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Capítulo 6 - Você vai arcar com os crimes de Charlene
Deirdre ficou tão feliz com a descoberta que quase chorou. Cerrando os dentes, para suprimir a dor, ela cambaleou em direção à porta da frente. No mesmo instante, a porta se escancarou. Assim que os olhos da mulher encontraram Brendan, faiscaram de felicidade:

― Bren! ― Ela deu um passo à frente, com entusiasmo ― Bren, escute! Há algo que você deve saber... ―

― Cale a boca e me siga! ― Deirdre notou como o homem parecia terrivelmente frio e, com medo, perguntou: ― O que está acontecendo? ―

O olhar do homem era frio, quando disse:

― Lena estava dirigindo. Ela atingiu alguém por acidente e fugiu, deixando o corpo para trás.

A mente de Deirdre ficou em branco e disse:

― Ela matou alguém em um atropelamento? Então, ela deveria se apresentar às autoridades! O que isso tem a ver com... ― ela sentiu um nó na garganta e sua voz sumiu, enquanto a descrença tomava conta dela. Deirdre já sabia o que aconteceria, mas, mesmo assim, as palavras vieram cruéis:

― Você irá assumir a culpa. ―

Os olhos de Deirdre se arregalaram de horror, e ela sentiu como se seu mundo estivesse à beira do colapso:

― Não! Não! Não! Não! Porque? Por que eu deveria fazer isso e ser presa? Desperdiçar minha vida em uma cela? Sofrer no lugar dela?! ―

― Porque, Deirdre McQueeny, você fingiu ser ela, por dois anos! ― Brendan rosnou. Os lamentos daquela mulher eram tão irritantes que ele franziu a testa, em frustração ― eles tiraram uma foto dela, na fuga, mas vocês duas são iguais, de qualquer maneira! Todo mundo vai pensar que foi você. Você não tem onde se esconder. ―

― Então, diga ao mundo que não somos a mesma pessoa! Diga a eles que Charlene e eu somos duas pessoas diferentes! ― ela gritou, com a respiração pesada e difícil ― e você está errado sobre eu fingir ser ela. Ela é a fingida! Ela quem roubou minha identidade! Fui eu quem arriscou a vida para salvar você do incêndio, Bren! Fui eu! ―

Deirdre esperava que Brendan ficasse chocado, mas, para sua surpresa, ele nem franziu a testa. Algo pior tomou conta de suas feições, nojo.

― Lena estava certa. Você descobriu que ela me resgatou do incêndio e tentou se passar por ela! Você é realmente uma sem vergonha, Deirdre. ―

― O que você está dizendo? ―

― Se tivesse sido você quem me resgatou, por que você não usou esse argumento em cada discussão que tivemos, nos últimos dois anos? Seria, de fato, bom para você, se o mundo inteiro soubesse! ―

Deirdre se desfez em lágrimas. Deus sabe o quanto ela tentou dizer isso a ele, nos últimos dois anos, mas ele nunca a deixava terminar uma frase. Ele odiava ouvi-la falar, e a única coisa que ele parecia suportar era a aparência dela. Brendan só estava satisfeito quando ela agia como uma mulher muda e humilde.

― Olha, eu já ouvi o suficiente. Se entregue para a polícia e não tente nenhuma gracinha. Vou garantir que sua sentença não seja muito grande e, na pior das hipóteses, você pegará alguns anos. Mas, quando for solta, eu a compensarei pelo seu tempo. ―

‘Apenas alguns anos, talvez? Alguns anos?!' Deirdre soltou uma risada entrecortada, atrapalhada por suas próprias lágrimas:

― Sem chance! Nem pense que pode me obrigar a cumprir a pena de Charlene. Ela matou alguém! Ela deveria pagar por isso! ―

Qualquer simpatia que ela tivesse conquistado, em sua causa, foi jogada ao fogo quando sugeriu que Charlene pagasse por seu crime. Uma tempestade acendeu nos olhos de Brendan e ele gritou:

― Como você ousa! Ah. Entendo. Você só gosta quando machuca, não é? Você sempre foi assim, sempre amou apanhar e ser mal tratada, não é? Tudo bem. Você quer ver as coisas do pior jeito, vamos fazer assim, então! ―

O homem saiu, furioso.

Os joelhos de Deirdre cederam e ela se sentou. No momento em que recuperou forças o suficiente para pegar seu celular, recebeu uma ligação. Desconfiada, a mulher olhou no identificador e viu o nome de sua mãe, Ophelia McQueeny, aparecer na tela.

Deirdre atendeu, em um piscar de olhos.

― Deedee? Onde você está? ―

A voz de sua mãe era tão fraca e vulnerável que lágrimas brotaram dos olhos de Deirdre. Ophelia era mentalmente atípica e sua mente equivalia à de uma criança.

Desde que Deirdre concordou em se tornar a esposa substituta de Brendan mudou sua mãe para uma casa, onde recebia todo o cuidado e atenção que precisava, de uma enfermeira dedicada.

Com medo de que algo grave tivesse acontecido. Deirdre fungou, secando suas lágrimas e entrando em estado de alerta, antes de responder:

― Oi, Mamãe. Estou, em casa, com Brendan. Por que você está me ligando? Onde está Engel? ―

Ophelia parecia confusa:

― Engel foi embora. ―

― Foi embora?! Você está aí sozinha?! ― Deirdre repetiu, sentindo-se atordoada. A enfermeira de sua mãe, Engel, nunca saia do lado dela ― onde ela foi? ―

― Eu não sei... ― a insegurança de Ophelia evoluiu para um estado de pânico ― Deedee, esta casa é de outra pessoa? Algumas pessoas vieram aqui. Eles quebraram coisas e me empurraram, dizendo que queriam que eu desse o fora. Eles disseram que iriam me internar em um asilo. O que é isso? ―

― O quê?! Deirdre ficou estupefata.

Mas, antes que ela pudesse reagir, ouviu o grito de Ophelia:

― Ahhh! Me solta! Por que você está me agarrando?! ―

― Mamãe?! Mamãe! ―

A ligação foi interrompida, deixando apenas os gritos inúteis de Deirdre ecoando no vazio. Ela sentiu seu coração palpitar e entrou em ação, apesar de estar tonta. A mulher correu para a rua e parou um táxi.

Entretanto, assim que chegou à residência de Ophelia, encontrou apenas um estranho trancando a porta da frente. Não havia sinal de sua mãe. Deirdre se lançou para a frente, agarrou a manga da camisa do homem e perguntou:

― Quem é você?! Onde está minha mãe?! O que vocês fizeram com ela?! ―

O estranho afastou a mão, sem mostrar um pingo de simpatia:

― Ah, a maluca é sua mãe?! Deus, loucura corre na família! Essas pessoas deveriam ter levado você para o manicômio também! ―

― Manicômio?! ― os olhos de Deirdre se arregalaram de raiva ― vocês mandaram minha mãe para um hospital psiquiátrico e reivindicaram a casa?! Quem diabos te deu autoridade para fazer isso?! ―

― Quem nos deu autoridade? ― o homem repetiu suas palavras, zombeteiro ― o dono da casa. Esta casa pertence aos Brighthalls, sua doida. Ele quer a casa de volta e a gente não ia jogar a velha na rua, certo? A propósito, sei que você está agradecida por termos mandado sua mãe para um manicômio. Quero dizer, você já olhou para ela? Ela não sobreviveria nem um dia sem cuidados. Então, de nada. ―

Sem aguardar resposta, o homem entrou em um carro e foi embora.

Deirdre sentiu o sangue congelar. Sua mente começava a imaginar sua mãe, assustada, sozinha e confusa, sendo maltratada e arrastada para uma instituição de reputação desconhecida. Isso era sua punição por se recusar a assumir o crime de Charlene?

Uma notificação apareceu em seu celular. Deirdre abriu a mensagem e viu sua mãe, vulnerável, tremendo, sentada em uma cama de campanha.

― Abre a boquinha, doidinha! ― disse uma voz zombeteira, fora de enquadramento.

Então, a câmera focou uma tigela, com uma comida dentro. Conforme a filmagem focou, Deirdre viu que era uma papa tão pegajosa que ninguém poderia dizer o que tinha ali dentro. Entretanto, algumas moscas sobrevoavam o ambiente.

Como Ophelia se recusava a comer, A pessoa jogou a tigela na senhora:

― Come, essa porcaria! Você não tava reclamando de fome? ―

Ophelia se encolheu, desobediente, lançou um olhar para a comida espalhada na cama e tapou o nariz:

― Isso fede! ―

― Fede? Esse é seu almoço! Você deveria ser grata por ter uma refeição! Pare de ser exigente e come logo! ―

Ophelia se afastou do homem, balançando a cabeça:

― Mas, eu não quero! Isso fede! Vai me dar uma dor de barriga... ―

A pessoa que gravava o vídeo, não deixou a mãe de Deirdre terminar a frase. Deu um passo chutou a mulher de meia-idade, pisando nela com força suficiente para que ela caísse no chão. Então, puxou-a pelos cabelos e a esbofeteou, várias vezes, gritando:

― Quando eu digo para comer, você come! Porra! Você é louca e mesmo assim chama a comida de ruim?! Que merda! Alguém vem aqui e faz essa vadia comer! Enfie na boca dela e mostre ao Senhor Brighthall! ―

Mais algumas pessoas apareceram. Eles abriram a boca da senhora, à força e despejaram o que restava na tigela em sua boca.

Deirdre gritou, chorando:

― Não! Nao! ―

Não adiantava. Ela estava na posição cruel de um espectador impotente. Tudo o que podia fazer era gritar e chorar. O número desconhecido, que mandou o vídeo, ainda enviou mais uma mensagem de texto:

‘Isto é o que você ganha por se recusar a cooperar!'

O rosto de Deirdre estava cheio de lágrimas. A náusea causada pela gravidez brotou em espasmos de vômito. Sua visão ficou turva e sua mente voltou para o passado, quando, diante de um mar de chamas, Brendan jurou que lhe daria uma vida sem dor.

Mas, ele era o único por trás de cada pontada de dor que ela sentia.

Brendan era um homem frio que não via Deirdre como um ser humano, mas sim como uma cadela a quem ele podia fazer o que quisesse, sempre que tivesse vontade. Sempre que falava com ela, suas palavras eram amargas. Ele não a amava.

Mas, dar uma ordem tão desumana contra sua mãe? Fazê-la comer lavagem, apenas para que Deirdre concordasse em assumir o crime de Charlene?!

A última brasa de esperança, que já durava muito mais do que a dignidade deveria permitir, se apagou. Finalmente, ela enxergava Brendan Brighthall como ele era: uma criatura sem humanidade. Um ser feito de crueldade.

Não havia mais nada que ela pudesse desejar. Deirdre não possuía mais sonhos e isso fez com que sua dor diminuísse. Ela enxugou as lágrimas dos olhos. Algo havia morrido dentro dela.

Sua mãe estava confinada em um estabelecimento duvidoso. Ela estava sendo torturada e Deirdre tinha que agir rapidamente. Por isso, ligou para Brendan que lhe atendeu com um rosnado impaciente:

― Achei que você tivesse dito não! Por que diabos você está me ligando? ―

Ela ouviu cada palavra dele e se segurou para não chorar enquanto seis anos de amor se tornavam cinzas.

― Você me odeia tanto assim, Brendan? Quanto você me odeia? ―

― De que diabos você está falando? ―

― Você quer que eu morra. Mas, não que eu morra em paz, mas que morra em desespero e agonia. Essa é a única coisa que vai te fazer feliz, não é?! ―

― Que porra você está falando?! ―

Deirdre respirou fundo, se recompondo, em silêncio. Só então, falou, com a voz firme:

― Eu vou fazer isso. Vou assumir o crime. Contanto que minha mãe viva uma vida digna, para o resto da vida. Estou decidida. Farei o que você pediu e desaparecerei de sua vida, para sempre! ―
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