— Porque não tinha essa opção de curso quando concorri a bolsa pelo Sisu.
E como uma pessoa que nem tem condições em comprar roupas decentes fará moda? Questionei-me em pensamento. Quero ser uma “design”, ditar a moda, criar roupas que todos queiram usar, mas parece um sonho tão grande para mim. Sim, eu poderia começar costurando, colocando meus desenhos em prática, mas tecido está caro, eu não tenho condições e Mainha nunca tinha o suficiente, então deixei esse sonho de lado. — Ah! Você fez pelo Enem. — Sim, não tenho condições de pagar uma faculdade. — Digo com pesar. — Entendo! — Ela fica em silêncio e eu me sinto no dever de quebrar o silêncio constrangedor que se formou entre nós. — Eu e Lourdes fazemos... Quero dizer, fazíamos a aula de saúde pública juntas, no início eu e ela nos sentíamos deslocadas, ela por ser a mais velha e eu por ser a única negra cotista na sala. Nós meio que criamos uma proximidade e ficamos amigas. Ela só me contou ser uma… — Calo-me sem saber como continuar. — Uma puta aposentada? Não tenha vergonha de falar Beatriz, a Lourdes não tem. — Sei disso, ela sempre falava abertamente, mas confesso que no início pensei que fosse brincadeira dela. — Rir ao lembrar de minha cara quando ela afirmou ser verdade. — Eu nem acreditei de início. — Confessei ainda sorrindo. — Imagino. — Ela rir também. — Mas, me diga, você realiza as diárias aqui, não vão te atrapalhar nos estudos? — Não, eu tranquei, estou no último ano, talvez consiga terminar ano que vem. — Eu nem acreditava em minhas palavras, sinto que nunca mais estudarei. — Mas porque isso menina? — Perdi a minha mãe a seis meses, ela tinha câncer, fiquei com a guarda de meu irmão, ele só tem nove anos, meu pai também é falecido, então fiquei com a responsabilidade de cuidar dele e da casa. O serviço está difícil, não sei mais o que fazer, então falei com a Lourdes e pedir ajuda. — Você queria trabalhar como puta? — Afirmei com a cabeça, sentindo-me sem graça e ela me olhou surpresa. — Mas a Lourdes disse que antes eu poderia tentar outra coisa, talvez limpeza, ou camareira. Admito que fiquei bastante aliviada. Eu sempre fui uma menina centrada nos estudos, nunca fui de me importar com sexo, minha mãe dizia: Bea, só abra as pernas para um homem que te faça se arrepiar da cabeça aos pés, se te fazer arrepiar, pode te fazer gozar. Nunca encontrei essa pessoa, então não liguei muito. E ainda não ligo. Porém, isso não digo em voz alta, ela não precisa saber que tenho uma baixa auto estima que só fez piorar no decorrer dos anos, às vezes eu me sinto uma mulher assexuada, não sinto atração por ninguém, nem mesmo me tocando sinto algo. Só pode ter algo errado em mim, só pode! Mas, dona Cláudia não precisa saber disso também. — Você cogitou em se entregar por dinheiro? — A voz dela me traz de volta a realidade. — Isso vai contra tudo que a minha mãe me ensinou, mas pelo meu irmão, eu faria, ele é mais importante que qualquer coisa. — Você é tão novinha, querida, deveria estar estudando, curtindo, transando muito por aí. — Eu não sou assim dona Cláudia, sou careta demais, não sei flertar. Acredito que me perdi no tempo, perdi meu tempo de juventude. — Credo, garota, você fala como se fosse uma velha. — Riu sabendo que ela está certa. — Agora sou mãe dona Cláudia, irmã e mãe. — Isso não quer dizer que você tem que se descuidar. Acredite, você ainda pode fazer a faculdade que quer, conhecer alguém e ainda cuidar de seu irmão, positividade sempre. — Diz levantando as duas mãos para o céu e rindo. Diferente de mim, ela age mais como jovem do que eu. — Ultimamente não tenho sido muito positiva, a realidade me pegou em cheio. — Otimismo é tudo! Agora chega desse negativismo, ficarei de olho em meus contatos, se eu souber de algum emprego te digo. — A senhora faria isso? — Perguntei com um largo sorriso surpresa por suas palavras. Sorrir com alívio pela primeira vez após meses. — Claro, gostei muito de você! Agora venha, ela se levanta e eu a imito. — Vou te mostrar o lugar. — Afirmei. — Hoje quero que você apenas limpe às duas suítes principais.— E como faço quando os clientes tentarem algo comigo? — Perguntei não escondendo o meu medo.— Eles são avisados para não tocar nas domésticas daqui.— E eles o fazem?— Às vezes eles tentam algo, mas se acontecer você chuta as bolas dele e me avisa para eu tomar providências. — Certo, farei isso!— Olhe, às duas suítes serão ocupadas hoje, mas os cavaleiros vão demorar um pouco, estão em uma reunião muito importante. Um deles é muito exigente, gosta de tudo certo, então você limpa o quarto dele primeiro.— Certo! Hum! Aqui também é hotel?— Mais ou menos, a maioria dos clientes vem, faz a putaria e vai embora, mas os senhores, os clientes em questão, às vezes gostam de marcar suas reuniões de negócio aqui, então quando isso acontece, ele pede o local só para ele e seus acompanhantes. Ele sempre paga muito bem, muito bem mesmo.— Ele deve ser bem rico. — Comentei acompanhando ela que saia pela porta que entramos a pouco. O cara deve ser um velho gordo e asqueroso. Penso não freando
Aprendi a cozinhar, nunca fui bom nisso, mas não morro de fome. Aprendi a lavar a minha roupa, arrumar e limpar o quarto, os banheiros, trabalhei na criação dos animais, aprendi jardinagem, praticava esportes radicais, aquático, tinha bastante tempo livre para ler, praticar esgrima, judô, canoagem, música, entre outras coisas.Tudo bem que eu preferia os meus pais por perto, mas muito do que sou hoje foi definido e aprendido no internato. Se algum dia eu tiver um filho e meu filho quiser ir, não pensaria 2 vezes. Seria os R$100,000 mais bem pago, pois sei que valeria a pena. Nos meus 19 anos eu já fazia faculdade, meus pais deixaram tudo para mim, toda a sua fortuna, talvez por isso meu tio me odiou tanto a ponto de me mandar para longe, mas hoje ele sabe que me fez um grande favor. Ele já é falecido, nunca me pediu perdão e nem eu esperava isso da parte dele. Eu não o odeio, talvez quando criança, mas hoje, não mais. Eu nem precisaria trabalhar. Meus pais tinham uma empresa que
— Edward, você sabe que não foi culpa da garota. — Você ia gostar que alguém abocanhasse o seu pênis sem querer? — O questionei zangado. — Cardoso é o nosso melhor cliente aqui em Salvador, quase teve um infarto ontem. — Ele me encarou sério, mas não demorou muito para que ele caísse na gargalhada, eu tentei não rir, mas acabei rindo também. Olho para frente e vejo meu motorista, Paulo, rindo, mesmo não entendendo nenhuma palavra nossa, ele sabia o motivo de nossa risada, pois esse assunto é a pauta de nossas conversas desde ontem à noite. — Achou Graça, Paulo? — Imagine se fosse o seu pênis sendo mordido. — Comentei. — Deus me livre, senhor! — Riu de sua voz apavorada. Olho para o Felipe e ele nos olhava não entendo nada. Felipe às vezes tem dificuldade em aprender algumas palavras do português, e neste momento não entendeu nada que Paulo havia falado. Revirei os olhos e entortei a boca. — Cara, você precisa estudar mais o português. — Digo voltando a falar em inglês. — Como
— Como assim? — A conheci 3 meses atrás no aeroporto, quando voltava para New York. — No aeroporto daqui ou lá? — Daqui! Ela é brasileira, estava indo morar em New York, notei seu pavor e puxei conversa. — E você está namorando ela? — Não, ainda não, mas vou oficializar isso quando voltar, mas ela sabe que tenho interesse nela. — Engraçado... — O que tem graça? — Você parece apaixonado por uma mulher que conheceu a pouco e fode com várias mulheres. Que amor. — E quem disse que estou fodendo com várias mulheres? — Você faz questão de vim para cá. —Digo o óbvio. — Não consigo mais, não me sinto mais atraído, a menina que me acompanha, a Talita, ela só faz me ensinar o português, ou tentar. — Fico surpreso com suas palavras. — E você está 90 dias sem sexo? — Ele afirmou. — Eu não consigo, sinceramente falando, eu não consigo. — Porque você não encontrou a pessoa certa, cara. — Hum! — Respondo-lhe não acreditando em suas palavras. Eu já amei, ele sabe disso, então não tem p
BEATRIZ Sorrir agradecida assim que coloquei o refil com cheiro de lavanda no aromatizador do banheiro e apertei. O cheiro de lavanda tomou todo o ambiente fazendo o meu sorriso se alargar. Eu já havia limpado a suíte que o tal ricaço usaria fazia um tempo. Eu não o vi, nem a ele e nem ao rapaz que ocuparia o quarto que acabei de limpar. Se mainha me visse agora ficaria orgulhosa de mim. Peguei tudo que ela me ensinou sobre como ser uma boa camareira e apliquei nos quartos. E olhe que os quartos estavam sujos demais, a única coisa limpa eram os lençóis das grandes camas queen, mas até eles foram preciso trocar, devido à poeira que tomou todos os móveis. O quarto parecia um quarto de hotel convencional. Hotéis de rico, mas é convencional. A única diferença é que os quartos daqui não tem guarda-roupa, só uma cômoda. E que cômoda! Assim como os móveis da outra suíte, esses também são pretos, mas as cômodas diferiam em tamanhos. A do primeiro quarto que limpei a cômoda pare
Através do espelho vejo a mulher que se veste do meu corpo, que faz os mesmo gestos com as mãos, como se fosse eu. Às vezes sinto que a miserável acena para mim, me provoca e eu não posso fazer nada, porque mesmo não querendo, a mulher fraca, triste e feia que me encara, sou eu mesmo. As portas do elevador se abrem no térreo e eu volto a minha pose contínua de que tudo está bem e se não estivesse, um dia ficará. Vou em direção a área, chegando lá deixo o carrinho de materiais de limpeza, me troco no vestiário que fica entre a área de serviço e o banheiro para funcionários. No vestiário tem uns cinco armários dispostos próximo aos boxes de banho, dois boxes, na verdade. Vou ao armário que guardei as minhas coisas, tiro meu celular e a chave do armário de dentro do bolso de meu avental e abro o mesmo. Guardo meu celular dentro de minha bolsa, tiracolo e pego as minhas roupas. Tomo banho rapidamente, me arrumo e logo estou no encalço de dona Cláudia. Ela disse que eu estaria li
Salvador, Bahia!BEATRIZÉ noite e o vento forte balançava meus cabelos para todos os lados deixando os meus cachos embaraçados, o suor colava a minha calça, jeans clara e minha blusa, polo ao meu corpo me deixando desconfortável. Caminhei a passos largos pelas ruas do comércio, estava tudo tão silencioso. Alguns carros passavam e meu corpo gelou de medo. O que estou fazendo? Porque eu não dou meia volta? — Porque preciso! —Tento me convencer pela milésima vez. A vida é uma sucessão de escolhas e eu sinto, sinto em meu íntimo que vou me arrepender dessa minha escolha. Ou talvez seja só o medo falando. — Mas agora é tarde! Não dá para retroceder. Se dependesse apenas de mim eu estaria em meu quarto, estudando as matérias atrasadas da faculdade. Pensei, sentindo a tristeza nublar meus pensamentos mais uma vez, mas tão rapidamente surgiu, me obriguei a ignorá-la. Contudo, eu não posso! Não tenho dinheiro para pagar minha faculdade, não tenho dinheiro nem para pegar um ônibus
Os seguranças à minha frente usavam a típica farda social, calça, blazer, sapatos, gravatas na cor preta e camisa social branca. Pareciam seguros e altivos. Estava claro estarem acostumados com as mulheres que vem aqui em busca de trabalho. — Ciências Sociais? — Perguntei-lhe. — Isso! — Falta pouco para ela terminar, senhor! Hum! Os senhores podem ver se está tudo certo?— Ah, sim! O pedido de Lourdes é uma ordem para mim. — O entusiasta disse caminhando novamente até a sua mesa, abre um caderno, olha por um instante e depois volta a olhar para mim. — Aqui! Ana Beatriz, uma diária como camareira, oito horas de relógio.— Sim!— Ligarei para, Cláudia, ela que resolve essas coisas.Enquanto ele ligava para senhora Cláudia, o rapaz que me atendeu não tirava os olhos de mim, eu não sabia para onde olhar.— Você daria uma bela de uma puta. — Ele diz como se estivesse me elogiando. Fingir que não ouvir. Troglodita.Meu coração voltou a bater forte e eu fiquei com raiva de mim por se