A luz dourada do amanhecer banhava o acampamento de Donaldo, transformando as tendas luxuosas e as pilhas de suprimentos em reluzentes promessas de poder. Porém, o brilho não passava de uma ilusão: por trás da ordem aparente, o caos sussurrava nos cantos.Dentro da tenda principal, o ar era preenchido pelo aroma adocicado de vinho e frutas frescas. Donaldo, reclinado em uma almofada de veludo, projetava uma imagem de soberania indolente. Duas mulheres adornadas com joias cintilantes massageavam seus ombros, conforme seus olhos analisavam mapas e anotações espalhados pela mesa à sua frente.Donaldo era o epítome da ambição: insaciável e inescrupuloso e teimoso. Sua crença em sua própria invencibilidade era quase tão grande quanto seu desejo por mais. Mais terras, mais ouro, mais poder.Ele ergueu uma taça de vinho, contemplando-a como se ali estivesse sua próxima conquista.— Minha querida Helena — disse, com um sorriso que não alcançava os olhos. — O que você diria de um homem que tra
O sol nascente banhava a floresta com sua luz dourada, mas no alto das estepes sussurrantes, onde Naaldlooyee permanecia em vigília, a luz era apenas um intruso distante. Sombras densas dançavam ao seu redor, movendo-se em um ritmo que parecia sincronizado com sua respiração. Elas não eram simples ausências de luz, mas algo vivo, carregadas de uma essência que sussurrava segredos, mistérios inomináveis e promessas de poder eterno.O trono improvisado de Naaldlooyee, feito de rochas negras, parecia moldado pela própria escuridão. Assentado com as pernas cruzadas, as mãos pousadas sobre os joelhos, ele aparentava serenidade. Mas sua mente fervilhava com um turbilhão de pensamentos: estratégias intricadas, desejos ocultos e uma ambição que transcendia o tempo e o espaço.— Eles ainda não compreendem — murmurou, sua voz profunda reverberando como um eco pelas sombras. — Nem Donaldo com sua fome de ouro, nem o guerreiro com sua efêmera luz.Naaldlooyee fechou os olhos, mergulhando em um est
As sombras dançavam no chão irregular da floresta, acompanhando o movimento feroz de duas figuras no centro de uma clareira. Tupã e o Comandante Hargrove estavam frente a frente, rodeados pelo silêncio expectante de um público invisível — a floresta, que observava com seus olhos ancestrais. O confronto já durava tempo suficiente para que o suor escorresse profusamente pelo rosto de Tupã. Suas vestimentas estavam rasgadas, marcadas pelos lugares em que a lâmina de Hargrove quase o alcançara, e sua respiração era um som áspero, irregular, como ondas quebrando nas rochas. Hargrove, porém, mostrava-se inabalável. Sua postura firme e olhos de aço refletiam uma gélida confiança, que nenhum sinal de cansaço traía. Ele era precisão encarnada — cada golpe de sua espada uma mistura perfeita de técnica refinada e força brutal. — Esperava mais de você — provocou Hargrove, girando a lâmina com facilidade quase casual. — Dizem que você é um guardião, um protetor da floresta. Mas tudo que vejo é
Tupã não desferiu o golpe final. Em parte, foi o peso de um terrível pressentimento; em parte, a exaustão que dobrava seus braços; e, em parte, a clemência, que sussurrava alto em seu coração.O Comandante Hargrove jazia no chão, a espada caída ao lado. Sua mão ensanguentada pressionava o peito, enquanto sua respiração pesada carregava o som de um esforço exausto. Mesmo assim, seus olhos ainda brilhavam com aquele traço calculista, como se considerasse a derrota apenas mais um degrau em sua estratégia.Tupã o observava, imóvel. A flecha permanecia firmemente encaixada no arco, mas sua força para disparar parecia hesitar.— Você perdeu — disse ele, a voz baixa, rouca, como o eco de um trovão distante. — E, ainda assim, algo me diz que isso não acaba aqui.O sorriso que Hargrove esboçou foi gélido, desprovido de qualquer humor.— Você é esperto, selvagem. — Sua voz era um murmúrio cortante. — Mas nunca esperto o suficiente.E então Tupã ouviu.Primeiro, o som abafado de passos esmagando
O esconderijo subterrâneo estava mergulhado em um silêncio pesado, quebrado apenas pela respiração irregular de Tumbleweed. Ele se contorcia sobre um improvisado leito de palha, conforme Kaena pressionava um tecido contra a ferida em sua perna, o sangue escorrendo lentamente pelos dedos dela.— Aguente firme, garoto. — Kaena falou, a voz baixa.Tumbleweed mordia um pedaço de madeira para conter os gritos, seus olhos apertados de dor. Hei estava ao lado, segurando firme o braço do garoto para que não se debatesse.— Você é mais forte do que pensa. — A voz de Hei tinha uma calma forçada, como se estivesse tentando conter o próprio desespero.Kaena ergueu os olhos por um momento, trocando um olhar ligeiro com Hei. Eles não precisavam falar para saber que o tempo era curto e as opções, limitadas.— Fique aqui com ele — disse Kaena, levantando-se de repente. — Vou até as minas. Ainda há gente presa lá.Hei hesitou, seu olhar fixo nela. Por um momento, pareceu prestes a argumentar, mas cedeu
A manhã avançava preguiçosamente sobre as minas. O sol lutava para atravessar o céu carregado de poeira e fumaça que pairava como um véu opressor. As sombras das árvores próximas se alongavam no chão irregular, estendendo-se como garras ameaçadoras conforme Kaena deslizava silenciosamente entre os túneis e os abrigos improvisados.Seus olhos avaliavam cada centímetro do terreno, buscando tanto uma brecha para agir quanto sinais de perigo. As armadilhas deixadas pelos homens de Hargrove eram cruéis em sua simplicidade: cordas escondidas sob folhas secas, disparadores de dardos camuflados em troncos e buracos disfarçados por uma fina camada de terra. Cada passo era um risco medonho, transformando a floresta em um tabuleiro mortal.Kaena parou atrás de um tronco caído, observando a cena adiante. Três mercenários patrulhavam uma área onde um grupo de prisioneiros estava acorrentado, forçado a cavar incessantemente no solo endurecido. As expressões dos cativos variavam entre o cansaço absol
Callahan ajustou o chapéu de abas largas conforme deixava a tenda. Embora esboçando movimentos descontraídos, suas palavras carregavam uma gravidade que ecoava no ar.— Não gosto de me repetir, senhor Donaldo, mas tem algo nessa floresta — disse ele, parando na entrada e virando-se levemente. Seus olhos brilhavam sob a luz difusa do amanhecer. — Algo que não pode ser explicado apenas com truques.Donaldo, recostado em sua cadeira de madeira entalhada, ergueu uma sobrancelha. Sua expressão era de ameno desprezo, mas seus dedos tamborilavam contra o braço da cadeira.— Um conselho, então: não subestime o que não entende. — Com isso, Callahan se virou e saiu, seus passos firmes sendo engolidos pela terra macia.Donaldo permaneceu em silêncio, o eco das palavras do comerciante se infiltrando em sua mente como uma brisa gélida. Ele odiava admitir, mas havia algo naquela floresta que o fazia hesitar. Ele, o grande conquistador, sentia-se inquieto em um lugar que deveria ser apenas mais uma p
O rio estendia-se como um espelho sombrio diante de Donaldo, refletindo fragmentos distorcidos de seu rosto. Ele estava só, sentado em uma rocha desgastada pelo tempo. A tenda, com suas sedas luxuosas e as mulheres que preenchiam suas noites, parecia pertencer a outro mundo, deixada para trás em um raro momento de introspecção. A garrafa de licor em sua mão tremia ligeiramente, como se sentisse o peso das memórias que atormentavam seu dono.A ironia o atingia como uma lâmina cega: um homem temido e respeitado por seu poder, acorrentado por algo tão imaterial quanto o passado.A traição. Uma cicatriz que nunca cicatrizara.Donaldo fechou os olhos, permitindo-se mergulhar nas lembranças. Anos atrás, ele era diferente. Jovem, impetuoso, os olhos reluzindo com uma ambição que parecia infinita. Ao seu lado estava Clara, sua esposa, uma mulher cuja inteligência rivalizava com sua beleza radiante. Clara era um sol em sua vida, iluminando caminhos que ele sequer sabia que existiam.Mas a fort