Capítulo 2

O que quer que ele estivesse dito, causou um tumulto de protesto entre os homens reunidos. Akmed, porém, exibia um ar de aprovação e seus olhos brilhavam de ganância ao estender a mão na direção do desconhecido, para receber dele uma pequena bolsa de couro. Ashilley assistiu atordoada à transação, sentindo a realidade fugir do alcance de sua compreensão. Mas, quando o retardatário aproximou-se da mesma e envolveu-lhe a cintura com o braço, ela recuperou a consciência e lutou com todas as forças de que era capaz seu corpo esguio.

— Não pode fazer isso comigo! ― gritou, batendo com os punhos no peito sólido como rocha de seu raptor. O braço que lhe prendia a cintura com firmeza revelava que o esforço era inútil, mas mesmo assim Ashilley continuou a resistir freneticamente.

Ele inclinou a cabeça até encostar-lhe a boca no ouvido.

— Eu aconselharia você a cooperar, a menos que goste da ideia de se tornar um brinquedo nas mãos de um desses homens.

Ashy ficou tão surpresa que amoleceu o corpo. O estranho tirou vantagem do momento para montar e levantá-la até a sela. Mantendo-a presa entre os braços, esporeou o cavalo e deixou para trás o acampamento.

— Você é americano! — ela exclamou. — Mas por quê...

— Mais tarde eu explico — avisou ele, tenso.

A mente de Ashilley fervilhava com perguntas, mas não havia oportunidade de expressá-las. O galope do cavalo tornava a conversação impossível e ela era forçada a segurar-se ao corpo forte do homem que conduzia o animal para manter-se segura sobre a sela. As coxas firmes dele roçavam as suas, deixando-a incomodamente consciente do contato entre seus corpos. A única esperança que a alentava era pensar que o cavalo não poderia continuar naquela marcha veloz para sempre.

Muito tempo se passou antes de chegarem a um pequeno oásis, nada mais do que um agrupamento de palmeiras junto a um escasso gramado. Um nativo com um rifle e um cavalo tomava conta de um velho jipe.

O homem que conduzia Ashy desmontou e dirigiu-se ao guarda.

— Algum problema, Abdbbul?

Ao receber a resposta negativa, ele entregou ao árabe algum dinheiro antes de voltar para junto do cavalo e ajudar Ashilley a descer.

Ela sentia as pernas moles e dores por todo o corpo. Quando ele tentou ampará-la, Ashilley o repeliu.

— Quem é você, afinal?

— Podemos falar disso mais tarde. No momento temos assuntos mais importantes para tratar.

Ele tirou o kaffiyeh da cabeça, revelando os cabelos escuros e uma pequena cicatriz na testa. Ao despir o caftã, Ashilley surpreendeu-se ao ver que ele vestia um calção jeans branco e uma camiseta azul por baixo do traje árabe. Quem seria àquele homem? Por que fingia ser um nômade? As perguntas tiveram que esperar, porque ele já lhe entregava o caftã e a empurrava para dentro do jipe.

— Aqueles sujeitos não ficaram muito satisfeitos quando eu tirei você do acampamento. Acho melhor sairmos logo daqui antes que pensem duas vezes e resolvam vir atrás de nós.

O jipe afastou-se do oásis através do deserto, enquanto Ashilley tentava pôr os pensamentos em ordem. Decidiu que não poderia esperar mais para saber o que estava acontecendo.

— Há alguma razão para você não querer me contar quem é?

— Nenhuma. Meu nome é Taylor Hunter.

Havia um tom de expectativa na voz dele, como se esperasse que ela reconhecesse o nome. Na verdade, Ashy o achou vagamente familiar, mas estava muito preocupada para pensar nisso.

— O que está fazendo em Yahren e como apareceu de repente no meio do deserto?

— Acho muito mais estranho a sua presença naquele lugar.

— Oh, sim foi horrível! Eles me sequestraram, me mantiveram presa por três dias e eu não tinha como me comunicar com as pessoas e descobrir o motivo. Mas parece que você fala a língua deles. Onde aprendeu?

— Passei algum tempo aqui no ano passado. Eles não a molestaram, não é?

— Não fisicamente, mas a ansiedade que senti foi uma verdadeira tortura. Primeiro pensei que eles tinham me prendido para pedir resgate, e quando descobri... Não quero nem falar nisso. Como podem vender um ser humano?

Ele esticou o braço e segurou a mão de Ashilley, transmitindo-lhe uma inexplicável sensação de segurança. Embora nem soubesse bem quem era aquele homem, ela experimentava a estranha impressão de que nada de ruim poderia lhe acontecer enquanto estivesse ao lado dele.

— Eles fazem qualquer coisa por dinheiro. Além disso, você precisa se lembrar de que é uma mercadoria muito valiosa. Loiras de pele clara são uma raridade nesta parte do mundo. E eu duvido que eles já tenham visto alguma vez um par de olhos de um verde tão lindo quanto os seus.

— Está defendendo aqueles sujeitos?

— Não, apenas explicando. — Ele sorriu com ar malicioso e seus olhos brilharam ao fitar o corpo de Ashy, envolto na túnica árabe. — Pensando bem, talvez eu tenha um pouco de inveja daqueles nômades. Há algo de atraente nas sociedades que ainda não foram atingidas pela chamada "civilização".

— Como pode dizer isso? Iria querer uma mulher que você tivesse que comprar?

— Quem sabe? — ele murmurou, rindo ao ver o ar zangado de Ashilley. — Não se preocupe, minha querida, isso nunca aconteceu comigo.

Ela o observou com o canto do olho, pensando que aquele homem nunca precisaria comprar uma mulher. Era mais provável que o problema dele fosse escolher entre as pretendentes. Tinha um rosto bonito e, mais do que isso, interessante e atraente. Dava a impressão de ter sempre vivido com intensidade...e de ter amado muitas mulheres. Ashilley se surpreendeu imaginando que tipo de amante ele devia ser. Terno? Autoritário? Embaraçada, apressou-se em afastar o pensamento.

Foi com alívio que viu uma cidade surgir no horizonte. O longo pesadelo estava quase terminado! Ainda tinha problemas a enfrentar, como descobrir o que havia acontecido a Roby e Will, contatar a revista para receber instruções, arrumar roupas decentes, mas eram insignificâncias em relação ao sufoco pelo qual acabou de passar.

Taylor entrou em uma tranquila rua residencial, estacionou o jipe ao lado de um Mercedes prateado e desligou o motor.

As apreensões de Ashilley retornaram.

— Por que paramos aqui? Preciso de um telefone.

— Daqui a pouco você o terá — ele garantiu, ajudando-a a sair do jipe e entrar no Mercedes.

— Por que estamos mudando de carro?

— Não precisa se preocupar tanto. Mercedes são comuns por aqui e não repararão em nós. Além disso, ele tem a vantagem de ser rápido. Tenho certeza de que posso despistar qualquer carro de polícia.

— Mas por que faria isso? Eu quero ver a polícia!

— Ah, é? — ele retrucou, em tom cínico. Sem lhe dar chance de responder, entrou no carro, fechou a porta e deu a ela o Katieh que usava na cabeça com o caftã. — Coloque isso e mantenha-se abaixada.

— Não! Não obedecerei mais nenhuma ordem antes de saber para onde está me levando.

A expressão de Taylor endureceu.

— Ouça, garota, eu acabei de pagar um resgate milionário por você e faço questão de obter o que vim procurar. Depois disso, pode ir à polícia, se for tola a esse ponto.

O automóvel veloz movia-se pelas ruas desertas. Ashilley já não compreendia nada e sua sensação de segurança havia evaporado, mas, pelo menos, não se sentia tão indefesa na cidade. Sempre poderia pedir ajuda em alguma casa. Encolheu o corpo pensando nas chances de sobreviver se pulasse do carro em movimento.

— Nem pense nisso — avisou Taylor, lendo-lhe os pensamentos. — Mesmo que não quebre esse lindo pescoço, eu posso correr muito mais depressa do que você nessa túnica comprida, Ele tinha razão, admitiu Ashy, afundando-se no banco de couro e desistindo do plano. Era preciso manter a calma e esperar para ver o que iria ocorrer.

Poucos minutos depois, Taylor entrou por um portão aberto em um muro branco que circundava inteiramente uma casa, deixando-a pouco visível da rua. Havia extensos gramados e jardins bem-cuidados diante da residência, uma imponente mansão de pedras rosadas em estilo mourisco.

Quando Taylor a conduziu através do vestíbulo, Ashilley notou que os aposentos abriam-se todos para um pátio interno. Uma fonte azulejada no centro refrescava e alegrava o ambiente e um grande número de vasos de flores e plantas ornamentais perfumava o ar com aromas delicados.

O interior do prédio estava fresco, apesar do calor que fazia do lado de fora. As grossas paredes funcionavam como isolantes naturais. A mobília da sala combinava de modo harmonioso o moderno e o antigo: confortáveis sofás brancos combinavam com os belos tapetes persas que cobriam o assoalho de madeira. Mesmo nas circunstâncias em que se encontrava, Ashilley apreciou o ambiente em que era introduzida.

— Vou lhe mostrar seu quarto — disse Taylor.

— Não vou ficar aqui. Você está sempre prometendo respostas, mas por enquanto ainda não me contou nada. Quero saber com exatidão qual é a sua parte em toda esta história!

— Eu pretendo lhe contar e, em troca disso, espero uma igual franqueza. Apenas pensei que você gostaria de se refrescar primeiro, já que eu estou ansioso por uma ducha. Mas, se prefere conversar agora, por mim está bem.

Ashilley lembrou-se que há três dias não tomava um banho decente e sentia-se suja e suada. Depois de tudo que passou, mais meia hora sem esclarecimentos não faria muita diferença.

— Eu gostaria de tomar banho, se você prometer que depois iremos conversar.

— Eu prometo.

O quarto a que foi conduzida era tão bonito quanto o resto da casa. Uma grande cama coberta por uma colcha de seda rosa era cercada por cadeiras almofadadas e tapetes felpudos no chão escuro.

O interesse de Ashy, porém, concentrava-se no banheiro, em especial no grande chuveiro fechado por um box de vidro transparente. Logo que Taylor a deixou sozinha, ela tirou o caftã e o ridículo traje de dançarina árabe e abriu as torneiras.

Lavou primeiro os cabelos e, depois, ensaboou o corpo esbelto para livrá-lo da areia. Demorou, longos e deliciosos minutos sob a água e apenas quando saiu do chuveiro e enrolou-se em uma toalha lembrou que não tinha roupas limpas para vestir. Era inadequado ter de colocar a túnica suada que acabou de tirar.

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