Capítulo-2

💀 💀

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Nalla escutava os sermões intermináveis de sua mãe através do telefone, cada palavra soando como um eco de frustração em sua mente. Ela revirava os olhos, a mistura de tédio e obrigação em não desobedecer pulsando em seu peito. Mas naquele momento, uma faísca de coragem a impulsionou.

— Mamãe, eu não o amo. Como posso viver com alguém por quem não sinto nada, nem mesmo uma mera atração? — Sua voz, embora firme, carregava um eco de insegurança.

Do outro lado da linha, Lola exalava impaciência. A voz dela elevou-se em um tom crítico, a indignação visível até na forma como suas mãos gesticulavam.

— Ouça o que está dizendo, minha filha! Mulheres da nossa família não podem ficar solteiras, viver uma vida de libertinagem. — A palavra "libertinagem" saiu como um golpe. Nalla podia quase sentir a frustração da mãe atravessando a linha. — Você sabe como é: sempre foram os tios que decidiram, e assim sempre será!

A indignação em Nalla a fez sentir-se como uma rebelde em um campo de batalha. A raiva queimava, mas ela se controlou.

— O problema é exatamente esse, Mamãe. Eu nem conheço esse homem! Nada sobre ele, sua família, seus amigos. — Ela fendeu o ar com as palavras, mas foi abruptamente interrompida.

— O que você quer dizer com isso? Cuidado com a sua língua, menina! — A reprimenda feroz de Lola arrepiou Nalla.

— Sim, Mamãe, é exatamente isso que a senhora está pensando. — Sua sinceridade soou como um grito dentro de um túnel escuro. Sabia que cortaria fundo, especialmente em uma família que valorizava tradições acima da felicidade individual.

Nalla sentiu o impacto de suas palavras. Mesmo à distância, via a tristeza moldar-se no rosto da mãe. Quebrar uma tradição era um crime imperdoável para a família, um ato de rebeldia que ressoaria entre os mais conservadores. Mas liberdade, ela pensou, era um preço que estava disposta a pagar.

A raiva de Lola a trouxe de volta à realidade.

— Você só pode estar louca! Está vendo o que está dizendo? Quer que eu morra? É isso? Sua ingrata! Seu pai nunca deveria ter deixado você ir para a Espanha, mas a culpa não é sua, é dele! — Sua voz, agora dramática, parecia um grito em uma peça de teatro.

Nalla conhecia aquele truque. Desde a infância, sua mãe a manipulava para conseguir o que queria, seja um desejo de consumo ou uma ideia antiga sobre o que era melhor para a família. No entanto, ela nunca quis ser um peão no jogo de Lola, cuja prioridade parecia ser o dinheiro. Para a mãe, ter um genro rico superava qualquer questão de amor ou felicidade.

— Você quer que eu morra para que você possa ser feliz, Nalla? — A dramatização soava como uma lâmina cortando o ar, mas a filha via através do ato.

— Não, Mamãe, não é isso! — Nalla respondeu, mantendo a calma como um escudo. — Eu só quero viver a minha vida. O que importa mais, o amor ou um casamento arranjado?

O silêncio que se seguiu pesou como uma pedra entre elas, o coração de Nalla batendo forte, ansiando por uma resposta.

— Nalla, você precisa entender que amor não é tudo. O que importa é a segurança, a união das famílias — a voz de Lola insistiu, teimosamente presa à tradição.

— Mas minha felicidade, Mamãe? Você não me quer feliz? — O desejo por compreensão iluminava seu rosto, mesmo com os olhos marejados.

— Meu amor, claro que quero. — A voz de Lola suavizou num momento de vulnerabilidade. — Mas você não pode fazer barulho e querer mudar tudo de uma vez. Isso é uma falta de respeito!

O peso da resposta foi esmagador para Nalla. Sabia que, para a mãe, respeitar a tradição era mais importante do que respeitar os desejos da própria filha. Respirando fundo, ela se concentrou em se manter firme.

— Desculpe-me, Mamãe. Respeito a sua opinião, mas eu preciso me respeitar também. Não posso me casar com alguém que não conheço, que não amo...

O que poderia ser um diálogo sereno tornou-se um embate. A distância geográfica agora parecia um abismo emocional, preenchido pela respiração angustiada de Lola.

— Vou dizer que a culpa é do seu pai, então — Lola murmurou, sua voz agora triste e derrotada.

O coração de Nalla afundou. Ela sabia que a dor que sentia pela destruição das expectativas da mãe seria apenas uma fração do que o resto da família sentiria. O medo do que essa mudança significava para a reputação e a continuidade das tradições a arrepiava.

— E o que ele dirá? — Nalla questionou, a força que lhe restava fraquejando.

— Ele vai me apoiar. Sempre fez o que eu disse. Você sabe como ele é! — A confiança de Lola parecia renovada, mas Nalla, mordendo o lábio, franziu a testa.

Mas, no fundo, ela não tinha certeza se o pai a apoiaria. O que mais a angustiava eram os olhares críticos da família, os sussurros nos corredores empoeirados de sua infância. Para Nalla, essa escolha representava uma batalha interna entre o que esperavam dela e o que realmente desejava.

— Mamãe, — Nalla declarou com sinceridade — eu só quero ter a liberdade de fazer minhas escolhas. Você não pode colocar o seu desejo de me ver casada acima da minha felicidade!

— Nalla, você não entende! O nosso nome está em jogo. O que as pessoas vão dizer? — A voz de Lola parecia um apelo desesperado.

Era irônico, pensou Nalla, que o que mais a preocupava não era o que os outros pensariam, mas o que sentiria vivendo uma vida que não era a sua. O amor e a liberdade têm um preço que vai além da tradição, contemplou. E ela estava disposta a pagar.

— Eu não quero saber o que as pessoas vão dizer, mamãe. Isso não importa para mim.

— Você faz isso parecer tão fácil, Nalla. Vai ser difícil... — A exaustão estava evidente na voz da mãe, marcando sua expressão com um pesado selo de preocupação.

— Eu sei, Mamãe. Mas eu prefiro esse tipo de dificuldade a viver uma mentira. — Nalla se sentiu crescer, aquecendo-se com a própria determinação.

— Lute, então — Lola desabafou, como se seu ânimo estivesse se esvaindo. — Mas lembre-se: as consequências podem ser severas.

— Sei disso, mas estou disposta a enfrentar as consequências — Nalla declarou, robusta como um soldado pronto para a batalha. — Afinal, a vida não é sobre obedecer, mas sobre viver de verdade.

O silêncio estendeu-se novamente, carregado de emoções. Quando finalmente Nalla desligou o telefone, um peso enorme caiu sobre seus ombros — uma mistura de angústia e liberdade. Ela sabia que sua escolha se desdobraria em novos caminhos, em busca de amor e, acima de tudo, de si mesma.

Sem olhar para trás, Nalla se permitiu sonhar, imaginando um amor intenso, alguém que a faria sentir-se viva e completa, e não apenas uma marionete em um jogo de convenções sociais. Assim, partiu, decidida a construir sua própria história, desafiando as correntes que tentavam prendê-la.

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