O que mais impressionava Esther nas pessoas em geral era o modo como acreditavam que as coisas eram tecnicamente impossíveis.
Seria nossa sociedade, impressionada com as injustiças, desforras políticas, mentiras e ilusões dos maioritários que a tornava assim?
Visto que nascemos em um lugar, ainda que este não mostre perspectiva de vida, ou nos apoiem de maneira realista e positiva, o que define nosso “possível” não é o mundo ao nosso redor, senão nossa capacidade de vê-lo em profundidade, muito além da camada grossa que criamos em nosso campo de visão.
Ainda que Esther vivesse uma vida tranquila e absolutamente normal com sua deficiência, ela não perdia as esperanças de um dia poder ver o mundo colorido. Pelo menos esse desejo caminhava ao lado dela desde quando ela era criança.
Há um ano, foi divulgado um teste experimental que poderia reverter a condição da acromatopsia, e é claro, ela apostou todas as suas crenças nesse possível tratamento.
Seus pais decidiram então buscar ajuda com um profissional, de modo a saber se ela estava apta para fazer o procedimento. Eles começaram então a se encaminhar durante alguns finais de semana até o consultório médico da Dra. Cecília, na cidade vizinha.
Era duro, mas absolutamente necessário.
A garota foi alertada antes de tudo, que precisaria de um milagre para continuar, e claro, ela fez o melhor para expressá-lo.
O que muitos talvez não soubessem era que, orar em busca de um milagre é dizer escandalosamente para o mundo que você não vê o possível, por outro lado, aciona um sentimento puro de crença no improvável, e certamente obteria respostas. Entretanto, a base lógica de cada milagre está no que você sabe sobre ele. Se você tem a consciência que as coisas são impossíveis, certamente seu milagre é só um esboço em anseio, mas quando você manifesta a consciência de que tem o impossível em suas mãos, todo milagre é manifestado. Contudo, as pessoas também deveriam saber que, se seus pulmões processam o oxigênio para seu sangue, seu magnífico coração bombeia sangue e seu sistema nervoso sente o universo a sua volta, esta é a prova mais inquietante de que milagres são possíveis.
A Dra. Cecília era uma renomada oftalmologista do país. Em uma pesquisa mais avançada da ciência, descobriu que seria possível, através de um delicado processo biogenético, que Esther voltasse a enxergar pelo menos noventa por cento de cor. As chances de sucesso eram de um em dois mil. O que não desanimou a família nem um pouquinho.
É claro que o procedimento era delicado, e qualquer erro poderia piorar ainda mais o problema, ou deixá-la totalmente na escuridão.
Quando você descobre que pode mudar um fato em sua vida, como este que Esther estava prestes a receber, involuntariamente sua consciência começa a sugerir questões do tipo; "isso realmente é necessário?", "você está pronto para isso?", "quais são as consequências." Ora, isso era apenas o medo que ela sentia. Esther precisava expeli-los para continuar com o que era preciso, se assim o sentisse como necessário.
Ainda que Esther vivesse sua vida em plena adaptação e crescendo positivamente com sua condição, um desejo ardente de poder possuir o mundo diante de si mesmo, da magnífica forma como as outras pessoas o via, se expandia dentro dela, mas tudo era muito rápido.
— Colocou tudo no carro, filha?
— Sim, pai. Já podemos ir. — Esther abriu a porta do carona do carro, jogou sua mochila no banco e entrou no automóvel, colocando seus fones de ouvido e ajustando o volume em um nível em que ela pudesse ouvir seu pai.
Viajar por duas horas para ela, poderia ser chato demais, mas se tinha uma coisa que ela adorava, era de estar na companhia do seu bom e sábio pai. O que mudava tudo, pois ele tinha um senso de humor adorável.
— O que está ouvindo? — Ele indagou dando partida no carro e saindo devagar da garagem. Os seus óculos repousavam em cima do seu nariz. — Ele só o usava quando precisava dirigir. Afinal de contas, ele detestava aquilo.
— Então, pai. Estou ouvindo umas músicas de um grupo musical chamado de "La Oreja de Van Gogh". A professora de espanhol nos recomendou, e passou a seleção musical por correio eletrônico. É para um trabalho do colégio.
— Ah, legal! Eu conheço o trabalho do grupo e posso admitir que eles são demais!
Ela retirou os fones de ouvido e conectou o celular via ‘bluetooth’ no som do mp3 do carro.
— Esta canção se chama "Jueves". É triste quando você descobre o significado dela. Fala da história de uma série de atentados que ocorreram em Madri em 11 de março de 2004. Mas não fala do atentado, senão de uma história de amor em um dos trens atacados. — Esther disse, reproduzindo a canção enquanto tentava entender a letra.
— Profundo... E isso me faz pensar quão grato devemos ser pelo momento que temos agora, porque tudo pode mudar num pestanejar. — Ele falou aquilo com um brilho nos olhos, aumentando mais um pouco o volume do som do carro. Sabia que momentos como aquele com Esther, eram importantes.
Ele parecia entender algo e ela, bom, ela sempre gostou desse seu jeito.
— Sabe filha. — Ele iniciou. — Existem duas maneiras para conquistar qualquer coisa. Primeiro: tentando muito. Segunda: continuar tentando muitíssimo. Caso alguma das opções falhe, você pode tentar muitíssimo com amor. No fim, a magia de conquistar algo não está no como vamos obtê-lo ou quão esforço fazemos para tal. Se você aplicar com amor, tenha certeza que tudo fluirá.
Naquele momento, Raul mudou o foco, como de costume, pois foi sempre de falar o que vagava pela sua mente.
— É agora que eu pego a inspiração e uso em minha vida? — Esther indagou, soltando um sorriso simples de canto de boca.
Ele cambaleou os dedos no volante, enquanto olhava para ela, ainda concentrado na pista que se desenrolava à sua frente.
— Você é a pessoa mais centrada que conheço e sou orgulhoso disso, e sei que você sabe o que está fazendo. Ainda assim, sua mãe e eu apoiamos qualquer decisão sua.
— Eu venho pensando nisso desde o início dos exames e... — ela deu uma pausa antes de continuar. — Tudo parece ir a favor do que sonhamos. Afinal de contas, meu desejo é o desejo de vocês também. Por outro lado, de alguma forma, eu comecei a me perguntar se tudo isso é realmente necessário?
Raul respirou fundo e se colocou a pensar por alguns segundos antes de respondê-la de uma forma carinhosa, como um bom pai:
— É absolutamente normal sentir-se duvidoso e reflexivo quando uma nova ideia nos é apresentada. Principalmente aquelas que mudam muito a nossas vidas, pode ter certeza.
— Obrigada pelo conselho. Espero tomar a decisão correta. — A mente da garota por meio segundo, vagou por pensamentos distantes, como se vasculhasse um ponto de equilíbrio.
— Não sei se há uma má escolha, filha. Todos os caminhos levam você à totalidade de um fato em sua vida. Todavia com um diferente ponto de vista. Este, que curiosamente em seu caso, não muda como você é, mas mudará a forma como você lida com as coisas. — Raul não era de dar conselhos, ainda que pareça, mas ele se sentiu inspirado a fazer isso, talvez pelo fato de tentar dar uma luz à garota.
— O que você acha? — Ela perguntou aquilo rapidamente, como se ela estivesse querendo aproveitar o momento de inspiração para saber a opinião dele.
— A sua mã…
— A sua opinião, pai! — Ela o interrompeu.
Ele pensou por alguns segundos sobre o que falar. Raul não queria confundi-la ainda mais naquele momento de escolhas tão importantes.
— O que quero é ver você feliz. Você maravilhosamente já é muito feliz, mas sabe, felicidade é cumulativa, e se você faz algo que pode acrescentar disto em sua vida, por que temer?
Havia uma coisa em que Raul sempre foi bom, mais que futebol, era a capacidade de motivar pessoas a uma ação eficiente.
Assim que Esther e seu pai chegaram à clínica onde a Dra. Cecília trabalha, eles se encaminharam até o consultório dela.
Naquele momento eles fizeram o trajeto pelo longo e claro corredor, em pequenos passos ecoantes, Esther pensava em todas às vezes que ela teve a possibilidade de mudar algo na vida das pessoas, mas agora aquilo soava estranho. Ela via uma mudança iminente se encaminhando diretamente para ela, como nunca havia acontecido antes, mas como qualquer primeira coisa na vida, ela não estava pronta para aquilo.
Era o que estava fazendo agora...
Seus olhos bateram em uma porta de vidro onde havia escrito em uma placa: "Dra. Cecília". Era o consultório particular da oftalmologista.
Esther se adentrou com seu pai, sem receio, olhando em volta. Era a quarta semana que ela vinha ao encontro da doutora, mas parecia ser como se estivesse conhecendo-a pela primeira vez. Um desconforto na barriga era inevitável e involuntária.
— Olá, Esther. Bem-vinda. Pode me acompanhar, por favor? — Dra. Cecília pediu ao recebê-la, levando-a para outra sala menor, dentro daquela.
Seu pai ficou sentado em uma cadeira. Ele olhou diretamente para ela, lançando um sorriso confiante, seguido de uma piscadela. De certa forma Raul disfarçava seu próprio nervosismo.
A ansiedade dela era evidente. Parecia estar em uma montanha-russa, chacoalhando de um lado para o outro.
Agitada, Esther entregou alguns papéis de exames passados para a doutora, e se sentou na cadeira que havia diante de uma organizada mesa.
Ela começou a mexer no pequeno globo de neve que também tinha ali, tentando dissolver toda a tensão.
— Sabe do progresso dos estudos? E dos possíveis resultados? — Dra. Cecília começou seu discurso com questões, enquanto verificava detalhadamente com atenção cada papel.
Notava-se uma atenção e uma expressão séria da parte dela. Seus olhos foram de lá para cá, percorrendo todo o documento.
— Sim... Então, isso significa que existe uma possibilidade? — Esther perguntou voltando a mexer no atrativo globo de neve.
— Claro! — Ela não hesitou em responder prontamente à pergunta.
— Ótimo!
— Você obteve bons resultados nos exames, e saberemos em breve qual a próxima etapa. Estou otimista quanto a tudo, e sei que você também. — Dra. Cecília disse, soltando um sorriso que não parecia se encaixar em seu fino rosto. Era uma grande pesquisa e a profissional entendia que apesar de ajudar Esther, também teria uma grande experiência no currículo.
— Sim, Dra. Cecília. Fico grata por seu otimismo, mas não pensei ainda se gostaria de continuar. — Esther balbuciou as palavras, cerrando os punhos em um reflexo instantâneo de medo. Nem ela mesma esperava esta afirmação incerta de sua parte, afinal, era tudo que ela sempre desejou.
Cecília ficou um momento em silêncio, mastigando a dúvida da garota. Ela era uma mulher firme, profissional e estava certamente preparada para esta categoria de reação da paciente.
— Nós respeitamos sua decisão final, mas cedo ou tarde você terá que se decidir. Quer realmente poder ver o mundo colorido? A ciência pode proporcionar isto. Você tem uma oportunidade que muitos gostariam de ter. — Ela respondeu com franqueza, se levantando e dando alguns passos pela minúscula sala.
Esther retirou seus óculos escuros e levantou o olhar para a doutora, tentando passá-la a ideia de que ela estava lúcida quanto ao que disse.
— Por favor. Não pense que estou sendo ingrata. Eu só quero poder repensar sobre tudo isso. É como se eu tentasse procurar a lógica da necessidade. — Para Cecília, Esther estava sendo incongruente, mas havia uma fila de pacientes e ela não poderia perder mais tempo com indecisões.
A doutora sentou novamente à mesa, diante de Esther, ela segurou a mão da garota com tranquilidade e carinho, percebendo quão fria era. — Esther estava sob pressão.
— Não temos muito tempo, mas conheço você há anos e te dou alguns dias para pensar. — Ela expressou aquilo clara e sinceramente.
— Por quê? Você pensa que pode piorar. — De certa forma, Esther tinha uma estranha sensação de que algo a mais pudesse acontecer.
— Não. A condição é estacionária. Não piora com o tempo. — Cecília se virou um pouco para o lado, esticando o braço na intenção de pegar um notebook que havia em outra mesa. — Mas eu separei isso para você ver.
Ela apresentou para Esther, alguns ‘slides’ de pessoas com óculos escuros. Eles pareciam ter o mesmo que Esther e ela se identificou instantaneamente com aquelas pessoas.
— Sabia que existe uma ilha só de acromatas? — Cecília indagou, olhando as imagens com atenção.
— Acromatas? Não. — Esther demonstrou curiosidade. Não era de seu costume pesquisar sobre a condição que tinha. Eventualmente, nunca soube acerca de outras referências.
— Acromata é como se chama a pessoa com a condição. Bem, esse lugar fica na Micronésia, em uma ilha chamada de Pingelap, no sul do Oceano Pacífico. Lá, quase dez por cento da população sofre de deficiência de cores. Estes óculos, os chapéus, e agora, as lentes especiais, ajudam a combater os sintomas da fotofobia causada pela exposição na luz exterior.
— É. Eu sei bem como é.
— E eu que estudo isso, consigo imaginar como é difícil conviver com a deficiência. — A doutora acrescentou, deixando Esther um pouco incomodada com o comentário.
— Sabe... não levo isso como uma "deficiência", e apesar do modo como vivo, não acho um fardo. — Ela retrucou, iniciando um sermão em defesa de sua vida normal. — é claro que eu não consigo cozinhar, nem diferenciar a comida estragada da boa olhando para ela, acertar se o sinal de trânsito está aberto ou fechado, colocar uma lata de metal em uma lixeira de orgânicos sem querer, ou se dar conta de que estou vestindo uma blusa que combinava com o restante da minha imagem. Nada disso me incomoda.
A Dra. Cecília sorriu com as palavras de sua ilustre paciente.
— É que você é diferente. E sabe... Eu adoro isso em você. — Ela disse, ainda mantendo o sorriso no rosto e voltando a olhar a tela.
— Acredito que você vai gostar deste presente. — Dra. Cecília completou, se levantando da cadeira e indo em direção a um armário de metal. De dentro deste, ela retirou uma caixa de papelão.
Cecília colocou a caixa sobre a mesa, com cuidado.
— O que é isto? — Esther perguntou inquieta, trazendo seu corpo para frente e encarando a caixa.
— Abra! — Ela pediu.
Esther colocou seus dedos na caixa, caçando o lugar onde estão as dobras para abri-la.
— São óculos?
— Sim. É uma versão mais moderna desse seu atual.
— Obrigada pelo presente. — Esther agradeceu, tratando-o. Sua alegria era perceptível.
— Pelo menos você não precisará mais usar chapéu que cubra seu bonito rosto. A não ser que você goste. — Cecília falou, levantando as mãos.
— Definitivamente, não. — Ela respondeu rapidamente, antes mesmo da doutora terminar a frase.
Elas sorriram, descontraídas.
Esther saiu da clínica um pouco aérea, tonta, com uma suave dor de cabeça. — Se é que existe dor de cabeça suave. — E com uma voz irritante que a dizia em voz alta e aguda: faça uma escolha.
Não era tão simples assim. Parte dela queria fazer e continuar com os estudos, e quem sabe se tivesse sorte, fizesse o procedimento, mas a outra parte não suportava nem mais imaginar nesta história.
Toda sua infância e pré-adolescência foi uma fase de muitos desafios, em todos os aspectos, entretanto, ela aproveitou ao máximo como qualquer outra criança. A ideia de ver as cores surgiu depois de um programa de televisão infantil em que crianças se disfarçavam de lápis de cor e fugiam de um apontador gigante. Era um jogo engraçado, mas havia regras, apenas as cores primárias poderiam se juntar para salvar as secundárias que estavam presas em um grande estojo. A brincadeira televisiva deu tão certo que a maioria das escolas estava reproduzindo nas gincanas de feriados comemorativos, e Esther, ainda que se sentisse eufórica com o jogo divertido, sempre era a última a ser escolhida, o que a deixava frustrada. Quando a partida começa toda a magia era quebrada, pois, invés de cores, ela tentava decorar os nomes das cores e os rostos dos colegas, na intenção pouco favorável de se sair bem no jogo, mas sempre perdia, e prejudicava seu parceiro. A partir daquele momento ela detestou profundamente azul, ainda que não soubesse como ela era, mas para Esther, aquele tom simbolizava decepção.
Desta inquietante frustração, Esther começou a indagar as cores de tudo, na intenção de evitar inconscientemente a decepção que havia se instalado dentro dela. Sua avó, Geralda, gostava de presenteá-la com um pacote de jujubas, toda vez que visitava sua filha, Jéssica. Em uma dessas tardes, a senhora começou a responder todas as perguntas de Esther, enquanto a criança comia as guloseimas. Sempre que Geralda respondia que um dos docinhos era azul, como os olhos do avô, ela separava-os no pacote. No final, só restavam as azuis. Geralda questionando o porquê daquilo, Esther sem hesitação respondeu que as jujubas azuis são mais duras que as outras.
Esther trouxe consigo isso e a vontade de compreender através do sentido das cores, como todos poderiam enxergar o mundo, mas a verdade era que ela não entendia que todo mundo o via de um modo individual e muito mais incolor, na maioria das vezes, do que ela mesma poderia enxergá-lo.
Próxima etapa: pense!
Esther gostava de sair e pedalar um pouco, de modo a refrescar a mente. Era uma espécie de meditação sobre rodas. Naquele dia ela pedalou para longe. Foi em direção ao bairro onde Fernando Rebouças morava com seus pais, e coincidentemente encontrou o pai dele. Denis Rebouças naquele exato momento, estava sendo expulso de um bar de esquina por dois homens grandalhões. Suas roupas surradas e sujas pareciam dizer que ele bebia há dias. Ele estava aparentemente embriagado naquele momento. Esther não pensou duas vezes e foi ao encontro do homem, que trocava as pernas ao caminhar. — Senhor Rebouças. — Ela disse, enquanto se aproximava do homem. O cheiro poderia ser sentido de longe. Ele havia realmente bebido. D
Você deve estar se perguntando como uma garota que não enxerga cores, principalmente as dos sinais de trânsito, pode dirigir? E a resposta está no sistema em que a mãe de Esther instalou no carro, que narra em tempo real, placas e sinais de trânsito. É a inteligência artificial contribuindo para a inclusão. Frente a sorveteria em que Elis e Esther marcaram o encontro, estava praticamente sem vagas para carros, o que a fez estacionar o automóvel uma rua antes. Esther saiu do carro, ativou o alarme do mesmo e caminhou devagar pela rua, enquanto observava as pessoas. Aquele finalzinho de tarde tinha um brilho diferente. Pessoas sorriam sem esforço. Romances no banco da pracinha ao lado, pareciam se multiplicar. Cães e gatos se entendendo... Curioso. A primavera realmente era uma estação mágica.
DOMINGO É DIA DE FUTEBOL O dia de domingo para Esther era um pouco entediante. Principalmente quando seu pai a chamava para ajudar no campo de treinamento esportivo. Na verdade, ela não fazia muita coisa não. Eram os garotos que tinham que suar a camisa. Não que a maioria gostasse de fazer isso, pois geralmente eles costumavam tirá-la durante as partidas. Domingo de manhã, Esther estava disponível para seu pai. À tarde, estava disponível para a sua mãe e à noite, saíam os três para completar o domingo. Esther engoliu com pressa a última fatia de sanduíche, quando seu pai entrou pela porta da cozinha. — Terminou seu lanche? — Ele indagou, colocando a mochila em cima da mesa. Raul estava vestindo uma camisa regat
Esther terminava de arrumar sua cama quando a sua mãe a gritou, empolgada com algo. Ela correu do quarto, um pouco apressada e apreensiva, chegando à sala. Uma coisa era verdadeira: sua mãe era boa em dar sustos falsos. — Mãe. O que foi? — Ela perguntou, quando a avistou ali mesmo do corredor que dava acesso à sala. Jéssica estava sentada à mesa, lendo um e-mail no computador. Seus óculos na ponta do nariz e sua xícara sobre a mesa à esquerda, indicavam que ela estava em seu dia de pesquisas, a qual ocorria a cada final de mês. — Eu recebi uma proposta para um projeto! — Ela disse, saindo da frente do computador e indo em direção a Esther, dando-lhe um abraço forte que retirou o ar dos seus pulmões.<
PRÉ-FESTA Esther entrou no carro de sua mãe e bateu a porta. Aquele cheiro de rosas pairando pelo ar indicava que ela acabou de passar no lava-jato. — Hum? Batom vermelho. Quem é o garoto? — Jéssica questionou em um tom de sarcasmo, antes de dar partida no automóvel.— Até você, mãe? — Esther revirou os olhos, não acreditando na perseguição e insinuação amorosa por parte delas. — Eu estou brincando. Mas, está lindo! — Jéssica corrigiu o batom na boca da filha. — Obrigada, mãe. — Ela respondeu, mas sua expressão demonstrava chateação. — Trocando de assunto. — Esther iniciou, enquanto se arrumava no banco e colocava o cinto de segurança. — Recebi um e-mail da Dra. Cecília. Ela quer que eu vá conhecer o oftalmologista e genet
Algumas pessoas começaram a dançar. Inclusive o diretor Müller, que mexia todo o seu corpo, como aqueles bonecos infláveis que ficam na frente das lojas, quando há descontos, chamando a atenção das pessoas. Esther observou de longe Fogueira atravessar a porta de entrada. Ele parou, olhando para todos os lados antes de bater seus olhos na garota. Ela percebeu. Ele estava indo em sua direção. — Oi! Esther. — O sorriso dele se mistura às palavras, ecoando aos ouvidos da garota. — Oi! — Aquela palavra saiu arrastada, enquanto ela pensava no encontro inesperado de hoje mais cedo. Ela pensou por dois segundos antes de continuar a conversa com uma pergunta que não se encaixava muito bem: — De boas com seu pai? Fogueira respirou profundamente estampando um sorriso a fim de evitar o nervosismo. — Ele é um homem de poucas palavras. — O garoto balbuciou as palavras, trocando de assunto em seguida. — O pessoal caprichou na decoração. Tá si
O PEQUENO O carro derrapou meio metro antes de parar de vez, chacoalhando-os para a frente. — O que houve? — Esther perguntou, olhando para os lados. — Me segue. — Ele disse ao abrir a porta do automóvel, saindo rapidamente. — Certo. — Ela respondeu, ainda que não pudesse mais ouvi-lo, devido ao barulho da chuva que ainda caía. Esther pegou seu casaco que ali estava próximo, e saiu, passando pela frente do carro e chegando do outro lado da calçada, onde Fogueira já estava. O frio não o intimidava, e antes que Esther pudesse fazer mais uma pergunta sobre o que estava acontecendo, ele disse: — Eu acho que ele está ferido.
Esther Esther se levantou da cama tarde, mas recuperada do intenso e diferente ontem. Ela colocou seus pés no tapete que havia ali ao lado da cama e deu três pulinhos para despertar e matar a preguiça que ainda insistia em segurá-la. Ela soltou um duradouro bocejo. Esther foi até o banheiro, escovou pacientemente os dentes, colocou a lente de contato que reduzia significativamente a luz ambiente, e desceu para a cozinha, preparada para mais um dia na pacata cidade de Monteiro. Dias tão iguais estavam deixando-a maluca, até que sua mãe lhe aconselhou mudar alguns hábitos. Como acordar mais cedo para dar uma volta no quarteirão e aproveitar para pegar as roupas na lavanderia, ou dar alguns pulinhos na revistaria de modo a lhes trazer alguns livros e revistas interessantes que pudessem matar