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6 - O Começo do Fim

Donatella Romanova - 8 anos

 Já faz meses que papai anda doente. Os médicos, figuras de jaleco branco e olhares clínicos, insistem que seu coração está fraco. Mas minha mãe, Anastacia, tem pouco tempo e menos paciência para as explicações desses homens. "Seu coração é fraco demais para liderar a Bratva," ela diz, sua voz cortante como uma lâmina de gelo. As palavras dela, tão cheias de desprezo, reverberam em minha mente como um eco perturbador. Há uma verdade amarga nelas, uma verdade que me incomoda profundamente, mesmo que eu não entenda completamente o que isso significa. Papai, o homem outrora temido por todos, não é mais o mesmo.

 Ele está mais frágil, suas mãos tremem, seus passos são mais lentos. Até as surras que costumavam ecoar pelas paredes da mansão pararam. Era estranho não ouvir mais o som das cintas, dos gritos abafados e dos olhos suplicantes. Eu sabia, no fundo do meu coração, que ele estava fraco demais até para impor sua fúria sobre as desobediências de minha mãe.

 Ainda assim, ele se recusa a ceder ao inevitável. Ele tenta, com todas as forças que restam, manter as aparências. Sua postura ereta, os olhares desafiadores e as ordens gritadas... mas seus olhos não mentem. Aqueles olhos, antes tão firmes e aterradores, agora estão carregados de sombras. Cada vez que olho para eles, vejo o medo se instalando. Ele está perdendo o controle, e ele sabe disso.

 Uma tarde fria, enquanto eu brincava no jardim da mansão — as folhas secas caindo ao meu redor, a brisa gelada que prenunciava o fim do outono —, papai me chamou. Sua voz, embora mais fraca, ainda carregava aquela nota de comando que fazia com que todos ao redor se calassem imediatamente.

 — Donatella — ele chamou, com um sorriso que parecia mais uma tentativa de esconder a dor. — Quero que venha comigo. Vamos viajar, apenas nós dois.

 Fiquei surpresa. Papai nunca me chamava para ir com ele em viagens. Meu coração, tão acostumado a temer sua presença, acelerou de empolgação. Talvez, pela primeira vez em muito tempo, ele estivesse querendo passar tempo comigo. Sem pensar duas vezes, assenti. Eu ansiava por aquele momento, pela chance de ter o meu pai para mim, sem as sombras da Bratva nos rodeando.

 A viagem seria para uma casa isolada, longe dos olhos vigilantes da mansão, longe das tensões que pairavam sobre nosso lar como uma nuvem de tempestade. Na minha cabeça, imaginei uma aventura — talvez seria como os dias de antes, quando ele era o herói da minha infância.

 A estrada que cortava a vasta paisagem russa era interminável. O carro avançava em silêncio, enquanto as árvores nuas passavam como borrões sombrios. A escolta, sempre presente, nos seguia a uma distância segura. Eu olhava pela janela, o céu cinzento refletindo a inquietação que sempre senti ao lado de papai.

 Mas então, algo mudou.

 A escolta, que sempre nos seguia como sombras inabaláveis, começou a desaparecer. Primeiro, os carros começaram a se afastar. E, em minutos, simplesmente não estavam mais lá. Papai notou antes de mim. Sua expressão mudou, os lábios se apertaram, o semblante que antes se esforçava para manter a serenidade agora estava tomado por uma nuvem de preocupação. Ele murmurou algo em russo, algo que não consegui entender.

 — Papai? — perguntei, com a voz trêmula de medo. — Onde estão os outros?

 Ele não respondeu de imediato. Seus olhos, que antes carregavam uma autoridade inquestionável, agora estavam cheios de tensão. Suas mãos, aquelas mesmas que tantas vezes seguraram o poder da Bratva, estavam trêmulas sobre o volante.

 De repente, o som estridente de sirenes rasgou o silêncio da estrada.

 Meu coração disparou. O som era crescente, as luzes vermelhas e azuis piscavam no retrovisor como presságios. Papai praguejou, as palavras saindo com veneno enquanto apertava o volante com força.

 — Segure-se, Donatella — ele ordenou, sua voz carregada de uma urgência que eu nunca havia ouvido antes.

 Mesmo doente, mesmo frágil, meu pai acelerou o carro. O motor rugiu enquanto a paisagem ao nosso redor se transformava em um borrão. A perseguição começou. O asfalto diante de nós se esticava como uma serpente traiçoeira, e eu mal conseguia respirar. Olhei para ele — o suor escorria por sua testa, seu rosto estava pálido, mas a determinação em seus olhos era aterradora.

 As curvas da estrada se tornaram mais fechadas, perigosas. Mas ele não diminuía a velocidade. Sabia que, se fosse capturado, não haveria volta. Seu corpo mal conseguia aguentar, sua respiração era pesada, cada suspiro uma batalha. Mas ele se recusava a parar. Era um líder até o último instante. Os carros da polícia começavam a se afastar, mas o esforço estava cobrando seu preço.

 Após o que pareceu uma eternidade, conseguimos despistá-los. Papai desacelerou, estacionando o carro em uma clareira isolada. O vento soprava entre as árvores, o único som além do motor do carro que começava a esfriar. Ele respirava com dificuldade, o rosto pálido como um cadáver.

 — Papai... — murmurei, a preocupação crescendo dentro de mim.

 Ele ergueu a mão, pedindo silêncio. Seus olhos estavam fechados, sua respiração ofegante. Ficamos assim por longos minutos, até que ele finalmente conseguiu recuperar o fôlego. Mas quando abriu os olhos, não havia alívio — apenas uma fúria fria, cortante.

 — Vamos voltar para casa — ele disse, sua voz tão gelada quanto a noite que caía ao nosso redor. — Isso não vai ficar assim.

 Pegou o telefone com mãos ainda trêmulas, mas sua determinação era inquebrável. Ele discou rapidamente, o som do sinal chamando reverberava no silêncio da clareira. Fiquei observando, ainda tremendo pela perseguição, mas o medo foi lentamente substituído pela admiração. Mesmo à beira da morte, ele ainda era o chefe. Ainda era meu pai.

 — Nikolai — ele rosnou, quando a ligação foi atendida. Sua voz era rouca, desgastada pela corrida, mas ainda carregava o peso de um líder. — Fomos traídos.

 Do outro lado, pude ouvir a voz abafada de Nikolai, tentando explicar, justificar. Mas papai não o deixou falar.

 — Eu não me importo com suas desculpas — ele interrompeu, a voz endurecida pela fúria. — Quem quer que tenha nos traído, eu quero essa pessoa morta. Não importa o custo.

 Houve uma breve pausa. A mão de papai apertou o volante com tanta força que os nós dos dedos ficaram brancos.

 — Enquanto eu estiver vivo, Nikolai, essa cadeira ainda é minha. A Bratva ainda é minha. E enquanto minha esposa e minha filha respirarem, essa cadeira continuará pertencendo a um Romanov.

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