Roman Ostrov - 18 anos
O som abafado da prisão já havia se tornado um ruído familiar, quase um companheiro silencioso. O eco constante de vozes distantes, o ranger das camas de metal enferrujado e o silêncio pesado que preenchia as lacunas entre as paredes de concreto... tudo isso fazia parte do cenário que me envolvia. A cela, pequena e opressora, era o meu território agora. Ou, pelo menos, era assim que precisava pensar para manter a sanidade. Mas a cada dia que passava, a espera se tornava uma tortura lenta, o tique-taque invisível da minha paciência sendo corroído a cada segundo. Sabia que estava ali por um motivo maior — uma missão. Um alvo. Um teste. Mas mesmo com esse conhecimento, a incerteza e o tédio me consumiam como um fogo que queimava silenciosamente por dentro. Foi numa tarde cinzenta e claustrofóbica que a ligação chegou. Como um som dissonante no caos rotineiro da prisão, o guarda veio me chamar. Eu sabia, antes mesmo de pegar o telefone, que algo importante estava para acontecer. O olhar de curiosidade contida do guarda e a forma como seus passos ecoavam no corredor reforçavam essa certeza. Quando levei o telefone ao ouvido, a voz de Nikolai, fria e calculada, soou como um golpe no silêncio. — Roman — sua voz fluía como veneno. — O alvo ainda não foi preso. As palavras ecoaram na minha mente, rebatendo contra as paredes da cela imaginária que habitava dentro de mim. O alvo não estava aqui. O que significava que eu teria que esperar. Novamente. Uma mistura de frustração e alívio atravessou meu peito. A frustração, porque a missão estava incompleta e meu desejo de ação fervilhava. O alívio, porque cada momento adicional me permitia estudar o terreno, avaliar os jogadores, e me preparar melhor para o que estava por vir. — Aguarde — Nikolai continuou, sua voz impregnada com uma calma quase irritante. — A espera faz parte do teste. Sua paciência será recompensada. Mas lembre-se, Roman, a missão não é apenas eliminar o alvo. Sua sobrevivência aí dentro também é parte do que precisamos ver. Houve uma pausa, um momento em que quase pude imaginar o sorriso predatório surgindo em seu rosto, como o de um lobo que observa a presa lutando para se manter à tona. — Acha que consegue esperar? — a provocação em sua voz era clara, uma lâmina afiada que cortava o silêncio do outro lado da linha. Minhas mãos apertaram o telefone com força, os músculos dos meus braços tensos. Eu sabia que ele estava testando não apenas minha paciência, mas também minha determinação. — Sim, eu espero — respondi, minha voz firme, inabalável. — Ótimo — ele murmurou, satisfeito. — Continue sendo discreto. Ninguém pode saber quem você realmente é. Antes que eu pudesse responder, a linha ficou muda. Fiquei ali, parado, o telefone ainda colado ao meu ouvido, enquanto o barulho incessante da prisão retornava como um zumbido distante. Para Nikolai, tudo era um jogo. Cada movimento, cada decisão, uma peça no tabuleiro. Não havia espaço para fraquezas. Voltei para minha cela, com a mente alerta. A prisão não era apenas um lugar de confinamento; era um campo de batalha. E se eu quisesse sair dali com a aprovação da Bratva, teria que fazer muito mais do que eliminar o alvo. Eu precisaria sobreviver às ameaças invisíveis que cercavam cada canto daquele lugar. A noite caiu como um manto de sombras sobre a prisão, trazendo consigo uma tensão palpável. O ar estava denso, carregado de algo mais do que o usual cheiro de concreto úmido e corpos cansados. O velho que dividia a cela comigo — um homem de aparência frágil, com cabelos brancos e olhos cansados — permanecia sentado em seu canto, como sempre. Ele era um enigma, quieto e introspectivo, mas os olhares desconfiados que outros prisioneiros lhe lançavam eram suficientes para me fazer entender que algo estava para acontecer. Rumores percorriam os corredores. Sussurros de que ele tinha ligações com a Bratva. E, em um lugar como aquele, isso era tudo o que bastava para torná-lo um alvo. Naquela noite, a tensão explodiu. Eu estava deitado na cama de metal, o colchão fino e desconfortável mal amortecendo o peso do meu corpo. Observava o velho no canto, seus olhos perdidos no chão, quando ouvi os passos ecoando pelo corredor. Era um som ritmado, pesado, como uma tempestade iminente. Um grupo de três homens apareceu na porta da cela. Eles eram brutamontes — grandes, brutais, o tipo de prisioneiro que todos evitavam. A malícia em seus olhos era evidente, assim como o ódio que exalavam. — Então é verdade... — um deles murmurou, seus olhos fixos no velho. — Um Bratva aqui, no meio de nós. Achou que podia se esconder, velho? O velho não se moveu. Seu corpo permaneceu imóvel, mas seus punhos se apertaram levemente. Era como se estivesse preparado para o que estava por vir, como se tivesse visto aquilo antes, inúmeras vezes. Mas os brutamontes não enxergavam o que eu via. Para eles, ele era apenas um homem frágil, com cabelo branco e uma postura curvada. Presa fácil. — Você e sua máfia russa acham que ainda mandam aqui, não é? — provocou outro dos homens, sua risada cortante e áspera. — Este lugar não pertence mais a vocês. Com um gesto brusco, o primeiro deles abriu a grade da cela, o metal rangendo como um aviso sinistro. Eu me levantei lentamente, minha mente já traçando os próximos movimentos. Sabia que, se eles atacassem, eu teria que intervir. Se o velho fosse, de fato, um Bratva, eu teria que protegê-lo. A irmandade exigia lealdade. O primeiro homem avançou, tentando agarrar o velho pelo colarinho. Mas, para surpresa dele, o velho se moveu com a agilidade de um homem muito mais jovem. Ele desviou do golpe, empurrando o agressor com uma força inesperada. O homem tropeçou, desequilibrado. Os outros dois hesitaram por um momento, atônitos com a reação. Mas isso não durou muito. Os três se lançaram sobre o velho, suas intenções claras. Ele se defendia com habilidade, seus movimentos precisos, mas eles eram muitos, e ele estava em desvantagem numérica. Um soco acertou o rosto do velho, e vi o sangue escorrer de seu lábio. Foi nesse momento que decidi agir. Com a rapidez de um predador, saltei sobre o segundo agressor. Meu cotovelo encontrou a lateral de seu rosto, e ele desabou no chão com um grunhido de dor. O terceiro tentou agarrar-me pelas costas, mas eu já havia sacado a faca que mantinha escondida. Com um movimento ágil, cravei a lâmina em sua costela, sentindo o calor do sangue se espalhar pela minha mão. O primeiro agressor, furioso, avançou novamente, mas ele era lento e desajeitado pela raiva. Desviei de seu golpe e o acertei com um soco certeiro na garganta, cortando sua respiração. Ele caiu de joelhos, as mãos agarrando-se desesperadamente ao pescoço. Antes que pudesse se recuperar, o acertei de novo, desta vez no coração. Ele desabou, sem vida. O último tentou fugir, mas o velho, com uma força que desmentia sua idade, o alcançou. Um soco brutal na mandíbula o derrubou no chão, e, sem hesitar, cravei a faca em sua garganta. O sangue jorrou, e a vida se esvaiu de seus olhos em segundos. A cela ficou em silêncio, o ar pesado com o cheiro de ferro e morte.Dias atuais... Roman Ostrov – 28 anos O tempo dentro das paredes frias da prisão havia me moldado de formas que eu jamais poderia prever. Dez anos. Dez longos anos desde que entrei aqui com uma única missão. Mas, ao longo desses anos, aprendi que o verdadeiro poder não reside apenas em sobreviver, mas em dominar. E foi exatamente isso que fiz. Ao lado do velho, que no início todos subestimavam, nos tornamos os senhores desse lugar infernal. O velho, com sua sabedoria acumulada por décadas de experiência nas sombras da Bratva, e eu, com minha juventude e ambição, fizemos da prisão o nosso império. Os guardas nos respeitavam — ou, mais frequentemente, nos temiam. E os prisioneiros, antes desorganizados e violentos, agora se reportavam a nós como soldados fiéis. Sob o comando do velho e minha liderança emergente, controlávamos o tráfico, o contrabando, e cada negócio que movia poder e dinheiro atrás dessas grades. Para muitos, essa prisão era um pesadelo; para nós, era um reino. M
Roman Ostrov O telefone tocou uma vez. O som ecoou pela cela como um presságio. Quando atendi, a voz fria e metódica de Nikolai me atingiu com a mesma precisão de sempre. — O alvo chegou — ele disse, sem rodeios. — Está em uma cela isolada. Chegou o momento de provar sua lealdade ao conselho. Eu ouvi em silêncio, deixando que suas palavras mergulhassem na minha mente. Tinha esperado por esse momento por muito tempo, mas agora, as circunstâncias eram diferentes. Não era apenas o Roman que entrou nessa prisão anos atrás. Muito havia mudado. — Cumprirei a missão, como me foi ordenado — respondi, minha voz calma, controlada. Desliguei o telefone e fiquei em silêncio por alguns instantes. Eu tinha uma nova missão, uma tarefa que deveria provar minha lealdade à Bratva diante do conselho. Mas havia algo que eles não sabiam, algo que eu guardaria em segredo por enquanto. Antes de ser iniciado formalmente, antes de fazer o juramento "Pelo Sangue e Pela Bratva", eu já havia me pr
Roman Ostrov Olhei em volta, estudando o estado da cela. As roupas do homem estavam sujas e rasgadas, indicando que houve uma luta antes de sua morte. Então, algo chamou minha atenção. Uma tatuagem no peito do homem, parcialmente coberta pelo sangue. Uma águia... usando uma coroa. Meus olhos se arregalaram enquanto a realidade me atingia como um golpe bem cravado no coração. Aquele homem... não era apenas o alvo. Ele era o chefe da Bratva. A águia coroada era um símbolo sagrado, reservado apenas para o líder supremo. A revelação me fez cambalear para trás, o coração disparado no peito. Um turbilhão de pensamentos inundou minha mente. Nikolai e meu pai, Ivan, não estavam testando minha lealdade... eles estavam conspirando contra a Bratva. Por isso eu nunca fui apresentado à cúpula da organização. Por isso, meu juramento de lealdade havia sido adiado por tanto tempo. Eles não queriam que eu soubesse a verdade, que eu entendesse a profundidade de sua traição. Eles queriam que
Roman Ostrov Houve um burburinho entre os capitães presentes. Olhei em volta, ainda amarrado e mudo, mas pude perceber os rostos de homens que nunca tinha visto pessoalmente, mas cujas reputações os precediam. Estes eram os homens mais poderosos da Bratva, cada um com um território e uma legião de seguidores leais. Nikolai fez questão de apresentar todos eles, mas os seus nomes já haviam sido citados na prisão, assim como os seus feitos. Sergei Volkov, Capitão de São Petersburgo, era um homem de meia-idade, corpulento e com olhos frios e calculadores. Ele estava sentado com os braços cruzados, seus dedos acariciando distraidamente a tatuagem de uma caveira em sua mão. Ao seu lado, Dmitry Kozlov, o líder brutal de uma das maiores facções de Moscou, observava Ivan com desconfiança. Dmitry era conhecido por ser impiedoso, seus olhos eram como punhais, sempre prontos para perfurar quem se metesse em seu caminho. No canto mais distante da mesa, Boris Petrov, um homem magro e de ol
Roman Ostrov Os capitães se entreolharam, e a votação começou. As vozes eram graves, cada uma carregando o peso de decisões que mudariam o futuro da Bratva. Eu observava tudo, na prisão eu aprendi muito, aprendi a ler o jogo por inteiro, e tudo naquele cenário me pareceu deslocado, fora de lugar. Poderia ser um grande movimento dos traidores, mas não era o último e se dependesse de mim o último movimento de Nikolai e Ivan seriam no inferno. Conforme a votação prosseguia, o resultado se tornava evidente: havia um empate. Sergei Volkov, Boris Petrov, e Alexei Sokolov votaram em Nikolai, enquanto outros capitães mais próximos a meu pai votaram nele. O equilíbrio era frágil, e agora tudo dependia do último voto. Dmitry Kozlov, o único a mesa que parecia possuir algum entendimento sobre a gravidade do que estava acontecendo ali, se levantou lentamente, seus olhos pesados enquanto observava meu pai. Ele era um homem de poucas palavras. Todos na sala o observavam, aguardando sua dec
Dias atuais... Donatella Romanova - 18 anos O silêncio na mansão Romanov era ensurdecedor, interrompido apenas pelo som distante dos passos suaves de Anastacia, minha mãe, atravessando o corredor como uma sombra. Ela apareceu à minha frente, seu rosto sem emoção, mas seus olhos brilhando com algo que eu não conseguia definir. Talvez fosse satisfação disfarçada, talvez fosse o alívio que ela vinha esperando por tanto tempo. — Donatella — ela disse, sua voz controlada, com uma tranquilidade quase perturbadora. — Seu pai... foi morto, na prisão. Eu senti meu estômago revirar, o chão parecia se desintegrar sob meus pés. As palavras dela caíram sobre mim como uma onda gélida. Uma dor forte me atingiu o peito, me fazendo curvar o corpo pra frente, em um movimento nada gracioso. — Mas não se preocupe — ela continuou, sem esperar uma resposta, enquanto atravessava a sala com a mesma elegância fria de sempre. — Nós estamos protegidas. Nikolai vai cuidar de tudo. — Ela tentou dar um
Roman Ostrov A reunião terminou, mas o peso dos olhares dos outros capitães permaneceu cravado em mim enquanto eu saía do prédio. Aqueles homens, que haviam dado suas vidas à Bratva, me encaravam como se eu fosse uma incógnita, um mistério que não conseguiam decifrar. Achavam que eu não pertencia a esse mundo? Eles não podiam estar mais enganados. Dmitry foi o único que teve coragem de me cumprimentar. Seus olhos, embora tranquilos, carregavam uma mensagem sutil. Ele sabia algo. Provavelmente, informações sobre o Sistema Prisional Russo, o suficiente para entender que eu, Roman Ostrov, jamais cometeria o erro de matar o chefe supremo da Bratva por engano. O seu gesto discreto confirmava o que eu já suspeitava — ele sabia que havia mais nessa história do que os outros imaginavam. No carro, a volta para casa se desenrolava em um silêncio pesado. Ivan Ostrov, ao meu lado, parecia perdido nos labirintos de seus próprios pensamentos. Eu, por outro lado, mantinha meus olhos fixos na escur
Donatella Romanova Era madrugada quando fui acordada por um som distante, abafado, que no começo achei ser parte de algum sonho. Mas, conforme minha mente saía do torpor, os barulhos se tornaram mais claros, mais reais. Tiros. Muitos tiros. Meu coração disparou, e me sentei na cama, atordoada, tentando entender o que estava acontecendo. A mansão, normalmente envolta em silêncio, agora parecia um campo de batalha. Meus pensamentos corriam, confusos e desorientados, mas uma coisa era clara: estávamos sob ataque. Levantei-me da cama de um salto, meus pés descalços tocando o chão frio enquanto tentava chegar à porta, mas antes que eu pudesse sequer fazer algo, a porta do meu quarto foi arrombada com um estrondo que fez todo o meu corpo tremer. Três homens vestidos de preto, armados e com o rosto coberto, invadiram o quarto. Antes que eu pudesse reagir, senti uma mão áspera agarrando meus cabelos com brutalidade, puxando-me de volta. — Não! — Gritei, lutando contra o aperto fero