Felipa
Depois de deixar meu tio consolando minha tia, fui para o quarto que dividia no alojamento. Onde tive que esperar meia hora do lado de fora porque o sinal com marca de batom estava no trinco. Quando minha colega decidia trazer alguém era assim que ela marcava. Eu podia fazer o mesmo, mas nunca fiz. Não sinto desejo nem interesse romântico por ninguém. Talvez nunca sinta.
Assim que o cara se foi, tomei um banho e me troquei e fui para a aula. Que eu espero não ter tido nada importante porque não consegui absorver nada.
Quando finalmente coloquei a cabeça no travesseiro, mal dormi. Passei a noite em claro me questionando se estava agindo certo ao planejar enfrentar um homem poderoso como o senhor Escobar. No fim, aceitei que tinha que fazer isso. Homens como ele precisam entender que as pessoas não são seus brinquedos. Ele está brincando com a minha vida, com a vida da minha tia, como se não fosse nada.
Às cinco da manhã me levanto e me arrumo. Faço tudo como um dia qualquer.
Vou até a empresa ensaiando o discurso de ódio.
Cumprimento as pessoas pelo caminho normalmente, mas ao contrário de ir trocar meu jeans e blusa pelo uniforme e iniciar meu dia, pego o elevador e subo até o andar do CEO.
Subo e passo direto da secretária dele. Que arregala os olhos e vem atrás de mim.
— Ei! Ei! Não pode entrar ai.
Antes que ela termine de falar, já abri a porta e me meti na sala do CEO, onde ele está com um homem loiro sentado à sua frente, conversando.
Ele me olha curioso. O loiro também.
— Pois não? — pergunta.
Meu discurso de ódio some. Fico calada olhando para ele, me sentindo intimidada pelo seu tamanho e seu jeito arrogante dentro de roupas que jamais eu poderia comprar.
— Temos reunião marcada? Não me lembro. — Ele insiste.
Por um momento penso em deixar todo ódio de lado e apenas implorar para que mantenha o emprego da minha tia.
— Você mandou demitir a minha tia?
Preciso saber. Preciso ter certeza que ele está fazendo isso para me atingir. Porque nem mesmo nos conhecemos, pode ser apenas uma coincidência, não ter nada a ver comigo.
— Sim, ordenei sua demissão. Agora, voltando a minha questão, temos reunião marcada?
É tão deprimente.
Ignoro a presença da secretária que segura o meu braço para me expulsar e o cara loiro que parece se divertir com o que estou passando.
— Em seus sonhos eu marcaria algo com você, seu verme escroto. — Meu tom de voz está alterado pela raiva e pelo choro que seguro com toda minha força. O cara loiro ri e olho para ele. — Está me achando com cara de palhaça? Palhaço é esse babaca que demitiu uma senhora que o idolatrava só pra mostrar que tem pau. Pois fique sabendo que a minha tia vai superar e vai conseguir um emprego bem melhor. Onde tem um patrão de verdade e não um moleque que agride quando perde o joguinho.
O CEO se mostra sereno e impassível diante das ofensas.
— Ela não precisaria superar se assinasse o contrato — diz.
Me solto da megera da secretária com um safanão que quase a derruba dos saltos finíssimos.
— Chamarei os seguranças — ela ameaça saindo. Ignoro. Continuo olhando o homem arrogante.
— O senhor só pode estar brincando. Eu sou capaz de arrancar meu útero antes de deixar que alguém com seus genes cresça nele. Sua raça deveria parar em você.
Ele levanta e se apoia na mesa, encostado de um jeito displicente.
— Acabou? — pergunta.
— Sim. Tenho mais o que fazer. Quando ao meu trabalho, considere abandono.
Saio empurrando a secretária. Mas antes que eu chegue ao elevador, as portas se abrem e dois seguranças aparecem.
— Tirem ela daqui. É a invasora. — A secretária parece ter prazer em humilhar.
Os homens nem mesmo fazem perguntas. Sou agarrada pelos braços e arrastada para o elevador. Logo em seguida vem a humilhação de ser levada para fora da empresa por eles, enquanto colegas de trabalho olham e comentam.
Acho que nunca falei tanto palavrão na minha vida. Muito menos fui tão humilhada.
Nunca pensei que sairia assim.
E enquanto passava a vergonha do século, jurei que minha tia e eu iriamos superar e conseguir empregos melhores.
Para garantir isso, menti para tia Joyce. Falei que não consegui falar com o CEO, que parece que ele está viajando. Pedi que tirasse uns dias de descanso enquanto ele não voltava.
Nesse meio tempo, montei nossos currículos e busquei vagas para que ela se envolvesse e desistisse de falar com o escroto que a demitiu.
O problema é que tia Joyce não superou. Perder o emprego a deixou triste e depressiva. E eu nem contei a ela que tinha me demitido.
Ela passa seus dias em casa lamentando. Meu tio está preocupado que ela fique doente. E a culpa de tudo isso é minha. Por isso, estou fazendo um sanduiche com meu orgulho e engolindo seco. Por ela sou capaz de me humilhar mais do que já fui humilhada.
Se para trazer sua alegria terei que me sacrificar... eu o farei.
AquilesA porta aberta nos dá uma visão dos seguranças levando Felipa. Ela não briga com os seguranças, se deixa levar.Caminho até o batente e fecho a porta, trancando antes que Bruna venha com sua preocupação exagerada. Talvez eu deva trocar de secretária, ela já está começando a se achar minha namorada.Jordan bate palmas como se tivesse assistido a um show.— Que furacão foi esse? Agora consigo imaginar a pequena Baker enfrentando um pitbull para salvar você. — Ele ri. — E agora, pretende fazer o que? Ela parece decidida a não ceder.— Garantir que nenhuma delas consiga outro emprego. Ela vai voltar e pedir perdão.— Cara, aquela mulher tem fogo e tem garra. Se não fosse pela tia dela você não teria chance.Eu sei. Todo mundo tem um ponto fraco. E o de Felipa são os tios.— Foi por isso que demiti a tia e não ela.— O Demônio Implacável ataca novamente.Reviro os olhos com seu comentário.— Vamos voltar ao trabalho? Pode ser?Ele dá de ombros e senta, pegando os papéis que estava
FelipaEu preferia morar debaixo de uma ponte que voltar aqui e pedir algo a ele, mas não sou só eu nesse barco afundando. Minha tia não consegue emprego, assim como eu, porém ela está cada dia mais abatida. Sempre pergunta sobre a volta do desgraçado, com esperança que se falar com ele tudo será resolvido.Se ela soubesse que foi demitida por maldade dele.Eu queria dizer, mas não posso. Eu não consigo magoar minha tia assim. Ela e meu tio Felix são tudo para mim. Por eles eu entrego meu orgulho em uma bandeja de prata a qualquer miserável da família Escobar, ou outra qualquer. E foi o que fiz.Tive que engolir todo orgulho e responder o e-mail que ele enviou com o contrato pedindo para conversarmos. Ele demorou dois dias para responder de volta. E aposto que viu antes e só queria me fazer esperar.“Esteja na empresa às nove. É sua última chance.”Essa foi a resposta.Sem nenhuma escolha, acordei cedo e cheguei na empresa às oito. Fiquei na recepção esperando ele passar para me anunc
FelipaNo intervalo do almoço, que fiz mais tarde pelo meu “atraso”, resolvi ligar para tia Joyce.“Oi, querida. Aconteceu alguma coisa?”Ela sempre me atende assim quando não está esperando uma ligação minha.— Tia, o senhor Escobar voltou e falei com ele. A senhora pode voltar a trabalhar.Ela fica alguns instantes em silêncio. Só ouço sua respiração meio pesada.“Eu não quero mais.”Sua resposta me surpreende. Eu sei que ela quer. Todos os dias ela dizia o quanto sentia falta e queria voltar.— Por que? Achei que era o seu sonho.“E qual foi o preço que pagou pelo meu sonho? Eu não sou boba, Lipa. E apesar de ter saído da empresa tenho muitos amigos ali. Você não estava trabalhando depois que fui demitida, e hoje foi lá e conseguiu meu emprego de volta. Como?”Sou muito idiota por acreditar que ela não descobriria. Ainda bem que ninguém me viu ajoelhando e beijando os pés daquele miserável.Suspiro.Não adianta mentir.— Ele não vai permitir que trabalhemos em outro lugar. Já mandei
Aquiles— Puta que pariu! Você fez ela ajoelhar? — o idiota do Jordan chega a se levantar da cadeira quando conto o que houve minutos atrás.Ele chegou já dizendo que viu Felipa e queria saber como foi o retorno dela. Contei, e agora estou pagando pelo meu erro de abrir a boca.— E implorar — completo sem emoção, escorado em minha cadeira.— Ela deve te odiar.Ele anda de um lado para o outro da sala.Não posso dizer que me senti bem com o que fiz, mas precisava ser feito. As pessoas não aprendem com carinho e consideração. Eu aprendi isso desde muito cedo.— É o que quero. Ela precisa saber que ter um filho comigo é um acordo, assim como o casamento. Não quero que tenha ideias erradas. Eu sou seu chefe, não seu namorado.— Mesmo assim acho que exagerou. Cadê o cara que procurou a garota para pagar uma dívida de vida?— Você não entende de mulher, acho que nem de homem. — Jordan me mostra a língua e volta a se sentar. — Se eu simplesmente devolvesse o emprego da tia dela, a garota ter
FelipaQuinze minutos depois de me encontrar com a senhora Mendes, estou na sala dela, sentada à sua frente.Ela coloca o papel na minha frente. Na verdade, duas cópias.— Aqui diz que é pelas suas faltas injustificadas — explica.Então, ele não colocou mais nada. Pelo menos isso.Leio rapidamente.— Tudo bem. Pode me emprestar uma caneta para assinar?Primeiro Iara franze o rosto por eu não questionar nada, depois ela pega uma caneta e me entrega.Assino e empurro os papéis para ela.— Está tudo bem mesmo? Se tiver algo que eu possa fazer...— Tudo bem — respondo.— Se você diz.Seu olhar em minha direção é de desconfiança. Tenho quase certeza que é ela a pessoa que se comunica com minha tia. Assim como deve ter outros. Todos amam a tia Joyce, duvido que tenham ficado feliz com a demissão dela. Aquele babaca escroto...— Tudo bem mesmo? — pergunta.Percebo que me perdi em pensamentos assassinos envolvendo o CEO.— Sim. Tive alguns problemas pessoais que me tiraram o rumo, mas já re
Aquiles“Posso saber por que mandou me chamar dessa vez?”Quanto atrevimento dessa morena.As palavras ficam ecoando na minha cabeça enquanto os olhos como um lago verde e sereno me encaram com certa revolta e medo.Nesse momento, todos ao meu redor desaparecem. Tudo que quero é fazer essa mulher atrevida sucumbir diante de minhas ordens.— Ao que parece a senhorita gosta de fazer um show. — Cruzo meus braços e apoio o corpo no encosto da cadeira. — Perdeu o medo das consequências?— Ainda não, mas estou quase lá. — Ela continua atrevida.Se pensa que com isso irei desistir dos meus planos, se engana. Aquiles Vincent nunca muda de ideia.Mordo o lábio inferior. Felipa está muito gostosa nessa pose rebelde. Sempre reparei em como suas curvas ganham destaque no uniforme e como seus olhos se destacam com o cabelo preso em um coque. É uma mulher linda, não posso negar. E isso não significa que esteja apaixonado por ela, como o lesado do Jordan diz.Ouço alguém limpar a garganta e aviso a
FelipaTalentos?“Dois escrotos”. Falo sem som, mas pela sobrancelha levantada dele sei que entendeu.Estou pouco me fodendo se entendeu ou não. Esse cara vem e faz de tudo para me obrigar a assinar esse contrato maluco sem nenhum motivo e vem dizer que aquela vaca tem talentos. Que ele enfie o talento dela no rabo.— Tanto faz, continue lendo. — Sua voz me tira dos pensamentos assassinos, onde o torturo com ferro quente.Irritada, me sento.Leio todo o contrato sob o olhar dos quatro homens.Resumindo, tenho que me casar com ele na data em que ele escolher, ter um filho homem e agir como sua esposa apaixonada não importa a ocasião. No final receberei uma pensão mensal pelo resto da vida que me garantiria nunca mais precisar trabalhar, e nem meus tios. Ainda não entendi muito a parte de se vier meninas. Mas acredito que eu ficarei com elas e ele não vai fazer mais do que ajudar financeiramente, nem deve ter contato.Eu nem me assusto. Estou calejada de saber o quão mau um pai e uma mã
Felipa— Filha, o que houve hoje?— Aconteceu que eu não podia ter contado nada para vocês. Podemos ser processados se isso espalhar. E aquele imb... homem — me corrijo — pode nos colocar na cadeia.A cara do meu tio não é nada boa.— Terei uma conversinha com esse senhor. Ele não pode nos ameaçar assim. Somos pessoas decentes.— Não precisa, tio. Eu aceitei os termos dele. Assinei o contrato.— Filha, como vai ter um filho de alguém assim? — ele insiste enquanto me tia nos observa. — Filho é uma coisa séria.É meio difícil colocar na cabeça dele que ter um filho nesse caso não passaria de um trabalho.— E não para por ai... — aproveito que a garrafa de café perto e despejo um pouco na caneca que sempre acompanha a garrafa. — Já que terão que assinar o tal documento de confidencialidade vou contar tudo. Também terei que casar com ele.— Mas não seria barriga de aluguel? Estou confusa. — Minha tia fala enquanto volta a mexer na receita que prepara.Dou de ombros.— Um casamento por con