A busca pela realidade

Clark Collins

Voltar ao trabalho é como acordar num mundo que não reconheço. As paredes da editora, que antes me pareciam acolhedoras, agora são frias e intimidantes. O som do telefone tocando, das impressoras funcionando, tudo é um ruído de fundo que me incomoda, mas que não consigo desligar. É como se eu estivesse presente, mas minha mente estivesse em outro lugar, presa entre a vida que eu imaginava e a vida que realmente existe.

Cada manhã, visto o terno e coloco a gravata como se estivesse me preparando para uma batalha invisível. Me olho no espelho e vejo o reflexo de um homem que não reconheço mais. Meus olhos estão mais fundos, o olhar mais vazio. Os três anos em coma me roubaram mais do que tempo; eles roubaram uma parte de quem eu era. Mas eu tento, tento me ajustar a essa nova realidade, mesmo que ela pareça uma peça que não encaixa.

Havia se passado um mês desde o meu retorno a editora Collins e minha mesa está cheia de papéis e manuscritos empilhados, mais do que consigo dar conta. O trabalho na editora sempre foi minha paixão, mas agora é apenas uma tentativa de distrair minha mente da confusão que sinto constantemente. Acordo todos os dias esperando que a memória da minha "família" desvaneça, mas ela só se torna mais vívida, como uma marca que se recusa a desaparecer.

Então, naquele dia comum que se transforma em algo extraordinário, Clara entra no meu escritório carregando um manuscrito. Ela está com um sorriso no rosto, parecendo animada, talvez um pouco demais para uma manhã tão normal.

— Senhor Collins, acho que encontrei algo que irá gostar — diz ela, estendendo-me o manuscrito como se fosse uma joia preciosa.

Eu pego o manuscrito sem muito interesse, pronto para adicionar à pilha de coisas que pretendo ver mais tarde. Mas então, algo me chama a atenção: o nome na capa. Victoria Hayes

Meu coração para. Minhas mãos começam a tremer, e o ar no escritório parece mais denso, difícil de respirar. A capa é simples, mas o nome é tudo menos isso. É o nome dela. A mulher que eu amei no coma. Minha esposa, ou pelo menos a mulher que eu acreditava ser minha esposa. Cada fibra do meu ser me diz que isso não pode ser uma coincidência.

— Clara! — a minha voz sai urgente, quase como um comando —Ligue para essa autora agora. Quero falar com ela imediatamente.

Clara me olha surpresa. Ela nunca me viu reagir assim a um manuscrito, sem sequer lê-lo. Eu sempre fui metódico, calmo, mas agora há uma urgência que não consigo conter. Ela faz que sim com a cabeça e sai rapidamente, deixando-me sozinho com minhas emoções desenfreadas.

Seguro o manuscrito com força, como se pudesse sentir algo além do papel. Meus olhos percorrem a capa, tentando encontrar alguma pista, qualquer coisa que confirme o que estou sentindo. Será que ela é real? Será que é possível? Mil pensamentos passam pela minha mente enquanto aguardo o retorno de Clara. A espera parece eterna, cada segundo se arrasta como se estivesse preso em areia movediça, devoro seu manuscrito como se eu buscasse mais uma lembrança da esposa dos meus sonhos.

Quando Clara volta, eu quase pulo da cadeira.

— Senhor Collins, falei com a senhorita Victoria . Ela está disponível e pode vir à editora hoje à tarde.

Meu coração b**e descontroladamente. Meus pensamentos estão uma confusão, entre o medo e a esperança. Tento manter a calma, mas as mãos suadas me traem. Eu mal consigo acreditar. Victoria Hayes. Ela realmente existe, e logo estará diante de mim. As horas passam arrastadas enquanto tento manter a cabeça ocupada, mas é impossível. Cada segundo é uma tortura, uma mistura de ansiedade e expectativa.

Quando finalmente chega a hora, estou na sala de reuniões, olhando para a porta como se ela fosse a entrada para um novo mundo. Estou tentando não criar expectativas, tentando não acreditar que tudo se encaixará de forma mágica, mas é difícil. Porque no fundo, eu preciso que ela seja real. Preciso que alguma coisa faça sentido.

Finalmente, a porta se abre e uma mulher entra. Ela é exatamente como eu lembrava: os cabelos, os olhos, a forma como ela segura a bolsa com um misto de nervosismo e confiança. Ela olha ao redor e nossos olhares se cruzam. Há um momento de reconhecimento, mas não é o tipo de reconhecimento que esperava. Ela parece surpresa, talvez até um pouco assustada, como se não esperasse me ver ali.

— Senhor Collins? — ela pergunta, a voz suave, mas carregada de incerteza.

Eu me levanto, ainda tentando encontrar palavras que façam sentido. Tudo parece surreal. Ela está na minha frente, e ao mesmo tempo, não é exatamente a mulher que eu conheci em meus sonhos.

— Victoria... — digo, e só o som do nome dela em meus lábios já faz meu coração acelerar. — Eu... preciso saber. Nos conhecemos?

Ela franze a testa, confusa, e balança a cabeça.

— Não, acho que não. Esse é nosso primeiro encontro — ela responde, sorrindo de leve, mas há algo nos olhos dela que me faz acreditar que talvez, em algum lugar além da lógica, ela também sinta essa conexão.

Convido ela a se sentar, e enquanto conversamos sobre o manuscrito, mal consigo prestar atenção nas palavras. Estou hipnotizado por cada gesto, cada expressão. Ela fala sobre sua história, e tudo o que eu consigo pensar é que, de alguma forma inexplicável, Deus trouxe Victoria para mim, em resposta as minhas orações.

Enquanto ela fala, eu me permito acreditar que talvez, apenas talvez, os sonhos tenham uma maneira estranha de se tornarem realidade, e que a linha entre o que é real e o que é imaginado pode ser mais tênue do que jamais imaginei.

Continua...

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >

Capítulos relacionados

Último capítulo