MINHA PRECIOSA
MINHA PRECIOSA
Por: Liliene Mira
UM

Salvador, Bahia!

BEATRIZ

É noite e o vento forte balançava meus cabelos para todos os lados deixando os meus cachos embaraçados, o suor colava a minha calça, jeans clara e minha blusa, polo ao meu corpo me deixando desconfortável.

Caminhei a passos largos pelas ruas do comércio, estava tudo tão silencioso. Alguns carros passavam e meu corpo gelou de medo.

O que estou fazendo? Porque eu não dou meia volta?

— Porque preciso! —Tento me convencer pela milésima vez.

A vida é uma sucessão de escolhas e eu sinto, sinto em meu íntimo que vou me arrepender dessa minha escolha.

Ou talvez seja só o medo falando.

— Mas agora é tarde! Não dá para retroceder.

Se dependesse apenas de mim eu estaria em meu quarto, estudando as matérias atrasadas da faculdade. Pensei, sentindo a tristeza nublar meus pensamentos mais uma vez, mas tão rapidamente surgiu, me obriguei a ignorá-la.

Contudo, eu não posso! Não tenho dinheiro para pagar minha faculdade, não tenho dinheiro nem para pegar um ônibus para chegar ao meu destino, piorou os materiais que preciso, fora as xerox e impressões.

Eu poderia continuar me lamuriando, porque tudo está dando errado em minha vida, mas cansei.

Cansei de verdade! Aspirei o ar me sentindo emocionalmente cansada.

Outro carro passa ao meu lado e buzina. Meu coração volta a bater rápido. Respiro fundo e olho as horas em meu relógio de pulso. 00:00h. Já faz uma hora e meia que estou andando sem parar, me sinto uma maluca.

Uma maluca cansada.

Viro a esquina na rua Portugal, passando ao lado da empresa Contax, e paro em frente a Ladeira da Montanha.

Eu deveria dar a volta… Mas nesse caso demorarei mais ainda e meus pés não estão aguentando mais.

Encarei a ladeira mais uma vez e sinto dúvida, mas ela logo se desfaz e me vejo dando mais um passo ao desconhecido.

Diferente das ruas, a ladeira parecia estar em festa. Havia uma prostituta por toda a ladeira, elas falavam alto, riam, acenavam para os carros que passavam, alguns paravam, outros buzinavam e seguiam seu caminho.

— Ei coisa linda, quer se juntar a nós? — Ouço uma delas me perguntar, mas desconsiderei completamente.

Sou louca, só pode ser isso.

Ando o mais rápido que posso, até sair da ladeira da montanha, no topo virei à esquerda, na rua Carlos Gomes. Fui andando até chegar na rua Dois de julho, desci o contorno chegando enfim ao meu destino.

O mau cheiro da rua se misturava ao meu medo, eu não sabia o que era pior. Era um fedor de fezes, maconha, sujeira, tudo junto.

Meu coração batia forte como nunca, a sensação que eu tinha era que ele ia sair a qualquer momento pela minha boca.

Você não pode fazer isso, vai contra todos os teus princípios! Minha consciência me acusou outra vez.

— O que farei? — Sussurrei. — É isso ou morrer de fome. Não é como se eu fosse me prostituir. — Tornei a sussurrar, mas a dúvida, a sensação de está fazendo algo errado me corroía por dentro.

Meu irmãozinho depende de mim, não temos mais ninguém, o que posso fazer?

Chego em frente a um grande portão preto que descascava, talvez devido ao tempo. Meus olhos se focaram no enorme letreiro acima do portão, escrito “CASA SENSAÇÃO”, em vermelho e azul com letras de imprensa, ao lado um desenho de peitos brilhava em neon vermelho.

Cafonas! Pensei reprimindo um impróprio.

Faço a volta para chegar na entrada de serviços como Lourdes havia me explicado. Um dos seguranças me viu e levantou, eles me olhavam como um pedaço de carne e isso fez eriçar todo o meu “coro cabeludo”. Uma sensação péssima.

Lourdes disse que eles estão me esperando, então não tenho porque me preocupar. Procurei me convencer.

— O que faz aqui negona, se perdeu? — O segurança perguntou parando em minha frente, enquanto o outro me observava sentado em uma cadeira giratória, na cor preta.

— Boa noite! — Os cumprimentei séria. — Senhor, tenho uma diária para fazer.

— Tem certeza? — Questionou-me confuso. — Qual o seu nome?

— Absoluta! Chamo-me Ana Beatriz.

— Bom, Ana Beatriz, não somos nós que cuidamos de contratar as putas daqui

Eu deveria me sentir ofendida pelas palavras dele, mas tudo que eu conseguia era me sentir envergonhada.

Lembrei de minha mãe falando: — “Bea, quem se mistura com porcos, farelo come.”

Ela acreditava que se a pessoa tem uma má companhia, acaba realizando as mesmas coisas ruins também.

Porque ela não conheceu a fundo a história de Lourdes. Volto a cogitar.

Eu não o culpo por pensar que sou uma prostituta, se alguém passasse agora e me visse nesse lugar pensaria o mesmo.

— Não, estou aqui para diária como camareira, vim por indicação da Lourdes. — Respondi com um sorriso sem graça.

— A puta aposentada? — O outro perguntou saindo de seu lugar. — Cara, essa mulher é famosa aqui. — Continua a dizer com um largo sorriso. — Como ela está?

— Bem!

— Terminou a faculdade? Lembro que ela estava estudando… — Ele parou de andar fazendo uma expressão estranha, como se estivesse tentando lembrar de algo e empertigou-se, fechando o primeiro botão de seu blazer.

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