PESADELOS OU REALIDADE? - PARTE 2.

Sarati estava de boca aberta e lágrimas desceram dos olhos. Não percebeu que dera um grito, não de medo, mas de emoção, e que agora todos estavam ao seu lado. Os moradores da casa não sabiam dizer por quanto tempo a estrela ficou no mesmo local; ficaram temerosos quando chegaram bem perto de Sarati e fez com que a garota se arrepiasse e tremesse de medo, não pela estrela, mas por terem a tirado daquele momento.

Com um abraço, o pai a arrastou para dentro da casa.

— Venha, Sarati!

— Quero ver. É linda. Que estrela é essa? Parece que o planeta está girando. Tem cores. Por favor, eu quero ver.

— O que você vê, Sarati? — Perguntou a avó, com a voz assustada.

— Uma estrela maravilhosa. Ela vai trazer vida e transformar tudo ao nosso redor. Ouço uma voz, a estrela está me dizendo isso. Vocês estão vendo as camadas de dourado e violeta no centro dela?

— O que está dizendo, Sarati? Vamos entrar! — Ordenou o pai, que dessa vez a pegou no colo, com mais brusquidão, e a levou dali.

— Eu não quero ir. Solte-me.

 — O brilho já está sumindo. Venha agora. — Sarati tentava descer do colo do pai.

— Papai, eu escuto um chamado. Ela quer falar comigo.

— Entre Sarati! — Ordenou o pai — jogando a menina dentro do quarto, que caída no chão, chorou.

Ané não gostava quando a pequena narrava seus sonhos ou falava coisas estranhas. O que, na visão dele, não faziam nenhum sentido. Mas não era medo ou descrença na própria filha, e sim compaixão pelo que ela teria de enfrentar, e foi esse o motivo que o levou a tomar decisões das quais, mais tarde, se arrependeria.

Ali pegou um copo com água e foi ao quarto da filha. Ajoelhada no chão, apertou a mão de Sarati, que caminhou para a cama triste e se virou para o lado contrário ao da mãe. A menina ainda deu uma olhada para o céu, mas o brilho e a estrela desapareceram, e restara apenas escuridão. Manú também foi ao quarto, falou algo no ouvido de Ali e despediu-se. Deitada na cama, sem conseguir fechar os olhos, a pequena criança lembrava da luz, e pediu para a mãe ir embora.

— Vá embora, mamãe. Quero ficar sozinha.

— Você só tem oito anos, filha. Tente dormir, nem era para estar acordada a essa hora.

— Quero saber por que papai ficou tão nervoso, naquele momento, da estrela. Ele nunca foi bruto comigo daquele jeito. Eu só queria ficar e terminar de ver. Nunca vi algo daquela intensidade.

— Já tivemos emoções suficientes por hoje, minha filha.

— Um mundo novo vai nascer, mamãe. Vocês não acreditam em mim, mas é verdade. Eu ouvi uma voz que vinha do centro.

— Eu acredito em você em partes. Acredito na beleza daquela estrela, e que realmente nunca vimos nada parecido, mas não fique pensando nessa voz, que não existe. Tire isso de sua cabeça, por favor. E, além disso, filha, vou dizer uma coisa, e não me faça perguntas. Não fale do que viu, nem para os animais. Não sabemos o que pode acontecer se souberem que você viu a estrela.

— Por quê?

— Não tem um porquê. Apenas faça o que estou mandando e durma, por favor.

Ali se levantou, também com um semblante muito sério, deu um beijo na filha e, com o gesto, disse à Sarati, que a conversa estava encerrada. Partiu para o quarto, atrás do marido, que andava de um lado para o outro e o abraçou.

— Ali, o que aconteceu? Que estrela é essa que surgiu? Não me venha dizer, que é a da profecia. Jamais deixarei minha filha correr perigo, nas mãos do Comandante Geral.

— Não sei, Ané. Acho que devemos nos acalmar. A descrição que Sarati fez é bem fiel, a estrela que existia, no obelisco da praça central, ainda mais quando ela brilhava.

— Então ela pode ser a tal criança.

— Pode.

— E se essa luz tiver sido vista na Cidade Central, e soldados vierem.

— Ela irá negar, jamais deixaremos que ela fale com qualquer pessoa sobre a estrela que viu.

— Sarati, só tem oito anos.

— Eu sei, meu marido, e nós vamos protegê-la. Em casa sempre negaremos qualquer assunto relacionado a uma estrela e não a deixaremos mais falar sobre o assunto. Agora, vamos nos acalmar e tentar dormir.

— Sarati, dormiu?

— Estava com o rosto virado para a janela. Vou ao quarto, de novo, verificar. Agora deite-se, se não ela poderá conforme nossas reações desconfiar.

A zelosa mãe voltou ao quarto da filha e viu que ela dormia. Apesar da advertência ao marido, ela mesma, ficou insegura e não conseguiu dormir bem aquela noite.

Após aquele evento, a vida na pequena propriedade continuou normal, mas se percebia uma apreensão no ar da casa. Ali, Ané e Manú estavam preocupados o tempo todo, e os pesadelos agora eram recorrentes. Todos os dias, a casa acordava com gritos, e Sarati era sufocada pelo medo. O temor ficou maior quando, mais ou menos, um mês depois, eles foram surpreendidos por soldados armados invadindo sua residência no meio da madrugada.

Dois homens entraram aos gritos, com espadas em riste, e os tiraram da cama. Antes, porém, deu tempo de o pai de Sarati pegá-la no colo e falar ao seu ouvido: — Não fale nada sobre a estrela, por favor, Sarati. Sua vida depende disso.

— Onde está a criança que viu uma estrela brilhar no céu?

— Temos dois filhos, soldados, e não sabemos de quem os senhores estão falando. — Respondeu Ali, olhando com um olhar terno, um brilho dourado nos olhos e uma luz que emanava de seu corpo.

O soldado, que estava com uma capa azul, virou o rosto na direção de Sarati. Parecendo encantado com sua pureza de criança, seu rosto angelical e a energia magnetizadora que exalava de sua pele, chegou perto dela.

— Qual o seu nome, menina?

— Sarati, senhor!

— Foi você quem viu uma estrela que brilhou no céu?

— Não, senhor!

— Mas me disseram que é nessa casa que mora uma menina que adora ver as estrelas.

— Eu gosto, senhor, mas aqui nunca brilhou nenhuma estrela.

— Julião, o nosso Comandante Maior mandou que ficássemos apenas nas cercanias da Cidade Murada. Essa menina não viu nada, olhe para ela! Uma criança comum, sem brilho, rosto angelical. E, além disso, estamos bem longe da cidade.

— Não querem uma cumbuca de água e pão para a viagem? Eu pego para vocês. — Perguntou Ali, com a generosidade que lhe era peculiar.

Os soldados relaxaram a tensão e ficaram vermelhos de vergonha diante da bondade oferecida, mesmo ante suas desconfianças. Sem se importar com atitude descortês, a dona da casa foi até a cozinha e voltou com água e os mantimentos, para que eles fizessem o caminho de volta.

— Quantos anos vocês têm, soldados? — Perguntou o pai, sorrindo com uma luz diferente em seu corpo.

— 18 anos.

— Tão novos e já servindo ao Comandante Maior! Deve ser uma honra!

— Sim, senhor.

— Vão em paz. — Desejou-lhes Ali.

Enquanto eles saíam pela porta da frente, Julião virou-se e voltou seu olhar para Sarati. Com um sorriso, despediu-se da menina e disse que um dia se veriam de novo. Na cabeça do soldado passavam algo muito ruim. Aquela imagem ficou na mente da pequenina por dias, mas, graças ao senhor do tempo e à arte de ser criança, foi fácil esquecer. Na verdade, ela nunca acreditou que ele voltaria a cruzar seu caminho. Sarati jamais imaginou que realmente um dia o encontraria novamente. 

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Julião e o outro soldado saíram da casa e alguns metros depois, se sentaram para se alimentaram, debaixo de uma árvore isolada, ainda perto da casa de Sarati. O soldado estava com visão ao longe, relembrando o dia que em que viu, uma luz, ainda que pequena, brilhar diferente no céu.

— Pensativo, Julião.

— Algo me diz que aquela criança está mentindo.

— Porque o Comandante nos designou para essa missão, Julião, sendo que dizem que essa profecia não passa de uma lenda?

— O Comandante não sabe, mas eu também vi, naquele dia, uma movimentação diferente no céu. Como a Cidade Murada é mais próximo, de onde supostamente se viu um raio de luz diferente, fomos convocados, para encontrar uma criança.

— Eu não sabia que o nosso soberano viu essa luz.

— Alid, nosso chefe na Cidade Murada, disse que ele acordou sobressaltado, com um feixe de luz, que iluminou, por um breve instante, o quarto. Com medo, de que possa ser, de verdade, a profecia, pediu para que soldados partissem, no caminho da luz, para procurar qualquer criança que a tenha visto.

— Você ficou intrigado com aquela menina da casa?

— Ela está mentindo. E se não descobri agora, vou dar um jeito mais tarde.

— E como fará isso.

— Nem que eu tenha que me casar com ela. Essa estrela não pode voltar, ela já causou desgraças demais em minha família.

— Como assim, soldado.

— Nada que o interessa, soldado. Vamos terminar esse almoço e seguir viagem. Só tem mais um, pequeno vilarejo, o qual temos que olhar.

No vilarejo, passaram de casa em casa, mas nada encontraram. A maioria, não tinha crianças, apenas jovens, já em idade de trabalhar. A profecia, que Julião conhecia, era clara, crianças veriam a estrela. Foram embora, e na Cidade Murada relataram a Alid, que não sabia como daria a notícia ao Comandante Maior, sem sofrer as devidas consequências.

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