O carro de Guilherme deslizava suavemente pela estrada, o silêncio no interior da cabine só interrompido pelo ruído do motor da Ranger. Sentada ao lado dele, processando a empolgação de Mirela, uma mulher rica, com seu bebê, Tábata olhava distraída à paisagem.— Te incomodou a oferta da dona Mirela? — ele questionou ao ouvir o centésimo suspiro desde que saíram da mansão Salvatore.— Não, jamais! Achei inesperado e adorável... Não esperava que ficasse tão animada com o bebê de uma completa estranha — confessou.— Dona Mirela é intensa quando o assunto é família. — Os dedos dele se fecharam com mais força no volante. Hesitou um pouco, escolhendo bem as palavras ao alertá-la. — Tenha cuidado! Ela tem boas intenções, mas também está à caça de uma esposa para o filho, um galinha sem futuro.Tábata virou-se rapidamente para ele, os olhos arregalados de surpresa.— O quê?!— Ela realmente adora planejar festas, principalmente casamentos, e o foco dela nos últimos anos tem sido o filho mais
Se Tábata achava que uma boa noite de sono resolveria a confusão de seus sentimentos por Guilherme, logo perceberia que não seria suficiente, sendo ele o maior culpado.Um barulho abafado a despertou no domingo, se revirando na cama, pegou o celular na mesinha e verificou as horas, vendo que passava das onze. Nunca tinha dormido até tão tarde, mas, não tendo nada a fazer, hesitou em se levantar. Foi o barulho insistente de batidas que a fez abandonar a cama e seguir sonolenta para o banheiro.Usou o vaso, lavou mãos, rosto, escovou os dentes, penteou o cabelo e trocou a camiseta velha, que usava para dormir, por uma em melhor estado e calça moletom. Durante o tempo todo o barulho preencheu o ambiente.Curiosa, saiu atrás do ruído, percebendo que a origem era no quarto ao lado, escritório dele. A porta tinha uma pequena fresta aberta, ao empurrar a porta um pouco mais, ficou totalmente paralisada.Guilherme estava de costas para ela, de pé, sem camisa, concentrado em algo na escrivanin
Na sala de Guilherme, envolta pelo emaranhado de luzes e enfeites de Natal, Tábata e ele montavam a árvore de um metro que seria o centro da comemoração de fim de ano da família dele. Ambos ocupavam as mãos na tarefa de colocar nos galhos, luzinhas, sininhos, laços e vários enfeites coloridos que estavam na mala que ele pegou na casa do pai.— Sempre gostei de apreciar as decorações de Natal — Tábata comentou, segurando um anjinho dourado. — Desde que fiquei responsável pelo antiquário, separo as peças mais bonitas, que tenham um ar natalino, para enfeitar a vitrine principal — comentou encaixando o anjo na lateral da árvore de plástico verde. — Tinha uma caixinha de música linda, com uma delicada bailarina de porcelana e arabescos em vermelho, que separei pra esse ano...A voz de Tábata morreu, deixando apenas a expressão melancólica e os dedos trêmulos buscando o próximo enfeite.Notando, Guilherme se enfureceu com a falta de consideração dos pais dela. Era difícil imaginar a dor qu
— Guilherme — ela começou, fechando a porta atrás de si com um clique suave —, vamos tomar uma bebida para comemorar as férias coletivas!— Não tenho tempo para isso — ele respondeu sem tirar os olhos da tela.Sem intenção de desistir, Simone aproximou-se, sentando na mesa ao lado dele, a barra da saia subindo e expondo a coxa.— É só uma bebidinha rápida, para alinharmos ideias sobre nossa viagem de trabalho no próximo mês.Ele ergueu o olhar, a observando com expressão neutra. Sabia o que ela estava fazendo. Não era a primeira vez que Simone forçava uma aproximação desde o término.— Todos os detalhes já foram resolvidos. O que precisar ser ajustado, discutiremos na volta das férias — respondeu com firmeza, controlando-se para não ser ríspido. — Se for urgente, mande para o grupo da viagem. Assim, todos ficam informados, e não apenas nós dois.Fazendo um beicinho, ela retrucou:— Ah, mas, entre um drinque e outro, poderíamos aproveitar o clima de fim de ano para... — inclinou-se lig
De manhã, na véspera de Natal, Tábata acordou com o aroma de pão fresco e café invadindo o quarto.— Vamos te alimentar, bebê — sussurrou deslizando as mãos carinhosamente pelo ventre volumoso ao ir ao banheiro.Minutos depois, seguindo o olfato e o brado do estômago, seguiu para a cozinha.Ao passar pela sala, olhou para os vários presentes sob a árvore, colocados por Guilherme no noite anterior. Ele não tinha comentado para quem eram, mas pela quantidade, seis, era óbvio que comprou um para cada pessoa que estaria no almoço de Natal, incluindo a bebê.Observando os embrulhos, envergonhou-se. Não tinha nada para dar a ele, nem a ninguém que estaria lá. Mesmo tendo pouco dinheiro, precisava sair e comprar algo especial para as pessoas que estavam cuidando dela e de sua bebê. No entanto, tinha um problema: o próprio Guilherme. Certeza que insistiria em ir junto.— Bom dia, Gui! — Tábata disse ao entrar na cozinha, tentando soar natural enquanto pegava uma caneca no armário.Ele ergueu
Tábata parou diante da casa de sua família, o local em que cresceu e morou até pouco tempo atrás, quando foi expulsa. Observou a pintura branca desgastada, as rachaduras, o portão enferrujado, que rangia ao menor toque, enquanto sua mão flutuava a centímetros da campainha. Ajeitou o corpo, respirou fundo e, enquanto uma mão pousava sobre sua barriga em um gesto carinhoso, enfim tocou a campainha.Aguardou ansiosa. A brisa fria fez seu cabelo cair sobre o rosto, o afastou com os olhos se revezando atentos da porta para à janela. Era costume olharem discretamente pela janela antes de atender. Logo, viu a cortina ser puxada minimamente, revelando apenas a sombra de alguém espiando. Por um instante, seus olhos brilharam com uma esperança quase infantil de estar perto de resgatar o laço familiar.No entanto, em um segundo, a cortina foi solta e voltou ao seu lugar, como se nada tivesse acontecido. Tábata esperou, fingindo para si mesma que eles só precisavam de um pouco mais de tempo e log
Tábata ajeitou-se desconfortável na cadeira, olhou revoltada para Maya, antes de se voltar novamente para Guilherme, em pé segurando uma sacola.— Gui, pensei que só viria quando te ligasse... — comentou tentando disfarçar o constrangimento.— Estava comprando umas coisinhas pro encontro de Natal aqui perto — ele explicou, mostrando a sacola com algo grande embrulhado em jornal. — Imagino que essas sejam as amigas que me falou — disse lançando um sorriso amistoso para as mulheres ao lado dela.— Ah, sim. Essas são Maya Rajab e Hana Mori — apresentou apontando para cada um das amigas. — Meninas, esse é Guilherme Perez, o amigo que está me ajudando.— É um prazer conhecê-las!Ele puxou uma cadeira no lado esquerdo de Tábata, sentando-se próximo, o braço relaxando sobre o encosto dela. As amigas, percebendo a proximidade natural, se entreolharam com expressões divertidas, que não passaram despercebidas por Tábata, deixando-a sem jeito.Maya inclinou-se, animada:— Ah, já tínhamos ouvido
Na manhã de Natal um carro estacionou na garagem da casa de Guilherme. A ansiedade de Tábata bateu no teto, os dedos deslizando nervosos pela camiseta desgastada, enquanto era coberta pelo arrependimento de não ter comprado uma roupa nova.Com o coração retumbando nos ouvidos, parou ao lado de Guilherme em frente a porta que levava para a garagem, a agitação e vozes do outro lado dando um vislumbre do que a esperava.— Por Deus, controle a língua pelo menos hoje — uma voz masculina exigia.— Serei um anjo de candura — outra, feminina, declarou carregada de um sarcasmo descarado.— Paola, por favor, não provoque... — ouviu a súplica suave e feminina próxima da porta.Guilherme pousou a mão em suas costas, deslizando suavemente para cima e para baixo, o olhar e o sorriso doces como mel, diminuindo a onda de nervosismos percorrendo-a.— Preparada?— Acho que sim... — respondeu com um tenso e miúdo sorriso.Os primeiros a entrar foram Pedro e o irmão dele, Paulo, gêmeos idênticos na aparê