Capítulo 4

Lyra Müller 

    Eu não podia guardar aquilo só pra mim. Precisava dividir com alguém e precisava ser alguém que não fosse da família. 

_ Eu não estou bem de saúde Louise – Admiti por fim – Apareceu uma mancha em meu pulmão e parece que é grave. Fui em dois médicos e ambos disseram que... não tenho muito tempo de vida.

      Foi muito difícil dizer aquilo. Parecia até que estava falando de qualquer outra pessoa, menos de mim mesma.

_ Como assim? E não dá para tratar? 

_ Não. Eles me passaram umas medicações, mas é apenas para prorrogar o irremediável. Eu estou me abrindo com você porque não tenho com quem fazer isso e preciso de ajudar. 

_ Não se preocupe. Pode contar comigo para tudo o que precisar. 

_ Eu não quero que diga nada a Brian. Eu não quero antecipar seu sofrimento, nem estragar a festa de casamento de minha irmã que está aproxima. 

_ Mas eles precisam saber. 

_ Não agora. Na hora certa eu vou conversar com eles – Expliquei e ela concordou comigo. 

    Da clínica eu retornei para casa, queria passar o máximo de tempo possível com meus filhos. Tentei tirar aqueles pensamentos da cabeça e tentar esquecer o que os médicos tinham dito. A semana se passou muito rápido. 

     A primeira vez que tomei a medicação foi simplesmente horrível. Fiquei enjoada e tonta, grogue o dia todo. Brian insistiu em me levar ao médico, mas eu me recusei terminantemente. 

     Minha irmã me ligava com frequência, ansiosa por compartilhar comigo aquele momento tão especial de sua vida, onde se casaria com o homem que tanto amava, mas minha disposição de sair da cama estava cada vez mais difícil. 

“Lyra, ragazza mia, mäl posso esperar para te ver” – Vi a mensagem de Matteo e desliguei o display. Eu tinha que admitir que aquele rapaz era insistente. Eu já tinha trocado de número mais de dez vezes e ele ainda insistia com suas mensagens. Depois de um tempo, eu simplesmente desisti de tentar bloqueá-lo. 

_ Amor – Brian sussurrou perto do meu ouvido, me trazendo de volta do sono induzido pelos remédios. Ele tentou me beijar, mas eu virei o rosto. Minha boca estava amarga e meu estômago embrulhado. Meu marido já estava ficando preocupado comigo, já estava começando a notar que algo não estava bem, mas eu disse apenas que andava cansada e indisposta. 

     Nos primeiros dias após a descoberta de minha doença, eu tinha decidido não sair de perto dos meus filhos, determinada a ficar com eles o máximo de tempo possível, mas então percebi que aquilo só dificultaria mais as coisas quando eu não estivesse mais presente. Eu precisava garantir que estivessem seguros e que aprendessem a viver sem mim. 

     Louise passou a frequentar minha casa com mais frequência. Ela trazia os resumos dos trabalhos realizados no dia e me entregava os papéis que precisavam ser assinados para que o serviço não parasse, me deixando a par de tudo o que estava acontecendo. 

     Meu interesse pela empresa se tornou quase nulo. Só agora eu me dava conta de como a vida era curta, de como a tinha desperdiçado com coisas banais. Se eu soubesse que viveria tão pouco, eu teria me dedicado mais a família.  

      Eu amava meu trabalho, mas muitas vezes sacrifiquei o tempo que deveria passar com a família trabalhando. Eu tinha feito tantas coisas erradas. 

_ Lyra – Minha mãe sentou ao meu lado, na cama – O que está acontecendo com você? Seu marido me procurou preocupado. Disse que não tem ido trabalhar e que mäl levanta da cama. Ele quer que você vá com ele ao médico. 

_ Não. Eu não quero ir a lugar nenhum – Falei irritada, me forçando a sair da cama – Hoje vou sair com as crianças para fazer um passeio, se amanhã estiver melhor, irei ao trabalho – Menti sobre o trabalho.  

_ Por que isso? Você não é assim. 

_ Eu trabalhei a minha vida inteira e agora, só porque decidi tirar umas férias, vocês querem me levar ao médico? – Reclamo irritada e minha mãe se dá por conformada. Ela era teimosa, mas sabia que eu era dez vezes pior do que ela.  

     Entrei no banheiro e tomando um bom banho decidi que não passaria aquele dia chorando dentro de casa. Eu iria morrer e quem não iria? Por mais difícil que fosse, minha mãe estava certa, eu precisava sair daquela cama. 

     Enxuguei o rosto e soltando os cabelos fui penteá-los e quando olhei para a escova, percebi um maior volume de fios na escova. Meu coração acelerou. Eu mäl conseguia respirar. Peguei meu celular e fui pesquisar na internet e vi que aquele era um efeito comum na quimioterapia. 

     Cai sentada no banheiro e chorei miseravelmente. Eu preferia morrer mais cedo a perder meus cabelos. Se fosse pelo menos um tratamento para me curar, mas o médico tinha garantido que não haveria cura pra mim. 

_ Lyra – Brian forçou a porta. 

      Levantei rápido e lavei o meu rosto novamente e só sai do banheiro quando finalmente consegui me acalmar. Minha mãe já tinha ido embora, o que significava que muito tempo tinha se passado. 

_ A babá disse que você prometeu sair com as crianças, mas não saiu do quarto – Ele me olhou enquanto eu revirava o guarda-roupas atrás de uma camisola. Eu queria aproveitar meus últimos dias, mas me sentia fraca, doente e infeliz. 

_ O que está acontecendo Lyra? – Brian perguntou nervoso – Lyra... – Ele insistiu e eu dei um grito escandaloso e enfurecido. 

_ NÃO ESTÁ VENDO QUE QUERO FICAR SÓ? – Berrei enfurecida e ofegante, descontando nele toda a minha raiva e frustração acumulada desde que havia recebido o meu diagnostico. 

_ Que Infernö! Por que não pode simplesmente me deixar em paz? É tão difícil assim? Para de ficar me cobrando as coisas. 

      Eu estava com tanta raiva da minha situação que meus músculos doíam. Estava com medo e magoada. Eu estava desesperada e não conseguia falar. As palavras vinham até a boca, mas eu as engolia de volta. Não conseguia dizer o que estava acontecendo. 

_ Qual é o problema? Quer que eu vá embora? Não está mais satisfeito comigo? É isso? 

_ É. É isso mesmo. Quero ficar só. Se puder apenas desaparecer e me deixar em paz, eu agradeço – Cuspi as palavras sem qualquer misericórdia. 

_ Quer que eu vá? Que eu simplesmente suma da sua vida? Por que? Você tem outro? É aquele malditö italiano de novo? – Quando ouvi Brian tocar novamente naquele assunto, peguei a luminária e joguei em cima dele. 

_ SAI DAQUI – Berrei jogando tudo o que minhas mãos alcançavam em cima dele, o obrigando a desaparecer da minha frente. Eu simplesmente destruí o quarto. 

    Naquela noite, Brian dormiu fora de casa e sinceramente eu senti alivio por isso. Eu só queria poder chorar a vontade, sem que ninguém visse. Sofrer e ser infeliz do jeito que eu quisesse, sem ter que dar explicações ou me justificar. 

 

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