O que estava acontecendo agora com Edvaldo era quase uma repetição de anos anteriores, quando ele decidiu se aventurar no Sul do país. Queiroz em crise e ele subindo e descendo ladeira para proteger o amigo, que engolira antidepressivos entre suas cachaças; por uma desculpa de que não desistiria de Edileusa, nas suas palavras, “uma alma gêmea”.
Quando em crise, Queiroz costumava dizer que perdera a chance de ser feliz com a sua “alma gêmea” de existências passadas, mas, agora, ele não iria perdê-la novamente. Essa era a única teoria do cearense que Edvaldo rejeitava por completo, para ele era uma fraqueza sua; um orgulho seu não reconhecer que não dava mais, que “ela tá noutra” e que ele não devia “fantasiar tanto a essa altura do campeonato”. Dizia Edvaldo:
— Venha cá, Pai Véi, que cearense bimba é você? Que homem é esse, misturando crença com mulé, cachaça e as porra toda?
E realmente ninguém entendia; Edvaldo e Samara eram os únicos que se preocupava com
Naquela época, para surpresa de Edvaldo, o cearense não se preocupava em nada sobre a vida sentimental de Samara, se ela tinha algum namorado. Edvaldo, que vez ou outra se achava pensando sobre isso; que, ela ainda mais nova, não era “assanhada para o lado de namoro”. Entendia que Samara tinha a excelente educação que Queiroz lhe proporcionara mas tinha o pensamento torto de que “a menina baiana sempre fora e seria assim, com o quadril solto para saçaricar, mas nem sempre namoradeira”, e Samara era desse jeito, pois já fizera balé e sacudia o esqueleto em qualquer ritmo, mas para namorado ou falar de rapaz, nunca ouvira e para sua surpresa, Queiroz que era um autêntico “Pai Véi”, nesse quesito “nem tava aí nem tava chegando”. Uma vez quando ela tinha quatorze anos, mais ou menos, Edvaldo perguntou ao pai sobre o assunto e Queiroz respondeu “tá preocupado, macho? Nem eu…” e ele disse “não é pra tá?”, pois tinha receio que a menina fosse como a mãe e, na sua linha de raciocín
Era tempo de chuva de dia inteiro em Salvador, rumas de chuva, e já escurecera. Edvaldo, depois da indecisão sobre onde ir, seguiu rumo ao seu apartamento. Também estava inconscientemente indeciso sobre pensar em Samara, mas seria muito difícil não pensar depois daquele olhar. Ele ficou estampado na retina e foi mais fundo. Tentou colocar outra preocupação em sua mente como ligar para o trabalho, dando mais justificativas sobre sua ausência, mas lembrou que Edgar, seu chefe, já havia lhe dito que fosse cuidar de Ceará. Que era muito seu amigo, uma pessoa a quem devia respeito e admirava profundamente por razões que cansamos de repetir. Pensou mais uma vez em Salustiano, tinha plena consciência de quem era Ceará e sua filha e o mesmo respeito que tinha pelo primeiro teria por ela. Pensou nela: “aquela…” Procurava mentalmente uma palavra. Tinha que pensar em pessoas para visitarem o amigo, pessoas de confiança que pudessem passar uma tarde com ele, pois o ex-padre, o desconhecido Quev
Edvaldo, quando ainda atendia pelo nome Henry, realmente se envolveu com o povo evangélico, influenciado por irmão Marciano, que embora não houvesse passado por formação teológica era chamado por muitos por “Pastor Marciano”. Um homem caridoso e também muito humano, esse era o fato de identificação do garoto Henry. Irmão Marciano era um marido fiel e pai de nove filhos. Morava no bairro de Plataforma, no subúrbio ferroviário. Era um herói na pregação da Palavra de Deus. Sem generosas concessões, levou milhares ao batismo nas águas. Era reconhecidamente um homem destemido, como o apóstolo Paulo e sem preconceito algum como o Divino Mestre Jesus Cristo. O importante para ele era batizar, pois o Reino de Deus estava próximo, e não havia tempo a perder. Tinha que pregar “em tempo e fora de tempo”. Ele era um artilheiro como Beijoca na Fonte Nova, que fazia gol em pé, sentado ou deitado, pois assim como o craque nos gramados, como uma fera objetivava apenas finalizar um tento, c
Edvaldo já tinha como certa a visita de Marciano durante a tarde, pois ele foi informado que ele ligara também para Baixa de Quintas buscando informações. Posteriormente ficaria sabendo que havia sido Jerusa, após ouvir os conselhos de Salustiano, que ligara para ele falando sobre a crise de Queiroz e ficara preocupada com Edvaldo. Ela se lembrou que tinha um número de recado antigo de Marciano que uma vez anotara, quando viu escrito num caderno de Edvaldo, pois se angustiou quando Salustiano falou de maneira descortês com Marciano. Ela percebia o respeito de Edvaldo por Marciano e sabia que, como bom amigo e pessoa de fé, ajudaria ela e Edvaldo caso fosse necessário. Logo naquela manhã, após as oito horas, Edvaldo ligou para Marciano, que confirmou que estaria no São Paulo naquela tarde. Edvaldo havia refletido muito sobre a possibilidade de pedir para Marciano e outros colaborarem com o cuidado de Queiroz, mas Marciano tinha aquela vida de pregação e não permanecia
É preciso contar um episódio desagradável em que Edvaldo se envolveu semanas antes da internação de Queiroz. Desagradável, porém que iria empurrá-lo de maneira mais rápida ao futuro que o esperava. Dejanira desejava muito sair daquela vida, em que, a cada dia, a concorrência crescia: casas de stripper, a oferta de meninas muito novas e sedutoras na orla marítima; homens de todas as classes e de todas as idades a procurando, cada vez mais, por transexuais, e mais, os cafetões oportunistas e golpistas que existem em todos os lugares. Ela costumava dizer que “antes os homens eram mais direitos e não essa cambada de golpistas que querem sexo de graça”. Logo que chegou do interior, de Catu, surgiu um Duzinho. Cafetão da pior espécie. Ela o conheceu em uma viagem e se apaixonara, veio para Salvador para morar com ele, mas era o famoso golpe das cartas de felicidade no amor. Ela morou por algum tempo com ele e quando estava bastante dependente levou-a para a casa onde as
Ao chegar a clínica anexa ao São Paulo, o horário de visitas começara quinze minutos antes, teve uma grata surpresa, pois no salão de visitas, já estavam sentados conversando Marciano, Queiroz e o ex-padre que já aceitara a alcunha de Quevedo. Seu amigo estava fumando, muito animado enquanto Edvaldo abraçava o Irmão Marciano que há muito tempo não via. Ouviu o cearense dizer, aparentemente, entre o delirante e o meio irônico “é um gênio, esse padre Quevedo é um gênio”, e Edvaldo quis dizer, que não o chamasse assim, e também, querendo ouvir o que o tal ex-padre estava resmungando baixinho. Foi surpreendido por Queiroz em uma de suas brincadeiras que julgava “desconcertantes”. O cearense dava um toque leve com a parte externa dos três dedos maiores na sua genitália acompanhado de um bordão “tá usando cueca caba?” Edvaldo respondeu com um muxoxo e com um “tá gaiato ele, hein?” como forma de reconhecimento de que saíra da crise. Queiroz voltou à conversa com o
Queiroz transmitia paz e, mesmo com suas pilhérias, muitos gostavam dele. Carnaval Moreira era um dos que gostava de estar na porta do bar por causa do cearense, gostasse de ouvir suas conversas e pilherias insistentes. Oliveira não via a presença de Carnaval com bons olhos, bons ouvidos e bom nariz; chamava Moreira de maconheiro e maluco desde o dia em que soube que ele espalhou em todo Santo Antônio que Oliveira visitava sua esposa três vezes à noite já com quase quarenta anos de casados. Edvaldo desconfiava que Moreira estava sentindo falta do cearense e queria ter certeza que podia contar com ele. Ele queria a presença de Moreira, menos por ele e por Queiroz e mais por Samara. Edvaldo queria que ela entendesse que não estavam desamparados, ela e o pai. Sentia-se confuso com as esquisitices dela, mas também devedor aos dois, pois eles chegaram num momento também de muita confusão na sua vida. Fugiu de uma confusão e foi buscar abrigo naquela família acreditando que poder
Por essa Edvaldo não esperava. Samara estava sentada no chão do corredor, ao lado da porta, à sua espera. Quando a viu, ainda das escadas perdeu o equilíbrio como se os degraus houvessem caído sob seus pés; segurou-se nas paredes. Ele que se acostumou a falar muito pouco com vizinhos observava o apartamento da vizinha que estava com a porta entreaberta. — O que você tá fazendo aqui? Eu não disse que é perigoso… descer essa ladeira essa hora… subir também é perigoso – disse em tom baixo quando percebeu alguém passando por trás da porta. Foi nesse momento que percebeu que ela trazia uma cabeça de frade na mão: — Olha, Edvaldo, que trouxe! Sua vizinha disse que isso é bom pra expulsar olho grande da casa da gente. Abriu a porta rápido e sem acender a lâmpada, colocou na estante, tateando um lugar para não cair o cacto. Disse baixo “vamos, vamos!” Ele de pé no primeiro degrau, descendo, disse em mais alto “vumbora” e fazia gestos vigorosos com u