Assim que chegou ao escritório, Harry foi recebido com um largo sorriso de Ana, sua secretária.
— Bom dia – ele cumprimentou antes de entrar em sua sala. Ao sentar, colocou o celular sobre a mesa, no mesmo segundo viu uma notificação. Desbloqueou a tela e sorriu ao ver o nome de Esther. “Está livre nesta tarde?”, ela perguntou. Harry respirou fundo antes de responder. Mesmo depois de tantos anos de amizade, toda vez que falava com ela sentia-se como um adolescente desajeitado. “Vou verificar minha agenda”, ele brincou, antes de responder: “Para você, sempre arrumo um tempo”. “Passarei aí na hora do almoço. Beijos”, ela avisou. Harry começou a cantarolar enquanto ligava o computador, mas engoliu em seco e tossiu ao ver Leandro entrar sem aviso. — Não sabe bater? – Harry o encarou, irritado. — Posso saber o motivo de tanta felicidade tão cedo? – Leandro sentou-se no sofá, esperando uma resposta. Harry inclinou a cadeira para trás, mantendo uma expressão séria. — Não é da sua conta – ele murmurou. — Deixa eu adivinhar: é por causa da Esther? Pensei que estaria uma fera após receber o convite de casamento. — Precisava tocar nesse assunto? – Harry revirou os olhos. — Por que veio até aqui? — Vim saber como você está. Desista dela, deixe isso no passado e siga em frente. Você é rico, tem um cargo importante. Sabe quantas mulheres estão à procura de alguém como você? Por que ainda perde tempo com ela? — Leandro disse, preocupado. — Esther é diferente – Harry respondeu, ajustando a gravata. Leandro respirou fundo. — Que tal sairmos hoje à noite? Vamos beber um pouco, aproveitar a vida e conhecer algumas mulheres. — Tenho outros planos para esta noite – Harry falou. — Esses planos envolvem a Esther? Ela vai se casar, Harry. Em todos esses anos, você nunca teve coragem de assumir seus sentimentos por ela. O que pretende? Viver como um cachorrinho, seguindo-a pelo resto da vida? – Leandro se levantou, encarando o amigo. — Já me decidi: vou conquistá-la – Harry afirmou, levantando-se. Os olhos escuros de Leandro brilharam, ele abriu um largo sorriso. Aproximou-se e surpreendeu Harry com um abraço. — Até que enfim! – ele suspirou. — Se ela não sentir o mesmo, eu a deixarei partir e seguirei em frente – Harry garantiu. — Esperei anos para ouvir você dizer isso! – Leandro ergueu as mãos, animado. — A operação Esther está de volta? Harry gargalhou ao ouvir o nome do plano que haviam criado quando adolescentes, para que ele conquistasse o coração de sua amada. — Vamos chamar de Operação Esther 2.0, afinal, a primeira tentativa falhou miseravelmente. — Porque você sempre foi um bundão – Leandro provocou. Harry se levantou, dando um soco no ar, enquanto encarava o amigo, que continuava sorrindo. — Desta vez, eu não posso vacilar. Essa é minha última chance de conquistá-la. — Quer algumas dicas para conquistar uma mulher? Você é péssimo nisso – Leandro cruzou os braços. Harry ergueu as sobrancelhas, fazendo uma careta para o amigo. — Sou ótimo com as mulheres – ele retrucou. — Então, por que levou tanto tempo com a Esther, senhor romance? – Leandro estalou a língua. Harry gargalhou com a provocação do amigo. — Você sabe o porquê – ele começou, mas Leandro o interrompeu. — Não vai dizer que era para não arruinar a amizade de vocês. É isso que todos os covardes dizem. Aquelas palavras foram um golpe baixo. Harry pegou a primeira coisa que encontrou — uma pequena bola de fisioterapia — e jogou em Leandro, que não conseguiu desviar a tempo. — Não se esqueça de que continuo sendo seu chefe aqui – Harry o ameaçou. Leandro riu e, antes que ele pudesse responder algo, Harry se aproximou, fazendo com que Leandro saísse rapidamente, deixando-o sozinho. Harry bufou, pegou a bola no chão e começou a apertá-la. No fundo, ele sabia que Leandro estava certo e se culpava por sua covardia. O casamento de Esther parecia ser o empurrão de que precisava para finalmente confessar seus sentimentos. Seu peito apertava ao pensar que ela poderia não sentir o mesmo. Sabia que precisaria se afastar se isso acontecesse, mas sentia uma necessidade urgente de dizer tudo o que guardou por tanto tempo. Não podia mais viver de incertezas. Ainda naquela noite, ele teria as respostas de que tanto precisava para, enfim, encontrar paz. Harry pediu para sua secretária fazer uma reserva para o jantar, ao qual pretendia convidar Esther assim que ela chegasse. Quando foi informado de que nenhum dos restaurantes renomados que escolheu tinha vagas para aquela noite, ele viu isso como um sinal ruim. Mas, teimoso, decidiu insistir — esperou demais para dizer o que sentia. Enquanto trabalhava, olhava para o relógio constantemente. Parecia que o tempo estava mais lento do que o normal, como se as horas naquele dia tivessem se alongado. Sentindo-se um pouco idiota por estar tão ansioso, escondeu o relógio de pulso na gaveta, respirou fundo e voltou sua atenção para a tela do computador. Ele só saiu de seu foco quando o telefone tocou. — A senhorita Brooks acabou de chegar – sua secretária avisou. — Peça para ela entrar. Harry se levantou no exato momento em que a porta se abriu, revelando Esther, com seu sorriso largo e os cabelos cacheados e volumosos balançando enquanto ela entrava. Ele adorava aquele sorriso e, por um momento, sentiu que poderia se perder nele. Aproximou-se para cumprimentá-la com um beijo no rosto. — É impressionante, cada vez que te vejo parece que está mais forte. Daqui a pouco ficará do tamanho de um armário – Esther brincou. Harry riu alto. — Tenho passado tempo demais na academia. — Tentando impressionar alguma garota? – ela arqueou a sobrancelha. Harry apertou os lábios antes de responder: — Você sabe que não. A verdade da qual ele queria dizer “Venho tentando te impressionar desde o ensino médio. Você é a garota”. Ele fez uma careta ao pensar nisso; em voz alta, soaria terrível. — Se continuar assim, vai acabar enorme, igual àquelas geladeiras de duas portas que tenho em casa – ela gargalhou. — Mas não se preocupe, tenho certeza de que alguma garota vai aparecer no seu caminho... ou talvez mais de uma. – Esther piscou. — Não acredito que você me comparou com um armário e agora com uma geladeira. Em todas as comparações, você usou as palavras “grande” e “enorme”... está tentando insinuar alguma coisa, senhorita Brooks? – ele sorriu de um jeito provocador, mordendo os lábios. Esther arregalou os olhos, em seguida soltou uma gargalhada, desta vez com as bochechas levemente coradas. Ela deu um leve tapa em seu peito e ajeitou uma mecha de cabelo atrás da orelha. — Harry, já passou da idade de pensar nessas bobagens e tirar do contexto palavras tão simples.Aquela conversa estava entrando em um caminho perigoso. Já havia sido excitante ouvir a maneira como Esther descrevia o seu porte físico; agora, o jeito como ela sorria, com as bochechas coradas, fazia sua imaginação percorrer um caminho diferente do que estava vendo à sua frente. Harry imaginou como seria tomar aqueles lábios nos seus com um beijo fervoroso, percorrendo as mãos por cada centímetro de seu corpo, fazendo-a suspirar com seu toque. Ele desejava mais do que tudo vê-lá sentindo o desejo e a chama ardendo dentro deles. Harry saiu de sua ilusão quando Esther começou a estalar os dedos à sua frente. Ele agradeceu mentalmente por isso, pois estava imaginando ela sentada em sua mesa com as pernas em volta dele, enquanto implorava para senti-lo ainda mais. Se continuasse com aqueles pensamentos, passaria por algo vergonhoso na frente dela, que ainda o via como seu amigo.— No mundo da lua de novo? – Esther cruzou os braços, o encarando. Era fofo como ela o encarava, fingin
Nem mesmo se quisesse, Harry conseguiria descrever o que sentiu e pensou quando as cortinas se abriram e Esther apareceu com o vestido de noiva. Ela sempre foi linda, mas naquele momento parecia uma miragem ou alucinação diante dele. Sabe aquelas cenas de filmes românticos onde o personagem se encanta com a beleza da moça, e os dois parecem estar vivendo em câmera lenta enquanto ela o observa timidamente, com as bochechas vermelhas? Isso poderia descrever perfeitamente aquele momento. Se prestasse atenção, Harry podia escutar a batida do seu coração, que parecia querer sair de seu peito. Ele nem piscou, ainda petrificado no sofá diante dela.— Fale alguma coisa – Esther quebrou o silêncio, ainda constrangida. Ele engoliu em seco antes de ter qualquer outra reação. Harry sentia que nenhuma palavra do dicionário poderia descrever a beleza da mulher à sua frente. Sim, pode parecer exagero, mas era o que seu coração apaixonado gritava enquanto batia cada vez mais rápido no peito. T
Enquanto caminhavam até o carro, Harry percebeu que Esther parecia querer dizer algo, o que era estranho, pois, em todos os anos de amizade, isso nunca aconteceu. Esther era a pessoa com quem ele sempre se sentia livre para falar sobre qualquer coisa (bem, quase tudo, já que ele nunca teve coragem de confessar o que sentia além da amizade). Mas, ultimamente, as coisas entre eles pareciam diferentes, e Harry não gostava disso. Quando decidiu perguntar o que ela estava pensando, ambos abriram a boca ao mesmo tempo, e sorriram, resmungando qualquer coisa.— Pode falar primeiro – Harry se adiantou.— Você precisa mesmo voltar ao trabalho hoje? Ele pensou em responder que sim, pois tinha muito trabalho, o que não seria mentira. Mas havia algo no olhar dela, quase uma súplica. Harry sabia que precisava estar com ela naquele momento. Talvez, assim, Esther tivesse coragem de contar o que a estava incomodando tanto.— O que você tem em mente? – Harry perguntou, observando enquanto ela mudav
— Estou precisando de umas férias mesmo – Harry respondeu com um sorriso de lado. Esther deu um grito e acabou com a distância entre eles, espremendo-o em um abraço caloroso e aconchegante. Fazia meses que ele não conseguia tirar um sorriso sincero dela, nem mesmo a via tão animada assim.— Para onde vamos? – Esther perguntou, mas, antes mesmo de ele responder, continuou: — Não importa, temos que fazer as malas – ela falou enquanto entrava no carro.— Agora? – Harry disse surpreso.— Sim, meus pais estão fora hoje; se não aproveitarmos essa oportunidade, jamais conseguiremos sair do país. Harry sorriu ao ligar o carro, com um sentimento nostálgico no peito. Fazia muito tempo que não se sentia assim.— Passaremos na sua casa primeiro? Ou eu te deixo lá e depois volto para te buscar?— Vamos fazer assim: primeiro passamos em casa; farei de tudo para arrumar a mala em tempo recorde, depois iremos para a sua casa.****************** Quando chegaram, já estava escurecendo.— E agora? Se
Quais loucuras você faria por alguém que ama? Nunca em toda a sua vida, Harry imaginou estar naquela situação. Já era tarde da noite, e mesmo assim, decidiram colocar suas malas no carro e seguir estrada. Esther não queria dar chance de alguém descobrir seu plano e atrapalhar, e Harry não ousou contradizê-la. Sentia uma energia nova subindo em seu peito e a adrenalina correndo nas veias. Por um instante, teve um vislumbre dos tempos de adolescente, quando faziam esse tipo de loucura. Ele havia esquecido como era aquela sensação e, naquele momento, se permitiu esquecer de tudo e viver o presente, com Esther ao seu lado. Após cantarem algumas músicas e dividirem uma porção de batata frita, Esther adormeceu ao seu lado, apesar de antes ter prometido com convicção que seria a melhor copiloto:“Vou ficar acordada a noite toda para te ajudar a não dormir ao volante. Já preparei várias músicas para animar e serei a melhor co-piloto dessa viagem”. Mas, assim que a quinta música começou,
Em todos aqueles anos, Harry havia conhecido várias personalidades de Esther; a atual era mais reservada, e, por conta disso, aquele simples ato o deixou surpreso e esperançoso. Foi somente quando saíram daquela tensão do casamento que ele pôde ver o vislumbre da garota pela qual ele se apaixonou. Esther estava debruçada sobre o balcão da cozinha, mexendo no notebook, quando Harry apareceu.— O que você está fazendo? – Harry perguntou.— Enviando um e-mail para minha mãe e para Daniel avisando que ficarei fora por um tempo – ela respondeu, sem ao menos tirar os olhos do notebook. Harry se serviu de café. Assim que se sentou na frente da amiga, ela empurrou um prato com ovos mexidos e torradas que estava ao seu lado.— Fiz para você.— Estou vendo vantagens nesta viagem, assim poderei aproveitar seus dotes culinários – Harry piscou, levando um pouco de ovo à boca.— São só ovos mexidos – ela deu um pequeno sorriso e, pela primeira vez desde que ele entrou naquele cômodo, levantou o
Em várias ocasiões, eles tocaram nesse assunto, mas ela nunca sequer teve coragem de confessar seus motivos. Apesar de aconselhá-la a viver sua vida, ele jamais falou para Esther se distanciar da família, mas sabia que, para ela conseguir se curar dos tormentos que a assombravam, ela precisava fazer isso. No entanto, ele não queria ser visto como o vilão daquela história, era assim que ela o veria, pois Esther estava cega demais para perceber o que acontecia ao seu redor. Então, ele decidiu esperar que ela visse tudo isso por conta própria, e aquela viagem era sua última chance. Leandro tinha razão em uma coisa: se Esther se casasse, ele precisaria se distanciar dela. Havia tomado muito de suas dores durante todos esses anos e, de alguma forma, Harry sabia que o pouco que restava da essência de Esther sumiria com aquele casamento. Ele queria poder esquecer aqueles sentimentos por ela, se apaixonar por outra pessoa e continuar sendo seu melhor amigo, para que Esther não ficasse sozi
A maneira como ela o encarava era diferente de todas as outras vezes. Seu olhar estava mais penetrante, e Harry podia jurar que havia algo naquele gesto. Um arrepio percorreu seu corpo, mas, antes de cogitar fazer qualquer aproximação, Esther se esquivou e levantou, recolhendo a bagunça que fizeram. Harry se levantou em seguida para ajudá-la. Quando fez menção de ir para a cozinha, sentiu o impacto do corpo de Esther batendo no dele. Ela parecia constrangida quando se desculpou e continuou andando.— Obrigada, mas não precisava ajudar – ela falou, abaixando a cabeça.— Imagina, eu também fiz essa bagunça – Harry disse, pegando as coisas de sua mão e jogando no lixo. Foi estranho; de repente, o clima entre eles começou a mudar, e Esther parecia mais tímida ao se aproximar. Nunca havia acontecido algo assim. Harry entendeu isso como um sinal para continuar com o seu plano inicial. Algo dentro dele dizia que isso iria dar certo, e aquele olhar de Esther sobre ele foi como uma chama