Acordo com um leve movimento na cama, e imediatamente percebi que estava sozinho. A presença calorosa e reconfortante de Abby não estava ali, o que me deixou com uma sensação de vazio. Ainda meio sonolento, abri os olhos devagar e me deparei com a vista da varanda do quarto.
A luz do dia começava a se filtrar pelas cortinas, revelando um cenário tranquilo lá fora. O sol lançava seus raios suaves, pintando o céu com tons de laranja e rosa, e o ar parecia estar repleto de promessas de um novo dia.
Enquanto me sentava na cama, tomei um momento para sentir a brisa matinal tocando meu rosto, tentando absorver toda a serenidade que aquele instante oferecia. Mas, ao mesmo tempo, havia uma pequena inquietação dentro de mim, uma preocupação com a ausência de Abby.
Ao me virar para olhar melhor a varanda, não pude acreditar no que vi. Abby estava lá, abraçada a si mesma, tentando se aquecer do frio da manhã. Senti uma mistura de alívio e preocupação ao vê-la naquele estado. Por que ela não estava dentro do quarto?
Com passos rápidos, fui até ela e a envolvi com meus braços, trazendo-a para perto de mim. Podia sentir o leve tremor em seu corpo, resultado do frio que enfrentava sozinha. Sem dizer nada, a aconcheguei em meu peito, oferecendo meu calor para aquecê-la.
— Abby, por que você não estava no quarto? — pergunto suavemente, preocupado com a razão de ela ter saído sem me acordar.
Ela não respondeu imediatamente, e pude perceber que seus olhos estavam marejados. Eu sabia o quanto Abby tentava ser forte em todas as situações, mas ali, naquele momento, ela parecia vulnerável.
— Eu tive um pesadelo, Ares. Acordei assustada e senti vontade de vir para a varanda para tentar me acalmar — explicou, sua voz embargada pela emoção — Sonhei com uma das vezes em que perdi nossos bebês.
Sabia o quão angustiante podia ser reviver um daqueles momentos em um pesadelo, e me senti mal por não ter estado lá para confortá-la quando precisou. Suavemente, acariciei seu cabelo e beijei sua testa, tentando transmitir todo o meu carinho.
— Sinto muito por não ter acordado antes. Mas agora estou aqui com você — afirmo com convicção.
Permanecemos abraçados por alguns minutos, deixando que o calor um do outro dissipasse o frio da manhã e a angústia que o pesadelo havia trazido. Aos poucos, a tensão foi se dissipando, substituída por uma sensação de segurança e conforto.
Juntos, voltamos para o quarto, e dessa vez, eu me certifiquei de que Abby estivesse bem coberta para se aquecer. Deitamos lado a lado, nossos corpos ainda se tocando, como se quiséssemos estar o mais próximos possível um do outro.
Enquanto a luz do sol inundava o quarto, senti uma profunda gratidão por ter Abby em minha vida. Ela era minha parceira, minha confidente e alguém com quem eu podia compartilhar meus medos e inseguranças. Nossas histórias se entrelaçavam, e, naquele momento, eu sabia que estaríamos sempre conectados de uma forma única e especial.
As perdas que Abby sofreu, especialmente os abortos, eram uma fonte de profunda dor e angústia para ambos. Mesmo sabendo que não tinha controle sobre esses eventos e que não podia prever ou evitar cada situação, eu não conseguia evitar sentir uma carga de culpa pesando em meu coração. Ver alguém que amava tanto passar por tanto sofrimento era devastador.
Eu me questionava constantemente se poderia ter feito algo diferente, se deveria ter sido mais cuidadoso, se existia alguma medida que pudesse ter tomado para evitar essas perdas. Mas a verdade é que algumas coisas estão além do nosso controle, e lidar com a imprevisibilidade da vida era uma lição dolorosa que estávamos aprendendo juntos.
Meu amor por Abby me impulsionava a querer protegê-la de qualquer dor ou sofrimento, mas diante dessas circunstâncias, eu me sentia impotente e frustrado. Eu desejava poder aliviar o peso que ela carregava, mas, ao mesmo tempo, sabia que não podia apagar suas experiências passadas ou fazer com que tudo ficasse bem de um momento para o outro.
Nesses momentos difíceis, tentava ser o melhor apoio possível para Abby. Estava sempre presente, ouvindo suas preocupações e medos, segurando sua mão durante os momentos de tristeza e a encorajando a nunca desistir.
— Eu faria qualquer coisa para melhorar essa situação — digo num sussurro, acariciando levemente sua cabeça.
Ela me olha por alguns segundos, erguendo as sobrancelhas por fim.
— Ares... — diz no mesmo tom — Faria qualquer coisa?
— Eu só quero ver você... sorrindo de novo, Abby — Era o que mais desejava nos últimos anos.
Ela se senta devagar, os olhos vagando pela cama.
— Estive pensando e... há uma coisa, Ares — diz hesitante —
Acho que tem uma coisa que podemos fazer. Não era o que eu queria, mas, estamos sem opção, não é? — Ela sorri levemente. Sento ao seu lado, segurando sua mão — Congelei alguns óvulos, poucos, por insistência da minha ginecologista e agora entendo que ela estava prevendo o futuro — Ela faz uma breve pausa — Nós podemos fecundá-los e usar em uma barriga de aluguel.
É difícil expressar o quão profundamente isso me afeta. Desde o início do nosso relacionamento, Abby e eu compartilhávamos o sonho de construir uma família juntos. Planejávamos esperar o momento certo, quando estivéssemos mais estáveis em nossas carreiras, para então dar esse passo tão importante em nossas vidas. E assim aconteceu: alcançamos sucesso profissional, conquistamos nossos objetivos, mas o tempo passou mais rápido do que imaginávamos.
Enquanto nos concentrávamos em nossas carreiras, o relógio biológico não esperou. A vida sempre nos prega surpresas, e às vezes são surpresas difíceis de lidar. Infelizmente, o tempo que planejávamos investir na construção de nossa família passou rapidamente, e percebemos que agora as coisas não seriam tão simples como antes.
A notícia de que talvez não pudéssemos ter filhos, por causa da condição de Abby, nos atingiu como uma avalanche emocional. Havia um misto de tristeza, frustração e até mesmo uma sensação de injustiça. Mas, apesar de todas essas circunstâncias, ainda continuávamos ali, esperançosos.
— É isso que quer? — pergunto com a voz firme.
— É — diz sem ao menos pensar, me olhando atentamente. Via em seus olhos que esperava uma resposta positiva para mim — Eu sei que é algo que nunca discutimos, tanto por que queria que eu... — Pressiono minha boca contra a dela de repente, gentilmente. Encostando minha testa na dela.
— Vamos fazer isso, está bem? Se é o que quer, faremos. Não importa o que eu quero, o que importa aqui é apenas o que quer.
Ela se afasta abruptamente, franzindo o cenho.
— Não está fazendo isso, só porque...?
— Não! — Minha voz soa firme e séria — Sempre quisemos uma família, só nossa. Lembra? E faço qualquer coisa para isso acontecer, já chega de protelar.
Abby solta o ar dos pulmões, sorrindo sem mostrar os dentes, acomodando seu corpo ao meu, permitindo que passasse meus braços ao seu redor e a abraçasse.
Com um empurrão, a porta de vidro range enquanto se abre, e o sino toca suavemente acima da minha cabeça, anunciando minha entrada. Adentrei a recepção, sentindo o ar abafado e percebendo que o local estava precisando de uma boa limpeza.A luz fraca filtrada pelas cortinas meio fechadas deixava a recepção com um ar sombrio e desgastado. O chão de azulejos parecia ter visto dias melhores, coberto por uma fina camada de poeira. O balcão de atendimento estava manchado e com algumas marcas de uso, mostrando que não recebia uma atenção adequada há algum tempo.Um balcão de madeira, também empoeirado, ocupava o centro da sala, repleta de papéis amontoados e documentos desorganizados. Algumas poltronas estofadas, já desgastadas pelo uso e pelo tempo, se alinhavam contra a parede, convidando os clientes a sentarem enquanto aguardavam atendimento.Atrás do balcão, havia um pequeno computador com uma tela envelhecida e uma impressora que parecia ser da época em que a recepção ainda estava em me
O telefone em cima da minha mesa toca e o atendo quase no mesmo instante.— Diana Singer está aqui, Sr. Luchese — Ouço a voz firme da secretária do outro lado da linha.— Pode mandar ela entrar — Coloco o telefone de volta no gancho. Ao chegar na empresa naquela manhã, senti o peso da responsabilidade sobre meus ombros. Prometer a Abby que resolveria os trâmites da barriga de aluguel era algo que deveria levar muito a sério, pois sabia o quão significativo era para nós construirmos nossa família. A ansiedade e a determinação caminhavam lado a lado enquanto me preparava para enfrentar o desafio burocrático que tinha pela frente.Iniciei o processo logo de manhã, buscando informações e contatos necessários para dar andamento à questão. Sabia que não seria uma tarefa fácil, mas estava disposto a fazer tudo o que estivesse ao meu alcance para tornar esse sonho realidade.Após algumas ligações e trocas de informações, finalmente consegui o número da pessoa certa, aquela que
Com o som ensurdecedor do aspirador de pó zumbindo em meus ouvidos, estava concentrada em concluir logo o meu trabalho. Mesmo tendo chegado algumas horas atrasada, eu estava determinada a compensar o tempo perdido e fazer um ótimo trabalho.Caminhava de um lado para o outro, movendo o aspirador com agilidade para garantir que cada canto do ambiente ficasse limpo e impecável. O barulho me incomodava, mas eu mantinha o foco na tarefa, sabendo que a eficiência era essencial para que eu pudesse terminar o mais rápido possível.Enquanto aspirava o carpete, observava o acúmulo de poeira e sujeira sendo sugado pela máquina. Cada passo que dava era uma pequena vitória, uma conquista rumo à conclusão da limpeza. Eu sabia que não podia relaxar até que tudo estivesse perfeitamente limpo e organizado.O tempo parecia voar enquanto trabalhava, e o som do aspirador de pó já se tornara uma espécie de fundo constante, quase hipnotizante. Mas eu não deixava que isso me distraísse. Cada segundo contav
Enquanto me aproximava de Abby, a observei pelo espelho do banheiro. O robe cintilante na cor gelo envolvia seu corpo de forma elegante e delicada, refletindo a pouca luz do ambiente. O brilho suave do tecido quase a fazia parecer etérea, como se estivesse envolta em um aura luminosa.Ela parecia perdida em seus próprios pensamentos, os olhos fixos no reflexo que o espelho lhe mostrava. Seus lábios se curvavam em um leve sorriso, talvez por se pegar distraída em algum pensamento agradável.Meu coração se encheu de amor ao vê-la ali, tão bela e serena. Sua pele translúcida, iluminada pelo brilho do robe, era como uma obra de arte. Tive vontade de abraçá-la e dizer o quanto a amava, o quanto ela era especial para mim, mas ao mesmo tempo, não queria interromper sua introspecção.Com passos lentos e suaves, me aproximei ainda mais, sem fazer barulho para não perturbar sua tranquilidade. Parei atrás dela, apreciando a imagem que o espelho refletia, um momento íntimo e único entre nós dois
— Diana! — diz Noah assim que passo pela porta do quarto do motel. Ao ver Noah correr em minha direção, um sorriso se formou em meus lábios. Ele me abraçou pela cintura com entusiasmo, e eu retribuí o gesto, sentindo uma onda de alívio e alegria por vê-lo bem e feliz. O quarto bagunçado e as embalagens vazias de alimentos indicavam que ele havia tido um dia normal e comum, como qualquer outra criança.— Ei, meu campeão! Como foi o seu dia? — perguntei, acariciando seus cabelos com carinho.Ele sorriu e disse empolgado:— Foi muito legal! Eu assisti a desenhos na TV, brinquei com os brinquedos que trouxemos e comi um montão dessas coisas gostosas!Aponta para as embalagens de comida espalhadas pelo quarto, e eu ri suavemente. Era bom saber que, apesar de todas as nossas dificuldades, Noah ainda podia se divertir e aproveitar as coisas simples da vida.— Fico feliz que você tenha se divertido, querido. — respondi, abraçando— o mais uma vez. — Mas agora é hora de arrum
Naquela manhã, minha mente estava mergulhada nos pensamentos sobre a nossa barriga de aluguel, e a perspectiva de ter que participar de uma reunião não era nada animadora. Cada minuto gasto naquela sala de conferências parecia uma eternidade, e eu mal conseguia me concentrar nas discussões que ocorriam ao meu redor.Enquanto os outros falavam, minha mente vagueava para nossos planos e sonhos, para a expectativa de formarmos nossa família e finalmente realizarmos o desejo de sermos pais. Cada detalhe sobre a barriga de aluguel era como uma película que se desenrolava em minha mente, e eu me pegava pensando nas etapas que viriam pela frente. Estar em uma reunião quando o coração e a mente estão ocupados com pensamentos tão significativos pode ser desafiador. Eu queria estar ao lado de Abby e talvez até mesmo pesquisando mais sobre o processo de barriga de aluguel juntos.Os minutos se arrastavam, e tentava me manter presente e focado nas discussões, mas era uma tarefa árdua. Por dentr
Com o corpo ainda levemente trêmulo, sabia que o nervosismo persistia após a consulta na clínica de fertilização. A lembrança da sala branca e gélida, dos profissionais ao meu redor e das informações compartilhadas durante a consulta ecoavam em minha mente.— Você só precisa seguir essas recomendações e logo estará nova em folha — diz a atendente, me entregando um papel com tudo que deveria ser feito e o que não deveria ser feito.— Obrigada — digo baixo, que já sabendo que ficar no mood descanso não seria possível. Tinha que trabalhar.Eu me sentei em um banco próximo à clínica, respirando fundo e tentando acalmar os pensamentos que me invadiam. A decisão de vender meus óvulos, não deveria ser significativa e nem envolver inúmeras emoções.Enquanto seguia para o trabalho, ainda não conseguia me livrar do que havia acabado de acontecer, mas a necessidade havia falado mais alto e cumprir minhas responsabilidades era mais forte.Na empresa, troco minha roupa por um un
— Ares — diz Abby séria — Você pode ir. Eu estou bem! Após a alta do hospital, embora Abby estivesse feliz pela notícia da inseminação, minha preocupação com ela permanecia presente. Ver sua alegria não era suficiente para aliviar completamente a preocupação que sentia em relação à sua saúde. Ao voltarmos para casa, me mantive atento a qualquer sinal. Preparava sua comida preferida, garantia que ela descansasse o suficiente e a lembrava de tomar os medicamentos prescritos pelos médicos. Abby sabia da minha preocupação e apreciava o cuidado, mas também me lembrava que estava se sentindo melhor e que os médicos a tinham liberado para voltar às atividades normais.No entanto, a sensação de responsabilidade estava sempre presente. Eu não queria que ela tivesse uma recaída ou enfrentasse qualquer desconforto durante esse o tão importante de nossas vidas. Naquele dia, mesmo com uma parte de mim desejando ficar em casa para acompanhar e cuidar de Abby, percebi que e