Aquela conversa estava entrando em um caminho perigoso. Já havia sido excitante ouvir a maneira como Esther descrevia o seu porte físico; agora, o jeito como ela sorria, com as bochechas coradas, fazia sua imaginação percorrer um caminho diferente do que estava vendo à sua frente.
Harry imaginou como seria tomar aqueles lábios nos seus com um beijo fervoroso, percorrendo as mãos por cada centímetro de seu corpo, fazendo-a suspirar com seu toque. Ele desejava mais do que tudo vê-lá sentindo o desejo e a chama ardendo dentro deles. Harry saiu de sua ilusão quando Esther começou a estalar os dedos à sua frente. Ele agradeceu mentalmente por isso, pois estava imaginando ela sentada em sua mesa com as pernas em volta dele, enquanto implorava para senti-lo ainda mais. Se continuasse com aqueles pensamentos, passaria por algo vergonhoso na frente dela, que ainda o via como seu amigo. — No mundo da lua de novo? – Esther cruzou os braços, o encarando. Era fofo como ela o encarava, fingindo estar irritada. Harry apertou os lábios tentando se concentrar. — Me desculpe, o que dizia? Esther suspirou antes de prosseguir. — Você vai me levar a um lugar hoje – ela assumiu um ar misterioso, pegando sua mão e o direcionando para fora da sala. Ele adorava seu jeito mandão; nem mesmo se importava de segui-la para onde quer que fosse. Conforme passavam pelo corredor da empresa, sentiu vários olhares direcionados a eles, algumas pessoas nem mesmo disfarçaram quando começaram a sussurrar. Harry odiava aquilo. Desde que entrou naquela empresa, estava consciente dos boatos que corriam pelos corredores envolvendo seu nome e o de Esther. O pior era que cada um deles parecia mais absurdo que o outro. Alguns acreditavam que Esther estava com Daniel por interesse, devido ao seu cargo como Presidente da empresa, e que Harry era o seu amante. Outros acreditavam que eram um trisal, o que era ainda mais repulsivo, sabendo que Daniel era o seu primo. Harry jamais dividiria o que é seu com outro homem. Outro boato dizia que os dois primos eram gays, e o relacionamento de Daniel com Esther era só uma fachada. Quando ouviu esse boato pela primeira vez, seu sangue ferveu. Poderia virar as costas e ignorar tudo aquilo, mas era o nome de sua família que todos estavam ridicularizando ao inventar essas histórias. Esther não merecia ser chamada de traidora, interesseira ou qualquer outra coisa que não fosse verdade. Mesmo depois de seu breve recado em uma das reuniões, alegando que nada daquilo era verdade e que gostaria que todos os boatos se encerrassem por ali, pois aquele era um local de trabalho e não um lugar para fofocas. Ele sabia que ainda existiam os curiosos e fofoqueiros que continuavam falando sobre a vida do CEO e do Presidente como se tivessem algum tipo de intimidade para isso. Ele não se arrependia de sua atitude; já era hora de tomar alguma providência. Mas a única coisa que poderia fazer agora era ignorar e viver sua vida. Assim que entraram no carro, Esther colocou o endereço no GPS e o mandou seguir. — Nenhuma dica? – Harry perguntou. — Não é nada de mais – ela deu de ombros antes de conferir sua maquiagem no espelho e devolvê-la à bolsa. Poderia ser impressão dele, mas Esther estava agindo de maneira estranha assim que entraram naquele carro. Seu sorriso parecia forçado, e seus olhos estavam cansados, como se não estivesse dormindo bem fazia dias. — Está tudo bem? — Sim, por que não estaria? – ela se virou, o encarando, fazendo um bico surpresa. — Nada não – Harry pegou em sua mão, que estava em cima da coxa, e entrelaçou os seus dedos. A cada momento que passava próximo daquela mulher, sentia que em breve sua sanidade mental iria pelos ares. O simples toque em sua pele quente fez seu corpo se arrepiar e dar mais sinal de vida. Ao olhar mais uma vez para sua mão, mexeu de leve, apenas para sentir o calor de sua coxa, que fantasiava inúmeras vezes em apertar cada centímetro dela. Novamente, Harry precisou afastar seus pensamentos, ao perceber que estava começando a ficar animado demais com a ideia. Ele voltou sua atenção no rosto da mulher ao seu lado. Algo parecia estar a incomodando, mas, se Esther não queria falar sobre isso naquele momento, ele esperaria até o dia em que ela estivesse pronta para desabafar. Para falar a verdade, Esther não parecia a mesma desde que assumiu um relacionamento com Daniel publicamente em uma das festas de Natal da empresa, o que foi um grande espanto até mesmo para Harry, que era o seu melhor amigo e com quem ela sempre confidenciou tudo sobre sua vida, até mesmo coisas constrangedoras ou íntimas das quais, Harry não precisava saber. Antes disso, Esther nunca havia tocado no nome de seu primo, nem mesmo o observava com qualquer tipo de interesse. Parecia que agora Esther estava perdendo o brilho nos olhos pouco a pouco, mas sempre que Harry perguntava algo sobre, ela evitava o assunto, mudando o rumo da conversa ou dizia: “Eu estou bem, Harry, estou feliz com Daniel, ele é bom para mim.” Mas Harry a conhecia melhor do que ninguém, e aquele sorriso em seus lábios não parecia nada verdadeiro. Somente quando ficavam a sós, sem tocar no assunto, que ele via um vislumbre do sorriso que o fez se apaixonar por ela. Naqueles momentos, Harry se consolava, acreditando que tudo era coisa da sua cabeça, talvez por conta do ciúme de Esther estar com Daniel e não com ele. O caminho foi mais silencioso do que o normal. Harry estava perdido demais em seus pensamentos e cada vez mais preocupado com as atitudes de Esther para tentar chamar a atenção dela. Só conseguiu sair de seu transe quando parou o carro em frente a uma loja que fez seu corpo todo estremecer ao ver do que se tratava. Ele engoliu em seco antes de sair do carro e abrir a porta para Esther, pegando em sua mão. Conforme seguiam até a loja de vestidos de noiva, Harry sentiu-se enjoado. Naquele momento, percebeu que precisava acabar com aquilo. Não conseguiria mais ficar ao lado de Esther fingindo ser apenas um amigo, sendo que tinha sentimentos verdadeiros e românticos por ela. — Espero que não se incomode de me acompanhar a mais um ajuste do vestido. Depois daqui podemos ir almoçar em algum lugar – Esther falou quase como em um sussurro. — Tudo bem – ele concordou, observando o olhar meigo que ela direcionava para ele. — Boa tarde, senhorita Brooks, estava te esperando. Tudo está pronto, me acompanhe – uma atendente deu um grande sorriso ao se aproximar deles. Ela falava tudo tão rápido que Harry quase não conseguiu raciocinar. — Claro – Esther sorriu. — Esse deve ser o noivo, devido à tradição de não ver a noiva antes do casamento, é uma surpresa vê-lo aqui. É um prazer conhecê-lo – a mulher se virou para ele e o encarou com os grandes olhos verdes, como se estivesse o julgando por algo que ele fez. — Na verdade… – antes mesmo dele tentar se explicar e dizer que não era o noivo, a mulher o interrompeu. — Pode se sentar aqui enquanto aguarda – ela apontou para o sofá branco que estava no centro da sala. Esther deu um sorriso travesso quando percebeu seu constrangimento. Depois, pegou em sua mão para assegurar que tudo estava bem. Harry respirou fundo e revirou os olhos enquanto se sentava, observando elas sumirem atrás das cortinas que separavam aquele cômodo. — Onde fui me meter? – Harry ajeitou a gravata antes de fechar os olhos com força. Sabia que não deveria permanecer ali, seu coração não era tão forte quando se tratava de Esther.Nem mesmo se quisesse, Harry conseguiria descrever o que sentiu e pensou quando as cortinas se abriram e Esther apareceu com o vestido de noiva. Ela sempre foi linda, mas naquele momento parecia uma miragem ou alucinação diante dele. Sabe aquelas cenas de filmes românticos onde o personagem se encanta com a beleza da moça, e os dois parecem estar vivendo em câmera lenta enquanto ela o observa timidamente, com as bochechas vermelhas? Isso poderia descrever perfeitamente aquele momento. Se prestasse atenção, Harry podia escutar a batida do seu coração, que parecia querer sair de seu peito. Ele nem piscou, ainda petrificado no sofá diante dela.— Fale alguma coisa – Esther quebrou o silêncio, ainda constrangida. Ele engoliu em seco antes de ter qualquer outra reação. Harry sentia que nenhuma palavra do dicionário poderia descrever a beleza da mulher à sua frente. Sim, pode parecer exagero, mas era o que seu coração apaixonado gritava enquanto batia cada vez mais rápido no peito. T
Enquanto caminhavam até o carro, Harry percebeu que Esther parecia querer dizer algo, o que era estranho, pois, em todos os anos de amizade, isso nunca aconteceu. Esther era a pessoa com quem ele sempre se sentia livre para falar sobre qualquer coisa (bem, quase tudo, já que ele nunca teve coragem de confessar o que sentia além da amizade). Mas, ultimamente, as coisas entre eles pareciam diferentes, e Harry não gostava disso. Quando decidiu perguntar o que ela estava pensando, ambos abriram a boca ao mesmo tempo, e sorriram, resmungando qualquer coisa.— Pode falar primeiro – Harry se adiantou.— Você precisa mesmo voltar ao trabalho hoje? Ele pensou em responder que sim, pois tinha muito trabalho, o que não seria mentira. Mas havia algo no olhar dela, quase uma súplica. Harry sabia que precisava estar com ela naquele momento. Talvez, assim, Esther tivesse coragem de contar o que a estava incomodando tanto.— O que você tem em mente? – Harry perguntou, observando enquanto ela mudav
— Estou precisando de umas férias mesmo – Harry respondeu com um sorriso de lado. Esther deu um grito e acabou com a distância entre eles, espremendo-o em um abraço caloroso e aconchegante. Fazia meses que ele não conseguia tirar um sorriso sincero dela, nem mesmo a via tão animada assim.— Para onde vamos? – Esther perguntou, mas, antes mesmo de ele responder, continuou: — Não importa, temos que fazer as malas – ela falou enquanto entrava no carro.— Agora? – Harry disse surpreso.— Sim, meus pais estão fora hoje; se não aproveitarmos essa oportunidade, jamais conseguiremos sair do país. Harry sorriu ao ligar o carro, com um sentimento nostálgico no peito. Fazia muito tempo que não se sentia assim.— Passaremos na sua casa primeiro? Ou eu te deixo lá e depois volto para te buscar?— Vamos fazer assim: primeiro passamos em casa; farei de tudo para arrumar a mala em tempo recorde, depois iremos para a sua casa.****************** Quando chegaram, já estava escurecendo.— E agora? Se
Quais loucuras você faria por alguém que ama? Nunca em toda a sua vida, Harry imaginou estar naquela situação. Já era tarde da noite, e mesmo assim, decidiram colocar suas malas no carro e seguir estrada. Esther não queria dar chance de alguém descobrir seu plano e atrapalhar, e Harry não ousou contradizê-la. Sentia uma energia nova subindo em seu peito e a adrenalina correndo nas veias. Por um instante, teve um vislumbre dos tempos de adolescente, quando faziam esse tipo de loucura. Ele havia esquecido como era aquela sensação e, naquele momento, se permitiu esquecer de tudo e viver o presente, com Esther ao seu lado. Após cantarem algumas músicas e dividirem uma porção de batata frita, Esther adormeceu ao seu lado, apesar de antes ter prometido com convicção que seria a melhor copiloto:“Vou ficar acordada a noite toda para te ajudar a não dormir ao volante. Já preparei várias músicas para animar e serei a melhor co-piloto dessa viagem”. Mas, assim que a quinta música começou,
Em todos aqueles anos, Harry havia conhecido várias personalidades de Esther; a atual era mais reservada, e, por conta disso, aquele simples ato o deixou surpreso e esperançoso. Foi somente quando saíram daquela tensão do casamento que ele pôde ver o vislumbre da garota pela qual ele se apaixonou. Esther estava debruçada sobre o balcão da cozinha, mexendo no notebook, quando Harry apareceu.— O que você está fazendo? – Harry perguntou.— Enviando um e-mail para minha mãe e para Daniel avisando que ficarei fora por um tempo – ela respondeu, sem ao menos tirar os olhos do notebook. Harry se serviu de café. Assim que se sentou na frente da amiga, ela empurrou um prato com ovos mexidos e torradas que estava ao seu lado.— Fiz para você.— Estou vendo vantagens nesta viagem, assim poderei aproveitar seus dotes culinários – Harry piscou, levando um pouco de ovo à boca.— São só ovos mexidos – ela deu um pequeno sorriso e, pela primeira vez desde que ele entrou naquele cômodo, levantou o
Em várias ocasiões, eles tocaram nesse assunto, mas ela nunca sequer teve coragem de confessar seus motivos. Apesar de aconselhá-la a viver sua vida, ele jamais falou para Esther se distanciar da família, mas sabia que, para ela conseguir se curar dos tormentos que a assombravam, ela precisava fazer isso. No entanto, ele não queria ser visto como o vilão daquela história, era assim que ela o veria, pois Esther estava cega demais para perceber o que acontecia ao seu redor. Então, ele decidiu esperar que ela visse tudo isso por conta própria, e aquela viagem era sua última chance. Leandro tinha razão em uma coisa: se Esther se casasse, ele precisaria se distanciar dela. Havia tomado muito de suas dores durante todos esses anos e, de alguma forma, Harry sabia que o pouco que restava da essência de Esther sumiria com aquele casamento. Ele queria poder esquecer aqueles sentimentos por ela, se apaixonar por outra pessoa e continuar sendo seu melhor amigo, para que Esther não ficasse sozi
A maneira como ela o encarava era diferente de todas as outras vezes. Seu olhar estava mais penetrante, e Harry podia jurar que havia algo naquele gesto. Um arrepio percorreu seu corpo, mas, antes de cogitar fazer qualquer aproximação, Esther se esquivou e levantou, recolhendo a bagunça que fizeram. Harry se levantou em seguida para ajudá-la. Quando fez menção de ir para a cozinha, sentiu o impacto do corpo de Esther batendo no dele. Ela parecia constrangida quando se desculpou e continuou andando.— Obrigada, mas não precisava ajudar – ela falou, abaixando a cabeça.— Imagina, eu também fiz essa bagunça – Harry disse, pegando as coisas de sua mão e jogando no lixo. Foi estranho; de repente, o clima entre eles começou a mudar, e Esther parecia mais tímida ao se aproximar. Nunca havia acontecido algo assim. Harry entendeu isso como um sinal para continuar com o seu plano inicial. Algo dentro dele dizia que isso iria dar certo, e aquele olhar de Esther sobre ele foi como uma chama
Por mais que acompanhasse Esther praticamente a vida toda, ele não podia dizer que entendia completamente o que ela sentia. Quando via tudo o que Esther passava com os pais, os problemas que ele tinha com sua própria família se tornavam sem importância. Talvez ele nem mesmo devesse chamar aquilo de problemas. Esther não merecia vivenciar isso. Ela merecia uma família acolhedora, que a amassem e, ao mesmo tempo, a apoiassem em seus sonhos, que a deixassem ser livre. Mas o maior erro de muitas pessoas é ter filhos e achar que são suas posses. A partir do momento em que se tornam mãe e pai, acreditam que têm o direito de forçar a criança a viver conforme as altas expectativas que criaram para ela. Infelizmente, não era somente Esther que passava por esse tormento. Muitas outras pessoas dão o seu máximo para receber o mínimo de afeto de outros e acabam pagando um preço alto demais no caminho, perdendo a liberdade. Harry pegou a mão de Esther tentando confortá-la. Ele não queria que a