cap.5

Cap.5 o dia que o inferno iniciou.

Seu pai estava na sala sentado com os pés descansando sobre a pequena mesa de apoio com o jornal na mão quando Dalila disparou pela escada a fim de esconder todas as sacolas.

— Quanto privilégio uma jovem garota pode ter, sabia que não precisava dar dinheiro a essa medíocre. — Resmungou demonstrando seu total incômodo. — Bom, ao menos vou ligar para dizer que o pouco limite foi um mal-entendido e agradecer pelos presentes. — Dizia enquanto discava o número.

— Onde ela está? — Perguntou atendendo imediatamente.

— Já chegou em casa.

— Não conseguir chegar a tempo de vê-la, meu filho não estava muito animado com a ideia de conhecer a garota.

— Então o senhor não a viu? — Perguntou curioso se levantando enquanto olhava em direção as escadas com os olhos em chamas de fúria.

— Não, infelizmente quando cheguei ela havia ido embora.

— Está bem.

— Podemos marcar outro dia, no momento não estou com tempo, mas quero vê-la novamente.

— Ok, até mais. — Desligou o telefone e subiu lentamente pela escada mantendo pensamentos frios e perversos que iam sendo alimentados a cada passo que o mesmo dava enquanto seguia pelo corredor com iluminação limitada. Dalila já havia escondido parte dos presentes que ganhara, deixando apenas os que iria usar junto ao presente da visita misteriosa. — Filha?! — Chamou com a voz suave forçada enquanto sua mão tremia em resposta a sua mente perversa.

— Papai? Pode entrar! — Abriu a porta inocente e animada com um sorriso de orelha a orelha, ele entrou silenciosamente olhando ao redor até encontrar algumas poucas coisas na penteadeira.

— Acredito que o dinheiro que eu te dei não dava para comprar isso. — Comentou mexendo na penteadeira olhando cada frasco.

— Foi mais como um golpe de sorte, a esposa de um homem não queria e ele não sabia o que fazer com essas coisas então ele me deu. — Explicou ingenuamente.

— Então... Você aceitou isso de um homem? — Perguntou fechando os punhos como se dessa forma sua raiva pudesse ser contida.

— Sim... — Respondeu com receio após perceber a expressão brava do pai e a resposta foi imediata, a bofetada a fez cambalear caindo na cama ainda tentando assimilar a dor enquanto massageava o rosto.

— Você acredita que uma mulher de respeito vive aceitando presentes de homens desconhecidos? Ainda mais casados? — Bradou irritado enquanto as lágrimas escorrem do rosto de Dalila, após essas duras palavras a garota não ouviu mais nada focando apenas em sua dor, até ouvi a porta bater indicando que seu pai havia ido embora, encolheu-se sobre a cama e permaneceu lamentosa até a empregada vir bater à sua porta.

— Dalila, a visita chegou... — Interrompeu o aviso, prestando atenção no rosto vermelho da garota. — Aquele velho perverso, ele te bateu de novo? — Perguntou preocupada.

— Não é óbvio? — Respondeu segurando o choro novamente.

— Vamos dar um jeito nisso! — Pegou a menina pela mão levando-a até a penteadeira. — Nossa, seu pai foi generoso como nunca vi. — Comentou perplexa ao visualizar os produtos.

— Não foi meu pai. — Falou lhe dando um sorriso tímido olhando o curativo em seu dedo.

— Quem te deu?

— Um homem chamado Vitor, ele havia comprado para sua esposa, mas ela repentinamente disse que não queria então ele fez essa doação para mim.

— Isso me soa tão estranho. — Comentou pegando o pó compacto começando a aplicar na mancha. — Hm... Seu rosto está um pouco inchado, isso não vai dar para disfarçar. — Falou ao franzir a sobrancelha. — Mas como era esse homem?

— Aparentava ser rico, tinha uma barba grande, parecia ser alguém carismático, bonito e jovem, porém não posso confirmar por causa de sua grande barba, Mona! — Falou levantando-se para em seguida se pôr de joelhos na cadeira de frente para a moça com o olhar malicioso. — Está interessada nele? Ele é alto, o corpo... Deixe-me pensar... Não sei nem explicar, estava vestindo camisa preta social e jeans justos, eu não sou boa com descrição, mas acredito que se ele fosse solteiro, ele se interessaria por você.

— Credo menina, você tem cada ideia, um desconhecido qualquer não ganharia o coração da Mona dessa forma — Comentou com ironia.

Mona é empregada da casa, jovem e bonita, olhos castanhos, cabelos encaracolados e negros, lábios cheios, normalmente Dalila divide seus produtos com ela então Mona adorava a arrumar vez ou outra.

— Por que não? Ele é rico, uma pena que seja casado, mas um dia nesses passeios eu encontrarei um parceiro para você. — Disse animada.

— Pare de loucura! — Falou com um sorriso tímido. — Se arrume, seu pai não está muito paciente, não quero que ele a machuque de novo. — Disse pegando o batom rosa e passando uma camada fina nos lábios desenhados da menina. — Pronto, está incrível.

— Obrigada Mona! — Agradeceu eufórica pegando a caixa com o presente seguindo pelo corredor até chegar as escadas, do topo das escadas conseguiu ver a mulher de vestido longo vermelho sentada no sofá ao lado de seu pai, seu coração gelou, as batidas pareciam ter cessado, enquanto descia cada degrau lentamente, a ideia de ser uma visita foi apagada da cabeça de Dalila quando viu a mão dos dois, entrelaçadas uma na outra.

— Dalila! — Chamou seu pai com sorriso de orelha a orelha.

— Que menina linda você tem, Auro. — Chamou-lhe carinhosamente pelo apelido.

— Boa tarde senhora. — Disse timidamente com reverência entregando o pequeno pacote.

— Oh, que linda e educada! Obrigada, querida. — Agradeceu com um falso sorriso.

— Vou ser direto, essa é a esmeralda, a sua madrasta! — Essas palavras ecoaram na cabeça dela a deixando trêmula direcionando os olhos em direção a grande barriga da mulher.

— Ah, isso? — Indagou ela com um sorriso brilhante ao perceber o olhar da garota. — São seus irmãozinhos! São gêmeos, um lindo casal.

— Irmãos? — Inquiriu petrificada.

— Sim, trate Esmera bem, ela é sua nova mãe! — Novamente as palavras sujas ecoaram nos ouvidos da garota. Sua respiração ficou pesada e visão turva, ela deu meia volta correu escada acima sem nem olhar os degraus e entrou em seu quarto trancando a porta em pânico imaginando o que já era óbvio, isso só a fez cair na cama em prantos novamente, onde permaneceu até amanhecer.

O sol raiava no céu e seus raios adentravam pela grande janela, da varanda de seu quarto ela tinha uma visão esplendorosa da sua rua e do jardim em frente à casa. Observava o balançar das árvores e o transitar das pessoas até avistar um carro do outro lado da rua que lhe pareceu familiar, ela mal havia percebido o rapaz que lhe observava outrora com o vidro do carro abaixado, agora escondido atrás do vidro fumê.

— Hm... Esse parece aquele carro... Vitor! Parece o carro dele. — Comentou pensativa, debruçada sobre o pequeno muro da sua sacada enquanto ele se sentia sortudo por conseguir vê-la novamente.

— Por quanto tempo teremos que ficar com essa menina? — Perguntou Esmeralda sentada a grande mesa de café.

— Até ela completar 18 anos.

— Sabe que não precisa mantê-la na sua casa por tanto tempo, não sabe?

— Óbvio que sei, ainda assim... Eu não quero que ela vá agora! — Confessou com a expressão dura.

— Por quê? — O silêncio pairou na cozinha até a empregada passar com uma bandeja.

— Onde está indo, Monalisa?

— Levar o café da senhorita. — Respondeu meio acanhada ficando com a postura curva.

— Chame-a para a mesa. — Ordenou indiferente voltando a comer.

Assim que Monalisa repassou o comando, Dalila vestiu-se e desceu para o café. O silêncio incômodo apenas era quebrado pelo barulho da colher batendo no prato, Dalila comeu o mais rápido possível sem os encarar enquanto seu pai a observava imparcial.

— Depois iremos conversar sobre o que aconteceu ontem. — Avisou tranquilamente descansando a colher sobre o prato cruzando os braços.

— Bom, eu tenho que sair agora. Preciso escolher o enxoval, você quer vir? — Perguntou a Dalila que hesitou.

— Sim, ela vai! — Confirmou seu pai a encarando, a menina levantou os grandes olhos surpresos e assentiu mesmo que não quisesse.

— Então se arrume e vamos. — Falou apontando para os cabelos desgrenhados, a vermelhidão do seu rosto ainda estava aparente, algo ignorado pelo seu pai e pela madrasta. Ela subiu rapidamente, trocou-se colocando um vestido com um decote coração discreto azul-marinho, esvoaçante acima dos joelhos e desceu a escada novamente encontrando sua madrasta encarando-a dos pés à cabeça.

— Como pode ficar tão bonita com tão pouca dedicação? — Comentou com um falso sorriso branco entre o batom vermelho intenso.

— Obrigada... — Falou timidamente, sua primeira palavra da manhã.

— Não quer que eu vá levar vocês? — Insistiu Aurélio.

— Não, eu já pedi um carro, estamos tranquilas.

— Está bem, querida. — Disse de forma afetuosa dando-lhe um beijo terno na têmpora, enquanto sua filha observa contendo a revolta e a mágoa.

Assim que saíram, o mesmo carro que ela viu em frente à casa mais cedo ainda estava ali com os vidros levantados tornando difícil para ela conseguir confirmar a identidade de seu motorista.

— Vamos? — Chamou Dalila que andava pausadamente. — Essa é a nossa carona hoje. — Falou deixando-a surpresa então a garota o viu sair do carro com aquele mesmo sorriso fechado e gentil entre a barba.

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