CAPITULO 2

Perola Campbell

Acordo com o som estridente e irritante do despertador, abro os olhos e encaro o teto branco. Reflito sobre a segunda feira ser o pior dia da semana, sem sombra de dúvidas.

Em pensar quer passei dois longos dias em uma folga maravilhosa e vem esse dia para estragar o tão sonhado descanso.

Mas o pior de tudo sem dúvida é a parte em que nos tornamos adultos e não podemos fugir das responsabilidades. No meu caso, essas responsabilidades vieram um pouco antes de alcançar a maior idade.

Quando eu tinha apenas quatorze meus pais morreram em um acidente de carro. Minha família sempre foi muito pequena, tanto meus avós maternos quanto meus avós paternos não tiveram mais que um filho. Ou seja, nada de tios ou primos, meu único parente vivo na época era o pai da minha mãe.

Que Deus me perdoe, mas o velho ainda está vivo. Pelo visto aquele velho ditado de que vaso ruim não quebra é verídico. O homem é um crápula, quem vê a aparência diz que é um vovozinho muito zeloso, mas a realidade é o contrário, acredito que ele seja a encarnação do próprio diabo.

Desde que fui entregue a ele que sirvo de escrava dentro dessa casa, como não bastasse assumir tudo como uma cinderela, mas sem o conto de fadas, ele me obrigou a trabalhar desde muito cedo, tanto para arcar as despesas da casa quanto para manter seus vícios em jogos de azar, no qual ele sempre perde todo o suado dinheirinho que ganho.

Já pensei diversas vezes em sair dessa casa, mas o velho me ameaçou, eu teria que sumir da cidade, talvez até do estado, pois ele falou que se eu o deixar, me caça e me mata.

Que destino cruel esse meu, se existe outras vidas, na minha passada eu fui uma menina muito malvada.

Sorrio da minha própria desgraça.

Quando ele perde no jogo, ou seja, praticamente todas as vezes, ele desconta a raiva em mim, seja com palavras agressivas ou até mesmo usando os punhos. Para um velho, ele ainda tem muita força. Tenho constantemente que usar camisa de manga comprida para esconder as marcas. Eu tento evitá-lo as vezes, quando chego do trabalho, arrumo rapidamente toda a bagunça que ele fez, me tranco em meu quarto e só saio no outro dia para ir trabalhar, na maioria das vezes dá certo.

Vida amorosa não tenho, meu avô jamais aceitaria que eu tivesse um namorado, ele deixou isso bem claro quando disse que eu não seria uma perdida igual a minha mãe. Na cabeça doentia dele, a minha mãe nunca deveria ter conhecido e casado com meu pai.

Quando eles eram vivos, eu não tinha contato com o pai da minha mãe, porém aqui estou eu, presa a esse velho até conseguir juntar dinheiro suficiente para fugir daqui.

Voltando para a parte do tão sonhado trabalho remunerado que mal dá para pagar as contas, que nunca sobra, mas que sempre me deixa feliz quando cai na conta. Mas, essa felicidade vai embora tão rápido quanto chega, pois preciso bancar aquele velho pervertido.

Sim, pervertido. O sem vergonha usa meu dinheiro para pagar prostitutas, embora eu não entenda bem o que ele faz com elas.

Sem poder fugir do meu compromisso, e sou muito grata por isso, levanto da cama para me arrumar para o trabalho. Ser secretária do Senhor Beaumont não é uma tarefa muito fácil. Tomo um banho rápido e visto minha armadura do dia, hoje a blusa é com uma manga mais curta, estou sem marcas de escrava que apanhou no tronco.

Nem sempre fui sua secretária, comecei a trabalhar na Império Beaumont aos 17 anos como estagiaria, eles têm um projeto de imersão profissional, no qual dão oportunidade de qualificação para jovens em busca do primeiro emprego.

Como eu não cursava nenhuma faculdade, tinha apenas o ensino médio completo e um cursinho de informática, não fui para as grandes áreas, basicamente, virei a secretaria da secretaria.

Nunca tive muito do que reclamar, a Marisa é um amor de pessoa, sempre me tratou muito bem e me ensinou muitas coisas, tanto que na sua licença maternidade eu fui designada para cuidar do seu cargo de secretaria do CEO da empresa, digamos que estou sobrevivendo e tem apenas uma semana que ela saiu.

Preciso correr para conseguir agilizar a agenda do tão respeitável e lindo Senhor Apolo Beaumont. Chove pessoas querendo um minuto da sua atenção e eu me viro nos trinta para conseguir marcar horário para elas, e ainda escuto desaforo quando não tem espaço para inclusões.

Confesso que estou alguns minutos atrasada, mas já estou pronta, com uma calça jeans e sapatilhas. Apesar de não trabalhar dessa forma, até os quatorze anos fui criada por uma mãe que sempre me ensinou a prezar pelo conforto.

Sempre concordei com ela.

Ainda mais porque o meu uniforme de secretária é uma linda e justa saia lápis que chega até os joelhos e uma blusa de manga três quartos, mas eu sempre mudo, sempre que preciso esconder as marcas, meu chefe nunca reparou, quer dizer, ele nunca reclamou. Tem também um vestido justo até os joelhos, que eu nunca uso. Para completar um par belo par de scarpin de salto fino. Mesmo quando ainda era a secretaria da secretaria eu me vestida dessa forma, pois sempre trabalhei na mesa ao lado da secretaria oficial e precisava estar bem vestida.

 O trabalho é meio cansativo e frustrante, mas paga as minhas contas, as minhas e as do velho.

A faculdade é algo fora de cogitação no momento, então um emprego como esse caiu dos céus, ainda mais porque meu contrato de dois anos encerrou um pouco antes da Marisa sair de licença e eu fui temporariamente efetivada, ou seja, preciso causar uma boa impressão, para quando ela voltar, eu não ser despedida.

Dobro cuidadosamente o meu uniforme e guardo na minha mochila, junto com tudo que preciso para me arrumar e o que poderei precisar.

Bem como: carregador de celular, carteira com documentos, meu crachá, remédios para dor, absorvente, meu ciclo é muito irregular, nunca se sabe quando ela virá.

Fecho a mochila e saio do quarto, passo pelo corredor e chego na sala, onde o velho já me aguarda. Ele levantou cedo hoje, sinto um frio na espinha.

— Bom dia — comprimento e apresso os passos até a porta.

— Espere um momento, querida — ele pede e paro imediatamente, meu sangue gela — Quando sai o nosso próximo pagamento?

— Nosso? — pergunto sem pensar e ele me encara — Desculpe — me apresso em dizer — Provavelmente em alguns dias — aviso.

— Preciso urgente de dinheiro, um homem precisa aliviar as suas necessidades — fala me encarando e sinto nojo do seu olhar avaliador.

— Preciso ir, estou atrasada — falo com a voz baixa demais.

— Vá logo, não pode se atrasar assim sempre, esse emprego te paga muito bem para você perdê-lo, vá logo sua imprestável.

Sem encará-lo me apresso e saio pela porta da frente, corro até o ponto de ônibus, mas não consigo pegar o que passa próximo ao meu trabalho.

Avisto um moto táxi e pago sua corrida, que diga de passagem, não é nada barata, porém não tenho escolha.

Ele acelera sua moto pelas ruas tentando manter meu horário, pois lhe dei pressa. Quando chego no prédio da Império, estou quinze minutos atrasada, corro para o elevador e quando chego no meu andar, me tranco imediatamente no banheiro feminino e visto meu uniforme.

Faço uma maquiagem bem simples, a única que sei fazer mesmo, tomo cuidado para esconder as enormes olheiras, prendo meus cabelos

em um rabo de cavalo arrumado e estou pronta.

Coloco minha mochila dentro do armário e antes de ir para minha mesa, dou uma rápida passada na copa do andar, preciso de café para acordar e aguentar toda a demanda do dia.

Assim que coloco minha bunda na cadeira ele aparece, adoraria dizer que está atrasado, mas ele é o CEO, dono de tudo isso aqui, não tem que bater ponto ou se preocupar em chegar cedo. Vale pontuar que ele está muito bonito em seu terno preto, feito sobre medidas. Os olhos mais azuis e marcantes que já vi na vida chamam minha atenção, como sempre. Deveria ser pecado uma pessoa ser tão bonita desse jeito.

O tipo de homem impossível para uma pessoa como eu — penso tentando não ficar triste com essa constatação.

— Bom dia, senhorita Campbell.

A voz dele é infernalmente grossa e arrepiante, sinto coisas que não consigo entender. Mas tenho que me forçar a lembrar que ele paga meu salário e nunca, em hipótese alguma posso me apaixonar por ele. Uma que, ele jamais se interessaria por uma pessoa como eu, pobre e sem muita beleza, e outra que aquele velho mataria nós dois, ele conhece pessoas barra pesada, eu nunca arriscaria a segurança de alguém.

— Bom dia, senhor Beaumont — respondo educadamente como sempre.

— Como foi o final de semana? — pergunta interessado.

Ele é extremamente muito educado, sempre!

— Foi bom, descansei bastante — respondo baixinho — E o do senhor?

— Foi muito bom — sorri tranquilo — Me dê alguns minutos antes de trazer a agenda do dia, por favor.

— Sim, senhor.

Ele sai do meu campo de visão e solto o ar que eu nem sabia que estava prendendo.

Respiro fundo, mentalizando que é apenas mais um dia de trabalho, como todos os outros ao longo desses dois anos, mesmo que um pouco mais intenso nessa última semana. Organizo minha mesa, pego sua agenda que deixei atualizada quando sair daqui na sexta e bato na porta de seu escritório alguns minutos depois da sua entrada.

Quando sento em sua frente, o vejo sorrir leve para mim e meu coração salta. Tenho certeza que não tenho nenhuma chance com esse homem, nem mesmo cogitaria tal coisa, mas ele não pode continuar sorrindo dessa forma para mim, sinto meu coração bater descompassado.

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