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2 - O Primeiro Crime

Roman Ostrov - 12 anos

 A sensação de puxar o gatilho sempre fora algo familiar para mim. O leve recuo da arma, o som seco do disparo ecoando na floresta enevoada, tudo isso fazia parte do que eu era. O primeiro pássaro caiu quase no instante seguinte, uma mancha escura contra o céu cinzento e nebuloso. O segundo logo o seguiu, um tiro limpo, preciso. Não havia hesitação. Não podia haver. No mundo de meu pai, o erro era um luxo que não se podia cometer.

 Mais um disparo. O terceiro pássaro despencou, seus últimos momentos interrompidos no ar. Não desviei o olhar enquanto os corpos das pequenas aves caíam, imóveis, em meio à vegetação densa. O silêncio que se seguiu era tão denso quanto a neblina que nos cercava, sufocante.

 Olhei para meu pai, esperando, quase ansiando por algum sinal de aprovação. Seus olhos, duros e calculistas, fixaram-se em mim por um momento que pareceu durar uma eternidade. Mesmo sem palavras, eu sabia. Ele estava satisfeito. Ele não precisava dizer, o brilho gelado em seus olhos falava por si.

 — Impressionante — murmurou Nikolai, sua voz tingida com uma surpresa que nunca soava genuína. — Ainda assim, não posso imaginar como ele nos será útil.

 O sorriso que se seguiu foi enigmático, um daqueles sorrisos que sempre me deixava inquieto, nunca certo do que ele realmente estava pensando. Ele olhou para mim por mais um instante, antes de se voltar para Nikolai, pegando a arma das minhas mãos com um gesto calmo, mas carregado de autoridade. Tudo o que meu pai fazia era uma lição, uma demonstração de poder.

 Sem dizer uma única palavra, ele começou a caminhar mais fundo na floresta. A neblina densa nos envolvia como um manto, abafando os sons e transformando o mundo em uma paisagem fantasmagórica. Nikolai o seguiu, ainda cético, seus olhos brilhando com dúvidas não ditas, como se tentasse decifrar o quebra-cabeça que meu pai representava. Os dois seguranças de Nikolai vieram logo atrás de nós, suas presenças imponentes e ameaçadoras, mas ao mesmo tempo desnecessárias naquela situação.

 Quando meu pai parou abruptamente, o silêncio da floresta pareceu pesar sobre nós como uma cortina espessa. Ele girou a arma em suas mãos com a habilidade de quem conhecia o objeto intimamente, e então lançou um olhar para Nikolai, seus olhos tão frios quanto as longas noites de inverno na Rússia.

 — Me diga, Nikolai — começou ele, sua voz tranquila, mas com um subtexto sombrio que era impossível ignorar — por que, depois de todos esses anos de amizade, você ainda sente a necessidade de manter esses seguranças dentro da minha casa? Você acha que precisa de proteção... de mim?

 Nikolai forçou um sorriso, tenso, suas feições endurecidas pela situação desconfortável. Ele balançou a cabeça lentamente, como se a ideia fosse absurda, embora claramente não o fosse.

 — Você conhece os tempos, Ivan — respondeu ele, a tensão em sua voz agora perceptível. — Não é uma questão de confiança. Apenas... precaução. Nada pessoal.

 Meu pai assentiu, o sorriso enigmático ainda nos lábios. Ele olhou para mim, e naquele olhar — frio e calculado — eu soube exatamente o que ele queria. Era um entendimento silencioso entre nós, como se as palavras fossem desnecessárias. Eu sabia o que fazer.

 Me movi sem hesitar. Meus passos foram rápidos, controlados. O primeiro segurança não teve tempo de reagir. Minha mão deslizou para a faca que meu pai havia me dado no meu quinto aniversário, a lâmina brilhando à luz difusa da névoa. Com um movimento certeiro, cravei a faca em sua garganta. O sangue jorrou quente, pulsante, enquanto ele agarrava o próprio pescoço em um reflexo inútil, os olhos arregalados em um choque que já era tarde demais para ser revertido. Seu corpo tombou pesadamente no chão, sem vida.

 Sem perder tempo, agarrei a arma presa ao coldre dele, fria e pesada em minhas mãos pequenas. O segundo segurança, agora alarmado, deu um passo para trás, sua mão indo rapidamente para o cinto, onde sua própria arma descansava. Mas ele era lento, muito lento.

 Levantei a arma, os movimentos fluidos como se tivessem sido ensaiados inúmeras vezes, e mirei diretamente em seu peito. O primeiro disparo ressoou seco, o recuo familiar em minhas mãos já não me perturbava. Ele foi atingido, o corpo cambaleando para trás, os olhos arregalados em surpresa e dor. Antes que pudesse sacar sua arma, apertei o gatilho novamente. O segundo disparo acertou diretamente o coração. O eco do tiro reverberou na floresta antes de desaparecer, engolido pela névoa que tudo envolvia.

 Ele caiu de joelhos, o olhar vidrado fixo em algum ponto distante antes de desabar completamente. O silêncio voltou, pesado, quase sufocante. Meus ouvidos ainda zumbavam dos disparos, mas minha mente estava fria, clara. Me levantei lentamente, limpando a faca na minha roupa, os movimentos automáticos.

 Olhei para meu pai. Ele estava parado ao lado de Nikolai, a expressão impassível. Mas seus olhos, sempre seus olhos — frios, calculistas — tinham aquele brilho particular que só eu conseguia reconhecer. Ele estava satisfeito. Ele sabia que eu havia aprendido a lição.

 Nikolai, por outro lado, estava imóvel, os olhos fixos nos corpos de seus seguranças caídos. Sua respiração estava rápida, irregular, e seu rosto perdera a cor. Finalmente, ele entendeu. Papai não estava apenas me escondendo do mundo. Ele estava me moldando, me treinando para ser a arma que ninguém jamais esperaria.

 — Como eu disse, Nikolai — a voz de meu pai era casual, quase indiferente, enquanto olhava para os corpos no chão. — Roman é o nosso plano. E quando a hora chegar, ele fará o que for preciso.

 Nikolai finalmente rompeu o silêncio, sua voz vacilante.

 — Ivan... Roman é a peça que faltava. Mas você sabe tão bem quanto eu que o que aconteceu aqui... — ele fez uma pausa, respirando fundo — isso não pode acontecer com outras pessoas por perto. Se eu vi, outros também podem ver. Roman precisa sair daqui. É perigoso mantê-lo aqui.

 Meu pai permaneceu imóvel, seu sorriso de antes desaparecido, mas o olhar ainda calculista. Ele assentiu lentamente, como se já tivesse considerado todas as implicações.

 — Sim, você está certo — ele respondeu, sua voz baixa, mas cheia de autoridade. — Roman será levado para longe. Para um lugar onde ninguém o verá. Onde poderá ser treinado sem que ninguém desconfie.

 Nikolai assentiu, ainda com um ar de preocupação, mas satisfeito com a resposta.

 — Não se preocupe, Nikolai. Roman estará pronto quando for necessário. — Ele virou-se para mim por um breve momento, o olhar intenso, como se estivesse me desafiando a interiorizar suas palavras. — Ele nasceu com esse dom. Ele nasceu para ser um assassino.

 Nikolai ficou em silêncio, claramente ponderando o que acabara de ouvir. Meu pai sempre fora um homem de palavras calculadas, e naquele momento, eu sabia que ele estava falando a verdade.

 — Ele foi criado para ser letal. Não por escolha, mas por destino. Ele será o golpe final, o fio da espada que cortará todos os nossos inimigos. Ele foi moldado desde o nascimento para esse papel. Seu primeiro crime foi matar a mulher que eu amava, e seu último será trazer a paz à nossa Bratva... ou destruí-la, se for necessário.

 Eu não era apenas um herdeiro. Eu era uma arma moldada pelo destino.

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