Coloquei Maria Luiza no transporte que a leva para a escola, onde fica o dia todo.
É um alívio para mim, pois eu saio do trabalho e venho correndo para pegá-la, não preciso pagar ninguém por fora.
Saí de casa tranquila para mais um dia de trabalho.
Avisei a Miguel que ia trancar o portão, mas que ele ficasse sossegado.
Não fiquei com medo de ser roubada, até porque, a única coisa de valor da minha casa estava na escola naquele momento, o restante eram bens materiais que assim como vieram um dia, também poderiam ir embora.
Cheguei na loja de material de construção e encontrei os meninos do balcão.
Tales e Felipe.
Pessoas maravilhosas, e que fazem do meu trabalho o melhor lugar do mundo.
Eu fico no caixa, e o senhor e a senhora Berna, donos da loja, fazem de tudo um pouco quando estão por aqui.
— E aí?
Tales estava de rolo com uma menina, e os dois tinham muita história para nos contar.
— Nada — responde Tales —, ela acha que eu sou palhaço.
— Se ela acha... eu tenho certeza — diz Felipe.
— Para, Felipe, não é assim.
— Como não é assim? — Tales questiona e eu respondo:
— Você mandou flores e chocolate quando ela literalmente falou que não queria mais nada.
— Para ela saber que eu sou homem para casar.
— Babacão — implica Felipe. — Fica lambendo, que ela te faz de trouxa. Cê tem que entender que mulher não gosta de homem grudento...
O assunto rendeu, sempre rendia, enquanto eu ajudava a estocar as coisas na prateleira e na organização da loja, até aparecer clientes.
********************
Assim que apontei na esquina da minha rua, eu vi o transporte escolar. Corri para que eles pudessem me ver e o tio buzinou. Sinal para eu ir tranquila, mas eu aguento de ansiedade sabendo que tem uma princesa naquela linda carruagem? Aguento não. A tia, sempre alegre, me entregou ela toda sorridente e falante, sobre o que aprendeu na aula e sobre curiosidades que eu nem sabia o que eram, só concordava e elogiava sua inteligência magnífica.
Adentramos no portão e estava um silêncio. Assim que abri a porta, eu senti o cheiro de produto de limpeza. E a casa brilhando de limpa.
— Miguel! — chamei, mas ninguém respondeu.
Meu coração até acelerou com a possibilidade de ele ter voltado para a rua. Procurei nos quartos e no banheiro e nada, tudo arrumado, porém nada dele. Sai pela única porta da casa e fui até a lateral, onde é a pequena lavanderia e lá estava ele, com o cabelo cortado, ou parecia cortado e com uma tesoura aparando a barba.
— Que susto!
— O que foi? — Ele me olhou mais assustado ainda.
— Pensei que tivesse ido embora.
— Ainda estou aqui. Eu achei sua tesoura e estou cortando meu cabelo e barba.
Olhei o trabalho dele e... nem de longe aquilo era um corte de cabelo.
— Quer ajuda? — ofereci, na tentativa de consertar o que ele estava fazendo.
— Está muito ruim? — Eu não ia desmotivá-lo, mas...
— Não está ruim, mas eu posso melhorar.
— Tudo bem.
Fui até o quarto da Malu e ela estava tirando a roupa para o banho, como eu sempre a ensinei.
— Mamãe vai brincar de salão com o tio Miguel.
— Posso ajudar?
— Se ele deixar, você pode ser minha ajudante.
Ela colocou a blusa novamente e passou por mim como um foguete. Quando carreguei a cadeira para a pequena área na frente da minha casa, lá estavam os dois com sorrisos lindos se encarando
— Ele deixou!
— E como eu vou dizer não para uma Alteza, a realeza?
— Viu, mamãe, ele sabe que eu sou uma princesa.
Ela me cochichou um tanto alto e enfim, ele olhou para mim com um sorriso lindo. Um sorriso encantador que fez meu coração acelerar. Eu o encarei, mesmo não sabendo o porquê.
— Vamos, tio. Senta para a mamãe cortar o seu cabelo e eu pintar suas unhas.
— Malú, não pode...
— Pode sim. Quero ver o que ela sabe fazer.
E lá se foi uma criança eufórica pegar a maletinha com esmaltes e algumas maquiagens que comprei para ela.
— Tira a camisa e senta aqui.
Ele, meio constrangido, tirou e ali eu pude notar um pouco do seu passado. Na costela tinha uma tatuagem que parecia um falcão com um bico bem desenhado e de fundo, montanhas. Mas, não foi isso que me deu pistas do que ele viveu e sim, as cicatrizes. Cicatrizes essas que não estavam totalmente curadas, porque muitas delas ainda estavam vermelhas.
— O que é tudo isso? — perguntei chocada, mesmo sabendo que era indiscreto de minha parte.
Não deveria ser tão intrometida assim, mas todas aquelas marcas me fizeram ver que ele padeceu e não foi pouco, e se ele tem esse olhar acuado e com muito receio, é porque sofreu um bocado.
— Eu não sei. Eu caminhei por muito tempo assim, machucado. Até parar num hospital e por não saber meu nome todo e nem de onde vim, eles me deram atendimento e depois me mandaram para a rua de novo.
— Miguel, eu...
Não consegui terminar nenhuma frase. Meus olhos queriam transbordar, eu não queria constrangê-lo a mais isso, porém, era sufocante saber que ele passou por todos esses traumas e ninguém foi humano o suficiente para prestar um atendimento ou dar uma ajuda digna.
— Ana, tudo bem. Não chora. Eu estou bem.
— Tio, por que você tem tanto dodói? — Ela apareceu na porta, olhando para o corpo dele.
— O tio não lembra, pequena princesa.
— Foram as pessoas más, né? Pessoas más fazem mal aos outros, mas no final, elas se dão mal, foi assim com o lobo mau, a bruxa má, a madrasta da Branca de Neve, não é, mamãe?
Apenas concordei, pois tinha um nó em minha garganta, me impedindo de pronunciar qualquer palavra.
Ele se sentou na cadeira, sorrindo para minha princesa, enquanto eu tentava controlar as minhas mãos.
Quando peguei o borrifador, elas tremiam muito. Respirei fundo para me controlar e assim que me acalmei, consegui fazer o trabalho.
Muito bom, por sinal.
Rodrigo me agradecia quando eu cortava o seu cabelo. Aprendi com minha mãe, que sempre foi uma dona de casa exemplar e fazia de tudo. Ela me ensinou tudo também, mas aquele não era meu caminho, eu queria mais, e mesmo que eu tenha quebrado a cara, eu sei que eu mereço mais, muito mais.
*********************
— Pronto, agora você tem um cabelo cortado — falei, finalizando o meu trabalho.
— Eu não acabei, mamãe.
Ela estava realmente pintando as unhas dele de rosa e amarelo e enquanto isso, ele sorria, se divertindo com esta situação.
— Pois acabe logo, que você tem que tomar banho, mocinha.
Assim que ela terminou, Miguel não poupou elogios para o trabalho da minha pequena. E ela era sorrisos e pompas.
Eu sinto que ele não é uma pessoa má, e demostra cuidado e atenção com a Malú. Ela não se faz de rogada com todo esse carinho.
Depois do jantar, assim que Miguel entrou para o quarto, eu decidi ligar para o Rodrigo e pedir ajuda sem que ele percebesse.
Miguel precisou usar as mesmas roupas, pois eu não tenho outras.
— Nana.
— Oi, Rodrigo, tudo bem.
— Ia mesmo te ligar, mas já que cê ligou, manda aí.
— Então, é um assunto complicado, e se você não puder ajudar, eu vou entender muito bem.
— Fala, cara, sabe que nós somos família, né? Se não tiver condições, nós damos um jeito.
— É que eu estou ajudando uma pessoa. Ele não tem nada, nem a memória e está precisando de algumas roupas. Eu gostaria de saber se você pode doar algumas suas.
— Como assim, Nana, quem é essa pessoa?
— Pode parecer loucura, mas eu estava saindo do trabalho e ele me pediu comida. Eu dei, e só o trouxe para casa para ele tomar um banho e ficar mais confortável e ter uma boa noite de sono.
— E deixa eu adivinhar o resto! Está aí até hoje porque você não consegue mandar o cara de volta para a rua? Cê sabe que isso é perigoso, né? É um estranho. Eu sei que seu coração é bom, Nana, mas o mundo está perigoso. Não pode colocar um estranho assim dentro da sua casa, ainda mais com uma filha pequena.
— Eu sei.
Fiquei triste com as suas palavras, porque eram realidade. Apesar de eu sempre ver o lado bom das coisas, a maldade ronda os quatro cantos da Terra.
— Ele vai ficar aí? Contou de onde veio? Sabe alguma coisa dele?
— Não, ele está totalmente sem memória e com o corpo cheio de cicatrizes. Só lembra que o nome dele é Miguel.
— Tô preocupado, não vou mentir.
— Eu não consigo mandar ele para a rua. Tem muita tristeza no seu olhar.
— E você acha que consegue abrigar todos que precisam de ajuda neste mundo?
Fiquei em silêncio, porque é isso que sou capaz de fazer.
— Vou separar algumas coisas aqui. Ele sabe quanto veste? Calça?
— Acho que o mesmo que você, ele só está um pouco magro, mas é bem alto. Calçar? Acho que 44.
— Vou estar aí pela Lapa amanhã, no carro da companhia e levo umas roupas, vou comprar um chinelo e um tênis para ele, porque eu calço 42.
— Obrigada! Obrigada, Rodrigo. — Um sorriso mais que enorme apareceu no meu rosto.
— Não tem de quê. Tô cismado, mas confio em ti. E ó, final de semana que vem, tô indo pra praia, queria levar minha princesa.
— Ai que legal.
— Kátia me pediu para eu falar com você para levar ela.
Katia era a namorada, noiva, mulher dele. Ela é o máximo de descolada possível. Super alto-astral. Sem contar aquele cabelo ruivo selvagem que eu amo.
— Ela vai amar.
— Eu sei — riu porque ele conhece a sobrinha. — Eu tenho a namorada mais confusa, não quer ter filhos, mas ama a minha sobrinha.
— Escolhas, mulheres têm escolhas.
— Eu sei, sou cercado das mais lindas e confusas mulheres, tinha que aprender alguma coisa, né?
— Obrigada.
Eu sei que ele sabia o porquê de todo este agradecimento.
Rodrigo é totalmente o oposto do irmão. Eu devia muito a ele por tudo que passei e se permaneço de pé, foi por causa de suas conversas e apoio, durante esse tempo que nos conhecemos.
— Que isso. Amanhã eu passo na loja para deixar as coisas.
— Certo, não vou falar nada para ela ainda, porque senão, vai ficar super ansiosa.
— Tá bom! Nana?
— Oi.
— Cuidado, presta atenção no proceder aí?
— Fica em paz, eu sinto que devo ajudar.
Depois que encerrei a ligação, fui para o quarto e não encontrei a minha pequena na cama, arrumando a sua bicharada de pelúcia como deveria ser. O coração acelerou um pouco e fui onde poderia encontrá-la.
— Mamãe fala que eu tenho que cuidar de todos para ter sempre.
— Ela está certa.
— Mocinha, onde deveria estar?
Os dois, que estavam sentados na cama, enquanto ela escovava a juba de um leão e Miguel colocava a meia no Fofura, olharam para mim.
— Você demorou e o tio está me ajudando a arrumar eles para dormir.
— Então vamos que eu te ajudo, deixa o Miguel descansar.
— Não estou cansado, eu ajudo a Malú. — Ele falou de cabeça baixa.
— Então vamos todos ajudar pra acabar rápido.
Sentei atrás da minha pequena, enquanto ela arrumava os ursinhos, um leão, um tigre a Galinha Pintadinha e o Fofura, que desde sempre é o inseparável dela, eu comecei a arrumar seu cabelo para dormir.
Enquanto fazia isso, reparava em Miguel.
Muito bonito. Talvez esteja perdido e sua família o procure desesperadamente, até mesmo deve ter filhos, pelo tratamento dele com Malu, com certeza deve ter filhos. Esse pensamento me fez ter mais certeza que devo ajudar.
— Pronto, meu amor, estão todos preparados para dormir.
— Tio, pode contar uma história hoje?
Ele olhou para ela espantado e depois para mim, como que pedindo socorro, não sabendo o que fazer.
— Eu conto, filha.
— Não, mamãe, todo dia é você, hoje o tio conta uma, né... tio?
— Eu não sei nenhuma história de princesa.
— A mamãe sempre conta uma história diferente. Pode ser qualquer história.
— Certo. Vamos para a cama.
É só Malú sorrir e o cara inseguro some, surgindo um outro que quer totalmente agradar esta criança.
Fui com os dois até o quarto e lá ajudei a arrumar os ursos e depois ela.
— A história se passa na selva.
— O que é selva?
— Um lugar onde tem muito mato.
— Mas, por quê?
— Malú, a história é para dormir — falei.
Miguel sorriu, eu conheço a minha pequena, história nova, assunto novo, as perguntas seriam infinitas.
ANA MARIA A minha rotina matinal era sempre a mesma. Só que agora tínhamos companhia. Miguel estava acordado, antes mesmo de eu levantar, estava na cozinha passando o café. Quando eu entrei no quarto da Malú, para pegar roupas para colocar na mochila, a cama estava bem arrumada e os cobertores dobrados. Fui até a cozinha e ele me deu um “bom dia” tímido, me olhou por poucos segundos e foi sentar na mesa. Sempre muito silencioso quando era eu e ele. — Bom dia, tio. Eu dormi na parte que a girafa se apaixona pela hipopótama. Eles foram felizes para sempre? — Ela foi como um foguete para cima dele. — Calma, mocinha, acabou de acordar e já está assim? — Só quero saber, mamãe. — Eles são amigos e permaneceram assim. — Puxa! Então não teve felizes para sempre? — Teve porque eles continuaram juntos. — Ahhh. Assim que ouvi a buzina, coloquei ela no transporte. Em seguida, me troquei e fui para o meu trabalho. Talvez a minha confiança no Miguel tenha aumentado, porque dessa vez e
ANA MARIA Estava esperando Malú se preparar para dormir, colocou os ursinhos no meio e se deitou também no meio da cama de casal, deixando o canto livre. — Deita lá, mamãe, o tio vai contar a história hoje. — Ele não vai dormir conosco, filha. — Só hoje, mamãe, para contar a história. Amanhã não tem aula e eu quero ouvir tudinho. Ela foi chamar Miguel, que entrou no quarto, sem graça. Eu me deitei no canto e puxei a coberta. Sei que ele não vai nos fazer mal, mas é uma situação totalmente desconfortável. Quando Rodrigo dormia conosco para contar a história de nanar era diferente, alguém com quem eu já convivia há muito mais tempo e meu corpo não reagia da mesma forma que reajo quando Miguel está perto. Ela deitou no meio e ele apenas sentou na ponta. — Deita, tio, para contar história de nanar tem que deitar igual o tio Digo. Ele procurou o meu olhar e eu apenas assenti. Timidamente puxou a coberta e deitou o mais afastado possível e começou a contar a história. A voz g
ANA MARIA Depois daquela noite, eu me mantive afastada. Quando chegava do trabalho, não o ignorava, conversava normalmente. Apesar da vontade, de quando ficávamos a sós, era de lhe dar um beijo daqueles que só ele me dá e que me acende por inteira. Na quarta eu o pedi para que ficasse com a Malú depois da aula, porque iria chegar tarde. Ia passar numa loja para comprar uns biquínis para ela. Aproveitei e comprei algumas camisas e cuecas que estavam na promoção, pro Miguel também. Porque amanhã eu vou contar a minha princesa que ela vai à praia, se eu conto antes, vira um poço de ansiedade e toda hora sai um: “Já está na hora de ir para a praia?” E aí já viu, né? Cheguei em casa e encontrei os dois brincando de chá com os ursinhos e dessa vez fui recebida com entusiasmo por minha princesa. Amo muito. Depois de toda a recepção, fui para o quarto e guardei as sacolas no lugar mais alto do guarda roupa, depois entreguei as sacolas do Miguel. — Ana, por favor, não gaste mais comigo.
ANA MARIA Como a vida é linda. Bela, quando vivida intensamente. Estava tão feliz, que nada tirava o sorriso do meu rosto. — Olha aqui para mim. — Felipe parou do meu lado no caixa e me abraçou de lado. — Quê? — Devo me preocupar? — Com o quê? — Com o cara por quem cê tá apaixonada. — Eu não estou apaixonada, estou feliz. — Eu conheço este sorriso bobo. Tá muito feliz, consegue nem esconder o sorriso. Tô feliz por você, só quero saber se devo me preocupar. Ele é do bem? — Acho que sim, ele tem sido uma ótima pessoa, tanto para mim quanto para minha filha. — É isso que importa. Qualquer coisa já sabe, né? Mando os mano colar e nós têm um teti a teti com o vacilão. — Não vai precisar. — E mais tarde, Chopada? Malú não está aí, então não tem desculpa. — Acho que não vai dá, tenho compromisso. — Qual foi? Abandonando as amizades por causa de macho, piranha? Impossível não se dar bem com esses meninos. — Para, Fê. — Empurrei seu ombro de leve, rindo da sua reação.
ANA MARIA Estou sem palavras pelo seu gesto. Já disse que são nessas pequenas atitudes que eu enxergo seu caráter? Ele é um homem lindo, não só por fora, como por dentro também. Eu o abracei e depois voltamos a nos deitar para dormir. Senti seus dedos me acariciando por todos os lugares do meu corpo e com isso, adormeci. ***************************************************** — Mamãe, eu estou bem. Tchau, que agora o tio vai me levar na praia. — É assim, mocinha? Sem mais? — Só, mamãe, dá um beijo no tio Miguel. — Vou dar, quando ele chegar. Hoje, assim que acordamos, Miguel decidiu sair para correr. Ele não falou nada sobre o pesadelo da noite passada, mas acho que isso afetou na sua decisão de ficar só dentro de casa. Ele colocou umas roupas leves e tênis e saiu. Fico feliz por esse progresso, dia após dia ele está se soltando e sorrindo mais. Duas semanas que ele está conosco e parece que eu o conheço de uma eternidade. Agora sei que é verdade quando dizem que não é
ANA MARIA Felipe passou conosco o domingo até o finalzinho da tarde, quando minha princesa chegou dormindo. Com certeza, amanhã ela estará cheia de novidades e eu mais que pronta para ouvir tudo. Ela é um peixinho. Ama o mar, se fosse do querer dela, moraríamos perto de uma praia. Antes da princesa leoa, e da princesa unicórnio, e da princesa Tiana, e da princesa Rapunzel, era a princesa sereia. Enfim, mais uma semana chegou e muitas expectativas com ela também. Passei o dia no trabalho ansiosa pela entrevista que Miguel ia fazer. Tomara que dê tudo certo. Eu quero muito que tenha a sua independência, ele merece muito isso. À noite, quando cheguei, não demorou muito Rodrigo buzinou e ele saiu. Desejei toda sorte do mundo e para que pudesse ir confiante. Parece até um sonho toda essa felicidade. Eu sei que parecem ser valores invertidos, que eu vá trabalhar e ele fique em casa, torço para que consiga o trabalho por ele mesmo, porque mal ou bem, eu consigo ajudar com o básico, por
ANA MARIA Pedro nos convidou para almoçar, mesmo ressabido, Miguel concordou. Percebi que ele não ficou muito à vontade depois de saber da existência de uma noiva. Eu também estou desconfortável e, mesmo sabendo que não fizemos nada de errado, meu lado consciente me acusa. Pedro ligou para os pais de Miguel e pediram para que eles viessem com urgência, enquanto isso, Cida paparicava Malú, a elogiando por sua boa alimentação. E ela se gabava. A essa altura já havia conquistado a todos, inclusive, foi a única a arrancar um sorriso de Miguel, que sempre que Pedro iniciava um assunto, voltava a ser aquele homem sério. Permaneci calada e só respondia aquilo que me era perguntado. Neste momento, eu queria a minha casa, a minha segurança de que tudo ia ficar bem, e aqui, sabendo de todas essas coisas, eu não me sentia dessa maneira. Estava brincando com um pedaço de bife e com os pensamentos longe, quando senti a mão de Miguel buscando a minha. — Vai ficar tudo bem. Nós já vamos e
ANA MARIA Depois que Pedro foi embora, ficou um clima meio estranho entre nós dois. Não sei explicar. Malú preferiu que Miguel contasse a história naquela noite e foi melhor assim. Fui para o quarto e me deitei pensativa. Eu sei que queria muito que Miguel fosse uma pessoa simples, com uma história não muito complicada. Mas a sua família tem poder aquisitivo, ele é uma pessoa poderosa, e como a própria mãe falou, foi noticiado na TV e tudo, não ia demorar muito para a mídia descobrir sobre seu paradeiro e começar a persegui-lo, atrás de respostas. E ainda tem a noiva ou ex-noiva, não sei. — Não pensa muito, meu mel, vai ficar tudo bem— disse, fechando a porta do quarto e se achegando na cama. — Não sei se vai, Miguel. A realidade pode não ter chegado para você, mas nós dois somos de mundos completamente diferentes. Uma hora isso vai pesar. — Ana, eu sou muito grato a você por tudo que me fez e não só isso, sou completamente apaixonado por você. Em tão pouco tempo você me fe