Estava na ultima série quando um miado esganiçado preencheu a academia da casa.
Ulisses soltou o peso, ofegante. Depois sorriu para a bolinha de pelos preta que andava até ele como se estivesse aprendendo a andar.
Ulisses deu risada.
— Veio aqui fazer o quê?
A gatinha miou em um berro agudo.
— Ok, já entendi. Está com fome? — perguntou se levantando do banco.
Fagulha deu meia volta e começou a correr de um jeito engraçado pela casa.
Ulisses foi atrás, passando uma toalha úmida pelo peitoral exposto para secar o suor. Em seguida a jogou sobre o ombro.
Costumava ir a academia com o amigo, mas Evan se mudou para Los Angeles. Fazia isso justamente porque lá, encontrava mulheres que pareciam gostar de vê-lo treinar e se derretiam com seu sorriso charmoso. Então sempre voltava bem acompanhando para casa.
Mas suas intenções agora são outras. Nada de sexo casual com belas mulheres. Terá que se contentar com a academia de sua casa e a companhia de Fagulha. Bem longe das interesseiras.
Ulisses conseguiu alcançar Fagulha rapidamente. A pegou no colo ignorando os miados irritados da bola de pelos. Sabia que ela fazia isso para que ele abastecesse a vasilha de ração.
Quando chegou na cozinha, deu de cara com a governanta bebendo café na ponta do longo balcão de mármore. Ela tinha a idade de Grace e sempre encarava Ulisses como se ele fosse um delicioso pedaço de mau caminho
Não que tentasse esconder.
Ou que ele ligasse.
— Olha esse tanquinho...
Ulisses cruzou a cozinha sorrindo.
— Já disse, Mary. Você não daria conta de tudo isso.
— Você subestima demais as mulheres de meia idade — Mary respondeu abandonando o café que tomava e indo até ele. — O que está procurando?
Ulisses olhou pelos cantos de sua enorme cozinha.
Mary apontou para baixo do balcão.
— Obrigada. Ela foi atrás de mim na academia... Ué, tem ração aqui.
Ele tinha se curvado para colocar Fagulha no chão.
Mary voltou a extremidade do balcão em que seu café estava e apoiou os cotovelos, assoprando sobre a xícara. Os olhos admirando as costas largas do St Jhon.
— Por que será que ela não come?
Ulisses se endireitou, com as mãos na cintura. Logo olhou Mary sobre o ombro.
Os olhos da governanta fixados em um ponto específico de seu corpo, abaixo da coluna e marcada pelo shortinho de academia. Que bundinha.
— Que parar de encara minha bunda e me responder?
— Não posso. Estou focada.
Ulisses se virou para ela, mas logo viu que não foi uma ideia inteligente.
Mary sorriu com a xícara contra a boca.
— Uh, bem melhor.
— Quer saber, você e Evan são dois casos perdidos.
Mary suspirou ao se lembrar também da bundinha de Evan. Depois andou até Ulisses com a xícara em mãos.
— Diga, meu bem. Estou ouvindo.
Ele apontou as duas mãos para a gatinha.
O miado de Fagulha era semelhante ao do patinho de borracha quando é pisado. Estridente e irritante.
— Gatos são assim. Troca a ração e você vai ver que ela vai comer.
— Está me dizendo que arrumei um bicho tão fresco quanto eu?
— Agora você vai ver pelo que eu passo — Mary sorriu e saiu andando para fora da cozinha.
Ulisses ainda gritou que não tem culpa de não gostar de batatas cozidas.
— Fresco!
Mary gritou de volta do corredor. Onde já se viu alguém não gostar de batatas? Ela não encontrava respostas para os gostos de Ulisses, a não ser que ele fosse um completo enjoado. E fresco.
Então ele trocou a ração de Fagulha. A gatinha se aproximou da vasilha na cor rosa e comeu normalmente a ração.
Ulisses a olhou indignado.
— Estou oficialmente chocado — disse a si mesmo.
Depois abriu o micro-ondas e lá estava seu prato de ovos mexidos. Mary sempre preparava, pois sabe que é o café da manhã que Ulisses toma depois que malha. Pegou café na cafeteira e se sentou para comer.
Na primeira garfada, se lembrou que deixou o celular na academia. Então se levantou e foi buscá-lo.
Ele voltou para a cozinha de cenho franzido, lendo a mensagem que chegara.
Brenda irá se casar. Sua melhor amiga, chata pra caramba e que poucos suportam encontrou alguém que a aturasse a ponto de pedi-la em casamento.
E ele ali, sozinho. Só com uma gatinha enjoada e raivosa.
— Será que eu vou me tornar um coroa solteiro e rodeado de gatos?
Nesse mesmo instante, Fagulha solta um miado como se dissesse pode apostar que sim, humano.
Ulisses então empurrou o prato para longe, pois perdera totalmente o apetite.
(...)
Era tarde. No relógio já marcava meia-noite e sete. As ruas do bairro silenciosas. A casa silenciosa. Exceto, pelos barulhos que Hazel fazia ao digitar rapidamente em seu notebook.
Os olhos cor-de-mel fixos na tela, se desviando apenas para conferir se havia acabado o café que fez há meia hora atrás. É, acabou de novo.
Ela se levantou do tapete da sala, dando a volta na mesinha de centro que usava como apoio para o notebook e andou até a cozinha — que dividia-se com a sala.
Esquentou a água no micro-ondas e virou um sache de café instantâneo, voltando para a sala mexendo com uma colher.
Ao se sentar de novo, viu que alguém tinha lhe mandado mensagem. Ulisses. E não era uma, mas várias mensagens dele, mandadas todas de já vez.
“Hazelzinha do meu coração, está aí?”
“Haze?”
“Me responde...”
(Gif do Mr. Bean deitado na grama)
Logo ela começou a digitar, mas foi interrompida com a ligação dele.
— Oi? — ela atendeu.
— Haze? Por que não fala comigo?
A voz de Ulisses estava enrolada.
Hazel uniu as sobrancelhas.
— Está bêbado?
— Nãaoo...
Claro que estava. Mas não era algo normal. Embora não seja incomum Ulisses estar com um copo de bebida na mão, ele é sempre bem controlado e não consome álcool como se fosse a solução para tudo. Esse não era o jeito dele.
Hazel se remexeu no lugar, engolindo a saliva seca.
— Aonde você está?
— Isso não importa. Te liguei porque estou entediado.
Hazel teve que revirar os olhos. Eu mereço.
— E ligou para mim porque está entediado?
— É... não tinha mais ninguém pra ligar e eu sabia que você estava acordada. E você não me respondeu. O que está fazendo?
Ela suspirou olhando para o notebook. O documento estava pela metade e chamando por ela...
— Nada de importante — respondeu.
— Aposto que está trabalhando.
— Sou mesmo tão previsível? — ela trocou o celular de ouvido e o segurou com o ombro.
Pode ouvir ele rir e pedir mais uma.
As sobrancelhas dela se uniram.
— Aonde está, Ulisses?
— Eu vim beber. Fiquei deprimido.
Fez-se um tempo de silêncio.
— Você deveria ir pra casa.
— Quer vir beber comigo? — perguntou sem vontade de voltar àquele casarão vazio. — Por minha conta.
— Não dá, olha a hora. Preciso terminar isso aqui. Mas me diga o que aconteceu.
Hazel levou a xícara de café até a boca e encolheu as pernas, encostada no sofá.
— Não quero falar da minha vida amorosa, Haze.
— Pensei que fôssemos amigos.
— E somos, mas sou bonito demais para despertar pena nas mulheres.
Hazel revirou os olhos resmungando. Vai começar.
Ulisses tinha uma autoestima tão elevada que dava nos nervos dela. Um ego enjoado e inflado.
— Minha nossa, o que rolou para o grande Ulisses St Jhon estar tão abalado assim? Está até sentindo pena de mesmo.
— Não é nada. Eu estou bem. Nos falamos depois, Haze.
E antes que Hazel pudesse mandá-lo para casa, Ulisses desligou e a deixou falando sozinha.
Ela encarou a tela do celular. Não sentia um bom pressentimento sobre o estado emocional de Ulisses.
Desde que o conheceu, nunca o viu assim, abalado a ponto de afogar as mágoas. Nem no baile em que levou um fora da rainha da escola ele ficara deprimido assim. Algo estava acontecendo.
Ela discou para ligar para ele novamente, mas caiu na caixa de mensagem. Aconteceu o mesmo com as próximas duas vezes.
Ele é grandinho, pode se cuidar. Deu de ombros e voltou ao trabalho.
O que poderia acontecer, afinal?
As manhãs na casa das Parker eram sempre barulhentas. Felícia ouvindo música alta no banheiro enquanto se arruma, Hazel andando pela casa reclamando que tudo por ali estava uma baderna e ao mesmo tempo, o vizinho de cima estreava a cama nova. Às sete horas da manhã! — Eu mereço ter que ouvir essa baixaria logo cedo. Felícia, saí do banheiro que eu quero usar!Hazel gritou enquanto guardava suas coisas na bolsa. Depois foi até a cozinha em busca de cafeína.Ela fez seu café e voltou até o banheiro, se irritando com a porta fechada.Se aproximou e bateu na porta com força.— Oh madame, não existe só você no mundo, sabia? — gritou para a irmã sair.Felícia então desligou a música e abriu a porta. Encarou Hazel com uma expressão esnobe.— Quer entrar para quê se você nem se arruma?Essa garota.— E por acaso não mijo também?— Credo, que linguajar — Felícia saiu do banheiro jogando seu cabelo curto e moderno.Se parecia bastante com Hazel, exceto pelos olhos. Os de Felícia eram escuros c
— Toc-toc — Hazel disse ao invés de bater. — Estou entrando.Ulisses virou o rosto para ela de dentro do banheiro. Estava fazendo a barba e pensando em todos os seus problemas, até ela entrar e deixá-lo inexplicavelmente deslumbrado.O cabelo de Hazel se sacudia para os lados, lindamente, enquanto andava em sua direção.Ele chegou a engolir em seco antes de desviar o olhar para o espelho. O que está havendo comigo? — Estão querendo um pronunciamento seu — ela disse parada na porta.Ulisses virou o rosto para ela com as sobrancelhas grossas unidas.— Quem quer este pronunciamento?— A mídia.A resposta de Ulisses foi um dar de ombros indiferente.Hazel deu um passo para dentro, ficando ao lado dele.— Eu sei que nenhum deles tem a ver com sua vida, mas a mentira de que você foi do A.A está se espalhando. Pessoas importantes estão lingando...— Acionistas?Ulisses lavou a navalha, a olhando de relance.— Sim. Alguns investidores não querem o envolvimento.— Bando de babacas. Deveriam s
*** Ulisses entrou com a moto no estacionamento da St Tec bufando feito um touro.Repórteres ainda preenchiam o local, mesmo que em menor número. Alguns deles que sabiam que o ceo ia trabalhar de moto — dado o fato da Ferraria estar amassada feito uma bola de papel em alguma oficina especializada da cidade — por isso, correram na direção de Ulisses assim que o ronco da moto ecoou por todo o ambiente.Vieram atrás dele feito formigas no açúcar.Ulisses tirou o capacete, bufando mais uma vez.— Senhor, nos dê um pronunciamento.— Já fazem três dias que o senhor está em silencio. Podemos confirmar que saiu do A.A há semanas atrás?— Senhor...?Flashes, vozes e microfones vieram de todos os lados.Ulisses colocou a mão em frente ao rosto, percebendo que entrava mais repórteres no estacionamento. Ignorou a todos e adentrou na empresa sem dizer nada.Seus passos firmes em direção ao elevador eram resultados da frustração que acabara de passar.Alcoólicos Anônimos? Ele?Ulisses apertou o
Hazel entrou sem bater no escritório de Ulisses, já no fim do expediente. Encontrou ele fazendo flexões. Sem camisa e com suor formado entre os músculos das costas.Ela desviou o olhar para a porta atrás de si e empurrou com o pé fazendo um baque ecoar.— Trouxe café — disse.Hazel andou até a mesa dele e deixou um copo de café, se encostando na mesma para beber seu prazer líquido.— Já estou acabando.Ela não falou mais nada. Apenas ficou ali vendo ele terminar a série de flexões e se jogar no chão de barriga para cima. Estava ofegante.— Pelo visto está chateado — Hazel falou se aproximando dele.Ulisses sempre se exercita fora de hora quando está irritado ou chateado com algo.Ela puxa uma cadeira e se senta ao lado do chefe largado no chão.— Um pouco.— Vim para fazermos uma declaração sua nas redes sociais. Você precisa dar um parecer.Ulisses a encarou serio e depois desviou o olhar. Não consigo olhar pra ela.— Não estou a fim de fazer isso — respondeu e começou a fazer abdom
A semana passou rápido demais, porém em nada Hazel poderia reclamar. Precisava de uma folga. De fazer nada . Procrastinar. Só comer e dormir.Não se lembrava da última vez que desacelerou seu ritmo.Los Angeles a aguardava dentro de alguns dias e por isso, vinha trabalhando dobrado para não deixar nada no trabalhar acumular. Então, naquela bela e ensolarada manhã de sábado, Hazel decidiu se cuidar como a muito tempo não fazia.Felícia estava dormindo na casa de uma amiga e passaria o fim de semana lá sem incomodar a irmã mais velha para absolutamente nada. Era o fim de semana ideal.Assim que acordou foi para o banho. Hidratou a pele e o cabelo, depilou as pernas e passou óleo de baunilha no corpo quando desligou o chuveiro.Saiu do banheiro enrolada na toalha. Renovada e com fome.- Aquela pirralha acabou com o cereal?Hazel bateu na porta do armário pegando uma maçã em cima da mesa.Estava seguindo para o quarto quando ouviu alguém bater na porta.Rapidamente ela andou em direção à
Ulisses fechou o livro em um suspiro. O teto alvo de seus olhos lhe pareceu bem interessante. — Eu posso estragar tudo...Era verdade.Em seguida ele se sentou na cama e encarou a capa do romance que estava lendo: Estupidamente apaixonado, de Lyssa Kay Adams. Uma história de amor entre amigos que o fez questionar a possibilidade de Hazel e ele se relacionarem. Logo ele negou com a cabeça, jogando o livro ao seu lado e deitando novamente. — Tentar algo irá estragar nossa amizade!E ele preferia viver sem um amor do que perder a companhia de Hazel. Sem ela, Ulisses não será feliz, então, se tentar algo ou chamá-la para sair em um encontro, como casal, significa perder a amizade dela, então não valerá a pena. Não!Ulisses levantou da cama rapidamente.— Não dá pra arriscar o que temos. Ficou de pé e andou até seu closet. Lá se despiu para tomar banho e seguiu para o banheiro luxuoso. Já deveria estar na empresa dado ao horário, mas mergulhou no romance entre amigos e viu tanta semel
Esperava o café ficar pronto em uma das mesas na cafeteria de Grace quando seu celular vibrou no bolso. Era Hazel. Algumas mulheres ainda mandavam mensagem para ele, até mesmo a que devorou seu bolo com folhas de ouro e tudo mais que estava em sua geladeira. Mas se recusava a responder cada uma delas.Principalmente agora. Estava com incertezas e sentimentos dentro de si que podia estragar uma relação importantes par ele. Sequer cogitava sair com algumas dessas interesseiras.Embora a falta de sexo o deixar maluco e sensível às vezes.Entrou na conversa de Hazel:“Virá na empresa hoje?”Ulisses ia responder, mas viu ela entrar na cafeteria. Chegou a s com a coincidência, mas não durou muito já que ela estava acompanhada por aquele tal de Marcolino. As sobrancelhas de Ulisses se uniram tanto que um vinco se formou. Por que estão juntos?— Ei — ele gritou, percebendo que fez isso alto demais. Ulisses atraiu não só a atenção de Hazel e Marcotário — como o chamou em seu pensamento —,
A semana se passou estranha para os amigos. Ulisses fazia tudo ficar estranho, graças aos seus sentimentos confusos e pela briga interna entre se arriscar ou manter a amizade. Obviamente que Hazel percebeu as diferentes atitudes do amigo. Ele estava indo mais vezes na sala de funcionários e pelo menos duas vezes naquela semana a levou para almoçarem juntos em um restaurante perto da St Tec. Estava oferecendo mais caronas do que costumava oferecer e sempre tratava Marcolino como se fosse o cara fosse um problema. Nada disso a incomodava. Comer de graça em restaurantes chiques e andar na garupa de uma moto que vale milhões não era o problema aqui. Ulisses estava mais grudento do que o normal! Um chiclete. Tanto, que queria ir buscar Hazel na casa dela no dia da viagem, sendo que em breve iriam se ver e ficar trancados no jatinho particular dele cinco horas seguidas. É muito Ulisses!Hazel riu de seus pensamentos ao chegar na pista de pouso. Pagou o taxista e percorreu toda a pista p