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Amar Agora
Amar Agora
Por: Vania Grah
Capítulo 1 Traição e desespero

Raila Salim

A vida me deu uma rasteira exatamente no momento em que passei a confiar cegamente no meu noivo. Num dia, estávamos comemorando meu aniversário juntos; no outro, eu estava sendo despejada da minha própria casa e, de brinde, tinha perdido também a empresa que meus avós lutaram tanto para construir.

Como tudo isso aconteceu? Nem eu mesma sei. Provavelmente foi em uma daquelas noites de bebedeira, porque não me lembro de ter assinado nada. No entanto, lá estava o documento oficial, com minha assinatura, transferindo tudo para Miguel, o homem que deveria me amar e cuidar de mim. Agora ele era dono de tudo e ainda me colocou para fora de casa.

— Desgraçado! Por que você fez isso comigo? — questionei, batendo em seu peito enquanto sentia o coração se despedaçar.

— Você é burra, Raila. Sempre foi! Quero que saia da minha casa. Não temos mais nada um com o outro. Nunca pensei em me casar com você!

As palavras saíram como punhaladas certeiras, frias e cortantes. Como eu explicaria aos meus avós que havia perdido a empresa que eles confiaram em mim? Fui tomada por um vazio cruel e me tornei alvo de chacotas dos vizinhos, que sussurravam pelas esquinas.

Horas depois, lá estava eu na porta da casa dos meus pais, buscando abrigo. Porém, a recepção foi pior do que eu temia.

— Você não é mais minha filha! Não acredito que deixou aquele homem colocar as mãos em tudo. Te avisamos tanto sobre a ambição dele, mas você nunca nos escutou! — disse meu pai, sua voz carregada de decepção.

— O que vou fazer? Não tenho para onde ir! — implorei, sentindo o desespero tomar conta de mim.

— Desculpe, minha filha, mas seu pai tem razão. Você não pode ficar conosco. — minha mãe encerrou o assunto com um olhar triste, mas firme.

Sem alternativas, fui pedir ajuda à minha tia, irmã da minha mãe. Apesar de as duas não se darem bem, minha tia sempre me tratou com respeito. Ela me acolheu sem hesitar, e isso foi como um fio de esperança em meio ao caos.

Peguei um ônibus pela primeira vez na vida e fui rumo ao interior. Estava tão anestesiada que não sabia se chorava ou se me jogava da próxima ponte. Quando cheguei à casa da minha tia, minha recepção foi... peculiar. Logo na entrada, meu salto alto atolou na bosta de galinha.

— Ótimo. Agora só falta um desses bois me confundir com uma vaca e querer montar em mim. — Resmunguei, segurando as lágrimas que teimavam em cair.

Segui em direção à porta, e minha tia logo apareceu, braços abertos. Ela me abraçou apertado, e naquele instante, desabei.

— Querida, você não é a primeira, nem será a última mulher enganada por um homem. — disse ela, enquanto afagava meus cabelos.

— Eu sei, tia... eu sei.

Acomodada em um dos quartos da casa, senti um vazio esmagador. Não fazia ideia do que seria de mim dali em diante. No dia seguinte, fui acordada pelo canto estridente de um galo. Antes que pudesse fechar os olhos novamente, minha tia bateu na porta.

— Raila, o café está pronto. Quero te mostrar a beleza do sítio. Você nunca veio me visitar antes!

Enquanto ela estava animada logo cedo, eu só queria desaparecer.

— Vou dormir mais um pouco. — respondi, enterrando o rosto no travesseiro.

— Dormir? Você vai perder uma manhã linda, menina!

— Nada é mais bonito pra mim... — murmurei, dramática.

Minha tia, rindo da minha teimosia, saiu do quarto. Fiquei ali, alimentando pensamentos amargos sobre o relacionamento perfeito que acreditei ter. As lembranças me sufocavam, e imaginar a reação dos meus avós ao saberem da empresa me fazia querer me enterrar ainda mais.

Eles deviam me odiar, certo? Eu, no lugar deles, me odiaria. Após mais meia hora de tortura mental, levantei e fui até o banheiro. Ri da minha própria cara desgraçada no espelho, inchada de tanto chorar. Lavei o rosto, respirei fundo e, finalmente, saí do quarto.

Era hora de encarar minha nova realidade, por mais cruel que fosse.

Quando saí do quarto, o cheiro de café fresco invadiu minhas narinas. O aroma era quase um convite para esquecer meus problemas, pelo menos por alguns minutos. Minha tia estava na cozinha, cantarolando uma música antiga enquanto mexia um tacho de doce. Era estranho ver alguém tão tranquila quando o meu mundo estava desmoronando.

— Finalmente decidiu aparecer! — brincou ela, com um sorriso largo. — Senta aí. Fiz pão de queijo pra você.

Me sentei meio desajeitada, ainda com a cabeça pesada e o coração apertado. Peguei um pão de queijo, mas minha fome era mais emocional do que física. Minha tia se sentou na minha frente, olhando-me com aquele misto de preocupação e determinação.

— Raila, sei que tá difícil agora, mas o mundo não acabou. — sua voz era firme, mas doce. — Aqui você vai recomeçar. Vou te ensinar que a vida no campo tem suas vantagens. Talvez, quem sabe, encontre algo que realmente te faça feliz.

Suspirei. Não sabia se aquilo era possível. Estava presa num buraco emocional tão profundo que qualquer luz parecia distante.

— Tia, eu perdi tudo... Tudo! Nem sei por onde começar.

— Começa por aqui. — Ela apontou para fora da janela, onde o sol brilhava sobre o pasto verdejante. — A terra é boa, a vida é simples. Dá trabalho, mas também dá paz. Vai me ajudar hoje a cuidar das galinhas. Prometo que isso tira qualquer tristeza.

— Cuidar de galinhas? Tá brincando, né? — respondi, descrente.

— Vai por mim, menina. Melhor terapia que você vai ter na vida. — ela riu, levantando-se e puxando uma cesta de ovos.

Sem alternativa e sem ânimo para argumentar, segui minha tia para o quintal. O calor do sol na pele e o cheiro da terra fresca começaram, aos poucos, a trazer uma sensação estranha... quase reconfortante. O terreno era extenso, cheio de árvores, galinhas espalhadas e alguns porcos que me observavam como se eu fosse um espetáculo.

— Primeiro, você pega os ovos. — ela me mostrou como fazer, enquanto as galinhas ciscavam ao redor. — Não precisa ter medo, só chega devagar.

Me aproximei de um ninho e estendi a mão, mas a galinha me encarou com um olhar mortal. Parecia mais feroz que Miguel no dia anterior em que me expulsou de casa. Hesitei.

— Isso, menina! Não é a galinha que manda em você. Vai logo! — incentivou minha tia, rindo.

Respirei fundo e peguei o ovo, mas, no processo, a galinha deu uma bicada na minha mão. Gritei, largando o ovo no chão.

— Essa aí tem personalidade, hein? — brincou minha tia, gargalhando.

Fiz uma careta, mas acabei rindo junto. Era a primeira vez que eu ria desde que tudo aconteceu. Não sabia se era pelo absurdo da situação ou pelo fato de estar viva, de alguma forma.

Depois de um tempo, já estava mais confiante e até comecei a conversar com as galinhas, como se fossem amigas que não me julgavam. Aquele pequeno momento me fez perceber algo: talvez, no meio do caos, ainda houvesse espaço para recomeçar.

Quando terminamos, minha tia colocou a mão no meu ombro.

— Tá vendo? Sobreviveu. Se consegue lidar com uma galinha-brava, consegue com qualquer coisa. Amanhã, te ensino a plantar alface.

Revirei os olhos, mas dessa vez sem tanto peso no coração.

— Plantar alface? Tia, você tá tentando me transformar em fazendeira, é isso?

— Quem sabe? — respondeu ela, com um sorriso maroto. — Às vezes, a gente só precisa de uma mudança pra descobrir o que realmente importa.

E assim, no meio de galinhas e ovos quebrados, comecei a entender que talvez o interior não fosse o fim do mundo..., talvez fosse um começo.

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