O vento frio de fim de tarde carregava um aroma das folhagens próximas, enquanto Tábata esperava ao lado de Paulina e o corretor de imóveis, indicado por Guilherme, em frente ao prédio comercial que visitariam naquele dia. O local era praticamente deserto e a fachada nem um pouco atraente, mas tinham esperança de ser aquele o local para a realização do sonho de Paulina.Fugindo das declarações sobre sua filiação e da ansiedade com o processo de guarda, não hesitou em aceitar o convite para ajudar nas visitas ao futuro local que Paulina iniciaria sua empresa.— Tá tudo bem, abelhinha? — perguntou para a bebê, que se agitava no carrinho. Lean olhou para ela com aqueles olhinhos amendoados, cheios de curiosidade, e soltou um som alegre que a fez sorrir.— Espero que ela não demore — comentou Paulina, apertando a alça da bolsa. — Paola insistiu tanto para me encontrar que não tive alternativa... — lamentou.Tábata assentiu, balançando levemente a cabeça enquanto acariciava o cabelo filha.
Na hora do jantar, enquanto Guilherme comia, Tábata alimentava Lean com papinha de legumes. Satisfazendo a fome da filha, Taby aproveitou que não tinha mais que se concentrar no perigo das mãozinhas agitadas baterem na colher, para falar sobre o ocorrido naquela tarde.— Paulina se encantou com o imóvel que vimos hoje — disse limpando a boca da filha.— Sim. Enfim a busca acabou — ele comemorou se erguendo para levar o prato vazio para a pia.— Ela tem muitas ideias. — Olhando para as costas dele, umedeceu os lábios e contou hesitante: — Paulina me convidou para trabalhar com ela... Na empresa que vai montar... E eu... aceitei...Guilherme moveu a atenção do prato que lavava, virando-se para olhá-la, a surpresa reluzindo nos olhos dourados.— Tem certeza de que quer trabalhar agora?Tábata travou, um nó se formando em sua garganta e o coração se apertando em um instante.— Acha que não devo?Ele se aproximou, ajoelhando na frente de Tábata, os dedos úmidos pela água da pia cobrindo a
Guilherme empurrou a porta da sala de Simone com tanta força que ela bateu contra a parede com um estrondo e voltou, fazendo ela e o cliente que a acompanhava, erguerem os olhos assustados.— Guilherme?! — ela perguntou confusa, enquanto ele atravessava a sala em sua direção.Ignorando o homem sentado em frente à advogada, ele espalmou as mãos na escrivaninha dela.— Sua obsessão não tem moral, nem vergonha? — ele perguntou furioso. — Como pode financiar Mateus para tirar a guarda da Lean de mim e da Tábata?Simone piscou lentamente, como se digerisse a acusação, e então virou-se para o cliente com um sorriso calculado.— Senhor Silva — ela se virou para o cliente —, remarcarei nossa reunião em breve. Infelizmente, surgiu um imprevisto.O homem, visivelmente desconfortável, não esperou que ela repetisse. Pegando sua pasta, levantou-se às pressas, murmurando algo indistinto antes de desaparecer pela porta escancarada.Ela se ergueu e, depois de dar um olhar fulminante aos colegas que o
Carlos olhou para Simone, sua expressão séria.— Isso é verdade?— Claro que não. Ele está sendo manipulado por aquela mulherzinha infeliz — mentiu sem titubear.Carlos olhou para ela, a expressão carregada de decepção.— Conheço você e Guilherme desde que estavam no ventre de suas mães. Aceitei ambos embaixo de minhas asas quando demonstraram gosto pela lei. Sei o tipo de pessoas se tornaram — pontuou olhando-a com firmeza. — Guilherme não é o tipo de homem que age por impulso, sem provas. Se ele está dizendo isso, é porque tem motivos de sobra. Por isso pergunto novamente: É verdade?— Ele está sendo irracional... Não vai deixar ele sair do escritório, vai?— Conversarei com ele.Ele saiu da sala, deixando Simone sozinha. Ela olhou para a porta fechada, sa
Guilherme fechou a porta de sua sala. Com a bolsa carteiro no ombro e o casaco dobrado sobre o braço, seguiu para a porta separando o escritório da recepção. De queixo erguido e olhar vidrado a frente, ignorava os cochichos e olhares dos colegas, todos querendo decifrar o que ocorria, mas sem coragem de questioná-lo.Passando pelas portas, sentiu o peso dos olhares curiosos das colegas em suas costas. Mas não olhou para trás. A mente já estava focada no que vinha a seguir: uma semana longe de Simone; uma semana perto de Tábata e Lean; uma semana para arranjar um jeito de impedir o plano de sua ex contra elas.Ao chegar à recepção, as recepcionistas interromperam a conversa animada ao vê-lo se aproximar. Parou em frente ao balcão, a postura rígida e a voz calma.— Mila, Vanessa — começou, alternando o olhar entre as duas. — Ficarei fora até quinta que vem. Qualquer urgência, me avisem por e-mail ou WhatsApp. E, por favor, desmarquem as reuniões agendadas para esses dias.Mila abriu a b
Tábata empalideceu, apertando Lean em seus braços.— O quê? Como ela pode fazer algo assim?Assim que a pergunta saiu de seus lábios, o choque foi substituído pelo cinismo. Óbvio que Simone seria a pessoa por trás da inesperada vontade de Mateus em ser pai, na ostentação que o envolvia. O dinheiro daquela mulher era tão podre quanto o coração dela.— Ela é capaz de qualquer coisa — Guilherme disse, colocando em palavras a conclusão que Taby chegou. Ele esfregou os olhos, os ombros caídos ao contar: — Fiquei com tanta raiva que anunciei minha saída definitiva do escritório.— Gui, não pode fazer isso — ela se opôs de imediato. A ideia de Mateus envolvido com Simone era perturbadora, mas a de Guilherme jogando fora anos de trabalho árduo por isso era ainda pior. — Você ama seu trabalho. Entendo sua raiva... Compartilho dela. Mas abandonar tudo? Você batalhou por esse espaço, por esse respeito. Não pode desistir por algo que não é culpa sua.Carinhoso, ele tocou o rosto dela.— Amo meu t
O parque do Ibirapuera estava especialmente tranquilo naquela tarde. A chuva dos últimos dias tinha dado um descanso e o sol, filtrado pelas árvores, criava rastros de luz no chão, o ar fresco ainda carregando o cheiro de grama molhada. Guilherme caminhava com Lean presa ao canguru, a bebê balbuciando feliz. Tábata os acompanhava, observando-os com um sorriso terno, mas, por trás do sorriso, havia uma inquietação crescente.Guilherme andava tranquilo, os dedinhos gorduchos da bebê agarrados ao tecido da camisa dele, soltando murmúrios satisfeitos. O carinho que ele dedicava à menina era genuíno, natural.— Olha só, abelhinha — Guilherme disse, apontando para um casal de patos deslizando pela lagoa. — Os patinhos nadando.Lean balbuciou, os olhinhos amendoados brilhando de curiosidade seguindo um pássaro na direção contrária, as mãozinhas rechonchudas agarradas a camisa dele. Tábata sorriu, mas era superficial, apenas no exterior. O calor no peito que sentia ao vê-lo assim era rapida
Guilherme estacionou o Ford Ranger em frente à casa dos pais de Tábata, o motor silencioso contrastando com o turbilhão de emoções que ela sentia. Ele olhou para ela, os olhos âmbar cheios de preocupação, enquanto ela encarava a fachada da casa onde cresceu. A casa parecia à mesma de sempre, porém, Tábata temia que, dentro daquelas paredes, houvessem segredos se remoendo em sua fundação, segredos que explicariam anos de rejeição e tratamento frio.— Tem certeza de que quer fazer isso? — Guilherme perguntou apertando as mãos no volante, sem desligar o motor.Ela inspirou fundo. O ar preencheu os pulmões, mas não dissipou a pressão em seu peito.— Preciso saber... — murmurou, os dedos apertando o cinto de segurança, hesitantes em soltá-lo. — Não aguento viver com essa dúvida. Se minha vida foi uma mentira, mereço descobrir a verdade.Do banco de trás, um som suave preencheu o espaço. Lean balbuciava algo incompreensível, os dedinhos tentando agarrar um dos brinquedos presos à cadeirinha