A PROFECIA? - PARTE 1

Em outras paragens, bem mais longe, a caverna, que se transformará em uma verdadeira cidade, estava no fim do seu dia de expediente normal de trabalho e outras atividades. Os trabalhos se revezavam entre os plantios, as colheitas e a extração de areia para feitura de obras artesanais, que eram vendidas em algumas festas, sendo a principal a de Laidé — essas eram as únicas aglomerações em que vários amigos se reencontravam, e podiam relembrar um pouco do que fora um dia, Jetiah.

A caverna era distribuída em cômodos, salas, mas existia um refeitório onde todos comiam juntos. Era a maneira de se confraternizarem, depois de um dia de trabalho. A minicidade foi construída após a grande fuga da Cidade Central, e Padiah, o guardião da estrela, o qual foi o seu administrador e idealizador. Era um homem de meia-idade, aparentava uns 50 anos, cabelos castanhos, olhos verdes, estatura mediana. Gostava de andar sempre com um cajado na mão e, ainda que ninguém visse, nunca deixava seu colar de guardião guardado, carregava junto ao corpo, mesmo sabendo que a estrela já não brilhava mais.

Padiah era casado com Magdali, também guardiã, sua companheira no amor e na guerra. Era uma linda mulher, cabelos longos, loiros bem claros, sobrancelhas compridas e olhos azuis com pupilas esverdeadas. O casal tinha um único filho, Alair, naquela época, com 13 anos. Alair era um adolescente com cara de jovem, robusto, alto e musculoso, consequência do trabalho braçal. Ajudava na colheita e em qualquer outra função em que fosse solicitado, mas aquele rapazote tinha uma característica marcante: adorava ver as estrelas, assim como Sarati.

A família de Padiah sempre se sentava à mesa central e, com ela, os amigos mais próximos, Lucadelli e Jonas, ex-soldados dos últimos monarcas, que um dia governaram Jetiah. A conversa fluía solta, diálogos informais, e a alegria de saber que a festa de Laidé estava próxima e que, mais uma vez, parte do povo do planeta poderiam se reencontrar. Somente uma pessoa estava destoante naquela mesa, Alair, que se encontrava inquieto, mexendo a comida de um lado para o outro, e o mais impressionante, sem dar palpites nas conversas dos dois soldados.

— Alair, está tudo bem com você? — Perguntou Lucadelli, batendo na mão do rapaz e caçoando dele. — Está apaixonado por alguém? Parece que está no mundo da lua.

— Está tudo bem. Só não quero comer, nem estou com muita fome hoje.

— Esse menino está doente, Padiah. Ele come mais do que Lucadelli e Jonas juntos! Meu filho, o que está acontecendo? — Falou Magdali, brincando, mas com a preocupação atenta de toda mãe — Você falar que não está com fome é algo muito preocupante para uma mãe.

— Nada, mãe, quer dizer, não sei. Estou inquieto, tive alguns sonhos estranhos essa noite. Posso ir lá para a pedra? Hoje está um ótimo dia para ver as estrelas.

— Cara, você realmente não está bem hoje! — exclamou Lucadelli. — Não tem nenhuma estrela no céu, e parece que o mundo acabou de escurecer de vez. Acabei de fazer a ronda externa e está tudo negro, sem vida, sem nada.

— Mas terá. Posso ir?

Magdali fixou seu olhar em Alair e sentiu a presença da estrela, mas, em um primeiro momento, não acreditou em tal possibilidade e só conseguiu dizer: — Sim, meu filho, pode ir, mas não se esqueça de voltar. Quando você se senta naquela pedra, parece se esquecer do mundo aqui dentro.

— Não vou me esquecer. Quando ver a primeira estrela da noite, volto para dentro.

Alair saiu sem ao menos ter tocado na comida. Ele foi para a parte dos fundos da caverna. Nesse instante, o coração de Padiah começou a bater em disparada quando escutou a fala do filho e sentiu a mesma coisa que a mulher.

— Padiah, será que chegou a hora?

— Não sei, mas está muito forte, muito forte. Ainda mais quando Alair disse que voltará quando ver a primeira estrela da noite.

— Do que vocês estão falando? — Perguntou Lucadelli.

— Não sabemos ainda, Lucadelli, mas, se acontecer o que desconfiamos, contamos para vocês.

— A profecia?

— Não sabemos, mas o coração está acelerado e tem uma força pulsando em mim e Padiah. — Explicou Magdali.

— Vamos, Magdali.

O casal saiu para o quarto, enquanto Alair chegava na parte de fora da caverna. Logo que saiu para o ar da noite, Alair viu que Lucadelli tinha razão, pois não havia estrela alguma no céu. Se não fosse por algumas tochas que eram colocadas para iluminação, estaria tudo escuro e perigoso, os animais noturnos não poderiam ser vistos e eram perigosos. Ele continuou inquieto e sentou-se na rocha lateral à direita, como quase todas as noites. Essa pedra, que parecia uma escultura de barro feita pela natureza, Alair sempre a usava para admirar as estrelas ou, naquele dia, apenas descansar e tirar a sua agonia.

O jovem deitou-se com os braços atrás da cabeça e ficou olhando para a imensidão do universo. Era tudo tão vasto, tão misterioso, mas tão belo. Naquele momento, parecia ainda mais, pois, sem explicação, nenhuma estrela ocupava o céu daquela noite. Ele estava limpo, sem poeira, e não havia tido nenhuma tempestade de areia ou chuva iminente. Alair sorriu com a beleza e a sensação era de realização, por estar ali, naquele dia.

No interior da caverna, Magdali pediu licença e foi para o quarto, seguida por Padiah. Há tempos, eles não usavam seus objetos estelares. Apesar de acreditarem na profecia, não viam necessidade de se expor a qualquer soldado do Comandante. Padiah, ainda guardava, junto a si, escondido em sua túnica, mas não a esposa. Magdali abriu a terceira gaveta da cômoda, retirou uma caixa de madeira, gravada em sua tampa com a estrela de sete pontas. Com a chave dada por Padiah, que sempre a escondia no bolso de sua túnica, ela a abriu e retirou uma sacola violeta, que já emanava uma luminosidade sutil.

— Padiah, veja. É fraca, mas o objeto está emitindo uma luz, ainda que sem vida e disforme, mas uma luminosidade.

— Será que chegou a hora do retorno, Magdali.

— E será que nosso filho é o escolhido?

— Acredito que sim, mas quem será a outra criança?

— Não pensemos nisso agora, vamos até Alair. Ele precisará de nós.

Com a emoção à flor da pele, a guardiã abriu a sacola. De lá retirou o colar e a pulseira estelares, que brilharam um pouco mais intensamente quando foram para as mãos de seus donos, respectivamente, o colar para Padiah e a pulseira para Magdali, não contendo a emoção, Magdali chorou.

— Magdali, precisamos ir atrás de Alair.

— Está acontecendo! Com o crescimento da luz, se confirma, Padiah. Nosso filho é o menino da profecia. Eu tinha sonhos premonitórios, mas não acreditava. Padiah, o que nos aguarda? O que será de nosso rapazinho?

— Não vamos pensar nisso agora. Ele precisa de nós. Venha!

Quando saiam do quarto, eles sentiram o chão tremer e correram para a pedra, não sem antes voltar a usar seus objetos sagrados.

Enquanto os pais corriam ao encontro do filho. Alair observava o céu, e ainda estava envolto em pensamentos que percorriam as mais longas terras quando sentiu um tremor. Esse começou devagar, mas foi aumentando de intensidade. No céu fez-se um clarão, que até hoje nunca se soube como não o cegou. Era muito forte e foi descendo, bem rápido e em poucos segundo chegou bem perto dos olhos do rapaz. A bola de fogo central, formou sete pontas douradas, mescladas com violeta, e a partir daí, o jovem começou a escutar uma voz distante, que a cada segundo ficava mais alta.

— Alair…

— Estou louco, ouvindo vozes.

— Não, jovem rapaz. Encontrei sua outra metade. Vocês terão uma bela e difícil missão para cumprir.

— Quem é você? De onde vem essa voz?

A luz e a voz foram aumentando de intensidade e se transformando em uma estrela de sete pontas, ainda maior. Nela havia: no centro, uma esfera com uma luz violeta forte, agora ainda mais visível; nas extremidades era dourado intenso, ainda maias brilhoso e radiante. A estrela foi chegando e fez Alair descer da pedra e correr, mas foi surpreendido pelo som da voz que o chamava, de novo: — Não tenha medo, Alair, você é o escolhido. Hoje a estrela concede a você e à sua companheira a missão de trazer Jetiah de volta. Antes, porém, você terá de encontrá-la, ela está distante de você.

— Quem é você? Que missão, sou apenas um jovem de treze anos.

— Sou o caminho de luz que deverá conduzir Jetiah para o seu renascimento. Sou a ESTRELA DE THUMAN.

— Mas você é apenas uma lenda, uma história que a gente escuta todos os dias, mas ninguém acredita.

— Seu pai e sua mãe poderão guiá-lo. Você terá um longo caminho e uma dolorosa missão, mas tenho certeza de que conseguirá transpor todas as barreiras.

— Você já disso isso, mas é difícil acreditar.

— Creia e viva essa missão.

— O que terei que fazer?

— Por enquanto, peça a seu pai que forje uma pulseira e um colar. Esses dois artefatos, que são os objetos estelares, serão feitos do pedaço da estrela que ele ainda tem, e que pertencerão a você e à sua companheira.

— Que companheira? Não entendo. Quem...

Alair ia fazer mais uma pergunta, mas foi interrompido.

— Não há mais tempo para perguntas, não posso deixar que vocês sejam descobertos. No momento certo, estarei com vocês.

O clarão se desfez de forma abrupta, e Alair caiu de costas no chão pela força energética que foi liberada. Padiah e Magdali, que apenas viram um lampejo do que aconteceu, aproximaram-se e acolheram seu filho, que estava bastante assustado.

— Alair, você está bem? — Perguntou a mãe, tentando emanar o mínimo de preocupação possível.

— Vocês viram o que vi? Eu estou ficando louco! Avistei uma estrela, e além de vê-la brilhar, falou comigo. Ela pediu para você, papai, forjar uma pulseira e um colar. O que significa tudo isso?

Padiah fez um sinal para Magdali, que mostrou os dois objetos para o filho.

— Chegou a hora, meu filho. Existe uma profecia, e você é o escolhido da estrela. Eu e sua mãe contaremos tudo o que sabemos, para que você possa se preparar para quando chegar a hora e o momento certo.

— E eu terei, agora — expressou Padiah — que fazer uma força tarefa, para tentar encontrar a outra criança, sua companheira, que deve, junto com você, realizar essa profecia.

— Que companheira. Só tenho treze anos…

Alair não conseguiu falar mais nada, estava com dores por todo o corpo e começou a tremer de frio pelo impacto da revelação.

— Venha, filho. Você precisa se deitar, foi um impacto muito grande.

No quarto, a mãe passou a noite toda, colocando bandagens de água morna, para aplacar a febre que dominou o corpo do filho. Era a força da estrela. Alair ficou assim, por três dias, até que o organismo recuperou o vigor e ele acordou com a mãe ao lado, lendo um livro.

— Mamãe

— Oi, filho. Está melhor?

— Sim, mas o que aconteceu naquela noite. Estou cansado, com dores pelo corpo.

— Foi a energia da Estrela, filho. Eu e sei pai iremos explicar tudo, mas com calma.

No decorrer dos dias, Padiah e Magdali revelaram apenas o teor da profecia, já que o restante ficaria para quando encontrassem a outra criança, escolhida da estrela. Então assim se completaria o ciclo dos objetos com a entrega da pulseira para a companheira de Alair. A espada, objeto de proteção, e a sua importância também foram deixadas para serem reveladas tempos depois. Alair ainda tinha de aprender a sobreviver aos homens do Comandante Maior e à sua fúria. Era preciso aprender a arte da luta. Um dia, em luta com Lucadelli, percebeu que o pai vinha com outras duas espadas diferentes da que ele usava, na mão.

— Mais espadas, pai? Lucadelli já está me dando uma surra!

— Essas são as espadas forjadas com a luz da estrela. Não explicarei como, ainda. Só preciso que você, com sua energia, descubra qual é a sua. E quando encontrar sua companheira, faça com ela, o mesmo exercício, a espada dela a encontrará.

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