os demais estavam sentados. Acuada, colocou Max no chão e, segurando-o firme com uma mão, usou a outra para telefonar para seu advogado. Foi perda de tempo, a resposta foi à mesma, com o acréscimo do tom carregado de desprezo pelos temores dela.Estava sozinha frente àquelas pessoas poderosas contra ela. Baixou o olhar, encontrando com os ansiosos de Max. De imediato renovou suas forças, estreit