Acordo de casamento

 Caleb

O sol invadia a sala de jantar da mansão Belmont como um lembrete cruel de que aquele café da manhã não seria apenas uma refeição. Sentado à mesa impecavelmente posta, tentei focar no aroma do café, no pão fresco… qualquer coisa que me distraísse do olhar controlado do meu pai.

Bernardo Belmont, mesmo aos 68 anos, parecia mais uma estátua de comando do que um homem comum. Sempre ereto, sempre vestindo um terno perfeitamente alinhado — até dentro de casa. Ele nunca relaxava. Nunca deixava de ser o patriarca. Minha mãe, Vitória, estava ao seu lado. Linda, elegante, com aquele ar quase etéreo que ela mantinha mesmo depois dos sessenta. Mas ali, ao lado dele, parecia sempre uma coadjuvante resignada.

Do outro lado da mesa, meu irmão Nicolas mal prestava atenção. Magro, distraído, vivia no próprio mundo, mexendo no celular como se aquilo tudo não o envolvesse. E, até aquele momento, eu achava que não envolvia mesmo.

Então, veio o golpe:

— Você precisa se casar, Caleb. Está na hora de ter um herdeiro. A dinastia Belmont precisa continuar.

Engoli o café com dificuldade. Já tínhamos tido essa conversa. Várias vezes. E eu sempre deixava claro que não estava interessado. Mas meu pai nunca ouvia.

— Não estou te perguntando se quer. Estou dizendo que vai acontecer — ele insistiu.

Quando deixei a mesa, empurrando a cadeira com mais força do que queria, eu estava fervendo por dentro. Queria fugir daquilo. Mas ele não deixou.

Horas depois, invadiu meu escritório como se fosse dele — o que, tecnicamente, era.

— Você vai se casar — ele repetiu, como se fosse uma ordem de contrato.

E então jogou a bomba:

— Já fechei um acordo com os Monteiros.

Minha cabeça girou. Casamento arranjado? Em pleno século 21?

— Pai, isso é loucura. Você não pode decidir minha vida assim.

— Não estou pedindo sua permissão, Caleb. Estou garantindo o futuro da família.

A gota d’água veio quando ele ameaçou tirar tudo de mim. A empresa. A herança. O nome. Tudo.

Eu estava prestes a sair da sala quando vi sua expressão mudar. Ele levou a mão ao peito, os olhos perdendo o foco. Cambaleou na cadeira.

— Pai?

Corri até ele. Era estranho ver aquele homem — o mesmo que me tratava como um soldado — tão frágil.

— Vai ficar tudo bem, pai — eu disse, mesmo sem acreditar.

Chamei ajuda. Um médico. Um milagre. Qualquer coisa.

Naquele instante, algo dentro de mim cedeu. Pela primeira vez, eu o vi como um homem. Não como o chefe. Não como o imperador da dinastia Belmont. Só um pai. Um velho pai tentando segurar tudo com as próprias mãos.

E eu não sabia mais se queria herdar esse império… ou fugir dele.

****

Meu pai estava dente, e naquele momento eu não tinha mais o que fazer, eu precisava me casar para realizar o seu sonho de ser avô.

***

Caleb

A vista da sacada do hotel era magnífica, mas eu mal conseguia prestar atenção. Estava a trabalho em Londres, lidando com investidores, mas minha cabeça não saía de São Paulo. Mais especificamente, daquela conversa com meu pai.

Meu celular vibrava em cima da mesa. Peguei o aparelho, esperando que fosse uma mensagem de algum dos diretores, mas era apenas um lembrete irritante. Encontro com a Srta. Monteiro – 20h.

Suspirei, esfregando o rosto.

— Droga...

Eu não tinha tempo para voltar a tempo desse encontro. E para ser sincero, não estava com a mínima vontade de ir.

A ideia de conhecer minha futura esposa por meio de um contrato arranjado parecia absurda. Mas se eu faltasse, sabia que Bernardo usaria isso contra mim. Ele estava louco para me empurrar essa responsabilidade.

Foi então que uma ideia estúpida — e talvez genial — me ocorreu.

Rolei os contatos do celular até o nome do meu irmão. Liguei, e ele atendeu no terceiro toque.

— Caleb?

— Nicolas. Preciso de um favor.

— Hum… Isso nunca é bom. — A voz dele soou hesitante. — O que foi?

Me joguei na cadeira e estiquei as pernas, encarando o teto.

— Lembra do acordo ridículo que o pai fez? O casamento arranjado?

— Lembro. — Ele riu do outro lado. — Você ainda tá fugindo disso?

— Sim. E agora preciso que você vá no meu lugar.

— O quê?!

Afastei o telefone do ouvido com a reação dele.

— Não é grande coisa. Só apareça no encontro e diga que é você, mas está lá para me representar.

— Caleb, isso é loucura.

— Não precisa fazer nada além de sentar e conversar. Só quero que ela saiba que eu tenho interesse, mesmo que seja de longe.

Nicolas riu de novo, mas dessa vez nervoso.

— E se ela perceber que eu não sou você?

— Ela nunca me viu pessoalmente. Além disso, nós têmos o mesmo sobrenome. Não tem erro.

Ele hesitou, e eu sabia que estava quase o convencendo.

— Cara, eu não acho que isso vai dar certo…

— Nicolas… — Apertei a ponte do nariz, já irritado. — Me faz esse favor. Se você fizer, eu fico te devendo uma. E você sabe que não dou favores à toa.

Houve um silêncio do outro lado. Eu o conhecia bem. Nicolas adorava ter vantagem sobre mim.

— Tá bom, tá bom. Eu vou.

Sorri.

— Sabia que podia contar com você.

— Mas se isso der errado, eu vou te jogar na fogueira, Caleb.

— Isso não vai acontecer.

Desliguei o telefone, me sentindo mais leve.

Agora, pelo menos, eu tinha um problema a menos para lidar.

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