— Você enlouqueceu, Clara! Você enlouqueceu! — Exclamei, indo de um lado para o outro, assim que chegamos em casa.
Porque era o que tinha acontecido, não?Digo, inventar um namorado para mim quando, na verdade, eu havia acabado de sair de um relacionamento.Loucura total! — Eu não podia deixar aquela gente te humilhar, Zoe — Clara justificou. — Nem sua mãe te defendeu.Me sentei no sofá, o coração acelerado, as mãos suadas, uma sensação de sufocamento dentro de mim.Eu odiava mentiras, muito. Elas têm pernas curtas e te jogam numa teia complicada demais, que te impedem de sair de lá tão cedo.Nada de bom acontece quando há mentiras pelo meio.Aprendi isso com os livros da Carina Rissi. — Clara, eles querem que eu o leve para o casamento da Anelise. Você não percebe onde me meteu?Foi isso que aconteceu quando Clara inventou essa lorota toda, minha tia praticamente intimou que eu levasse o tal de Alex para o casamento da filha, que, por sua vez, ainda não engolira a história narrada pela minha amiga.Até vovó fez perguntas sobre o moço. E Clara não poupou elogios.Alex era trabalhador, honesto, lindo e muito, muito bacana. Só não havia ido para o almoço hoje porque houve um contratempo muito grande. — Amiga, me escuta, eu tenho uma ideia. Eu jamais te meteria numa encrenca dessas sem ter algo em mente. — Eu sinceramente não sei se isso me conforta ou me assusta.Clara foi até a cozinha e voltou segundos depois, com um copo d’água com açúcar para mim. Tomei tudo numa golada só. — Vai — falei, colocando o copo vazio na mesinha de centro —, me conta esse seu plano mirabolante. — Muito bem, o Alex a gente já tem, né?Olhei para ela, embasbacada. — Não... — Escuta, Zoe. Tudo o que você tem que fazer é se aproximar dele, iniciar uma amizade. Vocês se deram bem ontem. — Eu tava bêbada, Clara! Me daria bem até com a Anelise.Tá, exagerei. — Nem vem, eu te conheço. Você gostou do cara.Balancei a cabeça em sinal de negação. — Não no sentido romântico — ela se corrigiu. — Não posso fazer isso. Não posso magoar alguém tão legal como ele.Então Clara ajoelhou-se de frente para mim e segurou firme minha mão. — Você mesmo disse que ele é apaixonado por outra, Zoe — argumentou. — Por mais linda que você seja, não se muda um sentimento tão forte do dia pra noite. Só se aproxime dele, dê uns beijinhos, quem sabe uma boa noite de sexo, e pronto. Conseguiu um ficante, leva o Alex para o casamento da Anelise como namorado e depois termina o lance porque acabou de sair de um relacionamento sério. — Sei lá, parece muito injusto. — É o que os homens vivem fazendo. Só pensa a respeito, tá? Agora eu tenho que ir, amanhã é dia de acordar cedo.Minha amiga sapecou um beijo em minha bochecha e saiu, me deixando confusa.E se eu embarcasse nessa ideia pra valer? E se, no fundo, não fosse tão ruim assim?De uma coisa eu sabia, Alex jamais se apaixonaria por mim.Nem eu por ele.Pedro deixou um buraco enorme em meu coração, não era qualquer um que o preencheria assim tão fácil.Por volta das seis horas da noite, minha mãe ligou para mim. Estranhei, ela não costumava ligar tanto, como disse Anelise, nós não éramos tão próximas.Isso me machucava bastante, mas eu estava aprendendo a lidar com essa ausência, guardando tudo dentro de mim, fingindo que não era assim, tão importante. — Sinto que te devo explicações, Zoe — Ela foi logo dizendo, tão logo eu atendi. — Ah, sério? — Fui irônica. — Por quê? Por que de repente a senhora me aparece com um cara bem mais novo e o apresenta como namorado? — Idade não importa quando se há amor, querida. — Ela retrucou.Fui até a cozinha e preparei um chá. Deixei o copo rodar no micro-ondas e fiquei ali, encostada no batente da cozinha. — Amor? Há quanto tempo a senhora conhece esse cara? — Inquiri.Minha mãe demorou alguns segundos para responder. — Faz uns dias — disse por fim. — Você, mais do que ninguém, poderia entender. Clara disse que está apaixonada, eu nunca acreditei que vocês eram namoradas, mas você nunca teve sorte com homens.Uau, essa doeu. — É verdade essa história, Zoe? Você está mesmo apaixonada? Está namorando?Eu deveria desmentir, contar toda a verdade, negar até a morte porque, afinal, era tudo uma farsa.Mas a partir do momento que fiquei em silêncio, digerindo tudo o que minha mãe dizia, eu não fui forte o bastante para fazer isso.Então eu fiz a última coisa que deveria fazer. — É, mãe. — Afirmei. — Eu estou namorando o Alex. — Maravilha! — Ela exclamou, contente. — Quando irei conhecê-lo? — Em breve — respondi, abrindo o micro-ondas e pegando o copo com chá de camomila. Segui até a sala e me sentei no sofá. — Me fala mais sobre seu namorado. — Ele é advogado — contou, toda empolgada —, nos conhecemos no Tinder.Tinder! Minha mãe estava usando o Tinder!Virei o chá, nervosa, mesmo ele estando quente. — E a senhora... Está feliz? — Estou. Era o que seu pai queria, Zoe. Ele me disse isso antes de partir. A vida segue, afinal. — Eu sei, é que.. — O quê?“Eu sinto tanto a falta dele.”, era o que eu queria dizer, mas deixei pra lá. — Nada. Mãe, preciso desligar agora, vou tomar um banho. — E depois? Qual a programação para depois?Respirei fundo. — Pedir pizza — contei, e torci bastante para que Alex viesse junto. ***Como havia dito, lá pras nove da noite, pedi pizza. Para minha sorte, Alex veio entregar para mim. — Oi, motoboy — eu disse, ansiosa. — Oi, Zoe. Está se sentindo melhor?O tom de preocupação em sua voz me fez amolecer. Eu iria mesmo meter esse cara legal nessa encrenca toda?Não. Eu não podia fazer isso. — Estou sim — afirmei e lhe estendi o dinheiro —, fica com a gorjeta. — Obrigado. — Agradeceu. Seus olhos verdes me estudaram por um tempinho, antes de ele se virar para ir embora. — Alex — cala a boca, Zoe. Só cala. — Oi — notei que havia uma certa expectativa no modo como ele me respondeu.Tudo bem, eu podia fazer isso. Ele estava apaixonado por outra, eu não era, nem de longe, apaixonante. Seria só um lance ou talvez o começo de uma grande amizade, não passaria disso.Certo???Certo, respondi para mim mesma. — Vem pra cá depois do expediente — chamei e ele abriu um sorriso lindo que faria qualquer garota sorrir de volta. — Eu não demoro. — Prometeu.E ele não demorou.Uma hora depois, lá estava Alex, tocando a campainha da minha casa.Eu só podia estar doida.Só isso justificava o que eu estava fazendo naquele instante; deitada no ombro de Alex, comendo minha pizza favorita com ele, enquanto assistíamos uma comédia romântica, sentados no tapete da sala.É, eu estava doidona. — Lindo filme — falei enquanto rolava os créditos finais —, pena que não é assim na realidade. — Poderia ser — Alex afirmou, acarinhando minhas tranças.Eu ri. — Não consigo acreditar nisso. Pelo menos não agora quando meu coração está partido. — Sinto muito, Zoe — ele disse, consternado.Soltei um suspiro. — Tudo bem. Vai passar. — Claro que vai — Alex me encorajou —, não deixe um idiota te fazer perder a fé no amor. Ainda existem pessoas boas no mundo.Ergui a cabeça e o encarei. — Me diz quem?Seus lindos olhos verdes me escrutinaram, a pupila dilatou e ele desviou o olhar para o chão. — Não consigo pensar em ninguém agora. Mas quem sabe um dia você não encontre alguém que te faça ver fogos de artifícios. Que te
Estava com o olho inchado de tanto chorar. Eu podia ler mil vezes aquele livro, e em todas elas eu me derramaria de lágrimas.Fungando, peguei meu celular.Tinha algumas mensagens de Clara e uma de um número desconhecido. Optei por responder minha amiga primeiro.“Oi, Clara, eu tô bem. Acabei de ler Perdidos no amor.” “Ah, não, você sempre chora quando lê esse livro.”“É que eu não me conformo com o final. Ei, adivinha quem veio aqui.”“Quem??”“Pedro.”“Não acredito! O que ele queria?”“Me entregar algumas coisas, inclusive meu livro. Ele me disse que conheceu outra pessoa. Tá apaixonado.”“Como assim? Há três dias vocês eram um casal cheio de planos.”“Tudo muda muito rápido pelo visto.”“Sinto muito, Zoe.”“Tudo bem.”Clara mandou alguns emojis de coração e disse que ia estender umas roupas, então eu abri a mensagem do tal número desconhecido, sem ter a mínima ideia de quem era.“Oi, Zoe. É o Alex.”Acabei sorrindo.“Oi, motoboy.”“Como você está?”“Bem.”, menti
Durante a semana, eu nem precisei chamar Alex para vir, assim que terminava seu expediente, ele vinha, mesmo sem eu pedir pizza — voltei à dieta, e também iria à falência se torrasse a pouca grana que tinha.Fazíamos o de sempre, sentávamos no tapete da sala, conversávamos sobre coisas aleatórias e assistíamos qualquer programação na TV.Era bom assim.Era muito bom, para ser sincera.Na noite de sexta, entretanto, ele chegou mais cedo. Eu tinha acabado de sair do banho, estava com meu roupão, quando Alex tocou a campainha. — Oi — eu disse, surpresa —, não era pra você estar na pizzaria? — Pedi folga, um amigo me substituiu. Desculpe vir sem avisar, se quiser vou embo... — Entra — pedi, interrompendo-o —, vou me trocar, pode ficar à vontade e... Ei, o que é isso? — Perguntei ao notar uma sacola grande em suas mãos. — Faz parte da surpresa. — E piscou pra mim.Corei.Sério? Eu corei mesmo?Puta merda! — Já volto — sem esperar resposta, segui até meu quarto, fechei
Alex veio nos buscar por volta das onze e meia da manhã, chegou na porta de minha casa, dirigindo um Celta prateado.Desceu, abriu a porta para nós e sorriu para mim. Fiquei meio desconcertada, mas acabei sorrindo de volta. — Oi — ele balbuciou, tinha carinho em seu tom de voz. — Oi, motoboy — respondi, um pouco melosa.Deus, o que estava acontecendo comigo? — Oi, Clara — saudou minha amiga, todo simpático —, como você está? — Estou bem — ela respondeu —, e você? — Pra ser sincero, com fome. Entrem, eu juro que sou um bom motorista.Eu ri.Sentei no banco da frente e afivelei o cinto. Clara fez o mesmo, sentada no banco de trás. — Minha família é um pouco... Como vou explicar? Barulhenta...?Ri novamente. — Estou preparada — assegurei, apertando sua mão.Alex olhou para mim de soslaio e abriu um sorriso que aqueceu meu coração, me fazendo, a contragosto, suspirar.Sério, alguém me explica o que está acontecendo comigo?Como ele mesmo dissera no sábado (o
Alex veio nos buscar por volta das onze e meia da manhã, chegou na porta de minha casa, dirigindo um Celta prateado.Desceu, abriu a porta para nós e sorriu para mim. Fiquei meio desconcertada, mas acabei sorrindo de volta. — Oi — ele balbuciou, tinha carinho em seu tom de voz. — Oi, motoboy — respondi, um pouco melosa.Deus, o que estava acontecendo comigo? — Oi, Clara — saudou minha amiga, todo simpático —, como você está? — Estou bem — ela respondeu —, e você? — Pra ser sincero, com fome. Entrem, eu juro que sou um bom motorista.Eu ri.Sentei no banco da frente e afivelei o cinto. Clara fez o mesmo, sentada no banco de trás. — Minha família é um pouco... Como vou explicar? Barulhenta...?Ri novamente. — Estou preparada — assegurei, apertando sua mão.Alex olhou para mim de soslaio e abriu um sorriso que aqueceu meu coração, me fazendo, a contragosto, suspirar.Sério, alguém me explica o que está acontecendo comigo?Como ele mesmo dissera no sábado (o
— Uau! — Eu exclamei, boquiaberta, ao ver o local especial que Alex me levara naquele domingo. Em minha cabeça, pensei que fosse um parque, lago ou algo do tipo. Nunca imaginei que Alex me levaria para um asilo para ser sincera.Não que a ideia me parecesse ruim, eu só não esperava mesmo. Ele fez suspense o caminho todo, deu até dicas falsas, mas quando estacionou de frente para a casa de repouso, abriu um sorriso para mim e disse: — Seja bem-vinda ao Recanto Feliz, Zoe. Quero que conheça um pouco mais do meu mundo. Eu não soube o que dizer, então sorri em resposta e nós descemos do carro. No trajeto, Alex segurou minha mão, e meu coração disparou de imediato. Ele é apaixonado pela Laura, Zoe. Pelo amor de Deus!, era o que eu repetia para mim mesma enquanto entrávamos na enorme casa azul bebê. Estávamos, nesse momento, no Hall, onde eu admirava os quadros pintados pelos moradores dali.Um, em especial, me chamou a atenção.Era a imagem de uma senhora, sentada num ba
— Faltam menos de vinte dias pro casamento da Anelise — Clara apontou, enquanto despachava um cliente —, vai mesmo levar o Alex? Manter a farsa e tudo mais? Soltei um longo e pesaroso suspiro. — Não tem outro jeito — falei, encostada no balcão. — Zoe — ela chamou, preocupada —, desde que fomos assaltadas aqui, você tomou trauma desse lugar. E agora me aparece em plena segunda-feira, antes das oito da manhã. O que tá pegando? — Não sei — respondi, sincera —, eu realmente não sei. — Então descubra. — E se eu não gostar da resposta? Clara me encarou por alguns segundos, em seguida, também suspirou. — Então você conta uma mentira pro seu coração, até ele acreditar que é verdade. Eu ri. — Amanhã é sua folga? — É — respondeu —, a gente pode combinar alguma coisa. Mas primeiro você tem que fazer minha sobrancelha. Você tem mãos de fada. — Vou começar a cobrar — brinquei. Quando olhei para minha amiga, percebi que seu semblante estava iluminado, como se
— E aí, Alex, Zoe me contou que você é apaixonado por uma garota. — Clara! — Eu a repreendi, cutucando-a. — Assim Alex vai pensar que sou fofoqueira. Ele riu, sem graça, ao meu lado. — Conta pra gente quem é, Ruan — ela pediu e eu senti vontade de esganá-la. — Ih, Clarinha, isso é segredo de estado — falou Ruan, com a cabeça deitada no colo da fuxiqueira da minha amiga. Estávamos sentados no chão da sala, tínhamos acabado de assistir Feel The Beat e agora comíamos comida japonesa que pedimos no Ifood. — Ela deve ser muito especial — eu comentei, enciumada. — Pena que ela é cega — falou Ruan e recebeu um olhar furioso do amigo. Fiquei sem entender nada. — Eu nunca me apaixonei de verdade — Clara disse, de repente. — Como você se sente, Alex? — Clara, hoje você está impossível — resmunguei, não queria ouvir resposta. — Bem, eu sinto vontade de estar com ela todos os dias se assim fosse possível. É possível, afinal ela é sua chefe!Pensei em falar,