Eu tinha vinte anos e estava lutando para me manter na faculdade de medicina. Cada mês era uma batalha para pagar a mensalidade e manter um teto sobre minha cabeça. Eu sempre soube que seria difícil, mas não imaginava que a pressão seria tão esmagadora.
Foi então que Jonas, meu amigo da faculdade, mencionou uma forma de ganhar dinheiro rápido. “Alice, você já pensou em doar seus óvulos? Tem um estudo que paga muito bem por isso. Pode ser a solução que você está procurando”, ele sugeriu casualmente enquanto estudávamos na biblioteca.
Eu não conseguia tirar a ideia da cabeça. A cada dia que passava, as contas se acumulavam e eu precisava de uma solução. A decisão não foi fácil, mas finalmente marquei uma consulta na clínica de fertilidade. O dinheiro que receberia pela doação me permitiria pagar as contas atrasadas e garantir alguns meses de tranquilidade financeira.
Na manhã da consulta, sentei-me na sala de espera da clínica, segurando uma prancheta com o formulário de doação. Minhas mãos tremiam levemente enquanto preenchia meus dados. Nome: Alice Bianchi. Idade: 20 anos. Cabelos: ruivos. Olhos: castanhos. Motivo da doação: necessidade financeira desesperada. Mas eu não podia escrever isso.
A sala era impecável, com paredes brancas e cadeiras confortáveis. O silêncio era interrompido apenas pelo som ocasional de passos e o murmúrio baixo das recepcionistas. Enquanto escrevia, não pude deixar de refletir sobre como cheguei até ali. Meus pais sempre disseram que eu precisaria lutar por tudo na vida, e agora, aqui estava eu, vendendo uma parte de mim para sobreviver.
De repente, o silêncio foi rompido por risadas altas e vozes barulhentas. Três jovens entraram na sala de espera, conversando animadamente sobre algo que parecia muito engraçado para eles. Eu tentei me concentrar no formulário, mas era impossível ignorá-los.
— Cara, não acredito que você realmente vai fazer isso! — disse um dos rapazes, rindo.
— É uma aposta, não posso voltar atrás agora — respondeu outro, com um tom desafiador.
Levantei os olhos e vi os três se acomodarem nas cadeiras ao lado, ainda rindo e falando alto. Um deles, um jovem de cabelos escuros e olhos azuis penetrantes, parecia liderar o grupo. Ele se virou e nossos olhares se encontraram por um breve momento. Senti meu rosto esquentar e voltei a olhar para o formulário, tentando ignorar a presença deles.
Mas a conversa continuava, e eu não consegui mais me segurar.
— Vocês poderiam, por favor, fazer menos barulho? Este é um lugar de silêncio — falei, minha voz carregada de irritação.
O líder do grupo, o rapaz de olhos penetrantes, se virou para mim com um sorriso malicioso.
— Desculpe, senhorita. Não queríamos incomodar — disse ele, com uma voz que pingava sarcasmo. — Mas, já que estamos aqui, qual é o seu nome? Talvez possamos tornar esta espera um pouco mais interessante.
Senti meu rosto corar.
— Isso não é da sua conta. Só quero que respeitem o ambiente — retruquei, tentando manter a calma.
Ele se levantou e caminhou até minha cadeira, sentando-se ao meu lado e inclinando-se um pouco mais perto do que o necessário.
— Não precisa ser tão séria. Sabe, uma garota bonita como você não deveria estar sozinha em um lugar como este — disse ele, com um sorriso que certamente fazia outras meninas suspirarem. — Eu sou Bernardo, a propósito. E você é...?
— Alice — respondi, sem pensar. Imediatamente me arrependi de ter dado meu nome.
— Alice. Bonito nome. Então, o que uma garota como você está fazendo em um lugar como este? — perguntou, ignorando completamente minha expressão de desconforto.
— Isso não é da sua conta — repeti, desta vez com mais firmeza. Tentei me concentrar novamente no formulário, mas Bernardo não parecia disposto a me deixar em paz.
— Ah, qual é, Alice? Não precisa ser tão tímida. Estamos todos aqui um tanto entediados por essa espera, não é? — disse ele, lançando um olhar significativo para os amigos, que riram em resposta.
— Estou aqui para doar meus óvulos. Preciso do dinheiro para continuar meus estudos — disse, esperando que a honestidade o fizesse recuar.
Mas Bernardo apenas ergueu uma sobrancelha.
— Ah, então você é uma dessas garotas inteligentes. Admiro isso — ele disse, ainda com aquele sorriso irritante. — Eu estou aqui por uma aposta idiota que fiz com meus amigos. Nunca pensei que realmente faria isso, mas aqui estou. Talvez você possa me dar uma mãozinha. O que acha?
Eu o olhei, incrédula. Ele estava mesmo dando uma cantada baixa daquelas?
— Não estou interessada em suas apostas idiotas ou em qualquer coisa que você tenha a oferecer. Só quero preencher meu formulário em paz.
Ele inclinou-se para trás, levantando as mãos em um gesto de rendição.
— Tudo bem, Alice. Só estou tentando ser amigável. Boa sorte com seus estudos — disse ele, voltando para os amigos, que ainda riam da situação. — Você já ajudou de qualquer forma, não vai sair da minha cabeça.
— Babaca!
Eu voltei ao formulário, tentando ignorar o desconforto que Bernardo havia provocado. Ele era exatamente o tipo de pessoa que eu não queria perto de mim: arrogante, convencido e incapaz de levar as coisas a sério. No entanto, algo em seus olhos me dizia que havia mais ali do que ele deixava transparecer.
Minutos depois, uma enfermeira chamou meu nome. Levantei-me, ainda sentindo o olhar de Bernardo em mim. Caminhei até a sala de consulta, determinada a seguir com a doação e conseguir o dinheiro que tanto precisava.
A enfermeira me conduziu até uma sala pequena e acolhedora, onde me pediu para me sentar e esperar pelo médico. Olhei ao redor, tentando acalmar minha mente. A ideia de doar meus óvulos me enchia de incerteza, mas eu sabia que precisava fazer isso. Eram só estudos, não era como se fossem gerar filhos meus por aí.
Enquanto esperava, pensei em minha família e em todo o esforço que havia feito para chegar até ali. Sabia que, de alguma forma, tudo isso valeria a pena. E, mesmo que aquele encontro com Bernardo tivesse sido desconcertante, eu estava determinada a seguir em frente e lutar pelo meu futuro.
Mal sabia eu que aquela escolha, feita em um momento de necessidade, acabaria mudando minha vida de maneiras que eu nunca poderia prever. E que Bernardo, com seu sorriso arrogante e suas apostas idiotas, se tornaria uma parte inescapável dessa nova jornada.
A noite estava quente e agradável, perfeita para relaxar após um dia exaustivo na residência. Saímos do hospital em grupo: eu, Jonas, minha colega de residência Clarice, e dois outros colegas, Ricardo e Paulo. Estávamos rindo e conversando, aliviados por termos sobrevivido a mais um dia caótico.— Acho que merecemos um brinde — disse Clarice, levantando sua garrafa de cerveja. — À nossa sanidade!— À nossa sanidade! — repetimos em coro, rindo.Eu estava cansada, mas a companhia dos meus amigos fazia todo o esforço valer a pena. Jonas, meu namorado, estava ao meu lado, seu braço envolvendo meus ombros. Ele era extremamente inteligente e ambicioso, mas seu ciúme constante era algo que eu preferia ignorar. Nos conhecemos na faculdade, e depois de alguns anos como amigos, acabamos evoluindo a relação.— Preciso ir para casa — disse, sentindo o cansaço se apoderar de mim. — Amanhã será outro dia difícil.Jonas me olhou com preocupação.— Eu te levo. Não quero que vá sozinha a essa hora.—
Acordei com a determinação de enfrentar Bernardo Orsini e descobrir a verdade sobre Ian. Após uma noite mal dormida, meus pensamentos estavam a mil, mas a necessidade de respostas era mais forte do que o cansaço. Pedi que minha irmã cuidasse do bebê, mesmo sem dar muitas explicações, e sai de casa bem cedinho. Eu sabia que seria difícil conseguir falar com um bilionário famoso e CEO de uma das maiores empresas de tecnologia do país, mas não tinha escolha.Cheguei ao imponente prédio da Orsini Tech, uma estrutura de vidro e aço que se erguia majestosa no centro da cidade. Do lado de fora, o movimento era constante, com pessoas entrando e saindo, todas com expressões sérias e focadas. Respirei fundo e entrei, meu coração batendo acelerado.O saguão era impressionante, com paredes de vidro que permitiam a entrada de luz natural, plantas exuberantes e uma fonte moderna no centro. A recepção era minimalista, com balcões de atendimento futuristas e robôs bonitos e ágeis circulando, entregan
Acordei com o som suave de risadas e gorgolejos vindo do berço improvisado ao lado da minha cama. Ian, o pequeno enigma que havia virado minha vida de cabeça para baixo, estava acordado e pronto para enfrentar o dia. Sentei-me na cama, sentindo o cansaço das últimas noites mal dormidas, mas também uma onda de carinho ao ver seu rosto sorridente.— Bom dia, pequeno — murmurei, pegando-o nos braços. Seus olhinhos curiosos me observaram enquanto eu o balançava levemente.Jonas ainda estava dormindo no sofá da sala, exausto depois de tanto reclamar que Ian não parava de chorar e que não conseguia ficar no quarto com a gente. Tivemos uma breve briga na qual o mandei para casa, mas o sofá acabou sendo um bom meio termo. Levantei-me com cuidado para não o acordar e levei Ian para a cozinha. Precisávamos de um café da manhã reforçado.Coloquei Ian no cercadinho que havia improvisado com almofadas no chão e comecei a preparar algo para nós. Ian me observava com seus olhos grandes, balbuciando
Respirei fundo antes de entrar no suntuoso Hotel Milani. Nunca me senti tão deslocada na minha vida. Cada detalhe, desde o lustre de cristal até os funcionários impecavelmente vestidos, exalava uma elegância que parecia um mundo à parte do meu. Os lustres pendiam do teto como cascatas de diamantes, refletindo a luz de maneira encantadora. Sentindo o peso do olhar curioso de alguns hóspedes, empurrei o carrinho de Ian, tentando ignorar o desconforto que crescia dentro de mim.Cada passo que eu dava parecia ecoar nos corredores decorados com mármore polido e tapetes exuberantes. A grandiosidade do lugar me fazia sentir ainda mais fora de contexto. Os olhares dos funcionários impecavelmente vestidos eram educados, mas inevitavelmente curiosos, como se não conseguissem entender o que uma pessoa como eu fazia ali. Ou talvez fosse só impressão. Dirigi-me à recepção, onde uma recepcionista sorriu de maneira educada.— Boa tarde. Tenho uma reunião marcada com o senhor Bernardo Orsini.Ela ass
O hospital escolhido por Bernardo era um dos mais renomados da cidade. Ao entrar, fiquei impressionada com a modernidade e a eficiência do lugar. Era claro que ele não tinha medido esforços para garantir que o exame de DNA fosse realizado nas melhores condições possíveis. As paredes de mármore brilhavam com um luxo que parecia inatingível, e tudo ao redor exalava uma atmosfera de perfeição clínica. Eu teria preferido ter feito o exame no hospital onde trabalhava, mas também não queria dar motivos para Bernardo desconfiar que eu poderia manipular o resultado de alguma forma, devido aos meus contatos.Jonas tinha se oferecido para me acompanhar, mas antes eu não tivesse aceitado. Ele estava visivelmente tenso e agitado, seus passos rápidos e gestos nervosos revelando sua irritação. Podia sentir o calor de seu desconforto irradiar.— Eu ainda não acredito que você está levando isso a sério, Alice — disse, tentando manter a voz baixa, mas o tom de desdém era inconfundível. — Já deveríamos
Normalmente os dias no hospital eram bem intensos, mas hoje estava particularmente agitado. Aparentemente tinha acontecido um acidente de trânsito grave perto dali, o que resultou em corredores repletos de pacientes, médicos e enfermeiras se movendo de um lado para o outro. Eu mal tive tempo de respirar entre um atendimento e outro. Cada segundo contava, e a pressão era constante. Estava no meio de uma avaliação de um paciente quando o alarme do pronto-socorro soou, indicando mais um caso urgente.— Alice, precisamos de você na sala de emergência! — gritou uma das enfermeiras.Corri até lá, colocando minha máscara e luvas rapidamente. Uma mulher idosa estava tendo uma crise respiratória grave. A equipe já estava a postos, esperando por mim. Trabalhamos juntos para estabilizá-la, administrando medicamentos e monitorando seus sinais vitais. Após um período tenso, finalmente conseguimos estabilizá-la.— Bom trabalho, pessoal — disse, sentindo o alívio misturado ao cansaço. — Vamos mantê-
Fiquei parada por alguns segundos, tentando processar as palavras de Bernardo. "Alice, vou providenciar para que você e Ian se mudem para o meu apartamento. E também vamos nos casar." Aquelas palavras ecoavam na minha mente, cada sílaba parecendo mais absurda que a anterior. Quando finalmente consegui me mover, vi Bernardo se afastando pelo corredor, suas costas retas e postura confiante.— Belas costas... — murmurei enquanto mordia o lábio inferior, me perdendo por um segundo. — Merda, foco Alice!O corredor parecia se estender infinitamente enquanto eu corria atrás dele, meu coração martelando no peito. As paredes brancas do hospital, os rostos desconhecidos e a iluminação fria criavam um ambiente surreal, quase opressivo. Cada passo que dava em direção a Bernardo parecia me afastar mais da realidade que conhecia.— Bernardo! — chamei, minha voz tremendo levemente. Quando ele finalmente parou e se virou para me olhar, sua expressão impassível e os olhos brilhando com determinação me
Sorri para Liz através da parede de vidro que nos separava, enquanto eu observada a sala calma, cheia de berços. Alguns deles com crianças tranquilas que pareciam aproveitar o momento para dormir. Eu tinha a sorte de minha irmã mais velha trabalhar como cuidadora em uma creche, assim ela havia conseguido uma vaga para Ian, sem problemas, e eu ainda tinha a segurança de ter a pessoa mais responsável do mundo cuidado dele enquanto eu estava trabalhando.Ela fez um sinal para que eu esperasse por um momento e trocou algumas palavras breves com uma das outras cuidadoras, saindo discretamente da sala logo em seguida. Seguimos juntas até a cozinha onde ela preparou duas canecas de café fumegante.— Então, Alice — começou Liz, servindo-nos com alguns biscoitos. — Quero ouvir essa história direito. Como assim você vai passar o fim de semana com o tal Bernardo?Suspirei, mexendo no café com a colher.— É uma longa história, Liz. Tudo começou quando recebi aquela cesta com Ian...Liz assentiu,