Havia andado o dia todo sem encontrar o riacho, minha boca estava seca e meu corpo desejando um gole que fosse de água, até do vinho da boate eu sentia falta agora, mas só do vinho.
Agora a noite se aproximava e a idéia de fazer uma fogueira me parecia tão insensata, se aquele homem havia entrado aqui sem medo então deveria ter outros e eu precisava ser o mais discreta possivel, afinal pensando agora para onde eu iria?Se fosse na delegacia eles arrumariam um jeito de me pegar de volta ou me matar, e minha casa?Estariam me esperando agora lá sem dúvida.Será que meus pais ainda viviam perto da tribo Kai? Ou minha finalmente convenceu meu pai a se mudar para a cidade?Será que eles acham que morri? De certa forma eu morri.Estava sentada pensando nessas coisas quando notei uma figura saindo das sombras, uma muito alta.Me levantei do chão de sobressalto segurando uma pedra pronta para jogar quando um rosto familiar foi iluminado pela lua.Era o mesmo homem com seu olhos castanhos avermelhados de mais cedo, agora ele se aproximava cuidadosamente carregando um prato enrolado em um pano, junto ao prato uma garrafa de água que me lembrou o quanto eu estava com sede.
- Não vim fazer mal, não se preocupe.- revelou deixando o prato aos meus pés, recuei diante dele e ele se afastou mas ainda se manteve na minha linha de visão.
- Pode comer, está ótimo, beba a água também.- garantiu e fez gestos para que eu comesse, ainda acreditava que eu não falava seu idioma.
Olhei para o prato e pensei que beber e comer parecia um sonho.Mas não conhecia esse homem, não sabia o que tinha nessa água ou comida, ainda não confiava nele nem entendia para quem ele trabalhava.
- Deve estar achando que eu envenenei a comida.- refletiu ele e se aproximou do prato, abriu o embrulho revelando um ensopado com um aroma delicioso, meu estômago roncou ao sentir tal aroma, o homem retirou uma colher que estava enrolada no pano e mergulhou no ensopado.
A levantou cheia de carne e o que me pareceram batatas até a boca provando-a.Deixou a novamente no prato e abriu a garrafa de água, mas antes que provasse eu a segurei a tomando para mim.Assenti com a cabeça para ele, já era o suficiente, abri rapidamente a garrafa e bebi vários goles de água desesperadamente.Eu estava com tanta sede que praticamente esqueci que ele estava ali até que o ouvi dizer.- Me chamo Ravi.
Parei de beber a água e o encarei, seu olhos castanhos avermelhados estavam brilhantes agora, mas partiam mais para o vermelho do que o castanho, vestia uma camisa e casaco pretas, casaco que retirou e o estendeu para mim.Balancei a cabeça que não e ele o colocou de volta.- Então é um ensopado de galinha delicioso, prove.- sugeriu mantendo distância.
Peguei o ensopado e devorei em poucos minutos, não me importei que Ravi estivesse me observando, ainda não confiava nele mas ele não me parecia um mal imediato.Entreguei a ele o prato sem chegar muito perto.
Bebi mais água e permaneci longe.- Acho que devíamos fazer uma fogueira.
- Não!- exclamei me arrependo imediatamente porque Ravi me olhou com um sorriso triunfante.
- Eu já estava suspeitando que você falava meu idioma, então você se perdeu da sua tribo? Apesar de eu acreditar que você seja mestiça, não sabia que eles aceitavam mestiços nas tribos, de qual tribo você é? Esses olhos azuis são da sua mãe ou do seu pai? Você é muito clara para uma indígena, certeza é mestiça.- disparou a perguntar.
Não respondi.
- Caladona não é? Bom um mistério a ser desvendado.- anunciou ele.
Quem era esse cara?- Qual seu nome?- perguntou.
Eu o ignorei e me recostei na árvore me virando para a escuridão, meu vestido em trapos revelava muita pele e isso me fez ficar mais ereta.Ravi tirou o casaco e jogou-o para mim que caiu nas minhas pernas, era um casaco enorme e me cobria quase como uma manta.Estava tão quentinho, estar quente no frio da noite era uma sensação maravilhosa.- Esse casaco sempre me acompanhou nas horas que precisei, foi uma pessoa especial que o deu para mim.- contou.
Me agarrei a ele mais ainda e senti seu cheiro tão bom, tão quente.
Ravi estava sentado a alguns metros de mim, depois de um tempo se deitou e eu fiquei observando enquanto seu peito subia e descia.- Você provavelmente não encontrou o riacho não é? - perguntou ele seu olhos fixos no céu estrelado acima de nós.
Não respondi.
Mas isso não o impediu de continuar falando.- Achei que nunca encontraria ninguém aqui nessa mata, você sabe o que dizem desse lugar, amaldiçoado por criaturas do demônio.- contou ele e sorriu logo em seguida.
Demônios? Eu conhecia muitos demônios e eles não viviam nessa floresta.- Mas olhando para você sinto que você já conheceu muitos demônios.- sussurrou como se adivinha-se meus pensamentos.
Sim Ravi, eu quis concordar com ele mas não disse nada.
Era estranho estar diante de um homem e não ser obrigada a falar o que desejam, a fingir.Agora nessa floresta eu não sentia vontade de falar e não falava, não conhecia esse homem mas se fosse para me fazer mal já teria feito.Até agora tinha feito o bem, mas isso não significa que eu confie nele, nunca mais eu confiaria em ninguém.- Gosto de observar as estrelas, a lua e todo o céu, não tem lugar melhor para fazer isso do que aqui na floresta, sem grandes edifícios, e tudo mais das cidades, aqui é tranquilo e reservado.- ele falava de modo calmo deitado.
- Afinal, qual é seu nome? Não quer contar? Tudo bem.
A noite que já estava fria com o passar das horas foi ficando mais fria, Ravi não falou mais nada desde então, me segurei muito para não adormecer perto dele, mas eu me sentia exausta demais, lentamente minhas pálpebras foram se fechando e minha última visão foi de Ravi se levantando e indo embora.
Eu quis dizer para ele retornar e levar seu casaco mas só de pensar em me separar dele eu sentia frio.Em algum momento da madrugada senti alguém me cobrindo com uma manta grande e quente, abri meus olhos e vi olhos castanhos avermelhados.- Nina.- sussurrei antes de adormecer novamente.
O ouvi rir e sussurrar.
- Nina, significa fogo.
Ao acordar imaginei que estaria sozinha novamente, mas para a minha surpresa não estava.A minha frente estava acesa uma fogueira onde peixes estavam sendo assados, o aroma era maravilhoso, Ravi o manejava no fogo com cuidado.Olhei para a manta que me cobria, era azul marinho.- Bom dia Nina.- comprimentou Ravi, retirou um peixe do fogo e o estendeu para mim no espeto. Encarei-o sem entender porque ele ainda estava aqui.Afinal o que ele quer de mim?Começo a achar que ele não tem nada a ver com Sandra, se trabalhasse para ela já teria me levado.- Você é muito desconfiada.- pronunciou ele e retirou um pedaço do peixe provando-o na minha frente.Em seguida estendeu o restante do peixe, aceitei mais confiante ao menos envenenado não estava.Ele sorriu ao me ver comer o peixe, estava ótimo.- Você fala muito pouco para uma mulher sabia Nina.Não me dei ao tra
O sol estava alto, sorri para Avati parado a beira do rio, seus cabelos negros caiam sobre a testa molhada, ele tinha entrado no rio sem mim é claro. - Nina, você demora muito!- gritou ele nadando, Avati era um ótimo nadador.Sentei nas pedras do rio sorrindo para ele.Hoje era o dia que mamãe faria meu bolo. - Avati você vai a minha casa hoje não vai?- gritei a pergunta a ele enquanto nadava no rio. - Sua mãe vai fazer bolo olhos azuis?- perguntou ele.Era como praticamente todos da tribo Kai me chamavam, eu tinha traços de indígena, cor de indígena e cabelo também mas os olhos da minha mãe. - Então você só vai pelo bolo seu cabeça oca?!- questionei fingindo estar irritada.Avati saiu da água e se sentou ao meu lado. - Vou por você também olhos azuis.- sussurrou ao meu lado. - Tenho certeza disso Avati.- respondi.Ele se levantou de repente e andou até uma árvore, mexeu em umas folhas amontoadas ao pé dela, das folhagen
É estranho morrer, achei que veria anjos ou demônios mas não vi nada disso, vi escuridão e vazio mas não fiquei tanto tempo assim.Mas é claro que eu não morri de verdade caso contrário não teria acordado.Quando acordei senti algo estranho.Para começar parecia que havia um buraco no meu peito, meu corpo que antes doía agora não doía nada.Abri os olhos e vi que estava no mesmo lugar, deitada na cama e ao meu redor cada um sentado em um banco estava Olívia e Ravi, seus olhos se alarmaram ao me verem se sentando na cama.Olívia foi a primeira a chegar perto se sentando na cama ao meu lado. - Vai ficar tudo bem.- sussurrou ela.Minha mente parecia um turbilhão, vozes sem sentido começaram a se tornar muito altas, um casal conversando sobre praias, crianças bricando de pega-pega, uma porta batendo, um chuveiro sendo ligado, um carro saindo, carros chegando, a tv ligada, várias tvs ligadas...aq
É claro que ao me ouvir gritar Ravi entrou no banheiro sem a menor dificuldade, com um único empurrão quebrou a fechadura e entrou. - Pare de gritar, você está em uma pousada, não queremos atrair atenção!- ralhou comigo ele. - Meus olhos!- gritei. Ele suspirou e se aproximou de mim.Segurou meu rosto entre suas mãos e pareceu analisar meus olhos com cuidado. - É normal isso acontecer, você só está com sede.- ao ouvir dizer isso me dei conta da sensação na garganta que me incomodava desde a hora que acordei, uma sensação dolorosa de sede.Liguei a torneira e me abaixei tentando engolir o máximo de água que consegui, pareceu aplacar um pouco o que eu sentia, mas no fundo a sede ainda continuava ali, dolorosa e contínua. - Se vista, precisamos conversar.- avisou ele e saiu encostando a porta que eu não tinha mais a opção de trancar.Aquilo era uma loucura, estavam me drogando com toda a certeza, tirei o vestido e procurei marcas de agulh
A porta não ficava trancada, eu fui verificar quando Ravi me deixou sozinha, olhei para o corredor e vi muitas portas, fiquei um tempo observando pessoas entrando e saindo dos seus quartos, parecia mesmo uma pousada.Mas não tentei fugir, estava muito confusa e sem saber o que fariam comigo caso eu fugisse.Voltei para o quarto e liguei a TV, na boate não tínhamos TV nos quartos, nada que nos informasse sobre o mundo fora daquele lugar, a última TV que tinha visto era na casa dos meus pais, minha mãe estava assistindo a um filme, lembro-me que ela me chamou para ver com ela, mas eu não quis, estava ocupada com coisas de criança brincando com minhas bonecas... Porque o gosto do sangue Não me causou enjoos? Porque não me pareceu repulsivo?Até mesmo agora que eu sabia exatamente o que havia tomado não sentia repulsa.O que estava acontecendo comigo afinal? Uma batida na porta interrompeu meus pensamentos.- Entre. O garotinho de
Era tudo uma loucura, eu realmente estava morta.Agora era uma vampira sugadora de sangue alheio.Tantos anos em cativeiro para morrer sendo arremessada contra uma árvore.A garota que eu tentei salvar? Morta também, mas não morta como eu que Ravi me transformou em vampira, ela estava morta mesmo sem nenhum sangue em suas veias.Ravi a enterrou na floresta.O homem que eu vi ter a cabeça arrancada era um vampiro. - Porque não tenho nenhuma marca de mordida? Foi você que me mordeu certo?- perguntei enquanto voltávamos para meu quarto. Ele me olhou. - Para alguém que não via muita TV você tem uma visão muito hollywoodiana dos vampiros.- respondeu ele e só consegui me deter em ele saber que eu não assistia muita tv, como sabia? - Como sabe que eu não tinha acesso a TV?- questionei quando paramos em frente a porta do quarto. - Eu vejo lembranças e desejos quando toco em
Eu sabia que ela escondia algo difícil, aqui parado na porta eu conseguia ouvi-la chorar baixo, de forma que não quisesse ser descoberta e sua expressão assustada ao entender que eu teria acesso a quaisquer memórias esquecidas, perdidas definitivamente ela tinha um segredo que planejava a todo custo proteger.Mas todos tínhamos no final das contas, a deixaria em paz com o seu.Me afastei da porta e andei pelo longo corredor, ao descer as escadas pensei na reunião que iria hoje, o que seria decidido dessa reunião? - Irmão!- Odara surgiu a minha frente.- Estou com pressa Odara.- me apressei a dizer, não queria ouvir suas mesmas reclamações que me eram muito cansativas, depois de tantos anos vivendo em sua condição já deveria ter se conformado.- O que acha da indiazinha? Bonita não é? Foi uma boa idéia nos estabelecermos aqui.- perguntou maliciosamente enquanto me seguia desc
Olívia e Ravi saíram da sala carregando o garoto ferido, agora estavamos só eu e Odara que não sorria.Estava sentado apreensivo, sua expressão era de terror.Mas o seu terror com certeza não se igualava ao meu, os homens lá fora carregavam uma marca muito conhecida para mim.Uma tatuagem da fênix, assim como o fênix que matou Sara.Seria só uma coincidência? Ou talvez ele fosse um vampiro.- Odara, quem são esses lá fora que querem nos matar?- perguntei me aproximando dele.- Fazem parte do clã negro liderados pelo príncipe exilado, se denominam filhos da fênix, que iriam ressurgir sempre das cinzas, devem ter usado uma magia negra para estarem aqui, não é possivel esse tipo de viagem.- respondeu.Por isso a marca da fênix na mão, pensei.- O que eles querem??- perguntei.- Todos os vampiros que controlam a chama.
Último capítulo