06

Eu só podia estar doida.

Só isso justificava o que eu estava fazendo naquele instante; deitada no ombro de Alex, comendo minha pizza favorita com ele, enquanto assistíamos uma comédia romântica, sentados no tapete da sala.

É, eu estava doidona.

— Lindo filme — falei enquanto rolava os créditos finais —, pena que não é assim na realidade.

— Poderia ser — Alex afirmou, acarinhando minhas tranças.

Eu ri.

— Não consigo acreditar nisso. Pelo menos não agora quando meu coração está partido.

— Sinto muito, Zoe — ele disse, consternado.

Soltei um suspiro.

— Tudo bem. Vai passar.

— Claro que vai — Alex me encorajou —, não deixe um idiota te fazer perder a fé no amor. Ainda existem pessoas boas no mundo.

Ergui a cabeça e o encarei.

— Me diz quem?

Seus lindos olhos verdes me escrutinaram, a pupila dilatou e ele desviou o olhar para o chão.

— Não consigo pensar em ninguém agora. Mas quem sabe um dia você não encontre alguém que te faça ver fogos de artifícios. Que te faça tão feliz a ponto de você se perguntar se é mesmo real.

— É, quem sabe. — falei apenas, não acreditando nadinha naquilo.

O clima ficou tenso de repente, então resolvi mudar de assunto.

— Há quanto tempo você trabalha na pizzaria?

— Há pouco mais de um ano — ele respondeu —, gosto de lá, mas estou batalhando muito para realizar meus sonhos e fazer minha mãe feliz, dar à ela tudo o que ela merece.

Segurei em sua mão e o encarei com sinceridade.

— Tenho certeza que ela já é muito feliz por te ter como filho, motoboy.

Um brilho de satisfação e orgulho cruzou suas írises claras.

— Obrigado. Por falar nela, preciso ir. Não costumo demorar tanto para chegar em casa.

Levantou-se e me puxou pela mão também, nossos corpos acabaram se colidindo. Sua respiração ficou curta e o coração batia rápido demais. Queria dizer que comigo foi diferente, mas estaria mentindo na cara dura.

Por um ínfimo instante, eu senti vontade de beijá-lo.

— Você precisa ir — murmurei, atordoada.

— É — ele disse baixinho —, eu sei.

Me afastei de seus braços e o guiei até a porta, quando Alex desceu os três degraus, eu o chamei. Ele virou-se para trás, meio ansioso.

— A garota por quem você é apaixonado sabe disso?

— Não, Zoe. Ela nem desconfia.

Me encostei no batente da porta e cruzei os braços para me proteger do frio.

— Por que não conta?

— Tenho medo — ele confessou.

— Você é um bom rapaz, Alex. Qualquer garota se jogaria aos seus pés.

Sorriu, aproximou-se de mim e, ao chegar perto, falou:

— Este é o problema, Zoe. Ela não é qualquer uma.

Alex plantou um beijo casto em minha testa e foi embora, fiquei observando-o por alguns segundos. Depois entrei, meio confusa, e fui deitar.

Quando estava na cama, o rosto de Alex foi se formando em minha cabeça. A pele negra, reluzente, os olhos verdes, a boca farta, os cabelos bem cortados.

Lindo! Alex era tão lindo!

E foi com essa imagem dele em minha mente que eu adormeci de vez.

***

— Então você topou minha ideia? — Clara perguntou do outro lado da linha, na segunda-feira, lá pro meio-dia, quando eu liguei para ela.

— É, acho que sim — respondi e coloquei o prato com macarronada em cima da bancada branca. Me sentei numa das cadeiras giratórias, pronta para almoçar.

— E sua mãe está mesmo firme e forte com esse boy gostoso, hein?

— Nem me fale — resmunguei —, me ligou toda empolgada. E você sabe que ela não tem o costume de me ligar tanto.

— É, eu sei. Mas é sua mãe, Zoe, ela precisa do seu apoio, mesmo não sendo tão presente, ela só tem a você.

— Você reparou que ela e a tia Marta nem competiram pra ver quem tem a melhor filha? — Perguntei, enrolando o macarrão no garfo.

— Acredita que eu ia te dizer isso agora? O namorado da sua mãe roubou a cena.

Eu ri.

— Ele é um gato — opinei —, mas algo me diz que tem alguma coisa de errado nisso tudo. Minha mãe estava solteira até pouco tempo!

— Deixa de coisa, Zoe — Clara me repreendeu. — E por falar em gato, tem um cliente que vem aqui direto, acho que já te falei dele, e adivinha?

— O quê? — Eu quis saber, com expectativa.

— Ele sorriu pra mim — contou, toda empolgada.

— Não vai começar, Clara.

— Zoe, o cara faz o tipo fechadão, e hoje abriu um sorriso de orelha à orelha pra mim. Isso só pode ser um sinal.

— Ou ele pode ter transado ontem e acordou felizão.

— Veremos. Agora preciso desligar, minha hora de almoço está acabando e eu nem almocei. Me lembre de pedir demissão mês que vem.

Eu ri novamente.

— Lembro. Mas os boletos não se pagam sozinhos.

— Inferno — e encerrou a ligação.

Assim que terminei de almoçar, fui escovar os dentes. Me sentia tão... Entediada. Vivendo de seguro-desemprego, fingindo ter um namorado, colocando Alex no meio dessa merda toda.

Saco.

Eu já estava secando o rosto quando minha campainha tocou. Para ser sincera, eu não fazia ideia de quem era, então fui, me arrastando, para atender.

Toda desajeitada, vestindo um pijama de estrelinhas, e com as tranças emaranhadas, foi assim que eu o vi pela primeira vez depois do término.

E, pra piorar minha situação, Pedro estava um tremendo gato.

— Como você está? — Ele perguntou.

“Um caco”, tive vontade de responder.

— Bem — foi o que eu disse —, e você?

— Bem também. Você deixou essas coisas lá no meu apartamento, vim te entregar.

Olhei para a caixa que ele segurava e, automaticamente, peguei-a de suas mãos.

Mãos que me tocaram.

Que me conheceram intimamente.

Que me acariciaram por exatos seis meses.

Então era isso. O ponto final de uma história que um dia foi bonita. O fim de um ciclo.

— Você não deixou nada aqui — consegui, por fim, falar. — Acho que agora não temos mais nada pra conversar.

— Não queria que fosse assim — Pedro disse —, entenda, Zoe, o problema não é você.

Revirei os olhos.

— Por mais clichê que pareça, não é. Eu... Eu conheci outra pessoa.

Isso, Pedro, acabe com meu coração de vez.

— Quando? — Inquiri, tentando conter a raiva que crescia dentro de mim.

Ele ficou em silêncio.

— Ah, meu Deus! Você a conheceu antes de mim? Antes de nós? Você... Você me traiu?

— Não te traí — ele assegurou —, mas sim, eu a conheci quando ainda estávamos juntos. E, bem, eu me apaixonei por ela. Não queria que acontecesse, mas aconteceu. Ninguém manda no coração.

— Vá embora, Pedro — ordenei. — Agora.

E ele foi.

E eu fiquei em casa, desempregada, sozinha, e com o coração partido em mil caquinhos.

Se um dia eu iria conseguir colá-lo?

Bem, eu duvidava bastante.

Fiquei no sofá da sala, observando meus pertences. Tinha um conjunto de moletom, Perdidos no amor — meu livro favorito da vida —, e cinco calcinhas limpinhas, que eu costumava lavar debaixo do chuveiro.

Duas, eu sabia, estavam rasgadas de tão usadas.

Prometi para mim mesma que iria costurá-las depois.

Qual é! Elas ainda serviam.

E, de qualquer modo, eu não iria transar tão cedo mesmo.

Diferente de Pedro, que já estava em outra, certamente fazendo o Kama Sutra com a garota.

Não me permiti chorar, eu não lhe daria essa ousadia, então, tudo o que fiz foi pegar meu livro, me deitar no sofá, e o ler pela, sei lá, milésima vez.

Ele era meu porto-seguro, meu bote salva-vidas.

Estava triste?

Lia Perdidos no amor.

Feliz?

Lia Perdidos no amor.

Doente?

Perdidos no amor me curava.

A história de Elisa Sabeth e Gilbert Navarro me fazia ter fé, mesmo minha vida amorosa estando um caos, como agora.

Ali, naquele amontoado de palavras bonitas, eu encontrava conforto.

Nada é tão ruim que não possa melhorar com um bom livro.

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