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Capítulo 3 Assinatura falsa

O papel na minha mão parecia mais pesado que o mundo inteiro. Meus olhos percorriam cada linha daquele documento como se estivessem presos, como se não conseguissem desviar. Era um contrato... um maldito contrato que levou embora o que eu tinha de mais valioso. Perdi tudo. Algo chamou minha atenção dessa vez. Meus dedos tremiam enquanto eu olhava a assinatura. Era parecida demais com a minha, mas não era minha. O coração disparou como se tentasse fugir do peito. Não conseguia acreditar.

Larguei o papel sobre a mesa e corri para a cozinha, onde minha tia lavava louça, alheia ao meu desespero. Entrei apressada, quase tropeçando em mim mesma.

— Tia, olha isso! — estendi o documento para ela, que enxugou as mãos no avental e pegou o papel, franzindo a testa. — Olha essa assinatura. Parece a minha, não parece?

Ela olhou com atenção, ajustando os óculos que sempre escorregavam pelo nariz.

— Parece, Raila... mas você tem certeza de que não assinou isso? Às vezes, na correria, a gente faz coisa sem perceber.

— Claro que não assinei! — retruquei, minha voz saindo mais alta do que eu pretendia. — Eu sei o que assino, tia. Miguel falsificou isso! E agora... agora eu tô na rua por causa disso.

Minha tia largou o papel sobre a bancada e olhou para mim, visivelmente abalada. Ela sempre foi uma mulher forte, mas dessa vez parecia ter levado um soco no estômago.

— Meu Deus... — ela murmurou, passando a mão pela testa. — Raila, isso é grave. Muito grave.

— Eu sei! E o que eu vou fazer agora? — as palavras saíam como um grito sufocado. — Eu não tenho dinheiro pra advogado, muito menos pra um investigador! Tô de mãos atadas, tia. Eles ganharam. Acabou pra mim.

Ela balançou a cabeça devagar, como se tentasse processar o que eu dizia.

— Queria poder te ajudar, mas... — suspirou, olhando para as mãos como se procurasse uma resposta ali. — Você sabe como estão as coisas aqui no sítio. É ração pra bicho, conta de luz, conserto de cerca... eu não consigo nem guardar dinheiro, imagina tirar pra ajudar.

Eu senti um nó na garganta, mas me forcei a engolir. Não era culpa dela, eu sabia disso. Ela já fazia muito por mim, mais do que qualquer outra pessoa faria.

— Eu entendo, tia. De verdade. Não quero te colocar em mais problema do que você já tem.

Ela se aproximou, segurou minhas mãos com força e me olhou nos olhos.

— Escuta, Raila. Você é forte. Eu sei que parece o fim, mas você vai dar um jeito. Sempre dá. Essa gente que faz esse tipo de coisa, eles sempre deixam rastro. E você vai encontrar.

Fiquei quieta, tentando absorver aquelas palavras. Elas eram bonitas, mas soavam vazias no meio de tanta desesperança. Como eu iria encontrar algo sem recurso nenhum? Sem ninguém pra me ajudar?

— Eu não sei, tia... — murmurei, olhando para o chão. — É fácil falar, difícil é fazer.

Ela segurou meu queixo e me fez encará-la. Seus olhos estavam firmes, determinados, como se ela quisesse me transferir toda a força que tinha.

— Você não está sozinha. Pode não ser com dinheiro, mas estou aqui pra te apoiar no que for. E você vai sair dessa, Raila. Vai.

Eu queria acreditar nela. Queria mesmo. Mas tudo parecia um labirinto escuro e sem saída. Ela voltou a mexer na louça, como se aquele momento tivesse acabado para ela, mas eu sabia que estava longe de acabar pra mim. Peguei o documento da bancada e voltei para o quarto. Precisava pensar, precisava encontrar uma solução.

Na cama, os olhos grudaram de novo naquela assinatura. Como Miguel teve coragem de destruir a minha vida assim, sem remorso nenhum? Cada curva daquela falsificação me fazia sentir raiva, dor, impotência. Mas, ao mesmo tempo, algo dentro de mim começou a mudar. Era como uma faísca, pequena, mas suficiente para acender uma chama.

Se eu não tivesse dinheiro para advogado ou investigador, então teria que ser as duas coisas ao mesmo tempo.

Deitada na cama, fiquei encarando o teto, com a mente a mil. As palavras da minha tia ainda ressoavam, tentando me convencer de que eu era forte o suficiente para resolver tudo. No fundo, eu sabia que precisava de ajuda, e só havia mais uma pessoa a quem recorrer: minha mãe. O coração já apertava só de pensar no que ela poderia dizer, mas peguei o celular mesmo assim. Não tinha escolha.

Disquei o número, esperando com ansiedade enquanto o toque ecoava no viva-voz. Do outro lado, ela atendeu com aquele tom impaciente de sempre.

— O que foi, Raila? — começou, já cortando qualquer tentativa de introdução.

Respirei fundo, tentando manter a calma.

— Preciso de ajuda. Por favor, não continue me virando as costas assim...

Houve uma pausa curta, mas carregada de julgamento.

— O que foi dessa vez? Já tá enrolada de novo?

Engoli em seco, ignorando o nó que começava a se formar na garganta.

— Mãe, analisei o documento que tirou tudo de mim e descobri que a assinatura foi falsificada.

Do outro lado da linha, ela soltou um riso sarcástico.

— Você tá brincando comigo, né? O Miguel te pegou de jeito mesmo, afinal de contas, você estava cega de amor por ele.

Minha respiração ficou presa por um instante. Era como se ela já soubesse, como se estivesse esperando por esse momento para me culpar.

— Eu sei que não enxerguei quem ele era verdadeiramente. — admiti, minha voz quase sumindo.

O que veio a seguir foi como um tapa no rosto.

— Burra! É isso que você é, Raila! Sempre te falei que aquele homem não prestava, mas você achava que sabia de tudo. Foi lá, se enfiou nessa história com ele, e agora tá aí, chorando. O que você quer que eu faça? Passe a mão na sua cabeça?

Minha garganta fechou, mas me forcei a falar.

— Mãe, eu tô precisando de ajuda, não de sermão! Não tenho dinheiro para advogado, pra nada... Achei que você pudesse...

Ela me interrompeu, a voz cada vez mais dura.

— Pensa bem, garota. Você se meteu nisso sozinha, agora se vira sozinha. Sempre te avisei sobre confiar em gente como o Miguel, mas você nunca ouviu. Agora tá aí, pagando o preço. Quer que eu me mate de trabalhar pra resolver seus problemas também? Esquece!

As lágrimas começaram a rolar pelo meu rosto, mas tentei disfarçar, mesmo que ela não pudesse me ver.

— Eu só precisava de um pouco de apoio, mãe... só isso.

— Apoio? — ela riu de novo, amarga. — Meu apoio você perdeu quando começou a tomar decisões idiotas sem pensar nas consequências. Agora é com você, Raila. Aprende a se virar.

A ligação foi encerrada antes que eu pudesse responder. Fiquei olhando para o celular na minha mão, sentindo um vazio esmagador no peito. Minha mãe tinha feito exatamente o que eu temia: jogado tudo na minha cara, como se eu fosse uma completa inútil.

Deixei o celular cair na cama e cobri o rosto com as mãos. Meu corpo tremia, mas não era só de tristeza. A raiva começou a crescer, misturada com a frustração. Ninguém acreditava em mim. Ninguém parecia se importar.

"Se vira", ela disse. Essas palavras ecoavam na minha mente como um mantra cruel. Talvez fosse isso que eu tivesse que fazer, afinal. Me virar sozinha. Mas por onde começar?

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