— Estou precisando de umas férias mesmo – Harry respondeu com um sorriso de lado.
Esther deu um grito e acabou com a distância entre eles, espremendo-o em um abraço caloroso e aconchegante. Fazia meses que ele não conseguia tirar um sorriso sincero dela, nem mesmo a via tão animada assim. — Para onde vamos? – Esther perguntou, mas, antes mesmo de ele responder, continuou: — Não importa, temos que fazer as malas – ela falou enquanto entrava no carro. — Agora? – Harry disse surpreso. — Sim, meus pais estão fora hoje; se não aproveitarmos essa oportunidade, jamais conseguiremos sair do país. Harry sorriu ao ligar o carro, com um sentimento nostálgico no peito. Fazia muito tempo que não se sentia assim. — Passaremos na sua casa primeiro? Ou eu te deixo lá e depois volto para te buscar? — Vamos fazer assim: primeiro passamos em casa; farei de tudo para arrumar a mala em tempo recorde, depois iremos para a sua casa. ****************** Quando chegaram, já estava escurecendo. — E agora? Se entrarmos, duvido muito que um dos empregados não irá suspeitar ao me ver carregando uma mala – Esther falou pensativa. — E se entrarmos escondidos pela janela? – Harry perguntou, olhando para fora, pensando naquilo como se fosse uma missão secreta. — Como entraremos sem que os seguranças nos vejam? Tem câmera por toda a parte. Harry ligou o carro e os levou até a residência dos Brooks, mesmo com os protestos de Esther ao seu lado. — Vamos improvisar caso algum deles nos veja. Não é como se fôssemos crianças; você é adulta e, se quer viajar, não deve pedir permissão aos seus pais ou dar satisfações a ninguém – Harry rebateu. — Quando você diz assim, eu pareço ainda mais patética – Esther respirou fundo. Harry abriu o vidro do seu lado e tocou o interfone. Esther se aproximou e pediu para abrirem o portão; em poucos segundos, já estavam na residência. — É bom estar aqui sem sentir o olhar penetrante da general me vigiando como um alvo – Harry brincou. — Acredite em mim, eu sinto o mesmo. Lorena, a mãe de Esther, nunca foi uma grande fã da amizade deles. Nas poucas vezes que Harry os visitou, ela fazia vista grossa, por isso a apelidaram de general. Quando entraram, uma mulher os esperava em frente à porta. — Melanie, pode dispensar os outros empregados. Irei sair esta noite e não voltarei cedo; também peça que ninguém venha nos incomodar – Esther pediu antes de seguirem para o andar de cima. — E aí, como eu fui? – ela sussurrou para Harry. — Excelente – ele levantou o polegar confirmando e deu um sorriso enquanto a seguia até o quarto. Fazia tempo desde a última vez em que Harry entrou no quarto de Esther. Tanto tempo que, agora, as paredes, que eram rosas e com vários posters de cantores seminus, estavam vazias e com cores neutras. Também não havia sinal da coleção de bonecas e ursos de pelúcia, dos quais Esther odiava, mas sua mãe insistia em mantê-los ali na esperança de prolongar a infância da filha por mais um tempo. — Fico surpreso por não ter mais dezenas de bonecas e ursos de pelúcia – Harry sorriu, observando a penteadeira branca. Esther revirou os olhos e sorriu ao encará-lo. — Me livrei deles quando fiz 18. — Uma ótima maneira de mostrar que se tornou adulta. Como conseguiu tal feito? – Harry perguntou, cruzando os braços e a observando enquanto Esther colocava uma quantidade absurda de roupa na mala sem ao menos dobrá-las. — Aproveitei que meus pais haviam saído, juntei todos e doei – ela deu de ombros — Quando a general viu, gritou muito e depois se trancou no quarto, irritada. Uma atitude muito madura para uma mãe – ela sorriu. — Sua mãe parece desejar que você nunca crescesse – Harry disse, se aproximando de Esther para ajudá-la a fechar a mala. — Você não faz ideia – ela suspirou. — Pronto, peguei roupa para o frio e calor, biquínis, alguns produtos de higiene, apenas o essencial; o que precisar, comprarei onde quer que estejamos. Harry observou a mala. Esther estava decidida a fazer tudo o mais rápido que podia; apesar de a mala ser grande, não era nem metade do que ela costumava levar em suas viagens. Harry pegou a mala e colocou no chão, enquanto Esther pegava algumas coisas no banheiro e colocava em sua bolsa. — Vamos – Esther apareceu ao seu lado, apressando-o. A saída da mansão foi mais fácil do que imaginavam; sem ninguém para incomodá-los, mesmo assim, fizeram de tudo para sair silenciosamente e sem fazer muito barulho. Quando chegaram ao carro, Esther o apressou para que Harry saísse de lá o mais rápido possível. — Do jeito que você fala até parece uma fuga – ele brincou. — E não é? – Esther o encarou enquanto Harry arregalou os olhos antes de rir. — Você vai mesmo fazer isso? E o seu trabalho? – Esther perguntou. — Faz muitos anos que tenho me dedicado demais a esse trabalho e deixado minha vida pessoal de lado. Acredite, preciso mais do que você dessas férias. Aquilo era totalmente verdade. Harry passou a se concentrar mais no trabalho em busca de esquecer os seus sentimentos por Esther, já que todas as suas investidas com ela pareciam não dar em nada. Depois que Esther anunciou que estava com Daniel, tudo piorou. Aqueles sentimentos começaram a preocupá-lo. Às vezes, tudo o que ele mais queria era não sentir mais nada daquilo, mas nem mesmo as festas ou outras mulheres o fizeram se esquecer dela. Ele precisava retomar sua vida, então decidiu focar no trabalho, o que deu muito certo até quando Esther o procurava e ele percebia que aquele sentimento continuava ali. Por isso, Harry precisava daquela viagem para esclarecer as coisas com ela. Poderia parecer egoísmo, mas ele já estava certo de que, se Esther o rejeitasse, ele abandonaria tudo e recomeçaria uma nova vida longe dela. Em todos esses anos, até mesmo agora, pensar na possibilidade de ficar distante de Esther dava um grande e sufocante aperto em seu peito. Mas ele não podia continuar naquela vida, ou ela seria sua ruína. ****************** Em pouco tempo, Harry fez sua mala; depois, se sentou na cama enquanto decidiam onde iriam. — Um paraíso tropical, quero relaxar em uma praia bebendo água de coco e olhando para o mar – Esther falou com um olhar sonhador. Antes de prosseguir, seu celular começou a tocar. Ela pegou na bolsa e desligou a chamada. — É minha mãe. — Será que ela já sabe? – Harry perguntou. — Com toda certeza. Duvido muito que algum empregado não tenha dado com a língua nos dentes; sempre que ela sai, deixa alguém para me vigiar e contar cada passo que eu dou – Esther bufou enquanto mexia no celular. — É difícil encontrar passagens em cima da hora, mas precisamos ir logo antes que ela volte e acabe com os nossos planos. — Você não acha que está exagerando? Já é adulta, pode tomar decisões. — Até parece que você não conhece minha mãe. E, além disso, estou para me casar em breve; ela vai surtar, e quero evitar ao máximo ter uma briga ou dar satisfações a ela. Tudo que envolve a mãe de Esther é exagerado e, ao mesmo tempo, assustava Harry. Ele nunca viu alguém tão controlador quanto Lorena. Imaginava que havia mudado pelo menos um pouco depois que Esther cresceu, mas, pelos relatos de sua amiga, ela não mudou nada, continua a tratando como uma criança irresponsável. — Aqui será o primeiro lugar que ela vai procurar – Esther falou, andando de um lado para o outro. — Podemos ir para a casa de praia dos meus pais. Ninguém sabe sobre aquele lugar – Harry disse. — É uma ótima ideia – Esther sorriu e correu para abraçá-lo, depois deu um beijo em sua bochecha. Apenas o toque de seu lábio macio contra a bochecha de Harry já o fez ficar hipnotizado. Por um breve segundo, ele se perguntou se sobreviveria ficando dias sozinho com Esther. Parecia loucura o que estavam fazendo, mas, se recuasse agora, poderia (e iria) se arrepender muito no futuro.Quais loucuras você faria por alguém que ama? Nunca em toda a sua vida, Harry imaginou estar naquela situação. Já era tarde da noite, e mesmo assim, decidiram colocar suas malas no carro e seguir estrada. Esther não queria dar chance de alguém descobrir seu plano e atrapalhar, e Harry não ousou contradizê-la. Sentia uma energia nova subindo em seu peito e a adrenalina correndo nas veias. Por um instante, teve um vislumbre dos tempos de adolescente, quando faziam esse tipo de loucura. Ele havia esquecido como era aquela sensação e, naquele momento, se permitiu esquecer de tudo e viver o presente, com Esther ao seu lado. Após cantarem algumas músicas e dividirem uma porção de batata frita, Esther adormeceu ao seu lado, apesar de antes ter prometido com convicção que seria a melhor copiloto:“Vou ficar acordada a noite toda para te ajudar a não dormir ao volante. Já preparei várias músicas para animar e serei a melhor co-piloto dessa viagem”. Mas, assim que a quinta música começou,
Em todos aqueles anos, Harry havia conhecido várias personalidades de Esther; a atual era mais reservada, e, por conta disso, aquele simples ato o deixou surpreso e esperançoso. Foi somente quando saíram daquela tensão do casamento que ele pôde ver o vislumbre da garota pela qual ele se apaixonou. Esther estava debruçada sobre o balcão da cozinha, mexendo no notebook, quando Harry apareceu.— O que você está fazendo? – Harry perguntou.— Enviando um e-mail para minha mãe e para Daniel avisando que ficarei fora por um tempo – ela respondeu, sem ao menos tirar os olhos do notebook. Harry se serviu de café. Assim que se sentou na frente da amiga, ela empurrou um prato com ovos mexidos e torradas que estava ao seu lado.— Fiz para você.— Estou vendo vantagens nesta viagem, assim poderei aproveitar seus dotes culinários – Harry piscou, levando um pouco de ovo à boca.— São só ovos mexidos – ela deu um pequeno sorriso e, pela primeira vez desde que ele entrou naquele cômodo, levantou o
Em várias ocasiões, eles tocaram nesse assunto, mas ela nunca sequer teve coragem de confessar seus motivos. Apesar de aconselhá-la a viver sua vida, ele jamais falou para Esther se distanciar da família, mas sabia que, para ela conseguir se curar dos tormentos que a assombravam, ela precisava fazer isso. No entanto, ele não queria ser visto como o vilão daquela história, era assim que ela o veria, pois Esther estava cega demais para perceber o que acontecia ao seu redor. Então, ele decidiu esperar que ela visse tudo isso por conta própria, e aquela viagem era sua última chance. Leandro tinha razão em uma coisa: se Esther se casasse, ele precisaria se distanciar dela. Havia tomado muito de suas dores durante todos esses anos e, de alguma forma, Harry sabia que o pouco que restava da essência de Esther sumiria com aquele casamento. Ele queria poder esquecer aqueles sentimentos por ela, se apaixonar por outra pessoa e continuar sendo seu melhor amigo, para que Esther não ficasse sozi
A maneira como ela o encarava era diferente de todas as outras vezes. Seu olhar estava mais penetrante, e Harry podia jurar que havia algo naquele gesto. Um arrepio percorreu seu corpo, mas, antes de cogitar fazer qualquer aproximação, Esther se esquivou e levantou, recolhendo a bagunça que fizeram. Harry se levantou em seguida para ajudá-la. Quando fez menção de ir para a cozinha, sentiu o impacto do corpo de Esther batendo no dele. Ela parecia constrangida quando se desculpou e continuou andando.— Obrigada, mas não precisava ajudar – ela falou, abaixando a cabeça.— Imagina, eu também fiz essa bagunça – Harry disse, pegando as coisas de sua mão e jogando no lixo. Foi estranho; de repente, o clima entre eles começou a mudar, e Esther parecia mais tímida ao se aproximar. Nunca havia acontecido algo assim. Harry entendeu isso como um sinal para continuar com o seu plano inicial. Algo dentro dele dizia que isso iria dar certo, e aquele olhar de Esther sobre ele foi como uma chama
Por mais que acompanhasse Esther praticamente a vida toda, ele não podia dizer que entendia completamente o que ela sentia. Quando via tudo o que Esther passava com os pais, os problemas que ele tinha com sua própria família se tornavam sem importância. Talvez ele nem mesmo devesse chamar aquilo de problemas. Esther não merecia vivenciar isso. Ela merecia uma família acolhedora, que a amassem e, ao mesmo tempo, a apoiassem em seus sonhos, que a deixassem ser livre. Mas o maior erro de muitas pessoas é ter filhos e achar que são suas posses. A partir do momento em que se tornam mãe e pai, acreditam que têm o direito de forçar a criança a viver conforme as altas expectativas que criaram para ela. Infelizmente, não era somente Esther que passava por esse tormento. Muitas outras pessoas dão o seu máximo para receber o mínimo de afeto de outros e acabam pagando um preço alto demais no caminho, perdendo a liberdade. Harry pegou a mão de Esther tentando confortá-la. Ele não queria que a
Era por isso que seu avô escolheu Daniel para substituí-lo como presidente da empresa. De certo modo, Harry ficou aliviado. Jamais se rebaixaria a esse nível de arrogância para conseguir um cargo mais alto. Ele tinha seus princípios e gostava de tratar todos com gentileza. Esther era assim também, por isso não conseguia compreender por que ela estava disposta a se casar com Daniel. Harry passou muito tempo sem entender por que seu pai desistiu de trabalhar naquela empresa anos atrás. Afinal, era a empresa da família, da qual ele herdaria um dia. Agora que trabalhava lá, passou a compreendê-lo cada vez mais. Quando Harry estava na faculdade e recebeu a notícia de que seu pai havia tido um infarto, foi o pior dia de sua vida. Sentiu como se o mundo ao seu redor estivesse desmoronando, as paredes ficando cada vez mais próximas, e em breve iria sufocá-lo. Ele precisava ver sua família e jamais suportaria a ideia de que seu pai falecesse sem ao menos se despedir. Mas naquele dia, o úni
No início daquele jantar, tudo estava correndo como o planejado. Agora, depois daquela confissão inesperada de Esther, sua mente estava a mil. A mulher à sua frente parecia perdida demais em seus pensamentos enquanto comia e tentava evitar contato visual. Harry não queria aquilo. Aquela viagem era a chance de mudar tudo, o que mais precisavam naquele momento: se divertir, aproveitar a companhia um do outro e arejar a mente.— Não acredito no que estou vendo. É o Harry Miller! – Harry escutou uma voz estranhamente familiar próxima deles. Quando levantou o olhar, não conseguiu acreditar em quem estava ali. Levou alguns segundos para reconhecê-lo.— Adam! – Harry quase gritou de tanta empolgação ao ver um dos seus amigos da escola. Ele se levantou, e se cumprimentaram com um abraço. Adam estava um pouco mais alto, com a barba grande e um estilo diferente.— Quanto tempo, cara! Não nos vemos desde a formatura da escola! – Adam falou, se afastando.— Lembra da Esther? – Harry perguntou,
— Harry, vou ali cumprimentar as garotas – Esther avisou, levantando-se e indo com Angelina em direção ao grupo de mulheres que estavam do outro lado da piscina.— Então, enfim, você conseguiu conquistar a Esther? – Adam perguntou, batendo de leve nas costas de Harry e entregando-lhe uma cerveja. Ele sabia que era errado beber estando dirigindo, mas uma cerveja não faria mal, ainda mais porque estava precisando muito disso. Harry balançou a cabeça, sentindo as palavras entalarem na garganta. Era difícil confessar aquilo em voz alta, até porque já se passaram anos e ele continuava do mesmo jeito com Esther. Seus amigos o achariam um covarde, e teriam razão.— As coisas entre nós são complicadas – ele respondeu — Não estamos juntos, mas esta viagem mudará tudo. Estou confiante.— É assim que se fala, cara! – Adam o apoiou.— Eu sempre imaginei que vocês já estivessem casados e com filhos a essa altura –Denis observou. Antes que ele continuasse, Leandro apareceu, gritando, com uma ca