Não sai da cabeça

O dia inteiro foi arruinado por causa daquela mulher. Não queria admitir, mas desde o instante em que esbarramos no corredor, não consegui tirá-la da cabeça. Era irritante. O olhar dela, a forma como me desafiava sem nem saber quem eu era. E, mesmo depois que soube, continuava me encarando da mesma forma, como se não se importasse. Era como se estivéssemos constantemente em choque, faíscas invisíveis cortando o ar entre nós - e, por algum motivo, eu achava isso intrigante.

Sempre fui movido por controle. Quando algo fugia das minhas mãos, fazia questão de puxar de volta. Como um touro selvagem que precisava ser domado a qualquer custo. Talvez fosse por isso que a escolhi tão rapidamente, mesmo tendo opções melhores, mais qualificadas. As outras candidatas tinham aquele olhar - o tipo que eu odiava. Brilhavam demais, tentavam demais, encaravam como se o escritório fosse uma vitrine de oportunidades além do trabalho. Emma, por outro lado, me olhava como se não se importasse. E isso... bom, isso mexeu comigo.

Agora, aqui estou eu, sentado na minha sala, encarando o nada, com o nome dela martelando na minha cabeça. Emma. A maldita Emma, que eu escolhi para ser minha secretária. E por quê? Porque ela me desafiava. Porque ela fazia meu sangue ferver - de raiva, claro. Era isso. Precisava me concentrar. Retomar o controle. Era bom nisso.

- Olha só o meu irmãozinho, todo distraído. Isso nunca aconteceu.

A voz de Loke quebrou meu devaneio. Pisquei duas vezes, percebendo que ele estava encostado à porta, braços cruzados, um sorriso irônico no rosto. Me sentei direito, ajustando minha postura como se isso pudesse apagar o fato de que ele tinha me flagrado em um momento raro de vulnerabilidade.

- Não estou distraído - menti, a voz firme.

Loke arqueou uma sobrancelha, como se dissesse claro que não. E isso me irritou ainda mais.

O problema era esse: quando algo estava errado, eu mergulhava no trabalho. Era minha âncora. O lugar onde controlava tudo com um simples estalar de dedos. Mas agora... agora minha mente vagava, e o rosto dela surgia sempre que eu piscava.

E eu odiava isso. Odiava perder o controle.

- Me diz, quem está perturbando a paz do meu irmão mais velho? - a voz de Luke ecoou pela sala antes mesmo que eu notasse sua presença. Ele se encostou casualmente na mesa onde eu trabalhava, com aquele sorriso provocador que sempre usava quando queria cutucar.

Cruzei os dedos em frente ao corpo e desviei o olhar para um ponto aleatório da sala. Falar sobre sentimentos sempre me irritava. Eu preferia engolir tudo a ter que destrinchar o que estava se passando aqui dentro. Mas Luke sabia disso. Ele sempre soube.

Ele era meu irmão adotivo, mas isso nunca fez diferença. Éramos quatro, todos criados juntos, apegados como se compartilhássemos o mesmo sangue. Pelo lado do meu pai, tínhamos mais irmãos - muitos mais, na verdade -, mas minha mãe já fazia um milagre cuidando de nós quatro. Ela os amava como se cada um fosse uma extensão do próprio coração.

Luke foi adotado aos dois anos, eu aos três. Crescemos lado a lado, criando um vínculo forte. E sendo o mais velho, sempre me vi como o protetor - o urso feroz pronto para defender os irmãos a qualquer custo. Mas com Luke... nossa conexão era diferente. Talvez pela proximidade da idade, ou talvez porque ele conseguia enxergar além da minha fachada. Sabia dos meus segredos, das minhas falhas, até dos pensamentos que eu tentava esconder de mim mesmo.

- Você tá calado demais. Fala logo. 

Soltei um suspiro pesado, como se aquilo fosse o esforço de uma vida. Mas, no fundo, desabafar com ele era o que eu precisava.

- Você tinha que ver - comecei, balançando a cabeça, ainda incrédulo com a situação. - A mulher me desafiou sem nem piscar. Não demonstrou medo algum. E o pior? Ela nem trabalha na empresa. Mesmo assim, ficou ali, firme, encarando como se eu fosse só mais um cara qualquer.

Ouvi a risada abafada de Luke e virei o rosto para ele, franzindo as sobrancelhas.

- Você gosta de desafios agora? - ele provocou, arqueando uma sobrancelha. - Desde quando? Porque, pelo que eu me lembro, você odeia quando alguém te desafia. Odeia perder o controle.

Revirei os olhos, puxando o ar com força antes de soltar.

- Eu sei - admiti, a contragosto. - Mas com ela foi diferente. Não sei explicar.

Luke inclinou a cabeça, me estudando como se estivesse tentando decifrar um quebra-cabeça complexo.

- Então o grande controlador foi pego de surpresa. Interessante - ele sorriu de lado. - Mas me conta, irmão... o que você viu nela?

Fiquei em silêncio por alguns segundos. A pergunta ecoou dentro de mim, e por mais que eu buscasse uma resposta lógica, nada fazia sentido.

- Não faço ideia - murmurei por fim, sincero. - Talvez seja justamente isso. Ela não se encaixa em nada do que eu conheço... e isso me deixa completamente fora do eixo.

Luke sorriu, satisfeito com a minha confusão. E, de alguma forma, isso só me irritava mais.

- Vou deixar você pensando em tudo isso e espero que chegue à mesma conclusão que eu cheguei - disse Luke, com aquele tom provocador que me tirava do sério. - Acho estranho o que você tá sentindo. Volte ao trabalho e tente se concentrar. Afinal, seus dias de controle estão indo por água abaixo.

Franzi o cenho, recusando-me a acreditar nas palavras dele.

- Pelo contrário, irmão - rebati, mantendo a voz firme. - Vai ser divertido colocar aquela mulher no eixo. Você vai ver. No primeiro dia, ela vai entender como as coisas funcionam. Vai me entregar tudo o que eu preciso e vai manter a boca fechada. Vai responder apenas o que for necessário para o trabalho.

Luke soltou uma risada, balançando a cabeça em negação enquanto se afastava da mesa.

- Você acredita mesmo nisso? - perguntou, virando-se para mim antes de alcançar a porta. - Porque, sinceramente, acho que você nunca ficou distraído por causa de uma mulher. E quer saber? Vai ser divertido ver você enlouquecer... pela primeira vez.

Fechei a cara, cruzando os braços, o encarei com firmeza.

- Que tal você ir trabalhar e me deixar em paz? - resmunguei. - Afinal, eu sou seu irmão mais velho. E sou eu quem manda aqui.

Luke ergueu as mãos em rendição, mas o sorriso atrevido não saiu do rosto.

- Tudo bem, tudo bem... chefe - provocou antes de sair pela porta, me deixando sozinho e ainda mais irritado.

Suspirei fundo e encarei o relógio. As horas estavam passando rápido demais e, ao mesmo tempo, pareciam arrastar cada segundo como se zombassem de mim.

E sabe o que era pior? Eu estava com medo do amanhã.

Passei as mãos pelo rosto, tentando ignorar a sensação incômoda que crescia no meu peito. Eu cometi um erro. Com certeza cometi um erro. Não deveria ter me encontrado com aquela mulher, muito menos tê-la contratado. Por que eu fiz isso?

Eu nunca perco o controle. Nunca. Mas, desta vez, perdi. Droga.

Tentei me convencer de que ainda tinha uma saída. Talvez, se não conseguisse controlar a situação, eu poderia simplesmente demiti-la. Simples assim. Mandaria embora e contrataria alguém que soubesse exatamente o lugar que ocupa. Alguém que eu pudesse dominar.

Não alguém que me dominasse.

- É isso - murmurei para mim mesmo, como se repetir aquilo várias vezes fosse fazer parecer verdade. - Eu só preciso acreditar nisso.

Mas, no fundo, uma parte de mim sabia que não seria tão simples.

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