— Isso é coincidência ou ele tem um radar pra nos encontrar? — perguntou Elena, forçando um tom leve, mas o coração batendo mais rápido. — Com o Victor, nunca é só coincidência — respondeu Damien, terminando o café com um gole rápido. — Vamos, a reunião é em cinco minutos. Não queremos o chefe eterno bravo com a gente. --- A reunião com a NovaTech foi um teste de resistência. A sala de conferências era uma caixa de vidro e aço no vigésimo andar, com uma mesa longa cercada por cadeiras de couro e uma tela que exibia gráficos coloridos que Elena mal entendia. Victor presidia a mesa, os olhos cinza fixos nos representantes da NovaTech – dois homens de ternos caros e uma mulher de tailleur azul que falava rápido demais sobre "sinergias" e "metas de crescimento". Elena entregou o café preto a Victor, sentindo os dedos dele roçarem os dela por um instante – frios, quase gelados –, e sentou-se ao lado dele, o caderno aberto para anotar tudo. Damien estava do outro lado da mesa, liderando
Elena acordou com o eco do sonho ainda reverberando em sua mente, os olhos cinza da figura sombria fixos nela como se pudessem atravessar o véu entre o sono e a vigília. O quarto estava escuro, o relógio marcando 5h43, e a chuva da noite anterior reduzira-se a um gotejar intermitente contra a janela. Ela ficou deitada por alguns minutos, encarando o teto manchado, tentando convencer-se de que era só um pesadelo – o resultado de um dia longo, fotos antigas e a imaginação que sempre fora seu pior inimigo. Mas o peso no peito não cedia, e o sussurro do seu nome naquela voz grave continuava a ecoar, como se tivesse deixado uma marca invisível. Arrastou-se da cama, os pés tocando o chão frio com um estremecimento, e caminhou até o banheiro, o espelho refletindo uma versão dela que parecia mais pálida do que o normal. Os cabelos castanhos estavam emaranhados, os olhos verdes opacos com o cansaço, e as olheiras mais pronunciadas do que no dia anterior. "Você está ótima, campeã," murmurou par
A reunião com o financeiro foi um exercício de paciência. A sala de conferências era a mesma do dia anterior – vidro e aço, gráficos na tela, cadeiras de couro que rangiam a cada movimento. Victor estava lá, sentado à cabeceira como um rei em seu trono, os olhos cinza fixos nos relatórios que Elena entregara a ele com um leve tremor nas mãos. O chefe do financeiro, um homem baixo de óculos grossos chamado Harold, falava em um tom monótono sobre "margens de lucro" e "projeções trimestrais", enquanto Elena anotava tudo no caderno, o café preto de Victor intocado ao lado dele. Ele parecia mais distante hoje, o rosto uma máscara de pedra, mas os olhos a seguiam sempre que ela se movia – ajustando a caneta, virando uma página, cruzando as pernas sob a mesa. Era sutil, quase imperceptível, mas ela sentia o peso daquele olhar como uma corrente invisível. Quando Harold terminou, Victor tomou a palavra, a voz grave cortando o ar como uma lâmina afiada. — As projeções estão abaixo do esperad
Elena acordou com o bilhete anônimo ainda ecoando em sua mente, as palavras "Ele vive demais" gravadas como uma tatuagem invisível. O relógio marcava 5h07, o quarto escuro envolto no silêncio pesado da madrugada, quebrado apenas pelo gotejar intermitente da chuva contra a janela do beco. Ela ficou deitada por um momento, encarando o teto manchado de infiltração, o peso da noite sem sono pressionando os ombros como uma mão fria. O sonho da floresta escura voltara, os olhos cinza brilhando na névoa, mas dessa vez a voz não dissera seu nome – apenas repetira "vive demais" num sussurro que parecia atravessar o tempo. Levantou-se, o chão gelado sob os pés descalços enviando um arrepio que a acordou o suficiente para acender a luz fraca da cozinha. O apartamento era um caos familiar – a pia cheia de pratos que ela ignorava há dias, o sofá de segunda mão com a mola solta cutucando o tecido, o cheiro de café velho pairando no ar. Pegou o bilhete da bolsa, desdobrando-o sobre a mesa bamba, e e
Elena caminhou até o escritório de Victor, o corredor parecendo mais longo do que o normal, o clique dos saltos ecoando como um tamborilar de guerra. Bateu na porta, o som firme contra a madeira escura, e a voz grave respondeu de dentro. — Entre — disse Victor, o timbre baixo carregado de um peso que parecia atravessar o espaço. Ela abriu a porta, o escritório austero recebendo-a com o mesmo silêncio opressivo – a mesa de mogno polida, as cadeiras de couro preto, as pinturas abstratas nas paredes brancas. Victor estava de pé perto da janela, olhando para a cidade lá embaixo, o terno cinza-escuro impecável contra o vidro embaçado pela chuva. Na mão direita, ele segurava o medalhão dourado, os dedos longos e pálidos traçando os contornos como se fosse um ritual antigo. A luz fraca refletia no ouro, destacando detalhes que ela não vira antes – gravuras intricadas, talvez símbolos, que pareciam dançar sob o movimento dos dedos dele. — Seu café, Sr. Blackwood — disse Elena, colocando a c
Elena ficou paralisada, o desenho ainda repousando no chão como uma relíquia caída de um altar profano, os traços delicados da mulher de 1789 encarando o teto com uma serenidade que parecia zombar do caos que tomava conta dela. O escritório de Victor Blackwood, mergulhado na penumbra fria da noite, parecia encolher ao redor dela, as paredes brancas e as pinturas abstratas transformando-se em sentinelas silenciosas que testemunhavam o confronto. O coração dela batia descontrolado, um tamborilar frenético contra as costelas que ecoava em seus ouvidos como um tambor de guerra, enquanto os olhos cinza de Victor a perfuravam com uma intensidade que era ao mesmo tempo acusatória e insondável. Ele estava na porta, a figura alta e imponente recortada contra a luz fraca do corredor, o terno cinza-escuro impecável como uma armadura que escondia qualquer vulnerabilidade. Mas havia algo nos olhos dele – uma sombra que não era só raiva, um peso que parecia atravessar o espaço entre eles como uma co
O dia passou numa névoa de tarefas que ela executava no piloto automático, a mente girando em torno de Victor e do mistério que ele representava. Os e-mails chegavam em um fluxo constante – solicitações de reuniões, relatórios para revisar, lembretes de prazos que pareciam se multiplicar como ervas daninhas –, e ela respondia com uma eficiência mecânica que escondia o caos interno. A reunião das 10h com a NovaTech foi cancelada por um e-mail curto de Victor – "Adiada para amanhã. Prepare os dados revisados" –, e ela passou a manhã organizando números e gráficos que mal entendia, os olhos ardendo de tanto encarar a tela. O café preto que levara para ele ficou intocado na mesa do escritório, uma oferenda rejeitada que ela recolheu em silêncio, o calor da caneca contrastando com o frio que sentia nas mãos. Victor a evitava, isso era claro como o dia. Quando precisava de algo, enviava mensagens curtas por e-mail – "Cancele a ligação das 11h", "Envie os relatórios para o financeiro até o m
Ele hesitou, as palavras presas na garganta, mas finalmente falou, a voz baixa e comedida. — Boa noite, Senhorita Carter — disse Victor. Ela assentiu, recuando, os passos rápidos e desajeitados enquanto fugia em direção ao elevador. As portas deslizaram abertas com um leve "ding", e ela entrou, pressionando o botão do térreo com mais força do que o necessário. Enquanto o elevador descia, o zumbido do motor preenchia o silêncio, mas não conseguia abafar a tempestade de pensamentos girando em sua mente. O desenho, o medalhão, o bilhete — tudo se entrelaçava como vinhas, sufocando-a com perguntas que ela não podia responder. A viagem para casa foi um borrão — ruas escorregadias pela chuva refletindo as luzes da cidade, o ronco do metrô vibrando através de seus ossos. Ela mal registrava o mundo ao redor, os pensamentos presos naquele escritório, naqueles olhos cinza que pareciam ver demais. Quando chegou ao apartamento, o cansaço era um peso físico, arrastando-a enquanto ela lutava com