Capítulo 4

AIYANA

Uma batida suave na porta me acordou, e eu levantei a cabeça, atordoada e ainda com a sensação de que a noite inteira tinha sido uma luta. A batida se repetiu, mais firme desta vez.

Já se passou um ano desde que a chama revelou que Maxim e eu somos companheiros destinados, e as coisas só pioraram. Isabela se tornou mais cruel a cada dia, e ela fazia questão de transformar cada minuto que eu passava perto dela em um inferno. Não havia um só momento em que ela não fizesse questão de esfregar na minha cara o quanto ela e Maxim estavam juntos e felizes, com toques constantes e beijos sempre visíveis ou quando ela o fazia dizer que a amava. Ele, por sua vez, me ignorava na maior parte das vezes, mas não fazia nada para impedir Isabela em seus ataques maldosos.

Às vezes, eu sentia o olhar dele. Um olhar que parecia me atravessar, e por um breve momento, eu via algo ali. Mas era tão efêmero, tão pequeno, que logo desaparecia. Maxim continuava distante, implacável, como se eu fosse insignificante para ele.

— Aiyana? 

Eu levantei a cabeça, ainda atordoada, com o peso da noite anterior pressionando meu peito, como se o cansaço fosse mais do que físico.

A batida se repetiu, mais firme desta vez.

— Está tudo bem, minha querida?— a voz da minha avó chamou do outro lado da porta. Sua voz suave estava carregada de preocupação, como sempre que ela percebia que algo não estava certo.

Eu não queria preocupar minha avó, não queria que ela soubesse o quanto eu estava me sentindo cansada. Mas eu sabia que ela sabia, como sempre soubera. A minha avó tinha uma maneira única de perceber quando algo estava errado, mesmo que eu tentasse esconder.

Respirei fundo e abri a porta. Ela estava ali, na porta do meu quarto, com aquele olhar terno e carinhoso. Seus olhos, sempre tão cheios de amor e cuidado, me fizeram sentir como uma criança fragilizada, que buscava abrigo.

Ela me olhou, e com um gesto delicado, me puxou para um abraço apertado. Naquele momento, senti uma onda de alívio, como se ela fosse a âncora que eu precisava para não me afogar. Não precisei dizer nada. Ela sentiu a dor, sentiu a tristeza que eu tentava esconder.

— Não importa o que ele tenha dito, minha querida — ela sussurrou, acariciando meus cabelos com a suavidade de sempre. — Não deixe que as palavras dele definam quem você é. Você é mais forte do que imagina, e nunca se esqueça disso.

Depois de um longo silêncio, eu me afastei um pouco do abraço da minha avó, secando os olhos, e, quase sem perceber, as palavras escaparam de minha boca, carregadas com toda a frustração e dor acumulada ao longo de meses.

— Maxim... ele é um idiota detestável — eu sussurrei, com a voz falha e cansada.

Minha avó me olhou com calma, a mesma expressão contida de sempre. Ela não disse nada de imediato, apenas me abraçou novamente, com mais força, como se tentasse me proteger do mundo e de mim mesma.

Eu senti uma onda de calor percorrendo meu corpo e, pela primeira vez em muito tempo, senti uma leve esperança. Mesmo que eu estivesse quebrada, perdida em um mar de sentimentos conflitantes, minha avó estava ali para me lembrar do que eu ainda era, do que eu ainda podia ser.

No dia seguinte à revelação da chama, o pai de Maxim, Scott Blackwood, o alfa da alcateia, foi até a minha casa, com aquele tom autoritário de quem sabe que está falando com uma "inferior", e me disse claramente que eu não deveria me envolver com ninguém até os vinte e um anos, até que a consulta fosse feita novamente para confirmar se eu era ou não a companheira do filho dele.

A ousadia! Eu devia manter minha pureza intacta enquanto ele tinha o descaramento de deixar Maxim fazer o que quisesse, inclusive vivendo praticamente com Isabela. Ele nem tentava esconder. Mas eu? Eu teria que esperar. Esperar ser tratada como uma opção, como uma coisa a ser analisada.

Não mais.

Eu não era mais uma criança. 

Na verdade, acabei de fazer dezoito uma semana atrás. Por isso, essa noite seria diferente. Era o meu baile de formatura, o meu último dia no ensino médio, e eu não ia deixar que essa situação de rejeição e descaso me roubasse a chance de ser feliz. Eu e Alyssa passamos o mês todo escolhendo nossos vestidos, cuidando de cada detalhe. Eu não passaria a noite sozinha em casa enquanto todos os outros estavam vivendo suas vidas. Enquanto ele vivia sua vida com minha prima malvada.

Minha avó ainda estava ali, me observando com aqueles olhos que sempre enxergavam além do que eu dizia. Talvez esperasse que eu me encolhesse de novo, que deixasse a dor me consumir, mas dessa vez não.

Eu enxuguei o rosto com as costas das mãos e ergui o queixo.

— Eu vou para o baile.

Ela me encarou por um instante, e então, sorriu suavemente.

— Então faça isso com a cabeça erguida — respondeu, seu tom firme, mas gentil. — Mostre a eles que você não é uma garota que se esconde nas sombras.

Seus dedos enrugados tocaram meu rosto, um carinho rápido, antes de se afastar para me dar espaço.

Levantei-me e fui até o armário, onde o vestido que escolhi com Alyssa esperava, pendurado.Eu não sou uma garota de vestidos, todo mundo sabe que prefiro calças, mas tem algo neste que fez mudar minha escolha por uma noite.  Ele tem um tom de verde profundo, como folhas molhadas após a chuva. O tecido se moldava ao meu corpo de maneira elegante, deslizando sobre minha pele como se tivesse sido feito para mim. O decote revelava o suficiente para destacar minha feminilidade, mas sem exageros. A fenda longa, começando na coxa, acrescentava um toque de ousadia, e os ombros estavam expostos, destacando meu pescoço.

Coloquei os saltos mais altos que eu tinha, a altura dando-me uma postura mais altiva.

Quando me virei para o espelho, não vi mais uma garota magoada, cansada de ser rejeitada. Vi alguém que não iria mais aceitar ser empurrada para o canto, que não deixaria ninguém decidir como sua vida deveria ser.

Minha avó sorriu ao me observar e acenou com a cabeça, aprovando minha escolha.

— Você está linda, minha menina — disse, com orgulho evidente na voz.

Eu respirei fundo, sentindo o peso daquela noite sobre meus ombros.

Eu sabia que Maxim e Isabela estariam lá, Maxim iniciou esse ano como professor assistente de educação física e se voluntariou para ajudar na fiscalização do baile e minha prima encontrou alguma forma de ser a acompanhante dele. Sabia que eles provavelmente não se importariam com minha presença, ou pior, que Isabela faria questão de me lembrar disso. Mas, no fim, nada disso importava. Eu não estava indo por eles.

Eu estava indo por mim.

E se essa noite fosse minha vingança?

Que assim fosse.

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