Livros Antigos

O quarto estava mergulhado em um silêncio que parecia pesar tanto quanto o livro que eu segurava. A capa de couro preto, lisa e sem adornos, repousava fria contra minhas mãos. Ivy e Logan haviam recuperado este e outros volumes da antiga casa da minha família, resgatados de um cofre que por anos esteve fora do meu alcance. Agora, eu o tinha comigo, mas ao mesmo tempo, parecia que as respostas que buscava estavam tão distantes quanto sempre estiveram.

Respirei fundo e abri o livro. O cheiro de papel antigo, mesclado ao couro envelhecido, trouxe uma estranha familiaridade, um eco de algo que nunca conheci de verdade. A caligrafia fluía em latim, um idioma que até pouco tempo eu seria incapaz de decifrar. Mas agora...

As palavras não apenas faziam sentido — elas ressoavam em mim. Era como se cada frase despertasse memórias adormecidas, como se aquele conhecimento estivesse gravado em meu DNA. Li devagar, saboreando cada linha, cada conceito. A escrita abordava magia ancestral, feitiços complexos e, o mais perturbador, os custos para manipular tais forças.

Foi então que cheguei a uma seção que congelou o ar ao meu redor: "Consequências das Distorsões Temporais."

As palavras eram uma advertência. Saltos no tempo, dizia o texto, não eram apenas perigosos. Eram quase sempre catastróficos. Manipular o tempo era lidar com forças além da compreensão humana, forçando o universo a dobrar-se de formas que ele não fora feito para suportar. As histórias descritas eram assustadoras: bruxos que tentaram alterar o passado e acabaram apagados da existência; outros que retornaram de suas viagens trazendo horrores indescritíveis, sombras vivas que os consumiram.

Fechei o livro por um instante, o peso daquelas palavras pressionando meu peito. Não pude evitar lembrar o que o Sanguináculum havia me contado antes: minha mãe era uma bruxa que fazia saltos temporais. Era isso que ela escondia de mim? Sempre me perguntei por que ela parecia tão distante, sempre envolta em segredos. Agora, tudo fazia um sentido terrível e inevitável.

"Será que posso fazer o mesmo?"

A pergunta pairou no ar, inquietante. Voltei ao livro, virando as páginas com mais cautela. E foi então que percebi: algo estava errado.

Uma seção estava fora de ordem. O texto seguia de forma fluida até a página 70, mas depois saltava abruptamente para a 75. As páginas intermediárias estavam coladas, quase como se alguém houvesse intencionalmente ocultado o conteúdo. Franzi o cenho, passando os dedos pelas bordas unidas. A textura do papel parecia diferente ali, mais áspera, como se houvesse marcas ou rabiscos entre as folhas.

Segurei a respiração enquanto tentava separá-las, mas o material era antigo e frágil. Qualquer esforço adicional poderia destruí-las por completo. Recuei, frustrada, sentindo uma mistura de curiosidade e temor.

"O que minha mãe queria esconder aqui?"

Meus pensamentos vagaram. Quem teria colado essas páginas? Foi minha mãe ou alguém que queria apagar sua história? Observei o livro, analisando as margens das folhas, mas não encontrei nada que pudesse me ajudar a desvendar o mistério. Ainda assim, a presença daquela lacuna era perturbadora, como se escondesse algo que não deveria ser conhecido.

Larguei o livro no colo e passei uma mão pelos cabelos, tentando organizar as ideias. As advertências do texto sobre as consequências temporais voltaram à minha mente. O preço de manipular o tempo não era apenas alto; era irreversível.

As palavras ainda ecoavam: "O que foi feito não pode ser desfeito."

A verdade dessas palavras doía. Não importa o quanto eu quisesse corrigir o passado, trazer Dylan de volta, nada poderia apagar as escolhas que haviam sido feitas. Ainda assim, algo dentro de mim se recusava a aceitar.

O Sanguináculum tinha sido claro sobre minha mãe. Ela era uma bruxa de saltos temporais, uma feiticeira capaz de dobrar o tempo à sua vontade. E se ela pôde fazer isso, talvez eu também pudesse.

Olhei para o cofre vazio no canto do quarto. Ele tinha sido apenas um recipiente, uma barreira entre mim e o legado que agora pulsava à minha volta. Os livros, os feitiços, tudo parecia convergir para um único ponto. Não era apenas sobre magia. Era sobre quem eu era — ou quem eu poderia me tornar.

Voltei a encarar as páginas coladas. Sentia uma urgência latente, uma certeza de que as respostas que buscava estavam ali, trancadas dentro daquelas folhas. Mas algo também me dizia que não estava pronta para isso. Não ainda.

Fechei o livro com cuidado e o coloquei de lado. Deitei-me na cama, encarando o teto, enquanto minha mente corria. As histórias de minha mãe eram claras agora: ela sabia coisas que nunca compartilhou comigo, provavelmente tentando me proteger. Mas agora eu entendia que, ao esconder o passado, ela havia me deixado vulnerável ao presente.

Se eu realmente queria respostas, teria que enfrentá-las por completo. Não apenas nos livros, mas dentro de mim. O que quer que estivesse escondido ali, entre aquelas páginas ou no meu próprio sangue, seria a chave para o futuro que eu desejava — ou para a destruição total do que restava de mim.

Ainda assim, mesmo com todo o medo, uma pergunta me consumia: "Até onde eu estaria disposta a ir para trazê-lo de volta?"

(...)

Passei a noite imersa nas páginas, como se cada palavra escrita ali tivesse o poder de me prender em um transe. Quando finalmente ergui os olhos, o mundo parecia distante, como se estivesse assistindo a tudo por trás de uma vidraça embaçada. O cheiro inconfundível de café fresco invadiu o quarto, rompendo o torpor que me envolvia.

Leves batidas na porta me trouxeram de volta à realidade, seguidas pelo som da madeira se abrindo lentamente. Ivy entrou hesitante, seu rosto ainda carregando a sombra de uma mágoa que parecia se perpetuar entre nós.

— Logan fez o café da manhã — disse ela, sua voz calma, mas contida. — Ele pediu para te chamar.

Demorei alguns segundos para processar suas palavras antes de olhar para o relógio na parede. O ponteiro marcava 8:30 da manhã. Passei a mão pelo rosto, tentando afastar o cansaço acumulado pela noite em claro.

— Já é de manhã? — murmurei, mais para mim mesma.

Ivy permaneceu onde estava, perto da porta, sua postura tensa, como se estivesse decidindo se deveria dizer mais alguma coisa ou simplesmente sair.

— Ivy, espera. — Minha voz soou mais rouca do que eu esperava.

Ela parou, mas não se virou. Respirei fundo e continuei:

— Me desculpe. Por como te tratei. — Minha garganta parecia apertada enquanto eu falava. — As coisas... as coisas estão confusas de um jeito horrível desde que Dylan se foi.

Ela finalmente se virou, seus olhos encontrando os meus. Eles estavam cheios de algo que eu não conseguia decifrar completamente — dor, cansaço, talvez até um toque de resignação.

— Eu perdi tudo, Violet. — Sua voz tremia levemente. — Minha alcatéia, meu lar. Agora sou obrigada a viver aqui, com Logan, em um lugar que nunca será meu.

Cada palavra era como uma faca, cortando-me com sua honestidade crua.

— Nem mesmo Alaric está aqui. Sinto falta dos meus. Até mesmo dos lobos que me desprezavam. Pelo menos eles eram familiares. — Ela riu amargamente, um som sem alegria que parecia aumentar o peso no meu peito.

Uma onda de culpa e empatia me atravessou. Ivy suspirou profundamente antes de continuar:

— Tudo o que eu conhecia foi tomado de mim. E agora... agora o rei alfa decidiu que Logan e eu devemos nos casar.

Demorei um momento para compreender o que ela havia acabado de dizer. Levantei-me tão rápido que quase derrubei o livro no chão.

— O quê? Isso é impossível! Lobos só podem casar depois do ritual, quando a Chama Sagrada escolhe o par.

Ivy deu um sorriso amargo, olhando para o chão.

— Isso seria verdade... se eu ainda pudesse passar pelo ritual. — Sua voz ficou baixa, quase inaudível. — Mas isso nunca será uma opção para mim. Não depois do que ele fez.

Foi como se algo dentro de mim tivesse sido incendiado. Ela não precisava dizer o nome. O "ele" era Eric, o monstro que a havia violado durante o ataque de Caleb à nossa alcatéia. Era uma lembrança que eu gostaria de apagar, mas sabia que jamais a deixaria.

— Ivy... — tentei falar, mas ela ergueu a mão, interrompendo-me.

— Não é só isso, Violet. Logan... ele não é um lobo comum. Todos da família real parecem temê-lo. Até agora, eu nunca o vi em sua forma de lobo. Algo nele é... errado. Como se houvesse algo demoníaco dentro dele.

Seu tom era sombrio, carregado de uma verdade que ela parecia ter medo de verbalizar completamente. Meus pensamentos voltaram ao Sanguináculum e aos trechos que falavam sobre possessões demoníacas em lobos e sobre criaturas sobrenaturais que conseguiam abrigar demônios dentro de si, substituindo sua alma. A possibilidade me deixou inquieta.

— Você não precisa fazer isso. — Minha voz saiu mais firme do que eu esperava. — Você pode ficar aqui, comigo. Eu vou te proteger. Vou esconder você.

Ivy riu baixinho, mas não havia humor em seu riso.

— Violet, não se meta no caminho de um rei alfa. Eles não são apenas poderosos. Eles são implacáveis.

Ela se virou para sair, mas o peso de suas palavras permaneceu no ar. Suspirei profundamente, sentindo um nó se formar em meu estômago. Como eu poderia salvá-la dessa situação? E, mais importante, o que exatamente Logan escondia por trás de sua fachada impenetrável?

Enquanto a porta se fechava atrás dela, meu olhar voltou para o livro ao meu lado. Eu precisaria encontrar respostas — e rápido. Porque, de uma forma ou de outra, eu sabia que o tempo estava contra nós.

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