Quando cheguei na maternidade, a Juliete já estava de camisola e com a bunda de fora. O médico tinha pedido a hidromassagem para acelerar o parto, pois ela estava com dois dedos de dilatação.Juliete sofria, suada e pálida, mas quando entrei em seu campo de visão, perguntou logo:— O que aconteceu?— Porque você supõe que algo aconteceu? — Danilo quem ia assistir, e é a mão dele que vou tentar quebrar dessa vez.— E se por acaso eu que decidi ver agora? Ele já viu um parto seu, e eu que quero acompanhar dessa vez...— Corta essa, Isadora. O combinado foi você ficar com as crianças, e você não é tão sentimental desse jeito. Cadê o Alejandro? Pode me falar qualquer coisa, eu aguento. Estou com dois dedos de dilatação e contrações com espaçamento de quase uma hora. Só vim porque a bolsa está rota e estou com medo de Alexia ficar seca lá dentro antes de dilatar tudo. Vamos, me diga, cadê o Danilo?— Está bem, Juliete. Você sabe que sou uma mulher prática e meias verdades não combinam mui
Era uma data especial. Eu estava nervosa, porque hoje era dia de coquetel de renascimento na casa da Juliete, como festejamos há 17 anos. Desde o dia em que Aleksander voltou para nós. Me lembrava bem daquele dia, e sentia uma necessidade grande de me conectar com qualquer ser sobrenatural que nos deram aquele milagre. Eu não era religiosa, mesmo que a minha mãe tenha me criado indo às missas aos domingos. Mas fazendo um balanço geral de tudo o que vivi, sabia que sim. Deveria ter um ser superior que olhava pelos humanos e intercedesse por nós. Porque eu passei muita coisa ruim, mas tenho muito mais a agradecer do que reclamar. Os meus pais, que eram meu porto seguro e cuidavam de mim com amor e paciência, morreram em um acidente de carro. Mas dessa tragédia, veio o Danilo, que causou o acidente e se tornou o amor da minha vida. Também veio a percepção de que Tomás, o tio querido que era o melhor amigo do meu pai, era um psicopata maluco com dupla personalidade. Mesmo sendo triste
Pedro e Alexa também eram jovens muito bons, o Aleksander e a Juliete não tinham problemas com eles. Aliás, desde que o Aleksander recuperou a memória no parto de Eduardo, Tamires e Breno, eles vivam uma eterna lua de mel. Joseph vinha de Washington para o Brasil duas vezes por ano, ficava na casa de Laila que se apaixonou pelo menino que a ajudou a resgatar o Aleks. A outra metade do ano, passava na casa da Juliete. Ele optou por voltar a morar com o pai, quando descobriu a verdade. Que Vaitiari não era mãe dele e que o usava como um cofrinho. No resgate de Aleks, que o Leandro teve a ideia de Henrieta ligar por chamada de vídeo pra conseguir tirar Gerard da casa, quando invadiram Vaitiari ameaçou o Aleks com uma faca, e foi Joseph quem pediu pra ela não fazer aquilo. Ela gritou com o menino que nem era mãe dele, para ele apelar pro sentimental e ele deu um chute no braço dela, fazendo-a largar a faca e dando tempo para a Laila dar uns boxes nela. Os dois foram presos e Laila até que
O Thomas era um miserável e começou a tentar fazer da minha vida um inferno depois da morte dos meus pais, para me ter em seus braços. Em pouco tempo de luto, fiquei sem dinheiro para pagar as despesas do apartamento, para a faculdade e até para colocar combustível no meu carro. Então pedi a Laila pra me arranjar um emprego com a família dela. Ela disse que até poderia, mas que eu jamais teria um salário que cobrisse todas as minhas despesas, e me aconselhou a vender o carro e o apartamento e me mudar para um lugar menor. Coloquei o apartamento à venda, e com o dinheiro que consegui do carro, aluguei uma kitnet e comecei a trabalhar como assistente do pai de Laila. Três dias depois, descobri que o dinheiro do carro sumiu da minha conta, antes de eu pagar a mensalidade da faculdade. Laila sugeriu que eu chamasse a polícia, mas sabia que isso seria inútil. Thomas era muito esperto e não teria deixado rastros. Envolver a polícia só faria com que eu parecesse louca e manchasse ainda m
Eu mal conseguia conter o sorriso ao entrar naquele prédio espelhado, exibindo meu crachá com orgulho. Era meu primeiro dia de estágio, e a sensação era surreal. Cumprimentei todos que encontrei pelo caminho, da faxineira à recepcionista, antes de seguir para o elevador. Apertei o botão do último andar com tanta empolgação que acabei prendendo a respiração por um momento. Era lá, no topo, que ficava a presidência.Nem parecia real que eu havia conquistado a tão sonhada bolsa de estágio remunerado. Um ano atrás, antes dessa oportunidade, quase tranquei a faculdade por falta de recursos. Ser escolhida como a terceira participante do projeto de engajamento feminino no quadro de programadores da Psy Corp era mais do que eu podia imaginar. O projeto era um sonho para qualquer estudante de programação: seis meses de treinamento com os melhores profissionais da área, além de remuneração e benefícios incríveis.Voltei no tempo por um momento, lembrando do caos que foi quando o projeto foi anu
Quando cheguei à minha cobertura depois da faculdade, na sexta-feira, não consegui evitar pensar na história contada por Patrícia. O casamento dele me lembrou muito o meu próprio casamento, que aconteceu do mesmo jeito: rápido, discreto e sem alarde. Nem sequer conheci o meu noivo. Foi apenas uma assinatura de documentos formais. Eu me forcei a reviver os últimos dois anos da minha vida. Era um exercício doloroso, mas necessário.Eu era filha única. Cresci em Mairiporã, no interior de São Paulo, e tínhamos uma vida confortável. Meu pai era dono de uma empresa de programação e, para mim, o homem mais inteligente do mundo. Meus pais, Dona Lúcia e Sr. Geraldo, se conheceram na faculdade. Na época, meu pai levava uma vida desregrada e era parceiro de seu melhor amigo, Thomas, em atividades que beiravam o ilegal.Quando meu pai conheceu minha mãe, tudo mudou. Ele deixou as loucuras de lado, voltou a focar nos estudos e fundou sua própria empresa de software, convidando Thomas para fazer p
Eu olhava para minha linda Juliete, ali na clínica, em estado vegetativo. Os médicos insistiam para que eu não viesse mais, diziam que era inútil, mas todos os finais de semana eu dirigia até Mairiporã e passava o dia com ela.A cada dois ou três meses, eu a tirava da clínica e a levava para a casa que comprei especialmente para ela. A casa era toda adaptada, com rampas de acesso para a maca. Sempre dispensava as enfermeiras nesses dias. Queria cuidar dela sozinho. Ainda assim, pagava quatro enfermeiras para acompanhá-la na clínica, para que nunca se sentisse sozinha, mesmo naquele estado.Naquele domingo, depois de ajeitá-la de volta na clínica, eu aguardava a acompanhante chegar para poder voltar para casa. Enquanto esperava, me lembrei de como foi a semana com ela.Eu tinha perdido o controle. Não é comum, mas gritei com ela, bêbado, enquanto relembrava tudo o que nos trouxe até aqui. Normalmente, sou calmo. Tento dizer coisas boas, mostro fotos que a família dela manda da França.
Eu percebi que já tinha acabado com uma garrafa de vinho, mas não estava bêbada. Nem mesmo o torpor que eu buscava para aliviar a dor nos finais de semana aparecia. Sempre me obriguei a ser a menina responsável, estudiosa e, agora, trabalhadora como meus pais queriam. De segunda a sexta-feira, não bebia nada, não saía, só fazia o que era esperado de mim. Sorri, um sorriso amargo, enquanto me levantava para buscar outra garrafa de vinho. Talvez fosse esse meu comportamento discreto que aquele homem, que se aproveitou da minha fragilidade, procurava quando me fez assinar a certidão de casamento.Nos finais de semana, eu me desligava do mundo. Bebia, mal saía de casa. Às vezes, só ia ao mercado comprar algo. Fora isso, ficava trancada. Às vezes, pensando em como me vingaria do tio Thomas. Não, do nojento do Thomas. De tudo o que ele fez comigo e com a memória dos meus pais. Outras vezes, me dedicava ao salvamento das informações dos notebooks do meu pai e da minha mãe, destruídos no acid