Um Presente para Dois
Um Presente para Dois
Por: A. C. Barroso
Capítulo 1

DIANA

Já era noite quando finalmente cheguei em casa. Encontrei a babá sentada no tapete da sala brincando com Helena. Deixei a bolsa sobre a mesa de jantar e, mesmo cansada, fui me juntar a bagunça. Assim que me viu, minha pequena veio engatinhando e esticou os bracinhos para que eu a pegasse no colo.

— Mãmãmã!

Abracei-a forte e mordisquei uma de suas bochechas gordas, segurei-a no alto e fiz cócegas em sua barriguinha, o que a levou a dar gargalhadas. Não há nada mais gostoso de ouvir do que a risada de uma criança.

Paguei e agradeci Joana por ter ficado um pouco além do horário que tínhamos combinado, mas era culpa do trânsito infernal de sexta-feira a noite.

— Como a senhora avisou que atrasaria, eu já dei a janta.

— Obrigada, Joana!

— Se precisar dos meus serviços, a senhora sabe que é só ligar que eu venho correndo ficar com essa bonequinha. — Ela mexeu com Helena e minha filha abriu um sorriso de orelha a orelha.

Assim que ficamos sozinhas, me sentei no tapete para continuar a bagunça com ela. Alguns minutos depois, Helena começou a ficar enjoadinha e me olhava com cara de quem tinha enchido as fraldas.

Levei-a para o quarto e quando fui trocar as fraldas, vi que a situação estava tão crítica que não tinha outro jeito a não ser dar um banho nela.

A água quentinha sempre foi um ótimo calmante para a minha pequena diabinha da Tasmânia, tanto que quando terminei de vesti-la com o pijama comprido de ursinhos, ela já lutava contra o sono.

— Acho que tem alguém com soninho — falei enquanto a observava esfregar os olhinhos com as mãozinhas gorduchas.

Deixei o quarto iluminado apenas pela baixa claridade vinda do pequeno abajur em cima da cômoda. Dei a chupeta e Helena logo se aninhou em meu colo, então comecei a cantarolar uma canção de ninar.

Esses momentos entre mãe e filha eram os meus preferidos, porque era uma forma de fortalecer nossos laços. Eu me sentia completa quando estava com minha filha em meus braços.

Depois que Helena finalmente foi vencida pelo sono, coloquei-a com cuidado no bercinho para que não acordasse. Eu poderia ficar ali, contemplando minha filha pelo resto da vida, mas decidi ir para o meu quarto, a fim de tomar um banho e descansar um pouco.

Antes que eu conseguisse entrar debaixo do chuveiro, meu celular começou a tocar na sala e saí enrolada na toalha, para desligar antes que acordasse Helena.

Mal pude acreditar no nome que eu vi piscando na tela. Era minha mãe. O que ela poderia querer comigo? Coisa boa eu sabia que não era. Para outras pessoas pode ser normal receber ligação dos pais, mas para mim, não.

Pensei duas vezes antes de atender a chamada. Não importava qual seria a desculpa ou o motivo para a ligação, ela sempre arrumava um jeito de jogar na minha cara que eu tinha feito a maior burrada da minha vida e que homem nenhum iria me querer por conta da minha filha.

— Alô?

— Oi, Diana!

— Oi, mãe! O que você quer?

— Você está em casa?

— Eu estava entrando no banho... Se puder ir direto ao ponto.

— Tudo bem! Eu só liguei para avisar que a nossa família será homenageada num evento muito chique promovido pela prefeitura aqui da nossa cidade e como você é nossa única filha, pensei que...

— Vocês querem que eu vá ao evento... Já entendi.

— Sim, mas temos uma condição para a sua vinda.

Eu sabia que não seria um simples convite, tinha que ter alguma condição rídicula por trás. Não esperava nada menos, ainda mais vindo da minha mãe e por ela me considerar a errada da família.

— E que condição seria essa? — perguntei já revirando os olhos.

— Nós sempre dizemos aos nossos amigos que você se casou e... Por isso você não pode aparecer sozinha por aqui sozinha e com essa criança a tiracolo.

— Essa criança é minha filha e sua neta.

— E para piorar, você não sabe nem quem é o pai.

— Não vou discutir esse assunto com você de novo e...

— O que você acha que as pessoas vão falar se te verem com uma criança e sem um pai do lado?

— Não me importa o que os outros vão falar ou achar.

— Você não entendeu, querida.

— Eu entendi perfeitamente! Você quer que eu compactue com a mentira que você criou e contou para a cidade toda só para manter a aparência da família perfeita.

— Diana! Me respeite porque sou sua mãe!

— Eu te respeitaria se não estivesse mentindo sobre a minha filha.

— Tente arrumar um rapaz para lhe acompanhar... Faça isso pelo seu pai.

— Se essa é a sua condição para que eu vá, então eu recuso o convite.

— Por favor, não faça isso! Seu pai vai ficar arrasado... Será um evento para mais de trezentas pessoas e seria uma vergonha se a nossa única filha não estivesse presente.

— Talvez vocês devessem mentir de novo e dizer que morri.

— Por favor, Diana! Não diga uma coisa horrível dessas.

— Por que não? Vocês vivem como se não tivessem uma filha mesmo.

— Isso é um absurdo!

— Absurdo são vocês me renegarem só porque eu decidi ter uma filha através de inseminação.

— Pensa com carinho sobre a festa. — Ela tentou mudar de assunto.

— Eu não vou a lugares onde eu e minha filha não somos bem-vindas.

Encerrei a ligação tão rápido para não ter que ouvir minha mãe dizer mais nenhuma asneira. Eu já estava de saco cheio de ouvir esses absurdos.

Como posso ser filha de pessoas tão antiquadas que preferem mentir do que apoiar a própria filha?

Minha mãe nunca sequer me ligou para perguntar se eu precisava de alguma ajuda quando estava grávida e nem quando tive minha filha sozinha. Nunca quis saber se Helena estava bem, mas para pedir um absurdo daqueles, ela tinha coragem.

Bufei e joguei o celular sobre o sofá. Voltando para o meu quarto, dei uma olhada em Helena para me certificar de que meu anjinho ainda continuava dormindo.

Prendi o cabelo num coque no alto da cabeça e entrei no box para finalmente deixar que a água quente levasse embora todo o meu cansaço e a minha raiva.

Nunca passou pela minha cabeça, nem nos meus piores pesadelos, que um dia eu estaria numa situação como essa. Era inacreditável que minha própria mãe estivesse exigindo que eu arrumasse um "marido" para que eu parecesse a filha perfeita numa festa da cidade. A mesma cidade que fiz de tudo para sair e jurei nunca mais pisar de novo.

Leia este capítulo gratuitamente no aplicativo >
capítulo anteriorpróximo capítulo

Capítulos relacionados

Último capítulo