AIYANA
A sensação de calor no peito, aquele fogo incontrolável que dançava dentro de mim, ainda estava lá, como se a chama ancestral tivesse se enraizado em meu corpo. Mas o que antes parecia ser um privilégio agora só me trazia agonia.
A cada passo que dava, sentia os olhares da alcateia pesando sobre mim, frios, duros, implacáveis. O desprezo estampado em seus rostos me cortava mais do que qualquer palavra. Eles me viam como uma intrusa, uma ameaça. Não pertencente a eles. E, se já não fosse suficiente, eu tinha que enfrentar o ódio de Isabela e a rejeição estampada no olhar de Maxim.
Isabela se aproximou com um sorriso venenoso nos lábios, seus olhos brilhando com um ódio latente. Eu podia quase sentir a tensão pulsando no ar.
— Você realmente acha que pode simplesmente ser a "escolhida", Aiyana? — disse ela, a voz baixa e cortante, quase como se quisesse me ferir com cada sílaba. — Sua mãe era uma bruxa, e agora você acha que a chama te escolheu por acaso? Não engula essa mentira. Eu sei o que você é, e sei que fez algo para alterar o resultado.
—O q-quê? Eu não...
Minha garganta se apertou com a acusação. Minhas mãos tremiam levemente, mas eu apertei a mão de Alyssa com mais força, buscando um pouco de segurança. Eu já sentia o peso da herança de minha mãe, mas ouvir isso de Isabela... era como uma lâmina afiada, enterrada profundamente. Eu me lembrava tão pouco de minha mãe.
— Eu não escolhi isso! — minha voz saiu mais rouca do que eu esperava, mas eu a mantive firme, tentando controlar a raiva que se formava dentro de mim. — Eu não sou minha mãe.
Isabela deu uma risadinha sarcástica, cruzando os braços com um olhar de desprezo. Alyssa apertou minha mão ainda mais, como se me transmitisse coragem através do toque.
— Ah, claro. Como se fosse tão simples. Você não é sua mãe, mas é a mesma coisa. Uma bruxa. — Ela deu um passo em minha direção, a voz mais baixa agora, quase um sussurro, mas venenosa. — E agora você vai tentar roubar o que é meu, como sua mãe fez com o seu pai? Ela o roubou da minha mãe.
As palavras de Isabela me atingiram como um soco no estômago. Eu mal tinha uma lembrança da minha mãe, mas ela sempre foi o ponto de dor que eu carregava comigo. E agora Isabela estava misturando isso com uma mentira amarga, tentando fazer parecer que eu estava roubando algo que nunca quis.
Minha avó apareceu ao meu lado, como uma tempestade em forma de mulher. Ela estava firme, intransigente. Olhou para Isabela com uma fúria que eu raramente via nela.
— CALA A BOCA, ISABELA! — A voz da minha avó ressoou como um trovão, cortando o ar pesado entre nós. Ela colocou uma das mãos firmemente em meu ombro, me protegendo, e então, com os olhos como facas, fixou-se em Isabela. — Não ouse falar essas palavras a sua prima. Não ouse! Você não sabe o que está dizendo, e, se continuar, vai se arrepender de cada sílaba.
— Chega, Isa. — Maxim. Ele estava tenso, os punhos cerrados ao lado do corpo, o rosto tomado por uma raiva que queimava nos olhos. Eu podia ver a dor nele, mas ela não era dirigida a mim. Ele estava furioso consigo mesmo. E comigo. — Eu não preciso disso. Não preciso de você, Aiyana. Eu… amo Isabela, e vou ficar com ela. Não vou ignorar meus sentimentos por causa de uma chama idiota.
Eu não pude evitar. Meu coração se apertou, e um nó se formou na minha garganta. Ele... ele me odiava? Antes, ele nem sabia da minha existência, e agora parecia me ver como a responsável por todo o seu sofrimento. O desprezo nos olhos dele era como uma faca cravada em meu peito.
O ar estava espesso com tensão, e todos ao redor pareciam aguardar o desfecho. Scott Blackwood, o pai de Maxim, avançou, com sua postura rígida e cheia de autoridade. Quando ele falou, sua voz soou como uma sentença.
— A chama nunca erra, Maxim. — Ele olhou para o filho com uma frieza calculada, como se estivesse mais preocupado com a honra da família do que com qualquer outro sentimento. — Todos devem respeitar a força dos ancestrais. Ela escolheu Aiyana. Não há mais nada a discutir.
Maxim não respondeu de imediato, mas o desprezo transbordou de seus olhos enquanto ele olhava para mim. Ele deu um passo atrás, afastando-se de tudo o que representava essa escolha.
— A chama pode ter escolhido, mas eu não. Não vou deixar que isso me controle. — Ele estava desafiante, a voz tensa com raiva, como se sua última resistência estivesse quebrando a cada palavra.
Scott suspirou, resignado, como se já esperasse essa reação. Ele olhou para Maxim, então para mim, e sua voz soou como um decreto.
— A consulta será revista quando Aiyana completar 21 anos. Até lá, aguardaremos.
Aquelas palavras "aguardaremos" caíram sobre mim como uma maldição. Não era só uma questão de tempo; parecia que minha vida, meu destino, estavam sendo colocados em espera. Esperar o quê? Eu também não queria nada disso.
A sensação de ser vista como uma intrusa, alguém que não pertencia se intensificou. Meus olhos encontraram os de Alyssa. Ela sorriu suavemente para mim, como se dissesse que tudo ficaria bem. E, com isso, um pouco de alívio me invadiu, embora o peso da rejeição ainda estivesse em meus ombros.
Mas, então, eu olhei para Maxim mais uma vez. O ódio ainda estava lá, em seus olhos, e foi como se tudo dentro de mim se rompesse. Eu não podia suportar mais. Não mais os olhares, não mais as palavras, não mais aquela dor insuportável que estava surgindo no meu peito.
Eu olhei para a minha avó, senti o calor da mão dela no meu ombro, mas a dor dentro de mim ainda estava lá, afundando como uma âncora pesada. Era como se o peso do mundo tivesse se acumulado sobre meus ombros, e cada olhar, cada palavra, fosse um lembrete de que eu não era bem-vinda. Eu não sabia o que fazer com isso.
Sussurrei, mais para mim mesma do que para qualquer outra pessoa:
— Eu vou para a floresta...
E então, sem olhar para trás, comecei a correr. Não sabia exatamente onde estava indo, mas sentia que, se ficasse ali, eu iria desmoronar. As vozes de Isabela, a raiva de Maxim, os olhares da alcateia... tudo isso me esmagava, e eu não podia suportar mais.
Corri sem direção, os pensamentos misturados, o coração pesado. Eu precisava de espaço, de ar, de algo que me desse alívio. Mas, mais do que tudo, eu precisava me afastar de todos eles. Se eu ficasse ali, na frente deles, eu ia afundar. Então, corri, sem olhar para trás.
AIYANAO amanhecer estava perto de chegar, mas eu já estava de volta à beira da floresta, caminhando devagar. Meu corpo cansado ainda sentia os efeitos da noite mal dormida, e minha mente estava um turbilhão. A caverna onde passei a noite, embora já fosse um lugar familiar para mim, não me trouxe a paz que eu procurava. Dormir na floresta já não era tão fácil quanto antes. As árvores começaram a clarear com os primeiros raios de sol, mas o ar ainda estava frio, e eu sentia meu corpo arrepiado, não só pela temperatura, mas também pela inquietação. Meu coração batia mais rápido a cada passo que dava em direção à aldeia. Eu não sabia o que iria enfrentar lá, mas sabia que não podia continuar fugindo. Eu precisava voltar.De repente, alguém me pegou pela cintura, puxando-me com força para fora da trilha. Antes que pudesse reagir, uma mão cobriu minha boca, abafando meu grito. Meu corpo entrou em pânico, mas não pude fazer mais nada além de tentar me soltar. Estava sendo arrastada, forçad
AIYANAUma batida suave na porta me acordou, e eu levantei a cabeça, atordoada e ainda com a sensação de que a noite inteira tinha sido uma luta. A batida se repetiu, mais firme desta vez.Já se passou um ano desde que a chama revelou que Maxim e eu somos companheiros destinados, e as coisas só pioraram. Isabela se tornou mais cruel a cada dia, e ela fazia questão de transformar cada minuto que eu passava perto dela em um inferno. Não havia um só momento em que ela não fizesse questão de esfregar na minha cara o quanto ela e Maxim estavam juntos e felizes, com toques constantes e beijos sempre visíveis ou quando ela o fazia dizer que a amava. Ele, por sua vez, me ignorava na maior parte das vezes, mas não fazia nada para impedir Isabela em seus ataques maldosos.Às vezes, eu sentia o olhar dele. Um olhar que parecia me atravessar, e por um breve momento, eu via algo ali. Mas era tão efêmero, tão pequeno, que logo desaparecia. Maxim continuava distante, implacável, como se eu fosse ins
AIYANAA música pulsa no salão, a batida vibrando no meu peito enquanto giro ao lado de Alyssa. As luzes coloridas refletem no vestido rosa brilhante dela, e por um momento, me sinto leve. O vestido verde floresta molda-se ao meu corpo, valorizando minhas curvas, e o decote ousado me faz sentir poderosa. Nunca me senti bem dançando, mas prometi à vovó que me divertiria, então estou tentando. E, de certa forma, está funcionando.Até que uma sensação quente percorre minha espinha, um arrepio que nada tem a ver com a música ou com a pista de dança lotada. É um olhar. O olhar. Não preciso ver para saber que é Maxim.O fogo daquele olhar queima minha pele como um chamado que me recuso a atender. Ele está aqui. Em algum canto do salão, observando-me. Alyssa puxa minha mão, rindo animada.— Dois gatos a caminho, e um deles está olhando direto para você!— Quê? — arqueio a sobrancelha, mas antes que eu possa reagir, os veteranos já estão aqui.Um deles, alto, cabelos castanhos desarrumados e
AIYANAAssim que chego ao estacionamento, o ar frio bate contra minha pele quente. Meus olhos encontram sua caminhonete. É azul como o céu antes do amanhecer, na verdade, exatamente como o céu, às três horas da madrugada. Ela parece tão deslocada quanto ele, robusta e sombria.Maxim já está ao lado do veículo, os punhos ainda manchados de sangue, os músculos tensionados como se estivesse se segurando para não explodir novamente. Ele aponta para a caminhonete e me olha.— Entra. — ordena.Meu instinto me manda recuar. Ainda posso sentir a eletricidade no ar entre nós, a mesma energia bruta que vi em seus olhos quando ele estava socando Seth. Mas cruzo os braços e ergo o queixo, tentando disfarçar o fato de que minhas mãos ainda tremem.— E Isabela? Ela não vai gostar nada de me ver no seu carro — provoco.Maxim apenas solta um riso sombrio.— Entra. Agora.— Vou esperar por Alyssa. — digo.— Aqui? No meio de um estacionamento vazio, com o vestido sujo de sangue e rasgado?Bufo, mas v
AIYANAQuando Maxim se levanta, meu instinto me diz para recuar, mas não o faço. Não quero dar esse gosto a ele.— Eu vim me desculpar pelo que disse antes — ele continua, esfregando a nuca. — Eu não quis dizer que você era culpada pelo que o Seth estava prestes a fazer. Eu… eu me deixei cegar pela raiva. Isso sempre acontece quando estou perto de você. É mais forte do que eu. Mas eu sei que você não teve culpa e nunca deveria ter dito aquilo.As palavras dele me pegam de surpresa. Max raramente se desculpa. E, quando o faz, nunca parece realmente afetado. Mas agora… há algo na forma como ele não consegue ficar parado.—É, você não deveria.Ele evita meu olhar, os dedos inquietos tamborila
AIYANAMeu cabelo úmido grudava na pele, uma gota escorrendo lentamente pela minha clavícula antes de desaparecer sob a toalha apertada ao meu corpo.E então lá estava ele, parado no meio do quarto, o olhar sombrio e indecifrável.Meus olhos caíram para suas mãos manchadas de sangue seco. Seth. A lembrança do que aconteceu no baile passou na minha mente, mas eu a afastei. — Eu sei que estou sendo um idiota — ele quebrou o silêncio, a voz carregada de frustração. — Mas não consigo evitar. Você acha que eu queria isso? Você acha que eu queria sentir essa merda toda vez que olho para você?O riso que escapou de mim foi seco, amargo.— Ah, claro. Porque eu sou o seu grande problema agora. — Cruzei os braços, sentindo a umidade do meu cabelo escorrer em pequenas gotas. — A Chama Ancestral nos jogou nessa bagunça, Maxim, mas a diferença entre nós é que eu nunca te culpei.Ele passou a mão pelo rosto, como se tentasse organizar os pensamentos.— Não é assim tão simples…— Não? — dei um pass
AIYANAEu não esperava nada além de um dia comum. Trabalho, banho, cama. Era assim todo ano. Mas quando abri a porta de casa e vi todas aquelas pessoas reunidas, precisei de um segundo para entender o que estava acontecendo.Alyssa estava na frente, segurando um bolo coberto de chantilly e morangos, um sorriso largo estampado no rosto.— Feliz aniversário, sua loba rabugenta!Minha avó, Aldrich, estava ao lado dela, os olhos brilhando com aquele carinho que só ela conseguia transmitir. Azz pulava animado, segurando uma bexiga colorida, enquanto Chloé cruzava os braços e lançava um meio sorriso, como se dissesse: "Sim, eu estou aqui também."Luca assobiou.— A expressão dela tá ótima. Parece que viu um fantasma.Ele não estava totalmente errado.— O que…? — Minha voz falhou.Alyssa revirou os olhos.— O que parece? É uma surpresa!Minhas mãos ainda estavam presas às alças da bolsa, e eu percebi que meu corpo inteiro estava rígido. Eu nunca comemorava meu aniversário. Nunca quis.Mas al
AIYANAA respiração de Maxim era quente contra a minha boca, e algo dentro de mim se retorceu, uma força invisível me puxando para ele.E então, ele voltou.O segundo beijo não foi um toque.Foi algo mais profundo, mais faminto.Os lábios dele moldaram os meus, quentes e exigentes, como se quisesse me gravar nele. Sua mão deslizou da minha bochecha para a nuca, puxando-me mais para perto, enquanto sua outra mão segurava minha cintura.E foi aí que aconteceu.Algo dentro de mim rugiu.Era quente e instintiv