— Entre! — Ela avisou com um sorriso na voz. Provavelmente rindo de mim por dentro. A porta se abriu e ela olhou em direção à mesma. — Diga Carla. — Olho em direção a porta. A mulher por nome Carla parecia estar cansada e assustada.
Ela aparentava ser um pouco mais velha que a senhora Cláudia, seu cabelo loiro estava cortado em chanel, ela não parecia se importar com roupas, usava calças, jeans surrada e uma blusa de malha na cor preta, com alças tão finas que poderiam se partir a qualquer momento, e um decote tão aberto que deixavam metade de seus seios amostra. Encarei a tal da Carla por alguns segundos, a cumprimentei com um sorriso e voltei a olhar para frente. Constrangida, foquei os meus olhos em dona Cláudia outra vez. — Senhora, ele chegou e quer falar com a senhora. — Ao ouvir as palavras o sorriso da senhora Cláudia morreu na hora. Uma coisa que sou boa é ler as expressões das pessoas, seja lá quem for esse cara a deixou bastante aborrecida. — Agora? — Sim! Com urgência. — Ok, já estou indo. — A senhora Cláudia balançou a cabeça em negativo e se levantou visivelmente irritada. — Beatriz, me aguarde uns instantes que já volto. — Sim, senhora! — Senhora? Melhore, viu? — Volta a rir e sai da sala ainda com o semblante aborrecido. Assim que ela saiu com a moça chamada Carla, voltei a respirar aliviada. Minha mãe nunca que me deixaria trabalhar aqui, nunca. Suponho que por isso a voz em minha cabeça tema em dizer ser errado. Agora, se essa voz colocasse comida na mesa para me alimentar e alimentar meu irmão, eu já teria escutado ela. O tempo foi passando lentamente e nada da senhora Cláudia voltar. Tirei meu celular da bolsa e olhei as horas. Já era um pouco mais de uma da manhã. Será que ela não vai me deixar trabalhar hoje? — Meu Deus! Como voltarei para casa? Andando eu não terei condições. — Gemi angustiada com meus pensamentos negativos. — Me perdoe pela demora Beatriz, voltei. — Dona Cláudia surge vindo de trás da estante de livro que só agora notei ser uma porta falsa. Quase pulo da cadeira pelo susto. — Misericórdia dona Cláudia, quase morri do coração. — Ô querida, desculpe, não foi a minha intenção te assustar. Só quis usar um atalho, não imaginei que te assustaria. Vim da cozinha e quando venho de lá para minha sala, uso esse atalho. As palavras dela pareciam uma desculpa de última hora e me fez cogitar se a saída dela não foi uma estratégia para ela me testar, talvez julgando que eu fosse roubá-la. Atrás da mesa dela tem um vidro enorme. Pode ser um espelho falso, em minha faculdade tem, então não duvido nada que aqui também possa ter. Minha mente fica cheia de ideias. Ignorando os meus pensamentos, limpei a minha garganta, esperei dona Cláudia se acomodar em seu assento, só então voltei a falar. — A senhora está bem? Parece nervosa. — Estou sim, não se preocupe. — Senho… Dona Cláudia? — Sim? — Desculpa a pergunta, mas quero muito saber se a senhora irá querer os meus serviços hoje? — Por quê? Não poderá ficar? — Pelo contrário, preciso e muito dessa diária. — Quero sim! — Ela volta a sorrir. — Contudo, antes quero conhecê-la. Já sei que você é virgem, quero saber o resto. — Sorriu envergonhada não sabendo onde enfiar a cara. — O que a senhora quer saber? — A questiono limpando a garganta outra vez. — Tudo! — Ergo as minhas sobrancelhas. Nunca vi isso, estou fazendo uma entrevista em uma casa de prostituição e ainda tenho que contar a minha vida toda… Aff! — A senhora precisará perguntar, não tenho muito o que contar. — Aviso. Sou péssima quando se trata de falar sobre mim. — Comece me contando a sua idade e como conheceu a Lourdes. — Ah! Sim… Bem, tenho vinte e quatro anos… — Novinha ainda. — Ela diz recostando em sua cadeira me encarando pensativa. Ignorando a vontade de desviar os olhos, voltei a falar. — Eu e a Lourdes fazemos aula na mesma faculdade, na UFBA. Ela Ciências Sociais e eu fisioterapia. — Entortei a boca escondendo a minha contrariedade. — Não gosta do que faz? — Como assim? — Não quer ser fisioterapeuta? — Para dizer a verdade, eu quero mesmo é estudar moda, quem sabe um dia focar na moda plus size. Observo o empenho da indústria têxtil diante a inclusão de pessoas gordas na moda, contudo, há um longo caminho a ser trilhado. Espero um dia trilhá-lo. — Por que não faz? Sério que ela me fez essa pergunta? Não é óbvio? — Porque não tinha essa opção de curso quando concorri a bolsa pelo Sisu.— Porque não tinha essa opção de curso quando concorri a bolsa pelo Sisu.E como uma pessoa que nem tem condições em comprar roupas decentes fará moda? Questionei-me em pensamento.Quero ser uma “design”, ditar a moda, criar roupas que todos queiram usar, mas parece um sonho tão grande para mim.Sim, eu poderia começar costurando, colocando meus desenhos em prática, mas tecido está caro, eu não tenho condições e Mainha nunca tinha o suficiente, então deixei esse sonho de lado.— Ah! Você fez pelo Enem. — Sim, não tenho condições de pagar uma faculdade. — Digo com pesar.— Entendo! — Ela fica em silêncio e eu me sinto no dever de quebrar o silêncio constrangedor que se formou entre nós.— Eu e Lourdes fazemos... Quero dizer, fazíamos a aula de saúde pública juntas, no início eu e ela nos sentíamos deslocadas, ela por ser a mais velha e eu por ser a única negra cotista na sala. Nós meio que criamos uma proximidade e ficamos amigas. Ela só me contou ser uma… — Calo-me sem saber como con
— E como faço quando os clientes tentarem algo comigo? — Perguntei não escondendo o meu medo.— Eles são avisados para não tocar nas domésticas daqui.— E eles o fazem?— Às vezes eles tentam algo, mas se acontecer você chuta as bolas dele e me avisa para eu tomar providências. — Certo, farei isso!— Olhe, às duas suítes serão ocupadas hoje, mas os cavaleiros vão demorar um pouco, estão em uma reunião muito importante. Um deles é muito exigente, gosta de tudo certo, então você limpa o quarto dele primeiro.— Certo! Hum! Aqui também é hotel?— Mais ou menos, a maioria dos clientes vem, faz a putaria e vai embora, mas os senhores, os clientes em questão, às vezes gostam de marcar suas reuniões de negócio aqui, então quando isso acontece, ele pede o local só para ele e seus acompanhantes. Ele sempre paga muito bem, muito bem mesmo.— Ele deve ser bem rico. — Comentei acompanhando ela que saia pela porta que entramos a pouco. O cara deve ser um velho gordo e asqueroso. Penso não freando
Aprendi a cozinhar, nunca fui bom nisso, mas não morro de fome. Aprendi a lavar a minha roupa, arrumar e limpar o quarto, os banheiros, trabalhei na criação dos animais, aprendi jardinagem, praticava esportes radicais, aquático, tinha bastante tempo livre para ler, praticar esgrima, judô, canoagem, música, entre outras coisas.Tudo bem que eu preferia os meus pais por perto, mas muito do que sou hoje foi definido e aprendido no internato. Se algum dia eu tiver um filho e meu filho quiser ir, não pensaria 2 vezes. Seria os R$100,000 mais bem pago, pois sei que valeria a pena. Nos meus 19 anos eu já fazia faculdade, meus pais deixaram tudo para mim, toda a sua fortuna, talvez por isso meu tio me odiou tanto a ponto de me mandar para longe, mas hoje ele sabe que me fez um grande favor. Ele já é falecido, nunca me pediu perdão e nem eu esperava isso da parte dele. Eu não o odeio, talvez quando criança, mas hoje, não mais. Eu nem precisaria trabalhar. Meus pais tinham uma empresa que
— Edward, você sabe que não foi culpa da garota. — Você ia gostar que alguém abocanhasse o seu pênis sem querer? — O questionei zangado. — Cardoso é o nosso melhor cliente aqui em Salvador, quase teve um infarto ontem. — Ele me encarou sério, mas não demorou muito para que ele caísse na gargalhada, eu tentei não rir, mas acabei rindo também. Olho para frente e vejo meu motorista, Paulo, rindo, mesmo não entendendo nenhuma palavra nossa, ele sabia o motivo de nossa risada, pois esse assunto é a pauta de nossas conversas desde ontem à noite. — Achou Graça, Paulo? — Imagine se fosse o seu pênis sendo mordido. — Comentei. — Deus me livre, senhor! — Riu de sua voz apavorada. Olho para o Felipe e ele nos olhava não entendo nada. Felipe às vezes tem dificuldade em aprender algumas palavras do português, e neste momento não entendeu nada que Paulo havia falado. Revirei os olhos e entortei a boca. — Cara, você precisa estudar mais o português. — Digo voltando a falar em inglês. — Como
— Como assim? — A conheci 3 meses atrás no aeroporto, quando voltava para New York. — No aeroporto daqui ou lá? — Daqui! Ela é brasileira, estava indo morar em New York, notei seu pavor e puxei conversa. — E você está namorando ela? — Não, ainda não, mas vou oficializar isso quando voltar, mas ela sabe que tenho interesse nela. — Engraçado... — O que tem graça? — Você parece apaixonado por uma mulher que conheceu a pouco e fode com várias mulheres. Que amor. — E quem disse que estou fodendo com várias mulheres? — Você faz questão de vim para cá. —Digo o óbvio. — Não consigo mais, não me sinto mais atraído, a menina que me acompanha, a Talita, ela só faz me ensinar o português, ou tentar. — Fico surpreso com suas palavras. — E você está 90 dias sem sexo? — Ele afirmou. — Eu não consigo, sinceramente falando, eu não consigo. — Porque você não encontrou a pessoa certa, cara. — Hum! — Respondo-lhe não acreditando em suas palavras. Eu já amei, ele sabe disso, então não tem p
BEATRIZ Sorrir agradecida assim que coloquei o refil com cheiro de lavanda no aromatizador do banheiro e apertei. O cheiro de lavanda tomou todo o ambiente fazendo o meu sorriso se alargar. Eu já havia limpado a suíte que o tal ricaço usaria fazia um tempo. Eu não o vi, nem a ele e nem ao rapaz que ocuparia o quarto que acabei de limpar. Se mainha me visse agora ficaria orgulhosa de mim. Peguei tudo que ela me ensinou sobre como ser uma boa camareira e apliquei nos quartos. E olhe que os quartos estavam sujos demais, a única coisa limpa eram os lençóis das grandes camas queen, mas até eles foram preciso trocar, devido à poeira que tomou todos os móveis. O quarto parecia um quarto de hotel convencional. Hotéis de rico, mas é convencional. A única diferença é que os quartos daqui não tem guarda-roupa, só uma cômoda. E que cômoda! Assim como os móveis da outra suíte, esses também são pretos, mas as cômodas diferiam em tamanhos. A do primeiro quarto que limpei a cômoda pare
Através do espelho vejo a mulher que se veste do meu corpo, que faz os mesmo gestos com as mãos, como se fosse eu. Às vezes sinto que a miserável acena para mim, me provoca e eu não posso fazer nada, porque mesmo não querendo, a mulher fraca, triste e feia que me encara, sou eu mesmo. As portas do elevador se abrem no térreo e eu volto a minha pose contínua de que tudo está bem e se não estivesse, um dia ficará. Vou em direção a área, chegando lá deixo o carrinho de materiais de limpeza, me troco no vestiário que fica entre a área de serviço e o banheiro para funcionários. No vestiário tem uns cinco armários dispostos próximo aos boxes de banho, dois boxes, na verdade. Vou ao armário que guardei as minhas coisas, tiro meu celular e a chave do armário de dentro do bolso de meu avental e abro o mesmo. Guardo meu celular dentro de minha bolsa, tiracolo e pego as minhas roupas. Tomo banho rapidamente, me arrumo e logo estou no encalço de dona Cláudia. Ela disse que eu estaria li
Salvador, Bahia!BEATRIZÉ noite e o vento forte balançava meus cabelos para todos os lados deixando os meus cachos embaraçados, o suor colava a minha calça, jeans clara e minha blusa, polo ao meu corpo me deixando desconfortável. Caminhei a passos largos pelas ruas do comércio, estava tudo tão silencioso. Alguns carros passavam e meu corpo gelou de medo. O que estou fazendo? Porque eu não dou meia volta? — Porque preciso! —Tento me convencer pela milésima vez. A vida é uma sucessão de escolhas e eu sinto, sinto em meu íntimo que vou me arrepender dessa minha escolha. Ou talvez seja só o medo falando. — Mas agora é tarde! Não dá para retroceder. Se dependesse apenas de mim eu estaria em meu quarto, estudando as matérias atrasadas da faculdade. Pensei, sentindo a tristeza nublar meus pensamentos mais uma vez, mas tão rapidamente surgiu, me obriguei a ignorá-la. Contudo, eu não posso! Não tenho dinheiro para pagar minha faculdade, não tenho dinheiro nem para pegar um ônibus