Felipa
Termino meu trabalho meio aérea. Minha cabeça fica procurando respostas para o que aconteceu na sala do CEO. Eu estou alucinando? É a única explicação. Aquele homem não me conhece. Como pode querer que carregue um filho seu?
— Não vai embora, filha?
Minha tia está parada na minha frente, com seu sorriso gentil de sempre no rosto e uma cesta linda nas mãos.
— Vou sim. O que é isso? — aponto a cesta.
— Presente do CEO, acredita? E ele me deu duas passagens para uma semana em um hotel fazenda na cidade do meu velho. Ele vai ficar tão feliz.
— Que maravilha, tia! — tento mostrar felicidade em meio a confusão. Ela ter recebido um presente faz aquela conversa parecer mais real. — Faz tempo que o tio fala querer visitar seus parentes.
— O CEO me entregou os presentes pessoalmente e me agradeceu pelo meu trabalho — diz toda sorridente. — Está vendo? Esse é o melhor trabalho do mundo. Aquele homem é um anjo.
— Não é como o chamam. Já ouvi várias vezes que o nome que o chamam é Demônio implacável.
Ela faz uma careta desgostosa.
— Coisa de pessoas mal amadas. Deveriam lavar uma trouxa de roupa que ficar cuspindo no prato que comem. Depois que perde o emprego fica chorando.
Suas rugas a deixam tão fofa quando faz essas caretas ou sorri. Quero envelhecer tão linda como minha tia. Seus cabelos loiros meio grisalhos presos no coque, seu corpo com curvas naturais, sem contar dos olhos azuis como um oceano. Tudo nela é lindo, tão lindo quanto seu coração. Por isso meu tio a ama incondicionalmente, faria qualquer coisa por ela. Eu também, a amo com tudo de mim.
Vamos conversando enquanto seguimos para o ponto de ônibus.
— A senhora quer que eu leve? Parece pesado. Posso tocar no seu belo presente?
— Deixa de ser besta. Tá pesado mesmo. Pode levar.
Pego a cesta das suas mãos e continuamos andando.
Não demoramos no ponto e o ônibus chegou. Como é ponto final, conseguimos sentar juntas um pouco perto da porta para sair com mais facilidade.
Decido contar sobre o que houve. Eu sempre conto tudo para minha tia.
— Tia, hoje o CEO me chamou na sala dele. — Ela me olha com aquela expressão de “o que você fez?” — Eu acho que me chamou. Sinceramente, a proposta que ele fez me faz achar que delirei.
— O que ele queria?
— Que eu fosse sua barriga de aluguel.
— Como é? Não. — Ela ri. — Deve ter delirado.
— Ele disse que mandou o contrato por e-mail. Vou abrir aqui e a senhora me fala se estou alucinando.
Abro o celular e encontro o e-mail do secretário dele com o contrato. Minha tia coloca os óculos e pega o celular da minha mão.
— Parece coisa de novela. — Me entrega o celular. — Aceita.
— Como assim aceita tia? Isso é insano.
— Por favor, querida. Você nunca viveu nada emocionante na sua vida. Viveu em função de ter um futuro confortável para cuidar dos velhos que te acolheram. Nem se atreva a perder a chance de viver essa aventura.
Esqueci de dizer que minha tia é a mulher mais romântica que existe nesse mundo. Ela é do tipo que acredita em alma gêmea e romances mirabolantes. Como esse que aposto que está criando na sua cabeça.
— Mas tia, como posso gerar o filho de alguém? Eu não sei se consigo gerar uma vida e depois abrir mão dela. Essa aventura é demais para mim.
— Quem falou em abrir mão? Você vai viver um romance lindo.
Franzo o rosto. Essa mulher é incorrigível.
— Tia!
— Tia nada. O que você tem de especial além de ser a minha sobrinha linda, inteligente e com coração gigante? Ele viu alguma coisa em você.
Mas o que?
Fico pensando e não respondo.
— Olha, querida, você sabe como conheci seu tio.
Sim, a história que ela contava para eu dormir quando tia pesadelos. Eram filhos de dois fazendeiros que brigavam por terras. O pai do meu tio convenceu o filho a casar por interesse, mas ele acabou completamente apaixonado pela mulher e cedeu toda terra que ela quis. É assim até hoje. Ele dá tudo que ela pede. Isso é um resumo do que minha romântica tia conta.
Como não falo nada ela continua:
— É a minha opinião. Eu aceitei me casar por interesses da minha família, e foi a melhor coisa que aconteceu na minha vida.
— Mas ele não está propondo casamento. Só quer que eu seja a sua barriga de aluguel. É diferente.
— Ainda assim, eu aceitaria. Ele é um gato.
— Tia! — empurro seu ombro rindo.
Pelo menos terei o apoio dela se decidir aceitar a chantagem. O que é certo que eu faça. Jamais me pouparia tendo como vitima seus sonhos.
Aquele maldito mexeu na minha parte mais sensível: meus tios. Os únicos pais que reconheço.
Mas barriga de aluguel? Isso é loucura.
AquilesUm anos antes...— Trouxe novidades. — Jordan entra na minha sala sem bater.Desvio o olhar dos papéis sobre a minha mesa e encaro meu amigo com seu terno sob medida e seus cabelos loiros penteados para trás e sem um fio fora do lugar.— Espero que seja importante para invadir minha sala.Seus olhos verdes brilham de empolgação.— Você lembra que me pediu para encontrar a garota que te salvou quando era moleque?— A encontrou?— Melhor, ela nos encontrou. Pelas características que me passou, tenho noventa e oito por cento de certeza que ela acabou de ser contratada pela sua empresa. — Ele balança a pasta que segura. E traz para mim.Abro o papel e vejo a moça em várias fotos, aqui na empresa e fora dela. Em algumas ela está sorrindo. Um sorriso que toma seu rosto inteiro e faz seus olhos escuros brilhares.— Ela é da cidade onde aconteceu. Tem a idade aproximada que você falou e as características físicas, além da cicatriz.— Como você...— Olha as fotos. Ela não esconde.Ele
FelipaEu não fui até a sala dele. Me fiz de desentendida, esperando que ele acorde para a realidade e esqueça essa loucura.Não quero ser barriga de aluguel de ninguém.Agora estou aqui, limpando esse lugar sem nem um pouco de concentração.Ele não manda me chamar. Graças a Deus. Entendo isso como um sinal de que caiu na real.Ainda assim passo o expediente todo pensando que ele pode me chamar. Na hora de sair vejo que passou do horário que minha tia aparece para irmos juntas. O que é estranho. Ela nunca se atrasa.Vou até o restaurante no segundo andar e não a vejo. O lugar está quase vazio, apenas alguns funcionários trabalhando.— Você viu minha tia? — pergunto depois de cumprimentar Nania, sua colega no restaurante.Ela me olha de um jeito estranho. Me lembra pena.— Oh menina! Não sabe ainda? Foi um choque.— O que houve? — já começo a pensar em várias tragédias.— Ela foi demitida antes mesmo de terminamos o almoço. Achei que tivesse te contado.Demitida? Não pode ser.Aquele f
FelipaDepois de deixar meu tio consolando minha tia, fui para o quarto que dividia no alojamento. Onde tive que esperar meia hora do lado de fora porque o sinal com marca de batom estava no trinco. Quando minha colega decidia trazer alguém era assim que ela marcava. Eu podia fazer o mesmo, mas nunca fiz. Não sinto desejo nem interesse romântico por ninguém. Talvez nunca sinta.Assim que o cara se foi, tomei um banho e me troquei e fui para a aula. Que eu espero não ter tido nada importante porque não consegui absorver nada.Quando finalmente coloquei a cabeça no travesseiro, mal dormi. Passei a noite em claro me questionando se estava agindo certo ao planejar enfrentar um homem poderoso como o senhor Escobar. No fim, aceitei que tinha que fazer isso. Homens como ele precisam entender que as pessoas não são seus brinquedos. Ele está brincando com a minha vida, com a vida da minha tia, como se não fosse nada.Às cinco da manhã me levanto e me arrumo. Faço tudo como um dia qualquer.Vou
AquilesA porta aberta nos dá uma visão dos seguranças levando Felipa. Ela não briga com os seguranças, se deixa levar.Caminho até o batente e fecho a porta, trancando antes que Bruna venha com sua preocupação exagerada. Talvez eu deva trocar de secretária, ela já está começando a se achar minha namorada.Jordan bate palmas como se tivesse assistido a um show.— Que furacão foi esse? Agora consigo imaginar a pequena Baker enfrentando um pitbull para salvar você. — Ele ri. — E agora, pretende fazer o que? Ela parece decidida a não ceder.— Garantir que nenhuma delas consiga outro emprego. Ela vai voltar e pedir perdão.— Cara, aquela mulher tem fogo e tem garra. Se não fosse pela tia dela você não teria chance.Eu sei. Todo mundo tem um ponto fraco. E o de Felipa são os tios.— Foi por isso que demiti a tia e não ela.— O Demônio Implacável ataca novamente.Reviro os olhos com seu comentário.— Vamos voltar ao trabalho? Pode ser?Ele dá de ombros e senta, pegando os papéis que estava
FelipaEu preferia morar debaixo de uma ponte que voltar aqui e pedir algo a ele, mas não sou só eu nesse barco afundando. Minha tia não consegue emprego, assim como eu, porém ela está cada dia mais abatida. Sempre pergunta sobre a volta do desgraçado, com esperança que se falar com ele tudo será resolvido.Se ela soubesse que foi demitida por maldade dele.Eu queria dizer, mas não posso. Eu não consigo magoar minha tia assim. Ela e meu tio Felix são tudo para mim. Por eles eu entrego meu orgulho em uma bandeja de prata a qualquer miserável da família Escobar, ou outra qualquer. E foi o que fiz.Tive que engolir todo orgulho e responder o e-mail que ele enviou com o contrato pedindo para conversarmos. Ele demorou dois dias para responder de volta. E aposto que viu antes e só queria me fazer esperar.“Esteja na empresa às nove. É sua última chance.”Essa foi a resposta.Sem nenhuma escolha, acordei cedo e cheguei na empresa às oito. Fiquei na recepção esperando ele passar para me anunc
FelipaNo intervalo do almoço, que fiz mais tarde pelo meu “atraso”, resolvi ligar para tia Joyce.“Oi, querida. Aconteceu alguma coisa?”Ela sempre me atende assim quando não está esperando uma ligação minha.— Tia, o senhor Escobar voltou e falei com ele. A senhora pode voltar a trabalhar.Ela fica alguns instantes em silêncio. Só ouço sua respiração meio pesada.“Eu não quero mais.”Sua resposta me surpreende. Eu sei que ela quer. Todos os dias ela dizia o quanto sentia falta e queria voltar.— Por que? Achei que era o seu sonho.“E qual foi o preço que pagou pelo meu sonho? Eu não sou boba, Lipa. E apesar de ter saído da empresa tenho muitos amigos ali. Você não estava trabalhando depois que fui demitida, e hoje foi lá e conseguiu meu emprego de volta. Como?”Sou muito idiota por acreditar que ela não descobriria. Ainda bem que ninguém me viu ajoelhando e beijando os pés daquele miserável.Suspiro.Não adianta mentir.— Ele não vai permitir que trabalhemos em outro lugar. Já mandei
Aquiles— Puta que pariu! Você fez ela ajoelhar? — o idiota do Jordan chega a se levantar da cadeira quando conto o que houve minutos atrás.Ele chegou já dizendo que viu Felipa e queria saber como foi o retorno dela. Contei, e agora estou pagando pelo meu erro de abrir a boca.— E implorar — completo sem emoção, escorado em minha cadeira.— Ela deve te odiar.Ele anda de um lado para o outro da sala.Não posso dizer que me senti bem com o que fiz, mas precisava ser feito. As pessoas não aprendem com carinho e consideração. Eu aprendi isso desde muito cedo.— É o que quero. Ela precisa saber que ter um filho comigo é um acordo, assim como o casamento. Não quero que tenha ideias erradas. Eu sou seu chefe, não seu namorado.— Mesmo assim acho que exagerou. Cadê o cara que procurou a garota para pagar uma dívida de vida?— Você não entende de mulher, acho que nem de homem. — Jordan me mostra a língua e volta a se sentar. — Se eu simplesmente devolvesse o emprego da tia dela, a garota ter
FelipaQuinze minutos depois de me encontrar com a senhora Mendes, estou na sala dela, sentada à sua frente.Ela coloca o papel na minha frente. Na verdade, duas cópias.— Aqui diz que é pelas suas faltas injustificadas — explica.Então, ele não colocou mais nada. Pelo menos isso.Leio rapidamente.— Tudo bem. Pode me emprestar uma caneta para assinar?Primeiro Iara franze o rosto por eu não questionar nada, depois ela pega uma caneta e me entrega.Assino e empurro os papéis para ela.— Está tudo bem mesmo? Se tiver algo que eu possa fazer...— Tudo bem — respondo.— Se você diz.Seu olhar em minha direção é de desconfiança. Tenho quase certeza que é ela a pessoa que se comunica com minha tia. Assim como deve ter outros. Todos amam a tia Joyce, duvido que tenham ficado feliz com a demissão dela. Aquele babaca escroto...— Tudo bem mesmo? — pergunta.Percebo que me perdi em pensamentos assassinos envolvendo o CEO.— Sim. Tive alguns problemas pessoais que me tiraram o rumo, mas já re