Roman Ostrov - 18 anos
São Petersburgo O frio de São Petersburgo não era apenas uma presença física; ele cortava como lâminas invisíveis, entrando por cada poro, se infiltrando nos ossos. Mas aquilo não me incomodava. Estar de volta à Rússia era mais que uma mudança geográfica, era um retorno ao meu destino inevitável. Durante os anos que passei na Sicília, fui moldado, endurecido pela Cosa Nostra, e agora estava pronto para cumprir o papel que a Bratva exigia de mim. A hora de provar minha lealdade havia chegado. A reunião seria o primeiro passo. Esperava encontrar o Conselho da Bratva, onde seria formalmente apresentado como o filho de Ivan Ostrov, o Capitão, e finalmente fazer o juramento que eu já havia ensaiado tantas vezes em minha mente: Pelo Sangue e Pela Bratva. Mas o que me esperava não era o Conselho, e sim duas figuras isoladas na penumbra da sala. O local era uma construção antiga, suas paredes de pedra tão velhas quanto os segredos que guardavam. Ao entrar, senti o peso do silêncio pairando como um véu opressivo. O ar estava denso, como se o tempo naquela sala tivesse parado, preso pelas decisões de gerações anteriores. E ali, no centro daquele ambiente sombrio, estavam eles: meu pai, Ivan Ostrov, e Nikolai, o conselheiro da Bratva. Suas presenças não eram uma surpresa. O que vinha a seguir, no entanto, já pesava sobre meus ombros. — Roman — Nikolai começou, sua voz cortante como o ar lá fora. — Na Bratva, não há confiança cega. — Ele deu um passo à frente, a sombra do passado pairando sobre ele. — Não basta ser filho de Ivan Ostrov. Eu o encarei, impassível. Sabia que essa provação viria. A Bratva não aceitava ninguém apenas por laços de sangue. Ali, cada alma precisava ser testada, cada vida provada pela dor e pela lealdade. — Primeiro, você deve mostrar que é digno de estar aqui — continuou Nikolai, aproximando-se mais. Seu olhar era penetrante, calculado. — Somente depois que provar sua lealdade, poderá jurar sua fidelidade à Bratva. Pelo Sangue e Pela Bratva. Ele estendeu a mão, entregando-me um envelope. O papel era grosso, pesado, como o fardo que ele continha. Dentro, encontrei a foto de um homem, acompanhada de uma ficha detalhada. Ele não era mais um rosto entre tantos. Para mim, ele agora era apenas um alvo. — Este homem tenta romper nossos acordos com os aliados — disse Nikolai, suas palavras carregadas de intenção. — Sua missão é simples: matá-lo. Sem perguntas, sem falhas. Somente assim provará que merece estar entre nós. Olhei para a foto por alguns segundos. O homem era alguém que claramente havia vivido entre luxo e poder. Mas agora, seu destino estava selado. Ele se tornara uma peça descartável em um jogo que transcende individualidades. Naquele momento, não importava quem ele era. Para me tornar parte da Bratva, eu deveria eliminá-lo. Meu pai, Ivan, permanecia à porta. Sua presença, tão constante quanto o frio russo, parecia absorver a pouca luz da sala. Seus olhos, aqueles que sempre me analisavam com uma frieza cortante, me observavam atentamente. — Você não pode falhar, Roman — sua voz soou baixa, mas carregada de uma autoridade implacável. — Todo o treinamento que recebeu foi para este momento. Você sabe o que deve fazer. Não houve mais palavras entre nós. Saí da sala com um único pensamento na mente: a missão. O plano já se desenhava, preciso e calculado, como todas as lições que aprendi ao longo dos anos. Para chegar ao meu alvo, precisaria ser preso. A prisão seria o palco da execução, e a única maneira de entrar lá seria sendo detido. Com documentos cuidadosamente falsificados em nome de "Roman Trofimov" — um nome que usei em homenagem à minha mãe —, tudo estava pronto. Ninguém na prisão suspeitaria de quem eu realmente era. Para eles, eu seria apenas mais um criminoso comum. Naquela noite, fui a um bar sombrio nos arredores de São Petersburgo. O lugar era o tipo de cenário onde violência e desespero eram companheiros constantes. O cheiro de álcool barato misturava-se ao suor e à fumaça, e a tensão pairava no ar, esperando o momento certo para explodir. Foi fácil criar a situação perfeita. Um empurrão aqui, algumas palavras estrategicamente escolhidas, e logo o ambiente se incendiou. O caos se instalou, cadeiras voaram, socos foram trocados. Mas cada movimento meu era calculado. Não estava ali para matar, apenas para ser preso. A violência controlada que eu exibia era o suficiente para chamar a atenção da polícia. As sirenes não demoraram a aparecer, e eu me entreguei sem resistência. Quando os documentos falsos foram apresentados, "Roman Trofimov" foi registrado, e assim, comecei a caminhada rumo à prisão. O plano estava funcionando perfeitamente. A verdadeira missão só começaria agora. A van da prisão se movia aos trancos pelas ruas gélidas, as algemas apertadas em meus pulsos acentuavam o desconforto do metal frio contra minha pele. Ao meu lado, outros prisioneiros permaneciam em silêncio, alguns com expressões endurecidas, outros perdidos em pensamentos. Eu, no entanto, estava sereno. Sabia que a prisão não era o fim, mas o prelúdio do verdadeiro teste. Quando chegamos ao complexo prisional, o portão de ferro se abriu com um rangido prolongado, revelando o monólito de concreto que seria meu lar temporário. As paredes cinzentas, desgastadas pelo tempo e pelos gritos de vidas quebradas, erguiam-se como muralhas, tentando esmagar qualquer resquício de esperança. Mas eu não estava ali por azar. Estava ali para cumprir uma missão. Os guardas nos empurraram para fora da van, o vento cortante fazendo ecoar o ranger das correntes. Cada movimento meu era observado com atenção. Sabia que em um lugar como aquele, os olhos estavam em todos os cantos, observando, calculando, esperando uma fraqueza. Mas adotei a identidade de Roman Trofimov, mantendo-me sob o radar. Para todos ali, eu era apenas mais um homem marcado pela criminalidade. Após os procedimentos iniciais, fui levado à minha cela. Quando a porta de ferro se fechou com um estrondo seco, vi que meu companheiro de cela já estava lá: um homem de cabelos ralos e barba grisalha. Ele não disse uma palavra, apenas me observou por alguns segundos antes de voltar ao seu silêncio, mergulhado em seus próprios pensamentos. O ambiente ao nosso redor era pesado, sufocante, e o silêncio entre nós era quase palpável. Mas eu sabia que ali, naquela prisão, o silêncio era uma forma de proteção. Cada palavra não dita era uma barreira contra a morte. Mantive-me quieto, ciente de que o verdadeiro desafio ainda estava por vir. E assim, comecei a esperar. Esperar pelo momento certo, pelo instante em que o destino me daria a oportunidade de provar, de uma vez por todas, que Roman Ostrov não era apenas um nome — eu era a mão da Bratva, o instrumento afiado que cortaria qualquer traidor.Donatella Romanova - 8 anos Já faz meses que papai anda doente. Os médicos, figuras de jaleco branco e olhares clínicos, insistem que seu coração está fraco. Mas minha mãe, Anastacia, tem pouco tempo e menos paciência para as explicações desses homens. "Seu coração é fraco demais para liderar a Bratva," ela diz, sua voz cortante como uma lâmina de gelo. As palavras dela, tão cheias de desprezo, reverberam em minha mente como um eco perturbador. Há uma verdade amarga nelas, uma verdade que me incomoda profundamente, mesmo que eu não entenda completamente o que isso significa. Papai, o homem outrora temido por todos, não é mais o mesmo. Ele está mais frágil, suas mãos tremem, seus passos são mais lentos. Até as surras que costumavam ecoar pelas paredes da mansão pararam. Era estranho não ouvir mais o som das cintas, dos gritos abafados e dos olhos suplicantes. Eu sabia, no fundo do meu coração, que ele estava fraco demais até para impor sua fúria sobre as desobediências de minha mãe.
Roman Ostrov - 18 anos O som abafado da prisão já havia se tornado um ruído familiar, quase um companheiro silencioso. O eco constante de vozes distantes, o ranger das camas de metal enferrujado e o silêncio pesado que preenchia as lacunas entre as paredes de concreto... tudo isso fazia parte do cenário que me envolvia. A cela, pequena e opressora, era o meu território agora. Ou, pelo menos, era assim que precisava pensar para manter a sanidade. Mas a cada dia que passava, a espera se tornava uma tortura lenta, o tique-taque invisível da minha paciência sendo corroído a cada segundo. Sabia que estava ali por um motivo maior — uma missão. Um alvo. Um teste. Mas mesmo com esse conhecimento, a incerteza e o tédio me consumiam como um fogo que queimava silenciosamente por dentro. Foi numa tarde cinzenta e claustrofóbica que a ligação chegou. Como um som dissonante no caos rotineiro da prisão, o guarda veio me chamar. Eu sabia, antes mesmo de pegar o telefone, que algo importante esta
Dias atuais... Roman Ostrov – 28 anos O tempo dentro das paredes frias da prisão havia me moldado de formas que eu jamais poderia prever. Dez anos. Dez longos anos desde que entrei aqui com uma única missão. Mas, ao longo desses anos, aprendi que o verdadeiro poder não reside apenas em sobreviver, mas em dominar. E foi exatamente isso que fiz. Ao lado do velho, que no início todos subestimavam, nos tornamos os senhores desse lugar infernal. O velho, com sua sabedoria acumulada por décadas de experiência nas sombras da Bratva, e eu, com minha juventude e ambição, fizemos da prisão o nosso império. Os guardas nos respeitavam — ou, mais frequentemente, nos temiam. E os prisioneiros, antes desorganizados e violentos, agora se reportavam a nós como soldados fiéis. Sob o comando do velho e minha liderança emergente, controlávamos o tráfico, o contrabando, e cada negócio que movia poder e dinheiro atrás dessas grades. Para muitos, essa prisão era um pesadelo; para nós, era um reino. M
Roman Ostrov O telefone tocou uma vez. O som ecoou pela cela como um presságio. Quando atendi, a voz fria e metódica de Nikolai me atingiu com a mesma precisão de sempre. — O alvo chegou — ele disse, sem rodeios. — Está em uma cela isolada. Chegou o momento de provar sua lealdade ao conselho. Eu ouvi em silêncio, deixando que suas palavras mergulhassem na minha mente. Tinha esperado por esse momento por muito tempo, mas agora, as circunstâncias eram diferentes. Não era apenas o Roman que entrou nessa prisão anos atrás. Muito havia mudado. — Cumprirei a missão, como me foi ordenado — respondi, minha voz calma, controlada. Desliguei o telefone e fiquei em silêncio por alguns instantes. Eu tinha uma nova missão, uma tarefa que deveria provar minha lealdade à Bratva diante do conselho. Mas havia algo que eles não sabiam, algo que eu guardaria em segredo por enquanto. Antes de ser iniciado formalmente, antes de fazer o juramento "Pelo Sangue e Pela Bratva", eu já havia me pr
Roman Ostrov Olhei em volta, estudando o estado da cela. As roupas do homem estavam sujas e rasgadas, indicando que houve uma luta antes de sua morte. Então, algo chamou minha atenção. Uma tatuagem no peito do homem, parcialmente coberta pelo sangue. Uma águia... usando uma coroa. Meus olhos se arregalaram enquanto a realidade me atingia como um golpe bem cravado no coração. Aquele homem... não era apenas o alvo. Ele era o chefe da Bratva. A águia coroada era um símbolo sagrado, reservado apenas para o líder supremo. A revelação me fez cambalear para trás, o coração disparado no peito. Um turbilhão de pensamentos inundou minha mente. Nikolai e meu pai, Ivan, não estavam testando minha lealdade... eles estavam conspirando contra a Bratva. Por isso eu nunca fui apresentado à cúpula da organização. Por isso, meu juramento de lealdade havia sido adiado por tanto tempo. Eles não queriam que eu soubesse a verdade, que eu entendesse a profundidade de sua traição. Eles queriam que
Roman Ostrov Houve um burburinho entre os capitães presentes. Olhei em volta, ainda amarrado e mudo, mas pude perceber os rostos de homens que nunca tinha visto pessoalmente, mas cujas reputações os precediam. Estes eram os homens mais poderosos da Bratva, cada um com um território e uma legião de seguidores leais. Nikolai fez questão de apresentar todos eles, mas os seus nomes já haviam sido citados na prisão, assim como os seus feitos. Sergei Volkov, Capitão de São Petersburgo, era um homem de meia-idade, corpulento e com olhos frios e calculadores. Ele estava sentado com os braços cruzados, seus dedos acariciando distraidamente a tatuagem de uma caveira em sua mão. Ao seu lado, Dmitry Kozlov, o líder brutal de uma das maiores facções de Moscou, observava Ivan com desconfiança. Dmitry era conhecido por ser impiedoso, seus olhos eram como punhais, sempre prontos para perfurar quem se metesse em seu caminho. No canto mais distante da mesa, Boris Petrov, um homem magro e de ol
Roman Ostrov Os capitães se entreolharam, e a votação começou. As vozes eram graves, cada uma carregando o peso de decisões que mudariam o futuro da Bratva. Eu observava tudo, na prisão eu aprendi muito, aprendi a ler o jogo por inteiro, e tudo naquele cenário me pareceu deslocado, fora de lugar. Poderia ser um grande movimento dos traidores, mas não era o último e se dependesse de mim o último movimento de Nikolai e Ivan seriam no inferno. Conforme a votação prosseguia, o resultado se tornava evidente: havia um empate. Sergei Volkov, Boris Petrov, e Alexei Sokolov votaram em Nikolai, enquanto outros capitães mais próximos a meu pai votaram nele. O equilíbrio era frágil, e agora tudo dependia do último voto. Dmitry Kozlov, o único a mesa que parecia possuir algum entendimento sobre a gravidade do que estava acontecendo ali, se levantou lentamente, seus olhos pesados enquanto observava meu pai. Ele era um homem de poucas palavras. Todos na sala o observavam, aguardando sua dec
Dias atuais... Donatella Romanova - 18 anos O silêncio na mansão Romanov era ensurdecedor, interrompido apenas pelo som distante dos passos suaves de Anastacia, minha mãe, atravessando o corredor como uma sombra. Ela apareceu à minha frente, seu rosto sem emoção, mas seus olhos brilhando com algo que eu não conseguia definir. Talvez fosse satisfação disfarçada, talvez fosse o alívio que ela vinha esperando por tanto tempo. — Donatella — ela disse, sua voz controlada, com uma tranquilidade quase perturbadora. — Seu pai... foi morto, na prisão. Eu senti meu estômago revirar, o chão parecia se desintegrar sob meus pés. As palavras dela caíram sobre mim como uma onda gélida. Uma dor forte me atingiu o peito, me fazendo curvar o corpo pra frente, em um movimento nada gracioso. — Mas não se preocupe — ela continuou, sem esperar uma resposta, enquanto atravessava a sala com a mesma elegância fria de sempre. — Nós estamos protegidas. Nikolai vai cuidar de tudo. — Ela tentou dar um