Cap.1

Cap.1

Após mais de duas décadas, presa a um homem que nunca me amou, é incrível viver novamente na casa onde nasci. Mesmo estando sozinha, não há sensação melhor do que estar em um lugar só seu, onde se pode sentar em frente à lareira e descansar, apesar das lembranças das marcas e das dores que me assombram ocasionalmente.

Tudo estaria perfeito se não fosse pelo fato de precisar constantemente da vigilância de seguranças. Não consigo sair em paz, sempre há seguranças me seguindo. Vlad pode pensar que não percebo, mas eu também tento estar sempre alerta. Afinal, se a ex-mulher dele não representasse uma ameaça, minha casa não estaria cercada por seguranças.

Quando saio, o ambiente se torna caótico e desconfortável. Mas isso não diminui minha vontade de explorar e conhecer novos lugares. Neste exato momento, já estamos no meio da manhã. Tomei um banho e vesti roupas confortáveis e discretas, que escondem ao máximo meu corpo. As cicatrizes ainda me incomodam, mesmo que sejam difíceis de serem vistas. Imagino que qualquer homem que as visse, por mínimas que fossem, me envergonharia. E essas marcas nem são as piores.

Já faz duas semanas desde que minhas filhas tiveram seus filhos. Estou feliz por estarem felizes com seus maridos. Sinto alívio por elas não terem seguido o mesmo destino que eu no passado, quando foram forçadas a casar após seu pai, as venderem.

Hoje, saio para fazer compras, um novo passatempo que admito ter desenvolvido. No entanto, sempre há um carro com vidros escuros me seguindo. Finjo que não vejo, pois eles geralmente não me incomodam. No entanto, desta vez, sinto que é o depravado do Don que está me seguindo. Vou tentar ignorá-lo ao máximo, pois sei que, ao menor sinal de interesse, ele me envolverá em seus braços. Não que seja desagradável, mas... é estranhamente bom, porém errado, dadas as coisas que ainda não consegui superar.

No final, acabo não comprando nada, pois minha ansiedade não me permite relaxar. Ele está constantemente em minha mente. Faço um passeio, visito uma livraria e passo algumas horas lá. Vou a um restaurante e me pergunto se ele tem fome. Ele não sai do carro, então volto para casa no início da tarde. O dia começa a esfriar, o céu escurece. Essa mudança repentina no tempo me faz pensar que é melhor estar em casa antes da chuva.

A distância entre onde estou e minha casa permite que eu volte a pé. Sigo em passos largos e rápidos, não vejo mais o carro e nem os outros seguranças. Faz um tempo que não me sinto segura quando eles desaparecem assim. Pareço a Scarlett, talvez tenha herdado essa sensação de atrair perigo e se machucar.

Logo, percebo um homem estranho me seguindo. Ele não se encaixa no perfil dos seguranças que tenho visto. Ele usa um capuz e calças jeans, tentando ocultar o rosto. Estou apenas a uma rua de minha casa e sei que ele não faz parte dos homens que Don contratou como seguranças.

Sem pensar duas vezes, começo a correr, e como esperado, ele continua me seguindo. O mais dramático é que o bairro onde moro é normalmente tranquilo, e neste momento há poucas pessoas na rua.

Continuo correndo, já estou ao lado de minha casa, correndo próximo aos muros. Basta virar a esquina e chegar ao portão, mas como entraria sem que ele conseguisse invadir?

Passo rapidamente por um poste e ouço um baque alto atrás de mim. Olho de relance e vejo o homem caindo no chão, contorcendo-se de dor, enquanto Vlad emerge de trás do poste após tê-lo golpeado com força.

Suspirei aliviada por ele chegar a tempo. Ele lançou o homem tão longe que é difícil acreditar que tenha sido apenas ele. Logo, alguns homens aparecem e levam o perseguidor até uma van. Tenho certeza de que isso tem dedo da Hayna. Observo toda a situação, sem forças para correr.

Vlad está de costas, observando os homens levarem o intruso. Mas onde estavam antes? Ele me encara de maneira imparcial, e é difícil saber o que ele está pensando, enquanto meu coração parece querer me sufocar.

Ele sorri, um sorriso fechado, com um toque de humor, enquanto se aproxima de mim com elegância, mantendo as mãos nos bolsos de suas calças, seu jeito, sua postura mesmo em uma postura que deveria ser relaxada ele inspira imponência.

— Você está bem? — ele perguntou, e eu abro os lábios cética, franzindo o cenho.

— Estou bem. Você conhece esse homem que estava me seguindo? — questiono, incapaz de fazer contato visual.

— Não. Você não percebeu nenhum homem suspeito te observando nos últimos dias?

— Acredito que essa seja a sua função. Se não fosse por sua esposa, eu estaria segura e em paz na minha casa. — resmungo, dando as costas e me preparando para seguir. No entanto, ele segura meu braço e me puxa de volta.

— Você não precisa ficar tão na defensiva. Estou apenas te protegendo. Até onde sei, Henry disse que você sente a minha falta. Então, por que continuar me tratando assim?

— Ele estava errado. Eu nunca senti falta de você! — digo friamente e lhe dou as costas, mas de alguma forma, isso me incomoda.

Após entrar em casa, ele volta para o carro e fica estacionado em frente ao meu portão, com as janelas abertas. Já está escurecendo, e ele continua ali. Mesmo que não goste de tê-lo tão perto, sinto-me inquieta. Afinal, se não fosse pela sua proteção, tudo isso ainda seria culpa dele.

Olho furtivamente pela janela várias vezes, até que ele finalmente me percebe observando. Decido seguir até a cozinha, onde sinto um pouco de frio e desejo algo quente. Será que é confortável ficar tanto tempo em um carro?

Preparo um cappuccino e alguns brownies, mas sinto receio em levá-los até ele. Vlad sempre arranja uma maneira de me provocar. Suspiro profundamente, reúno coragem e saio com a comida em um prato. No meio do caminho, a chuva começa a cair. Corro cuidadosamente para não derrubar nada. A janela do carro dele está fechada, mas a porta se abre, e ele me observa enquanto passo pelo portão em sua direção.

— Pensei que não gostaria de falar comigo. — ele comentou indiferente, mas percebo os segundos que seu olhar vacila demonstrando surpresa.

— Eu não quero! — digo, enquanto percebo a chuva ficar mais intensa. — Pode simplesmente pegar de uma vez? Já está prestes a chover. — enrijeci a voz, estendendo o braço e oferecendo-lhe a comida. Em vez de pegar o prato completo, ele pega apenas o copo, colocando-o no suporte próximo ao volante, e em seguida o prato, mas também agarra meu braço no processo e em razão de segundos estou dentro do veículo.

— Quando você vai parar de negar? — perguntou, enquanto a chuva cai como se fosse o fim do mundo.

— Não sei do que está falando. Apenas me deixe ir. — bradei, empurrando-o.

— Você sabe muito bem do que estou falando. Se sente minha falta, basta me deixar ficar com você. — diz, soltando-me. Tento sair do carro, mas ele já o trancou, e as gotas de chuva batem no vidro com força.

— Não sinto sua falta. Não quero que você fique perto de mim. — ele coloca a mão sobre o volante e olha para fora com impaciência.

— Ok, não vou insistir. Os dias em que fiquei afastado foram bons para você? — perguntou, e ouço o carro destravar.

— Claro... — engulo em seco.

— Tudo bem, não vou mais aparecer. — ele diz com seriedade.

— O que está dizendo? — pergunto, franzindo o cenho.

— Você ouviu muito bem. Eu já disse que vou desistir. Mas você continua dando sinais e depois simplesmente me rejeita como se fosse um jogo. Se é isso que quer... talvez eu seja um pouco velho demais para isso. — confessou, indicando para que eu saia.

O encarei cética e aborrecida, enquanto ele me ignora. Saio do carro e caminho sob a chuva, odiando como ele me faz sentir como uma adolescente apaixonada, algo que até hoje apenas ele conseguiu despertar em mim.

— Shelly! — ele gritou, mas não me viro para o encarar, e parece que saiu do carro.

Para minha infelicidade, acabei deixando o portão aberto enquanto corria em direção a porta.

— Você é tão descuidada assim? — ele rosnou, encontrando-me à porta antes que eu pudesse entrar. — O que poderia acontecer se você deixasse o portão aberto assim? — ele perguntou, visivelmente irritado.

Após me repreender ele volta ao portão, minhas pernas estão travadas e internamente torço para que ele vá embora, mas ao olhar de relance, vejo que ele apenas o fechou e voltou até mim.

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