Roman Ostrov
O telefone tocou uma vez. O som ecoou pela cela como um presságio. Quando atendi, a voz fria e metódica de Nikolai me atingiu com a mesma precisão de sempre. — O alvo chegou — ele disse, sem rodeios. — Está em uma cela isolada. Chegou o momento de provar sua lealdade ao conselho. Eu ouvi em silêncio, deixando que suas palavras mergulhassem na minha mente. Tinha esperado por esse momento por muito tempo, mas agora, as circunstâncias eram diferentes. Não era apenas o Roman que entrou nessa prisão anos atrás. Muito havia mudado. — Cumprirei a missão, como me foi ordenado — respondi, minha voz calma, controlada. Desliguei o telefone e fiquei em silêncio por alguns instantes. Eu tinha uma nova missão, uma tarefa que deveria provar minha lealdade à Bratva diante do conselho. Mas havia algo que eles não sabiam, algo que eu guardaria em segredo por enquanto. Antes de ser iniciado formalmente, antes de fazer o juramento "Pelo Sangue e Pela Bratva", eu já havia me provado digno. Eu carregava em meu joelho o símbolo mais poderoso dentro da Bratva. A estrela de cinco pontas. Aquela tatuagem era algo que poucos tinham, algo que a maioria só conhecia em lendas e murmúrios. Eu era agora um "Homem sem Lei". Mas isso era algo que o conselho não precisava saber... ainda. Antes de cumprir minha missão, fui até o velho. Ele estava sentado no canto da cela, como sempre, observando o nada. Mas ao me aproximar, ele ergueu o olhar e soube, no mesmo instante, que meu momento havia chegado. — Hoje é o dia, não é? — ele disse, sem emoção, como se estivesse falando sobre o clima. Eu assenti. — Vou cumprir o que me foi ordenado — respondi, sem desviar o olhar. O velho sorriu, um sorriso cheio de cansaço, mas também de uma sabedoria que só o tempo traz. — Roman — ele começou, sua voz firme — quero que saiba de uma coisa. Quando te dei a estrela, não foi porque você salvou minha vida duas vezes. Eu te dei essa marca porque reconheci em você a verdadeira essência da Bratva. Eu fiquei em silêncio, esperando que ele continuasse. — A estrela de cinco pontas tem um significado muito além do que a maioria pensa. As pessoas acreditam que ela é um símbolo de poder... e é, mas representa mais que isso. Cada ponta da estrela reflete os valores fundamentais de um verdadeiro Homem sem Lei. Ele levantou uma mão trêmula e apontou para cada uma das pontas da estrela tatuada no meu joelho. — Primeiro, Poder — começou ele. — O controle absoluto sobre si mesmo, sobre os outros, e sobre os negócios da Bratva. Sem poder, você não pode comandar. Ele passou para a segunda ponta. — Respeito. A capacidade de comandar respeito não vem do medo sozinho. Vem de suas ações, da sua presença. Um verdadeiro líder não precisa dizer que é líder, ele simplesmente é. A terceira ponta veio logo em seguida. — Fidelidade. Lealdade inabalável à Bratva e ao código. Fidelidade sem desvio, sem hesitação. É o sangue que corre nas suas veias, e enquanto o sangue correr, sua lealdade nunca pode vacilar. A quarta ponta. — Vingança. A justiça implacável contra aqueles que ousam trair ou desafiar a Bratva. Retribuição é o que mantém o equilíbrio. Quem trai a Bratva, deve ser tratado sem misericórdia. E, por fim, a quinta ponta. — Sacrifício. Nada disso importa se você não estiver disposto a abrir mão de tudo, até mesmo da sua vida, pelo bem maior da Bratva. Aqueles que portam essa estrela sabem que a Bratva vem antes de qualquer coisa, até de si mesmos. Ele fez uma pausa, o olhar profundo, como se estivesse tentando gravar aquelas palavras em minha alma. — Estes são os significados que fazem de você mais do que um homem, Roman. Fazem de você um verdadeiro Homem sem Lei. A estrela que você carrega é o maior símbolo de comprometimento com a Bratva, e agora, você está pronto para provar isso ao mundo. Eu respirei fundo, absorvendo o peso de suas palavras. A estrela em meu joelho ardia como se tivesse acabado de ser marcada. Eu sabia, naquele momento, que ele estava certo. Tudo o que eu representava, o que a Bratva representava, estava encapsulado naquele símbolo. — Lembre-se, Roman — o velho disse, se levantando devagar, sua mão pousando no meu ombro. — O conselho quer ver sangue. Querem a morte daquele homem como prova de sua lealdade. Mas você... já provou que é mais do que eles imaginam. A verdadeira lealdade é para com a Bratva, agora você está acima do conselho. Você é um Homem sem Lei. Eu assenti, sentindo a gravidade do que ele dizia. Antes de sair, o velho me olhou nos olhos uma última vez. — Vai e faça o que precisa ser feito. Mas nunca se esqueça do que significa carregar essa estrela. Você é Bratva... para sempre. Com essas palavras ressoando na minha mente, deixei a cela. O som metálico da porta ecoou nos corredores. A missão me aguardava, e o conselho esperava minha prova de lealdade. Mas o que eles não sabiam... era que eu já havia me provado digno muito antes deste momento. A estrela de cinco pontas ardia no meu joelho, como uma marca indelével de quem eu era agora. Um Homem sem Lei. Governado pelo código de conduta da Bratva e guardião de suas leis. Os corredores escuros e frios da prisão ecoavam com o som dos meus passos firmes enquanto me aproximava da cela isolada. A missão estava clara em minha mente: matar o homem dentro da cela, provar minha lealdade ao conselho e, finalmente, ser iniciado formalmente na Bratva. Mas algo estava diferente, o ar parecia mais pesado, carregado de tensão. Ao me aproximar, percebi que o cadeado da cela já estava aberto. Algo estava errado. Empurrei a porta de metal e, ao entrar na cela, vi o homem caído no chão. Seu corpo estava imóvel, com uma poça de sangue se espalhando lentamente sob ele. Um tiro certeiro no peito. Por um momento, fiquei paralisado, observando a cena com uma mistura de choque e descrença. Aproximei-me cautelosamente, a lâmina que trazia em meu casaco ainda fria em minhas mãos. Quando me ajoelhei ao lado do corpo, reconheci imediatamente o rosto do homem. Era o mesmo homem da foto que Nikolai me havia mostrado há dez anos. O alvo que, desde então, eu havia sido treinado para eliminar. Mas ele já estava morto.Roman Ostrov Olhei em volta, estudando o estado da cela. As roupas do homem estavam sujas e rasgadas, indicando que houve uma luta antes de sua morte. Então, algo chamou minha atenção. Uma tatuagem no peito do homem, parcialmente coberta pelo sangue. Uma águia... usando uma coroa. Meus olhos se arregalaram enquanto a realidade me atingia como um golpe bem cravado no coração. Aquele homem... não era apenas o alvo. Ele era o chefe da Bratva. A águia coroada era um símbolo sagrado, reservado apenas para o líder supremo. A revelação me fez cambalear para trás, o coração disparado no peito. Um turbilhão de pensamentos inundou minha mente. Nikolai e meu pai, Ivan, não estavam testando minha lealdade... eles estavam conspirando contra a Bratva. Por isso eu nunca fui apresentado à cúpula da organização. Por isso, meu juramento de lealdade havia sido adiado por tanto tempo. Eles não queriam que eu soubesse a verdade, que eu entendesse a profundidade de sua traição. Eles queriam que
Roman Ostrov Houve um burburinho entre os capitães presentes. Olhei em volta, ainda amarrado e mudo, mas pude perceber os rostos de homens que nunca tinha visto pessoalmente, mas cujas reputações os precediam. Estes eram os homens mais poderosos da Bratva, cada um com um território e uma legião de seguidores leais. Nikolai fez questão de apresentar todos eles, mas os seus nomes já haviam sido citados na prisão, assim como os seus feitos. Sergei Volkov, Capitão de São Petersburgo, era um homem de meia-idade, corpulento e com olhos frios e calculadores. Ele estava sentado com os braços cruzados, seus dedos acariciando distraidamente a tatuagem de uma caveira em sua mão. Ao seu lado, Dmitry Kozlov, o líder brutal de uma das maiores facções de Moscou, observava Ivan com desconfiança. Dmitry era conhecido por ser impiedoso, seus olhos eram como punhais, sempre prontos para perfurar quem se metesse em seu caminho. No canto mais distante da mesa, Boris Petrov, um homem magro e de ol
Roman Ostrov Os capitães se entreolharam, e a votação começou. As vozes eram graves, cada uma carregando o peso de decisões que mudariam o futuro da Bratva. Eu observava tudo, na prisão eu aprendi muito, aprendi a ler o jogo por inteiro, e tudo naquele cenário me pareceu deslocado, fora de lugar. Poderia ser um grande movimento dos traidores, mas não era o último e se dependesse de mim o último movimento de Nikolai e Ivan seriam no inferno. Conforme a votação prosseguia, o resultado se tornava evidente: havia um empate. Sergei Volkov, Boris Petrov, e Alexei Sokolov votaram em Nikolai, enquanto outros capitães mais próximos a meu pai votaram nele. O equilíbrio era frágil, e agora tudo dependia do último voto. Dmitry Kozlov, o único a mesa que parecia possuir algum entendimento sobre a gravidade do que estava acontecendo ali, se levantou lentamente, seus olhos pesados enquanto observava meu pai. Ele era um homem de poucas palavras. Todos na sala o observavam, aguardando sua dec
Dias atuais... Donatella Romanova - 18 anos O silêncio na mansão Romanov era ensurdecedor, interrompido apenas pelo som distante dos passos suaves de Anastacia, minha mãe, atravessando o corredor como uma sombra. Ela apareceu à minha frente, seu rosto sem emoção, mas seus olhos brilhando com algo que eu não conseguia definir. Talvez fosse satisfação disfarçada, talvez fosse o alívio que ela vinha esperando por tanto tempo. — Donatella — ela disse, sua voz controlada, com uma tranquilidade quase perturbadora. — Seu pai... foi morto, na prisão. Eu senti meu estômago revirar, o chão parecia se desintegrar sob meus pés. As palavras dela caíram sobre mim como uma onda gélida. Uma dor forte me atingiu o peito, me fazendo curvar o corpo pra frente, em um movimento nada gracioso. — Mas não se preocupe — ela continuou, sem esperar uma resposta, enquanto atravessava a sala com a mesma elegância fria de sempre. — Nós estamos protegidas. Nikolai vai cuidar de tudo. — Ela tentou dar um
Roman Ostrov A reunião terminou, mas o peso dos olhares dos outros capitães permaneceu cravado em mim enquanto eu saía do prédio. Aqueles homens, que haviam dado suas vidas à Bratva, me encaravam como se eu fosse uma incógnita, um mistério que não conseguiam decifrar. Achavam que eu não pertencia a esse mundo? Eles não podiam estar mais enganados. Dmitry foi o único que teve coragem de me cumprimentar. Seus olhos, embora tranquilos, carregavam uma mensagem sutil. Ele sabia algo. Provavelmente, informações sobre o Sistema Prisional Russo, o suficiente para entender que eu, Roman Ostrov, jamais cometeria o erro de matar o chefe supremo da Bratva por engano. O seu gesto discreto confirmava o que eu já suspeitava — ele sabia que havia mais nessa história do que os outros imaginavam. No carro, a volta para casa se desenrolava em um silêncio pesado. Ivan Ostrov, ao meu lado, parecia perdido nos labirintos de seus próprios pensamentos. Eu, por outro lado, mantinha meus olhos fixos na escur
Donatella Romanova Era madrugada quando fui acordada por um som distante, abafado, que no começo achei ser parte de algum sonho. Mas, conforme minha mente saía do torpor, os barulhos se tornaram mais claros, mais reais. Tiros. Muitos tiros. Meu coração disparou, e me sentei na cama, atordoada, tentando entender o que estava acontecendo. A mansão, normalmente envolta em silêncio, agora parecia um campo de batalha. Meus pensamentos corriam, confusos e desorientados, mas uma coisa era clara: estávamos sob ataque. Levantei-me da cama de um salto, meus pés descalços tocando o chão frio enquanto tentava chegar à porta, mas antes que eu pudesse sequer fazer algo, a porta do meu quarto foi arrombada com um estrondo que fez todo o meu corpo tremer. Três homens vestidos de preto, armados e com o rosto coberto, invadiram o quarto. Antes que eu pudesse reagir, senti uma mão áspera agarrando meus cabelos com brutalidade, puxando-me de volta. — Não! — Gritei, lutando contra o aperto fero
Donatella Romanova Ivan manteve seus olhos fixos nos meus, esperando por uma reação, mas tudo o que ele encontrou foi um silêncio inabalável. Eu podia ver o brilho de frustração crescer por trás daquele olhar gélido, como se não conseguisse entender o motivo da minha apatia. A verdade é que, por dentro, algo em mim já estava morto há muito tempo. Só que ninguém havia percebido. — Todos vocês, saiam. — A voz de Ivan soou firme, cortando o silêncio da sala com uma autoridade que não deixava margem para questionamentos. Ivan relaxou o aperto no meu braço, mas não se afastou. Seus olhos percorreram meu rosto com uma mistura de curiosidade e apreciação. O silêncio entre nós se alongou por alguns instantes antes que ele quebrasse com um tom quase pensativo, como se estivesse refletindo em voz alta. — É curioso... — Ele murmurou, inclinando a cabeça levemente, avaliando cada detalhe. — Com essa sua beleza angelical, esse rosto delicado... — Ele tocou meu queixo com dedos ásperos,
Roman Ostrov Meu pai disfarçou bem o impacto ao ver os corpos dilacerados nas fotos espalhadas sobre a mesa. Seus olhos passavam de uma imagem para outra, com uma expressão de frieza que ele cultivara ao longo dos anos. No entanto, por trás da máscara de controle, percebi o leve estremecimento. O terror rapidamente deu lugar à preocupação. Ele pegou uma garrafa de uísque de uma prateleira atrás de si, serviu dois copos cheios e os esvaziou em questão de segundos, como se o álcool pudesse apagar as imagens gravadas em sua mente. Eu o observei em silêncio, o mesmo olhar de quando era criança, esperando sua aprovação. Mas desta vez, havia um leve sorriso em meus lábios. Porque, ao contrário de antes, eu não precisava mais da aprovação dele. Eu sabia que fiz um trabalho impecável. — Roman, o conselho não vai tolerar isso... — ele disse, sua voz carregada de gravidade. — Eles eram parte da linhagem fundadora da Bratva. Mereciam respeito. — Respeito pelos mortos é um desperdício — rebat