Se case!

Pamela

Cheguei em casa exausta. O salto alto parecia mais cruel hoje, talvez porque eu tenha passado boa parte do dia andando de um lado para o outro no escritório, tentando ignorar o fato de que meus olhos insistiam em buscar Caleb Belmont. Era frustrante. Um homem como ele não deveria existir no ambiente de trabalho.  

Eu larguei minha bolsa no sofá e me joguei na cadeira da mesa de jantar, sentindo meus ombros caírem. O escritório, sem ele, parecia vazio, sem graça. Apenas pilhas de papéis, reuniões intermináveis e aquela máquina de café que parecia cuspir água suja em vez de café de verdade. Mas, quando Caleb estava lá, tudo ganhava um brilho diferente — ou talvez fosse só o jeito que ele usava aqueles ternos perfeitamente ajustados.  

— Preciso parar com isso — murmurei, balançando a cabeça enquanto me levantava.  

Fui para a cozinha e comecei a preparar algo simples. Ninguém ia fazer isso por mim. Flávia e Valentina não mexiam um dedo sequer. A diarista limpava, mas não cozinhava. Então, era sempre eu, cozinhando após um dia cansativo de trabalho, como de costume.  

Preparei uma macarronada rápida, o tipo de receita que me salvava sempre que eu estava sem paciência. Quando finalizei, chamei as duas. Valentina apareceu primeiro, com aquele jeito despretensioso, se jogando na cadeira como se fosse uma princesa esperando ser servida.  

— Isso está uma delícia, irmãzinha — disse ela, com um tom exageradamente doce.  

Minha mão parou no ar por um segundo. Olhei de relance para Valentina. Estranho. Ela nunca elogiava nada. Na verdade, estava mais acostumada com suas reclamações do que qualquer outra coisa.  

— Obrigada — respondi, desconfiada, enquanto me servia.  

Flávia se sentou em seguida, sem dizer nada. Mas eu percebi que havia algo diferente nela. Ela estava calada, o que nunca era um bom sinal.  

Foi só depois de alguns minutos de silêncio que ela pigarreou. Eu levantei os olhos do prato.  

— O que foi? — perguntei, direta.  

Flávia hesitou, trocando olhares com Valentina, que apenas se levantou, limpou a boca com o guardanapo e disse:  

— Eu vou deixar vocês conversarem. — Ela saiu da mesa, mas não sem me lançar um olhar carregado de segundas intenções.  

Algo estava acontecendo. E eu sabia que, quando Flávia queria falar "algo sério", dificilmente seria coisa boa.

Flávia ajeitou o cabelo, como se estivesse prestes a anunciar a coisa mais natural do mundo. Mas eu sabia que, quando ela fazia isso, era porque vinha bomba.  

— Fechei um contrato de casamento com a família Belmont — ela disse, casual, como se estivesse me contando que ia ao mercado comprar pão.  

Eu parei de mastigar, encarando-a por alguns segundos, tentando entender se aquilo era uma piada.  

— O quê? — deixei escapar, sem conseguir esconder o choque.  

Flávia sorriu de canto, mas seu olhar sério não mudou.  

— É isso mesmo que você ouviu. É uma ótima oportunidade para nós.  

"Ótima para quem?", pensei, mas apenas a encarei em silêncio. Algo me dizia que ela não tinha terminado. E, quando Flávia tinha algo a mais para dizer, era porque a notícia seguinte conseguia ser ainda pior.  

— O que mais? — perguntei, cruzando os braços.  

Ela respirou fundo, como se estivesse calculando as palavras.  

— Você se casará com Nicolas Belmont.  

Por um momento, achei que tinha ouvido errado. Então, soltei uma risada curta, acreditando que aquilo não passava de uma brincadeira ridícula.  

— Está brincando, certo?  

Flávia, no entanto, manteve-se firme.  

— Eu não estou brincando, Pamela.  

Minha risada morreu.  

— E por que você não casa a Valentina, já que ela é quem sonha em se casar?  

— Isso não faz sentido. Valentina é muito jovem e… você é a irmã mais velha. É natural que o casamento aconteça com você primeiro.  

Meu garfo caiu no prato.  

— Isso é uma palhaçada. Eu não vou me casar.  

Levantei-me, largando o prato ali mesmo, e subi as escadas sem olhar para trás.  

Flávia, no entanto, veio atrás de mim, apressada.  

— Pamela, espera.  

— Não tem o que conversar.  

— Tem sim! — ela disse, segurando meu braço. Seus olhos estavam mais intensos agora, quase suplicantes. — O seu pai era muito amigo dos Belmonts. Eu não posso recusar essa oferta.  

— Oferta? Eu sou uma pessoa, não um bem de troca!  

— Essa é a única maneira de salvar a casa.  

Minhas pernas pararam sozinhas. Eu me virei devagar, encarando-a.  

— Salvar a casa?  

Flávia desviou o olhar.  

— Eu… hipotecamos a casa, Pamela. Estamos falidas. E as dívidas… elas só aumentam.  

Meu coração começou a bater forte, quase dolorido. Não sabia se estava mais irritada ou assustada. A realidade desabava sobre mim como um peso impossível de carregar.

***

Sentei-me na beira da cama, as mãos trêmulas entrelaçadas no meu colo. A cabeça girava com tanta força que eu mal conseguia pensar direito. Flávia estava sentada na poltrona do meu quarto, mas eu mal conseguia encará-la.  

— Como assim você hipotecou a casa? — perguntei, sem conseguir conter o amargor na voz. — Como você pôde fazer isso?  

Flávia abaixou a cabeça, passando as mãos pelo rosto, como se estivesse tentando encontrar uma explicação que soasse menos absurda.  

— Eu não tinha outra escolha…  

— Não tinha escolha? — minha voz subiu um tom. — Essa casa é a única coisa que meu pai e minha mãe deixaram para mim. Você não tinha o direito de fazer isso!  

Ela levantou o olhar, e vi as lágrimas escorrendo pelo rosto dela. Parte de mim sabia que Flávia não estava mentindo sobre a situação difícil, mas aquilo não mudava nada.  

— Eu sei — ela murmurou, a voz trêmula. — Eu sei que não tinha esse direito.  

— Então por que fez isso?  

— Porque eu não sabia mais o que fazer! — Flávia explodiu, mas logo baixou o tom, limpando as lágrimas com a palma da mão. — As dívidas estavam sufocando a gente, Pamela. Depois que o Augusto morreu, eu tentei manter tudo em ordem, mas…  

Ela fez uma pausa, como se não conseguisse continuar.  

— Mas o quê?  

— As dívidas só aumentaram. E agora… agora estamos devendo mais do que quando o Augusto morreu.  

A raiva borbulhou no meu peito, subindo como uma chama difícil de apagar.  

— E você não achou que seria bom me contar?  

— Eu não queria te sobrecarregar… — Flávia abaixou a cabeça de novo, encolhendo os ombros como uma criança que sabia que havia cometido um erro.  

— Sobrecarregar? — ri, mas sem humor algum. — Você acha que esconder isso de mim ajuda em alguma coisa?  

— Eu pensei que daria tempo de resolver…  

Soltei um suspiro longo e frustrado, apertando as têmporas. A sensação de impotência era quase sufocante.  

De repente, Flávia deslizou da poltrona e se ajoelhou dramaticamente na minha frente, segurando minhas mãos com força.  

— Por favor, Pamela… nos salve dessa ruína.  

— Flávia…  

— Eu posso aguentar, mas… Valentina… — ela olhou para cima, os olhos marejados. — Você sabe como ela é. Ela não sobreviveria a isso.  

Eu fechei os olhos, lutando contra a onda de frustração e cansaço. Parte de mim queria gritar, mas outra parte sabia que, por mais que odiasse admitir, Flávia estava certa.

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