Salvador, Bahia!
BEATRIZ É noite e o vento forte balançava meus cabelos para todos os lados deixando os meus cachos embaraçados, o suor colava a minha calça, jeans clara e minha blusa, polo ao meu corpo me deixando desconfortável. Caminhei a passos largos pelas ruas do comércio, estava tudo tão silencioso. Alguns carros passavam e meu corpo gelou de medo. O que estou fazendo? Porque eu não dou meia volta? — Porque preciso! —Tento me convencer pela milésima vez. A vida é uma sucessão de escolhas e eu sinto, sinto em meu íntimo que vou me arrepender dessa minha escolha. Ou talvez seja só o medo falando. — Mas agora é tarde! Não dá para retroceder. Se dependesse apenas de mim eu estaria em meu quarto, estudando as matérias atrasadas da faculdade. Pensei, sentindo a tristeza nublar meus pensamentos mais uma vez, mas tão rapidamente surgiu, me obriguei a ignorá-la. Contudo, eu não posso! Não tenho dinheiro para pagar minha faculdade, não tenho dinheiro nem para pegar um ônibus para chegar ao meu destino, piorou os materiais que preciso, fora as xerox e impressões. Eu poderia continuar me lamuriando, porque tudo está dando errado em minha vida, mas cansei. Cansei de verdade! Aspirei o ar me sentindo emocionalmente cansada. Outro carro passa ao meu lado e buzina. Meu coração volta a bater rápido. Respiro fundo e olho as horas em meu relógio de pulso. 00:00h. Já faz uma hora e meia que estou andando sem parar, me sinto uma maluca. Uma maluca cansada. Viro a esquina na rua Portugal, passando ao lado da empresa Contax, e paro em frente a Ladeira da Montanha. Eu deveria dar a volta… Mas nesse caso demorarei mais ainda e meus pés não estão aguentando mais. Encarei a ladeira mais uma vez e sinto dúvida, mas ela logo se desfaz e me vejo dando mais um passo ao desconhecido. Diferente das ruas, a ladeira parecia estar em festa. Havia uma prostituta por toda a ladeira, elas falavam alto, riam, acenavam para os carros que passavam, alguns paravam, outros buzinavam e seguiam seu caminho. — Ei coisa linda, quer se juntar a nós? — Ouço uma delas me perguntar, mas desconsiderei completamente. Sou louca, só pode ser isso. Ando o mais rápido que posso, até sair da ladeira da montanha, no topo virei à esquerda, na rua Carlos Gomes. Fui andando até chegar na rua Dois de julho, desci o contorno chegando enfim ao meu destino. O mau cheiro da rua se misturava ao meu medo, eu não sabia o que era pior. Era um fedor de fezes, maconha, sujeira, tudo junto. Meu coração batia forte como nunca, a sensação que eu tinha era que ele ia sair a qualquer momento pela minha boca. Você não pode fazer isso, vai contra todos os teus princípios! Minha consciência me acusou outra vez. — O que farei? — Sussurrei. — É isso ou morrer de fome. Não é como se eu fosse me prostituir. — Tornei a sussurrar, mas a dúvida, a sensação de está fazendo algo errado me corroía por dentro. Meu irmãozinho depende de mim, não temos mais ninguém, o que posso fazer? Chego em frente a um grande portão preto que descascava, talvez devido ao tempo. Meus olhos se focaram no enorme letreiro acima do portão, escrito “CASA SENSAÇÃO”, em vermelho e azul com letras de imprensa, ao lado um desenho de peitos brilhava em neon vermelho. Cafonas! Pensei reprimindo um impróprio. Faço a volta para chegar na entrada de serviços como Lourdes havia me explicado. Um dos seguranças me viu e levantou, eles me olhavam como um pedaço de carne e isso fez eriçar todo o meu “coro cabeludo”. Uma sensação péssima. Lourdes disse que eles estão me esperando, então não tenho porque me preocupar. Procurei me convencer. — O que faz aqui negona, se perdeu? — O segurança perguntou parando em minha frente, enquanto o outro me observava sentado em uma cadeira giratória, na cor preta. — Boa noite! — Os cumprimentei séria. — Senhor, tenho uma diária para fazer. — Tem certeza? — Questionou-me confuso. — Qual o seu nome? — Absoluta! Chamo-me Ana Beatriz. — Bom, Ana Beatriz, não somos nós que cuidamos de contratar as putas daqui Eu deveria me sentir ofendida pelas palavras dele, mas tudo que eu conseguia era me sentir envergonhada. Lembrei de minha mãe falando: — “Bea, quem se mistura com porcos, farelo come.” Ela acreditava que se a pessoa tem uma má companhia, acaba realizando as mesmas coisas ruins também. Porque ela não conheceu a fundo a história de Lourdes. Volto a cogitar. Eu não o culpo por pensar que sou uma prostituta, se alguém passasse agora e me visse nesse lugar pensaria o mesmo. — Não, estou aqui para diária como camareira, vim por indicação da Lourdes. — Respondi com um sorriso sem graça. — A puta aposentada? — O outro perguntou saindo de seu lugar. — Cara, essa mulher é famosa aqui. — Continua a dizer com um largo sorriso. — Como ela está? — Bem! — Terminou a faculdade? Lembro que ela estava estudando… — Ele parou de andar fazendo uma expressão estranha, como se estivesse tentando lembrar de algo e empertigou-se, fechando o primeiro botão de seu blazer.Os seguranças à minha frente usavam a típica farda social, calça, blazer, sapatos, gravatas na cor preta e camisa social branca. Pareciam seguros e altivos. Estava claro estarem acostumados com as mulheres que vem aqui em busca de trabalho. — Ciências Sociais? — Perguntei-lhe. — Isso! — Falta pouco para ela terminar, senhor! Hum! Os senhores podem ver se está tudo certo?— Ah, sim! O pedido de Lourdes é uma ordem para mim. — O entusiasta disse caminhando novamente até a sua mesa, abre um caderno, olha por um instante e depois volta a olhar para mim. — Aqui! Ana Beatriz, uma diária como camareira, oito horas de relógio.— Sim!— Ligarei para, Cláudia, ela que resolve essas coisas.Enquanto ele ligava para senhora Cláudia, o rapaz que me atendeu não tirava os olhos de mim, eu não sabia para onde olhar.— Você daria uma bela de uma puta. — Ele diz como se estivesse me elogiando. Fingir que não ouvir. Troglodita.Meu coração voltou a bater forte e eu fiquei com raiva de mim por se
Demorou um pouco até eu encontrar a sala que o segurança havia falado. Virei à esquerda, logo encontrei o corredor largo que ele disse, seguir reto, mas o corredor parecia que não tinha fim.— Puta que pariu. — Esbravejei baixo parando por alguns segundos. Minhas pernas queimavam de um jeito absurdo. — Como trabalharei às 08h00 de relógio assim?Trabalhando. Penso.—Você não tem escolha, Ana Beatriz! Você não tem escolha. — Murmurei. Mesmo não querendo, o ressentimento estava lá em minha voz.Eu não me arrependo de ter deixado meus planos ou a mim mesmo de lado pelo meu irmão, Levi. Longe disso, ele não tem culpa. Mas, não consigo deixar de ficar triste por tudo que estamos vivendo.Respiro profundamente com um pesar no peito e volto a caminhar, sentindo como se estivesse levando o mundo nas costas.Após andar por quase cinco minutos, cheguei em frente a duas salas. Isso ele não me contou. Olhei para a sala da esquerda e estava escrito novamente em letras de imprensa “COORDENAÇÃO”,
— Entre! — Ela avisou com um sorriso na voz. Provavelmente rindo de mim por dentro. A porta se abriu e ela olhou em direção à mesma. — Diga Carla. — Olho em direção a porta. A mulher por nome Carla parecia estar cansada e assustada. Ela aparentava ser um pouco mais velha que a senhora Cláudia, seu cabelo loiro estava cortado em chanel, ela não parecia se importar com roupas, usava calças, jeans surrada e uma blusa de malha na cor preta, com alças tão finas que poderiam se partir a qualquer momento, e um decote tão aberto que deixavam metade de seus seios amostra.Encarei a tal da Carla por alguns segundos, a cumprimentei com um sorriso e voltei a olhar para frente. Constrangida, foquei os meus olhos em dona Cláudia outra vez.— Senhora, ele chegou e quer falar com a senhora. — Ao ouvir as palavras o sorriso da senhora Cláudia morreu na hora.Uma coisa que sou boa é ler as expressões das pessoas, seja lá quem for esse cara a deixou bastante aborrecida.— Agora? — Sim! Com urgência.
— Porque não tinha essa opção de curso quando concorri a bolsa pelo Sisu.E como uma pessoa que nem tem condições em comprar roupas decentes fará moda? Questionei-me em pensamento.Quero ser uma “design”, ditar a moda, criar roupas que todos queiram usar, mas parece um sonho tão grande para mim.Sim, eu poderia começar costurando, colocando meus desenhos em prática, mas tecido está caro, eu não tenho condições e Mainha nunca tinha o suficiente, então deixei esse sonho de lado.— Ah! Você fez pelo Enem. — Sim, não tenho condições de pagar uma faculdade. — Digo com pesar.— Entendo! — Ela fica em silêncio e eu me sinto no dever de quebrar o silêncio constrangedor que se formou entre nós.— Eu e Lourdes fazemos... Quero dizer, fazíamos a aula de saúde pública juntas, no início eu e ela nos sentíamos deslocadas, ela por ser a mais velha e eu por ser a única negra cotista na sala. Nós meio que criamos uma proximidade e ficamos amigas. Ela só me contou ser uma… — Calo-me sem saber como con
— E como faço quando os clientes tentarem algo comigo? — Perguntei não escondendo o meu medo.— Eles são avisados para não tocar nas domésticas daqui.— E eles o fazem?— Às vezes eles tentam algo, mas se acontecer você chuta as bolas dele e me avisa para eu tomar providências. — Certo, farei isso!— Olhe, às duas suítes serão ocupadas hoje, mas os cavaleiros vão demorar um pouco, estão em uma reunião muito importante. Um deles é muito exigente, gosta de tudo certo, então você limpa o quarto dele primeiro.— Certo! Hum! Aqui também é hotel?— Mais ou menos, a maioria dos clientes vem, faz a putaria e vai embora, mas os senhores, os clientes em questão, às vezes gostam de marcar suas reuniões de negócio aqui, então quando isso acontece, ele pede o local só para ele e seus acompanhantes. Ele sempre paga muito bem, muito bem mesmo.— Ele deve ser bem rico. — Comentei acompanhando ela que saia pela porta que entramos a pouco. O cara deve ser um velho gordo e asqueroso. Penso não freando
Aprendi a cozinhar, nunca fui bom nisso, mas não morro de fome. Aprendi a lavar a minha roupa, arrumar e limpar o quarto, os banheiros, trabalhei na criação dos animais, aprendi jardinagem, praticava esportes radicais, aquático, tinha bastante tempo livre para ler, praticar esgrima, judô, canoagem, música, entre outras coisas.Tudo bem que eu preferia os meus pais por perto, mas muito do que sou hoje foi definido e aprendido no internato. Se algum dia eu tiver um filho e meu filho quiser ir, não pensaria 2 vezes. Seria os R$100,000 mais bem pago, pois sei que valeria a pena. Nos meus 19 anos eu já fazia faculdade, meus pais deixaram tudo para mim, toda a sua fortuna, talvez por isso meu tio me odiou tanto a ponto de me mandar para longe, mas hoje ele sabe que me fez um grande favor. Ele já é falecido, nunca me pediu perdão e nem eu esperava isso da parte dele. Eu não o odeio, talvez quando criança, mas hoje, não mais. Eu nem precisaria trabalhar. Meus pais tinham uma empresa que
— Edward, você sabe que não foi culpa da garota. — Você ia gostar que alguém abocanhasse o seu pênis sem querer? — O questionei zangado. — Cardoso é o nosso melhor cliente aqui em Salvador, quase teve um infarto ontem. — Ele me encarou sério, mas não demorou muito para que ele caísse na gargalhada, eu tentei não rir, mas acabei rindo também. Olho para frente e vejo meu motorista, Paulo, rindo, mesmo não entendendo nenhuma palavra nossa, ele sabia o motivo de nossa risada, pois esse assunto é a pauta de nossas conversas desde ontem à noite. — Achou Graça, Paulo? — Imagine se fosse o seu pênis sendo mordido. — Comentei. — Deus me livre, senhor! — Riu de sua voz apavorada. Olho para o Felipe e ele nos olhava não entendo nada. Felipe às vezes tem dificuldade em aprender algumas palavras do português, e neste momento não entendeu nada que Paulo havia falado. Revirei os olhos e entortei a boca. — Cara, você precisa estudar mais o português. — Digo voltando a falar em inglês. — Como
— Como assim? — A conheci 3 meses atrás no aeroporto, quando voltava para New York. — No aeroporto daqui ou lá? — Daqui! Ela é brasileira, estava indo morar em New York, notei seu pavor e puxei conversa. — E você está namorando ela? — Não, ainda não, mas vou oficializar isso quando voltar, mas ela sabe que tenho interesse nela. — Engraçado... — O que tem graça? — Você parece apaixonado por uma mulher que conheceu a pouco e fode com várias mulheres. Que amor. — E quem disse que estou fodendo com várias mulheres? — Você faz questão de vim para cá. —Digo o óbvio. — Não consigo mais, não me sinto mais atraído, a menina que me acompanha, a Talita, ela só faz me ensinar o português, ou tentar. — Fico surpreso com suas palavras. — E você está 90 dias sem sexo? — Ele afirmou. — Eu não consigo, sinceramente falando, eu não consigo. — Porque você não encontrou a pessoa certa, cara. — Hum! — Respondo-lhe não acreditando em suas palavras. Eu já amei, ele sabe disso, então não tem p