Aquiles
Um anos antes...
— Trouxe novidades. — Jordan entra na minha sala sem bater.
Desvio o olhar dos papéis sobre a minha mesa e encaro meu amigo com seu terno sob medida e seus cabelos loiros penteados para trás e sem um fio fora do lugar.
— Espero que seja importante para invadir minha sala.
Seus olhos verdes brilham de empolgação.
— Você lembra que me pediu para encontrar a garota que te salvou quando era moleque?
— A encontrou?
— Melhor, ela nos encontrou. Pelas características que me passou, tenho noventa e oito por cento de certeza que ela acabou de ser contratada pela sua empresa. — Ele balança a pasta que segura. E traz para mim.
Abro o papel e vejo a moça em várias fotos, aqui na empresa e fora dela. Em algumas ela está sorrindo. Um sorriso que toma seu rosto inteiro e faz seus olhos escuros brilhares.
— Ela é da cidade onde aconteceu. Tem a idade aproximada que você falou e as características físicas, além da cicatriz.
— Como você...
— Olha as fotos. Ela não esconde.
Ele me interrompe quando vou perguntar como viu se o cão a mordeu na altura dos seios.
Vejo as próximas fotos e encontro uma que ela está com um vestido tomara que caia. A cicatriz da mordida do animal parcialmente exposta.
— Ela não parece ter vergonha. — Ele insiste.
— Onde ela está agora? Quero ver se ela me reconhece.
— Está trabalhando. — Ele já levanta. — Vamos lá!
Agora...
Naquele dia eu a vi limpando uma das salas. Usava o uniforme.
Acho que não me reconheceu, pois sequer demorou o olhar em mim enquanto me cumprimentava com educação. Eu mudei muito. Nem eu me reconheço. Era um menino magricela com dificuldades de andar por causa de um acidente e usava um aparelho horrível nos dentes. Enquanto ela era uma menina corajosa e linda que enfrentou um animal violento para salvar um desconhecido. Devo minha vida a Felipa.
Olho o relógio. São nove e trinta. Ela não apareceu.
Pego o telefone e disco o ramal direto do Jordan.
— Vem aqui — falo e desligo.
Minutos depois ele aparece.
— Coisa boa ou coisa ruim? — entra já perguntando.
— Eu disse a ela para me dar uma resposta às nove. Ela está me ignorando.
— Cara, que pena. Ela seria a ideal. Seu bisavô sabe que estava procurando por ela. Nada mais romântico que se casar com sua salvadora.
— Eu não estou procurando romance.
— Nem eu. — O idiota brinca. — Mas sabe que vai ganhar pontos com o velho se casando com ela.
Pior que sei.
— Pode ser. Mas ela não colabora.
— O que pretende fazer?
— Cumprir a ameaça.
— O que? — ele levanta e balança a cabeça negativamente, assim como balança o dedo indicador. — Não pode demitir a Tia Joyce. Eu não sei viver sem almoçar a comida dela.
— Então é bom que aquela teimosa aceite — digo decidido.
— Nossa, cara! Você não tem coração? A mulher toda feliz pelos anos trabalhados conosco e você vai demitir ela. Isso não se faz.
— É só a sobrinha dela aceitar meus termos e ela pode voltar quando quiser.
— Quero morrer seu amigo.
— Então vai logo resolver a questão da demissão. Inventa qualquer coisa que justifique quando ela for readmitida.
— Fala como se tivesse certeza que a garota vai se submeter por causa disso.
— E eu sei. Não estou há um ano seguindo seus passos para não saber da vida dela. Agora some. Tenho muito trabalho.
Ele levanta e vai em direção a porta. Ao segurar a maçaneta, se vira e deixa o último comentário de merda.
— Vai foder. Anda muito estressado.
Sem esperar resposta, sai batendo a porta.
Não demora nem dois minutos e Bruna entra com seu andar sensual, se oferecendo.
Ela é minha secretária há cinco anos. Sabe como gosto das coisas, principalmente como preciso de um boquete quando estou estressado.
E é disso que preciso agora.
FelipaEu não fui até a sala dele. Me fiz de desentendida, esperando que ele acorde para a realidade e esqueça essa loucura.Não quero ser barriga de aluguel de ninguém.Agora estou aqui, limpando esse lugar sem nem um pouco de concentração.Ele não manda me chamar. Graças a Deus. Entendo isso como um sinal de que caiu na real.Ainda assim passo o expediente todo pensando que ele pode me chamar. Na hora de sair vejo que passou do horário que minha tia aparece para irmos juntas. O que é estranho. Ela nunca se atrasa.Vou até o restaurante no segundo andar e não a vejo. O lugar está quase vazio, apenas alguns funcionários trabalhando.— Você viu minha tia? — pergunto depois de cumprimentar Nania, sua colega no restaurante.Ela me olha de um jeito estranho. Me lembra pena.— Oh menina! Não sabe ainda? Foi um choque.— O que houve? — já começo a pensar em várias tragédias.— Ela foi demitida antes mesmo de terminamos o almoço. Achei que tivesse te contado.Demitida? Não pode ser.Aquele f
FelipaDepois de deixar meu tio consolando minha tia, fui para o quarto que dividia no alojamento. Onde tive que esperar meia hora do lado de fora porque o sinal com marca de batom estava no trinco. Quando minha colega decidia trazer alguém era assim que ela marcava. Eu podia fazer o mesmo, mas nunca fiz. Não sinto desejo nem interesse romântico por ninguém. Talvez nunca sinta.Assim que o cara se foi, tomei um banho e me troquei e fui para a aula. Que eu espero não ter tido nada importante porque não consegui absorver nada.Quando finalmente coloquei a cabeça no travesseiro, mal dormi. Passei a noite em claro me questionando se estava agindo certo ao planejar enfrentar um homem poderoso como o senhor Escobar. No fim, aceitei que tinha que fazer isso. Homens como ele precisam entender que as pessoas não são seus brinquedos. Ele está brincando com a minha vida, com a vida da minha tia, como se não fosse nada.Às cinco da manhã me levanto e me arrumo. Faço tudo como um dia qualquer.Vou
AquilesA porta aberta nos dá uma visão dos seguranças levando Felipa. Ela não briga com os seguranças, se deixa levar.Caminho até o batente e fecho a porta, trancando antes que Bruna venha com sua preocupação exagerada. Talvez eu deva trocar de secretária, ela já está começando a se achar minha namorada.Jordan bate palmas como se tivesse assistido a um show.— Que furacão foi esse? Agora consigo imaginar a pequena Baker enfrentando um pitbull para salvar você. — Ele ri. — E agora, pretende fazer o que? Ela parece decidida a não ceder.— Garantir que nenhuma delas consiga outro emprego. Ela vai voltar e pedir perdão.— Cara, aquela mulher tem fogo e tem garra. Se não fosse pela tia dela você não teria chance.Eu sei. Todo mundo tem um ponto fraco. E o de Felipa são os tios.— Foi por isso que demiti a tia e não ela.— O Demônio Implacável ataca novamente.Reviro os olhos com seu comentário.— Vamos voltar ao trabalho? Pode ser?Ele dá de ombros e senta, pegando os papéis que estava
FelipaEu preferia morar debaixo de uma ponte que voltar aqui e pedir algo a ele, mas não sou só eu nesse barco afundando. Minha tia não consegue emprego, assim como eu, porém ela está cada dia mais abatida. Sempre pergunta sobre a volta do desgraçado, com esperança que se falar com ele tudo será resolvido.Se ela soubesse que foi demitida por maldade dele.Eu queria dizer, mas não posso. Eu não consigo magoar minha tia assim. Ela e meu tio Felix são tudo para mim. Por eles eu entrego meu orgulho em uma bandeja de prata a qualquer miserável da família Escobar, ou outra qualquer. E foi o que fiz.Tive que engolir todo orgulho e responder o e-mail que ele enviou com o contrato pedindo para conversarmos. Ele demorou dois dias para responder de volta. E aposto que viu antes e só queria me fazer esperar.“Esteja na empresa às nove. É sua última chance.”Essa foi a resposta.Sem nenhuma escolha, acordei cedo e cheguei na empresa às oito. Fiquei na recepção esperando ele passar para me anunc
FelipaNo intervalo do almoço, que fiz mais tarde pelo meu “atraso”, resolvi ligar para tia Joyce.“Oi, querida. Aconteceu alguma coisa?”Ela sempre me atende assim quando não está esperando uma ligação minha.— Tia, o senhor Escobar voltou e falei com ele. A senhora pode voltar a trabalhar.Ela fica alguns instantes em silêncio. Só ouço sua respiração meio pesada.“Eu não quero mais.”Sua resposta me surpreende. Eu sei que ela quer. Todos os dias ela dizia o quanto sentia falta e queria voltar.— Por que? Achei que era o seu sonho.“E qual foi o preço que pagou pelo meu sonho? Eu não sou boba, Lipa. E apesar de ter saído da empresa tenho muitos amigos ali. Você não estava trabalhando depois que fui demitida, e hoje foi lá e conseguiu meu emprego de volta. Como?”Sou muito idiota por acreditar que ela não descobriria. Ainda bem que ninguém me viu ajoelhando e beijando os pés daquele miserável.Suspiro.Não adianta mentir.— Ele não vai permitir que trabalhemos em outro lugar. Já mandei
Aquiles— Puta que pariu! Você fez ela ajoelhar? — o idiota do Jordan chega a se levantar da cadeira quando conto o que houve minutos atrás.Ele chegou já dizendo que viu Felipa e queria saber como foi o retorno dela. Contei, e agora estou pagando pelo meu erro de abrir a boca.— E implorar — completo sem emoção, escorado em minha cadeira.— Ela deve te odiar.Ele anda de um lado para o outro da sala.Não posso dizer que me senti bem com o que fiz, mas precisava ser feito. As pessoas não aprendem com carinho e consideração. Eu aprendi isso desde muito cedo.— É o que quero. Ela precisa saber que ter um filho comigo é um acordo, assim como o casamento. Não quero que tenha ideias erradas. Eu sou seu chefe, não seu namorado.— Mesmo assim acho que exagerou. Cadê o cara que procurou a garota para pagar uma dívida de vida?— Você não entende de mulher, acho que nem de homem. — Jordan me mostra a língua e volta a se sentar. — Se eu simplesmente devolvesse o emprego da tia dela, a garota ter
FelipaQuinze minutos depois de me encontrar com a senhora Mendes, estou na sala dela, sentada à sua frente.Ela coloca o papel na minha frente. Na verdade, duas cópias.— Aqui diz que é pelas suas faltas injustificadas — explica.Então, ele não colocou mais nada. Pelo menos isso.Leio rapidamente.— Tudo bem. Pode me emprestar uma caneta para assinar?Primeiro Iara franze o rosto por eu não questionar nada, depois ela pega uma caneta e me entrega.Assino e empurro os papéis para ela.— Está tudo bem mesmo? Se tiver algo que eu possa fazer...— Tudo bem — respondo.— Se você diz.Seu olhar em minha direção é de desconfiança. Tenho quase certeza que é ela a pessoa que se comunica com minha tia. Assim como deve ter outros. Todos amam a tia Joyce, duvido que tenham ficado feliz com a demissão dela. Aquele babaca escroto...— Tudo bem mesmo? — pergunta.Percebo que me perdi em pensamentos assassinos envolvendo o CEO.— Sim. Tive alguns problemas pessoais que me tiraram o rumo, mas já re
Aquiles“Posso saber por que mandou me chamar dessa vez?”Quanto atrevimento dessa morena.As palavras ficam ecoando na minha cabeça enquanto os olhos como um lago verde e sereno me encaram com certa revolta e medo.Nesse momento, todos ao meu redor desaparecem. Tudo que quero é fazer essa mulher atrevida sucumbir diante de minhas ordens.— Ao que parece a senhorita gosta de fazer um show. — Cruzo meus braços e apoio o corpo no encosto da cadeira. — Perdeu o medo das consequências?— Ainda não, mas estou quase lá. — Ela continua atrevida.Se pensa que com isso irei desistir dos meus planos, se engana. Aquiles Vincent nunca muda de ideia.Mordo o lábio inferior. Felipa está muito gostosa nessa pose rebelde. Sempre reparei em como suas curvas ganham destaque no uniforme e como seus olhos se destacam com o cabelo preso em um coque. É uma mulher linda, não posso negar. E isso não significa que esteja apaixonado por ela, como o lesado do Jordan diz.Ouço alguém limpar a garganta e aviso a