Respirei fundo antes de entrar no suntuoso Hotel Milani. Nunca me senti tão deslocada na minha vida. Cada detalhe, desde o lustre de cristal até os funcionários impecavelmente vestidos, exalava uma elegância que parecia um mundo à parte do meu. Os lustres pendiam do teto como cascatas de diamantes, refletindo a luz de maneira encantadora. Sentindo o peso do olhar curioso de alguns hóspedes, empurrei o carrinho de Ian, tentando ignorar o desconforto que crescia dentro de mim.
Cada passo que eu dava parecia ecoar nos corredores decorados com mármore polido e tapetes exuberantes. A grandiosidade do lugar me fazia sentir ainda mais fora de contexto. Os olhares dos funcionários impecavelmente vestidos eram educados, mas inevitavelmente curiosos, como se não conseguissem entender o que uma pessoa como eu fazia ali. Ou talvez fosse só impressão. Dirigi-me à recepção, onde uma recepcionista sorriu de maneira educada.
— Boa tarde. Tenho uma reunião marcada com o senhor Bernardo Orsini.
Ela assentiu e verificou rapidamente em seu sistema.
— Claro, senhorita Bianchi. O senhor Orsini está aguardando no quarto 501. O elevador está à sua esquerda.
Agradeci, tentando manter a voz firme, e segui em direção ao elevador. O chão de mármore brilhava impecável sob os meus pés, e as paredes eram decoradas com obras de arte que eu jamais conseguiria decifrar. O cheiro de flores frescas invadia meus sentidos, aumentando a minha sensação de inadequação. Quando as portas se fecharam, uma sensação de náusea me invadiu. Será que isso era mesmo uma boa ideia? E se Jonas estivesse certo e eu fosse acusada de querer tirar proveito da situação?
Finalmente, as portas se abriram no quinto andar e eu saí, empurrando o carrinho de Ian pelo luxuoso corredor até o quarto 501. O corredor era decorado com obras de arte e tapetes que pareciam tão caros quanto confortáveis. Cada passo ecoava levemente, ressaltando o silêncio quase reverente do lugar. Parei em frente à porta, respirei fundo mais uma vez e bati suavemente. A porta se abriu quase que imediatamente, revelando Bernardo com uma expressão que oscilava entre a expectativa e a dúvida.
— Alice, entre — disse ele, dando um passo para trás para nos deixar passar.
Empurrei o carrinho de Ian para dentro, sentindo meu coração acelerar. O quarto era tão elegante quanto o resto do hotel, decorado com móveis de alta qualidade e uma vista deslumbrante do mar através de janelas do chão ao teto. Havia uma leve fragrância adocicada, e o som suave da música clássica tocava ao fundo. O ambiente era acolhedor, mas intimidante ao mesmo tempo, com seu luxo opulento. Bernardo estava ali, vestido casualmente, mas ainda assim exalando aquela aura de poder que o acompanhava.
Ele olhou para Ian e parou, como se o tempo tivesse congelado. Ian, deitado no carrinho, olhou curiosamente para Bernardo também, seus grandes olhos brilhando com inocência. Bernardo se ajoelhou lentamente, aproximando-se do carrinho.
— Ele... ele tem meus olhos — murmurou, visivelmente abalado. Seus olhos azuis estavam fixos nos de Ian, que refletiam a mesma cor intensa.
Senti um nó se formar na minha garganta.
— Eu sei. É difícil negar, não é?
Bernardo ficou ali, em silêncio, observando cada detalhe do pequeno rosto de Ian. Seus olhos se encheram de uma emoção que ele parecia estar lutando para controlar. Vi a mão dele tremendo levemente quando ele a estendeu para tocar a mãozinha de Ian. Os dedos de Bernardo roçaram levemente a mãozinha de Ian, como se temesse que o toque pudesse quebrar aquele momento frágil e precioso. Finalmente, ele se levantou e olhou para mim.
— Precisamos fazer um exame de DNA — disse ele, com a voz firme, mas com um leve tremor que traía sua insegurança. — Precisamos ter certeza.
Assenti, tentando manter a calma.
— Concordo. E se der positivo, precisamos formalizar a certidão de nascimento de Ian.
Bernardo franziu o cenho, a defensiva imediatamente tomando conta de sua expressão, enquanto refletia brevemente sobre minhas palavras.
— Isso é muito conveniente para você, não acha? Formalizar a certidão de nascimento... você conseguiria uma pensão enorme.
A acusação me atingiu como um soco no estômago. Minha visão ficou turva e o pânico começou a tomar conta.
— Você acha que eu tenho algo a ver com isso? — Minha voz saiu tremida, quase inaudível.
— Você é médica — diz, quase como se me acusando daquilo. — Pesquisei sobre você. E você também teria como pesquisar sobre mim facilmente. Você sabia o que eu fiz seis anos atrás. Seria fácil...
— CALA A BOCA! — Grito. — Tudo o que eu menos queria no momento era ser mãe! Isso está atrapalhando minha carreira! Já faltei dois dias seguidos, e isso vai pesar na mudança de cargo que estou esperando! — Minhas mãos tremiam descontroladamente e comecei a hiperventilar. As lágrimas escorriam pelo meu rosto enquanto minha voz ficava cada vez mais desesperada. — Eu não estou fazendo isso por dinheiro! Eu só... eu só quero entender o que está acontecendo! E enquanto isso você quer que eu faça o quê? Entregue essa criança para o conselho tutelar? Quer que ele vá parar em um orfanato? Em um lugar pior?
Bernardo ficou atordoado por um momento, claramente surpreso com minha reação. Ele se aproximou, hesitante, e colocou as mãos nos meus ombros.
— Alice, calma. Eu... eu sinto muito. Não queria insinuar que você está atrás do meu dinheiro.
— Não queria? Porque foi exatamente o que você fez!
Eu soluçava descontroladamente, incapaz de controlar minhas emoções. Até aquele momento eu ainda não tinha me dado conta do quanto estava assustada com toda aquela situação, mas eu estava.
Bernardo me puxou para um abraço, seus braços fortes me envolvendo de uma maneira surpreendentemente reconfortante. Lentamente, comecei a me acalmar, meus soluços diminuindo gradualmente. O calor do corpo dele era estranho e reconfortante ao mesmo tempo. Senti a textura do tecido da camisa dele contra meu rosto, e o cheiro leve de sua colônia era quase tranquilizante.
— Eu só... — continuei, minha voz um sussurro. — Eu só... Eu não sei o que fazer. Se essa criança... Se ele realmente for meu filho... Eu não sei o que fazer. Só quero o melhor para ele. Mas... Mas ao mesmo tempo, eu...
Bernardo me soltou, mas manteve as mãos nos meus ombros, olhando nos meus olhos com uma intensidade que me fez tremer.
— Vamos fazer o exame de DNA e, se ele for meu filho... nosso filho... vamos resolver isso da melhor maneira possível.
Ian, sentado no carrinho, começou a balbuciar e bater as mãozinhas, chamando nossa atenção. Bernardo e eu nos viramos para ele, e um sorriso involuntário surgiu em meus lábios. Ian era tão inocente e alheio a toda a confusão ao seu redor.
— Olha só, ele quer participar da conversa — disse Bernardo, rindo levemente, sua expressão suavizando.
Ian continuou a bater as mãozinhas, um sorriso encantador em seu pequeno rosto. Aquele momento de leveza parecia aliviar um pouco a tensão no ar. Bernardo se aproximou do carrinho e pegou Ian no colo, levantando-o com cuidado. Ian riu, estendendo as mãozinhas para tocar o rosto de Bernardo.
— Ei, campeão — disse ele suavemente, olhando nos olhos de Ian. — Vamos cuidar de você, ok?
Observei Bernardo segurando Ian com tanto cuidado e ternura. Meu coração disparou, e uma onda inesperada de emoções me atingiu. Ver aquele homem, de quem eu apenas me lembrava como sendo um garoto babaca, demonstrar tanta delicadeza e carinho despertou algo profundo dentro de mim. Era como se, naquele momento, toda a tensão se dissolvesse, deixando uma conexão inesperada e intensa entre nós. Senti uma atração avassaladora, uma força que me puxava para ele, desejando entender mais sobre quem Bernardo Orsini realmente era. Desejando estar em seus braços novamente.
O hospital escolhido por Bernardo era um dos mais renomados da cidade. Ao entrar, fiquei impressionada com a modernidade e a eficiência do lugar. Era claro que ele não tinha medido esforços para garantir que o exame de DNA fosse realizado nas melhores condições possíveis. As paredes de mármore brilhavam com um luxo que parecia inatingível, e tudo ao redor exalava uma atmosfera de perfeição clínica. Eu teria preferido ter feito o exame no hospital onde trabalhava, mas também não queria dar motivos para Bernardo desconfiar que eu poderia manipular o resultado de alguma forma, devido aos meus contatos.Jonas tinha se oferecido para me acompanhar, mas antes eu não tivesse aceitado. Ele estava visivelmente tenso e agitado, seus passos rápidos e gestos nervosos revelando sua irritação. Podia sentir o calor de seu desconforto irradiar.— Eu ainda não acredito que você está levando isso a sério, Alice — disse, tentando manter a voz baixa, mas o tom de desdém era inconfundível. — Já deveríamos
Normalmente os dias no hospital eram bem intensos, mas hoje estava particularmente agitado. Aparentemente tinha acontecido um acidente de trânsito grave perto dali, o que resultou em corredores repletos de pacientes, médicos e enfermeiras se movendo de um lado para o outro. Eu mal tive tempo de respirar entre um atendimento e outro. Cada segundo contava, e a pressão era constante. Estava no meio de uma avaliação de um paciente quando o alarme do pronto-socorro soou, indicando mais um caso urgente.— Alice, precisamos de você na sala de emergência! — gritou uma das enfermeiras.Corri até lá, colocando minha máscara e luvas rapidamente. Uma mulher idosa estava tendo uma crise respiratória grave. A equipe já estava a postos, esperando por mim. Trabalhamos juntos para estabilizá-la, administrando medicamentos e monitorando seus sinais vitais. Após um período tenso, finalmente conseguimos estabilizá-la.— Bom trabalho, pessoal — disse, sentindo o alívio misturado ao cansaço. — Vamos mantê-
Fiquei parada por alguns segundos, tentando processar as palavras de Bernardo. "Alice, vou providenciar para que você e Ian se mudem para o meu apartamento. E também vamos nos casar." Aquelas palavras ecoavam na minha mente, cada sílaba parecendo mais absurda que a anterior. Quando finalmente consegui me mover, vi Bernardo se afastando pelo corredor, suas costas retas e postura confiante.— Belas costas... — murmurei enquanto mordia o lábio inferior, me perdendo por um segundo. — Merda, foco Alice!O corredor parecia se estender infinitamente enquanto eu corria atrás dele, meu coração martelando no peito. As paredes brancas do hospital, os rostos desconhecidos e a iluminação fria criavam um ambiente surreal, quase opressivo. Cada passo que dava em direção a Bernardo parecia me afastar mais da realidade que conhecia.— Bernardo! — chamei, minha voz tremendo levemente. Quando ele finalmente parou e se virou para me olhar, sua expressão impassível e os olhos brilhando com determinação me
Sorri para Liz através da parede de vidro que nos separava, enquanto eu observada a sala calma, cheia de berços. Alguns deles com crianças tranquilas que pareciam aproveitar o momento para dormir. Eu tinha a sorte de minha irmã mais velha trabalhar como cuidadora em uma creche, assim ela havia conseguido uma vaga para Ian, sem problemas, e eu ainda tinha a segurança de ter a pessoa mais responsável do mundo cuidado dele enquanto eu estava trabalhando.Ela fez um sinal para que eu esperasse por um momento e trocou algumas palavras breves com uma das outras cuidadoras, saindo discretamente da sala logo em seguida. Seguimos juntas até a cozinha onde ela preparou duas canecas de café fumegante.— Então, Alice — começou Liz, servindo-nos com alguns biscoitos. — Quero ouvir essa história direito. Como assim você vai passar o fim de semana com o tal Bernardo?Suspirei, mexendo no café com a colher.— É uma longa história, Liz. Tudo começou quando recebi aquela cesta com Ian...Liz assentiu, j
Entrei no hospital, ainda sentindo o peso da conversa com Liz. Precisava falar com Jonas, esclarecer algumas coisas e tentar entender o que realmente sentia. Minha mente estava uma confusão de pensamentos, e o ar pesado do hospital parecia amplificar meu estado emocional.— Você viu o Jonas? — perguntei a uma das enfermeiras na recepção.Ela olhou para a tela do computador e assentiu.— Sim, ele está na salinha de descanso.Agradeci e caminhei em direção à sala. Minhas mãos estavam suadas, e meu coração batia mais rápido a cada passo que dava. Quando cheguei à porta, ouvi vozes abafadas. Puxei a maçaneta devagar, tentando não fazer barulho, e entreabri a porta.O que vi me deixou paralisada. Jonas estava sentado no sofá, e Clarice estava ao seu lado, rindo e tocando o braço dele de forma íntima. Em troca, ele acariciava seus cabelos. Não havia nada explícito, mas o jeito como ela olhava para ele e a proximidade dos dois me fez sentir uma pontada de traição. Senti meu estômago revirar.
Quando o fim de semana finalmente chegou, eu estava parada na entrada do prédio luxuoso onde Bernardo morava. O porteiro me cumprimentou com um sorriso formal e me indicou o caminho até o elevador privativo. Eu nunca tinha visto um lugar tão opulento. O mármore brilhante, os lustres de cristal e as obras de arte nas paredes davam ao lugar uma sensação de grandeza que me deixava desconfortável.Chegando ao andar do triplex, fui recebida por uma funcionária impecavelmente vestida, que se apresentou como Marta. Ela sorriu educadamente e nos levou até o interior do apartamento. Fiquei impressionada com cada detalhe. Era um triplex gigante e superchique, com uma vista panorâmica do mar que parecia tirada de um filme. As janelas do chão ao teto permitiam que a luz do sol iluminasse cada canto da sala de estar decorada com móveis de design.— Bem-vinda, senhorita Bianchi — disse Marta, com um sorriso suave. — Vou levá-la ao quarto.Seguimos Marta escadas acima, e um outro funcionário logo tra
Depois de deixar Ian no quarto com a babá, desci para encontrar Bernardo na sala de jantar. Quando entrei, fui recebida por uma visão que parecia saída de um filme. A mesa estava posta com uma elegância impecável, digna de um restaurante três estrelas Michelin. Havia velas acesas, flores frescas e uma seleção de pratos requintados que me deixaram sem palavras.— Uau — murmurei, sentindo-me um pouco deslocada naquele cenário de luxo. — Você realmente não poupou esforços.Bernardo sorriu, levantando-se para puxar a cadeira para mim.— Quero que se sinta à vontade aqui. E achei que um bom almoço poderia ajudar.Sentei-me, ainda deslumbrada com a atenção aos detalhes.— Bom, você definitivamente conseguiu causar uma impressão.Ele se sentou à minha frente, pegando uma taça de vinho e oferecendo uma para mim.— Saúde, Alice. A novas experiências e novas possibilidades.Toquei minha taça na dele, sorrindo.— Saúde.Rapidamente o silêncio se abateu sobre nós. Desconcertada, me peguei brincan
Quando Bernardo abriu a porta de vidro que levava ao terraço, no terceiro andar do triplex, fui recebida por uma brisa fresca que trouxe consigo o cheiro salgado do mar. O terraço era enorme, com uma piscina infinita que parecia se fundir com o horizonte. Havia espreguiçadeiras confortáveis e um bar elegante, tudo rodeado por plantas verdes que davam um toque de natureza ao ambiente luxuoso.— Uau! Este lugar é incrível — murmurei, admirada.— Fico feliz que tenha gostado — respondeu Bernardo, seu sorriso suave.Começamos a caminhar pelo terraço, retomando a conversa que havíamos começado no almoço.— Então, Alice, você ainda não me contou por que escolheu medicina — disse ele, olhando para mim com curiosidade.Suspirei, lembrando-me das dificuldades que enfrentei.— Sempre quis ajudar as pessoas — respondi, sorrindo levemente. — Quando eu era pequena, houve um incidente que... foi bobeira, mas... Sabe quando algo te marca? Nós tínhamos ido visitar meus avós no sítio deles no interior