A CASA
Eles entraram na rua Dr. Sales e foram direto para a casa de Fernando. Fazendo o mesmo esquema. Assim que chegaram, deixaram suas bicicletas ao lado e pegaram a chave secreta novamente.
— Não ligue a luz. Não vamos chamar atenção. — Fogueira disse, quando Esther já estava prestes a acionar o botão da luz da sala. — Vamos usar a lanterna do celular.
— Ah! Que burra eu sou... Está bem. — Esther respondeu, puxando seu celular do bolso e ligando a lanterna.A casa estava muito escura, mas nada que pudesse limitar a locomoção deles.— Eu não estou vendo estas caixas. — Esther disse para Fogueira, olhando para todos os cantos.— Talvez esteja no porão. — Ele sugeriu, indo até à cozinha.— Esther. Vem aqui! — Ele completou. Sua voz saiu firme e séria.— O que foi? — Ela chegou atrás dele, receosa.— Há galões com gasolina. São mais de trinta litros. — Ele falou, iluminando os galões que estavam pelo chão.— Para quê tanta gCORES RARAS - Magno NovaesIndependentemente da quantidade de livros e enciclopédias que Esther Ferreira leia, nenhum parece ter a resposta para quem ela realmente é e qual sua verdadeira influência neste mundo. Uma incessante busca para compreender por que chegou a este mundo do jeito que chegou a consome, mergulhando-a em um mar de incertezas. Ainda assim, entre todos da família, Esther sempre foi a mais entusiasmada. Apesar das inseguranças sobre os eventos em sua vida, mantinha-se firme graças à fé, esperança e uma positividade inabalável. Contudo, frequentemente sentia-se à beira de um abismo. Jéssica Ferreira, sua mãe, acreditava — mesmo sem ser psicóloga — que essa angústia de Esther era apenas um efeito de sua tumultuada adolescência. A "garotinha" estava a um passo de seus dezoito anos, dezoito primaveras peculiares aos olhos de Esther. Desde a mudança de sua família para Monteiro oito anos atrás, Esther passou a questionar ações e comportamentos que, para muitos, pareciam
CORES RARAS por Magno Novaes, 2017 - 2021 - TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. Não importa quantos livros e enciclopédias, Esther Ferreira leia, nenhum deles tem a resposta de quem de fato ela é, e qual a influência dela, neste mundo. Uma verdadeira febre por saber por quê ela veio ao mundo da forma que viera, a consumia vorazmente, fazendo-a se afundar em um rio denso de dúvidas. Entretanto, a garota sempre se mostrou ser a mais entusiasta da família, e ainda que se sentisse receosa quanto a tudo o que acontecia consigo mesma, tinha fé, esperança e uma positividade corpulenta que a mantinha em ordem, mas mesmo assim parecia estar estreitamente a ponta de um precipício. Sua mãe, Jéssica Ferreira, achava. — Ainda que ela não fosse psicóloga por título. — Que esta dúvida ex
VOLTA ÀS AULAS — Ouro ou prata? — Sua mãe indagou, ao vê-la descer pelas escadas. — Que diferença faz, mãe? — Esther disse em indagação, saltando dos dois últimos degraus e aterrissando na frente dela. — Você sabe muito bem que logo irá se formar e como tradição, todos usarão um anel de formatura. — Ela disse aquilo com aquela cara de quem pensava: seja normal pelo menos uma vez na vida, e isto, Esther definitivamente não se preocupava em ser. — Essa tradição está um pouco ultrapassada, não acha? — Esther murmurou, se agachando e amarrando o cadarço do seu sapato, que saltava para fora, o mesmo que havia ganhado de sua avó antes de se mudar de cidade. A garota puxou a revista que sua mãe ti
O que mais impressionava Esther nas pessoas em geral era o modo como acreditavam que as coisas eram tecnicamente impossíveis. Seria nossa sociedade, impressionada com as injustiças, desforras políticas, mentiras e ilusões dos maioritários que a tornava assim? Visto que nascemos em um lugar, ainda que este não mostre perspectiva de vida, ou nos apoiem de maneira realista e positiva, o que define nosso “possível” não é o mundo ao nosso redor, senão nossa capacidade de vê-lo em profundidade, muito além da camada grossa que criamos em nosso campo de visão. Ainda que Esther vivesse uma vida tranquila e absolutamente normal com sua deficiência, ela não perdia as esperanças de um dia poder ver o mundo colorido. Pelo menos esse desejo
Esther gostava de sair e pedalar um pouco, de modo a refrescar a mente. Era uma espécie de meditação sobre rodas. Naquele dia ela pedalou para longe. Foi em direção ao bairro onde Fernando Rebouças morava com seus pais, e coincidentemente encontrou o pai dele. Denis Rebouças naquele exato momento, estava sendo expulso de um bar de esquina por dois homens grandalhões. Suas roupas surradas e sujas pareciam dizer que ele bebia há dias. Ele estava aparentemente embriagado naquele momento. Esther não pensou duas vezes e foi ao encontro do homem, que trocava as pernas ao caminhar. — Senhor Rebouças. — Ela disse, enquanto se aproximava do homem. O cheiro poderia ser sentido de longe. Ele havia realmente bebido. D
Você deve estar se perguntando como uma garota que não enxerga cores, principalmente as dos sinais de trânsito, pode dirigir? E a resposta está no sistema em que a mãe de Esther instalou no carro, que narra em tempo real, placas e sinais de trânsito. É a inteligência artificial contribuindo para a inclusão. Frente a sorveteria em que Elis e Esther marcaram o encontro, estava praticamente sem vagas para carros, o que a fez estacionar o automóvel uma rua antes. Esther saiu do carro, ativou o alarme do mesmo e caminhou devagar pela rua, enquanto observava as pessoas. Aquele finalzinho de tarde tinha um brilho diferente. Pessoas sorriam sem esforço. Romances no banco da pracinha ao lado, pareciam se multiplicar. Cães e gatos se entendendo... Curioso. A primavera realmente era uma estação mágica.
DOMINGO É DIA DE FUTEBOL O dia de domingo para Esther era um pouco entediante. Principalmente quando seu pai a chamava para ajudar no campo de treinamento esportivo. Na verdade, ela não fazia muita coisa não. Eram os garotos que tinham que suar a camisa. Não que a maioria gostasse de fazer isso, pois geralmente eles costumavam tirá-la durante as partidas. Domingo de manhã, Esther estava disponível para seu pai. À tarde, estava disponível para a sua mãe e à noite, saíam os três para completar o domingo. Esther engoliu com pressa a última fatia de sanduíche, quando seu pai entrou pela porta da cozinha. — Terminou seu lanche? — Ele indagou, colocando a mochila em cima da mesa. Raul estava vestindo uma camisa regat
Esther terminava de arrumar sua cama quando a sua mãe a gritou, empolgada com algo. Ela correu do quarto, um pouco apressada e apreensiva, chegando à sala. Uma coisa era verdadeira: sua mãe era boa em dar sustos falsos. — Mãe. O que foi? — Ela perguntou, quando a avistou ali mesmo do corredor que dava acesso à sala. Jéssica estava sentada à mesa, lendo um e-mail no computador. Seus óculos na ponta do nariz e sua xícara sobre a mesa à esquerda, indicavam que ela estava em seu dia de pesquisas, a qual ocorria a cada final de mês. — Eu recebi uma proposta para um projeto! — Ela disse, saindo da frente do computador e indo em direção a Esther, dando-lhe um abraço forte que retirou o ar dos seus pulmões.<